JORNAL A TARDE, SALVADOR, SÁBADO, 20 DE
DEZEMBRO DE 1975
J. Cunha pintando em seu atelier na Bolandeira |
Sertão e Luz estão representados
neste álbum de J. Cunha que mostra a sua vitalidade criativa e um estilo
próprio e inconfundível.Ele se define como um pintor
popular, de formação simples, buscando o essencial e mágico nas manifestações
do povo e transformando em símbolos de expressão artística.
Natureza e espinhos, sofrimento e
magia, atitude e sobrevivência, poesia e pobreza, festas e fitas, sacrifício e
sol, mística e espera, alimento e promessa, razão e dor, água e sal e Sertão e
Luz. Estas palavras ainda são insuficientes para refletir a importância do
trabalho de J. Cunha.
Ele foge da representação pura e
simples de cenas que servem de motivos para os seus trabalhos. Não é
simplesmente um homem que capta , copia ou transporta para ou qualquer outro
suporte uma cena. É antes de tudo um trabalho de criação, que surge
espontaneamente em sua mente.
As cenas que presenciou ou
presencia são jogadas num plano maior de magia. São símbolos e elementos
jogados por todos os espaços do suporte cada um no seu devido lugar e com a sua
importância. Sem dúvida que este álbum Sertão e Luz organizado por Carlos Ramon
Sanchez representa uma das coisas boas que aconteceu este ano nas artes em nosso Estado. Por
falar em Ramon não podemos esquecer que ele também organizou o álbum do Grupo
Etsedron.
FLORIANO TEIXEIRA NA GALERIA
TEMPO
Foi aberta, ontem, a exposição do
pintor Floriano Teixeira que gosta de dizer que é cearense nascido no Maranhão
e radicado em Salvador, ou baiano de coração. Como podemos observar, uma
mistura com cheiro de Nordeste. Como bom nordestino o Floriano ama a terra onde
trabalha, mas isto não impede que ele arrume as malas e vá para outro lugar. É
a migração que está presente em seu sangue quente e criador.
Pintor e ilustrador dos livros de
Jorge Amado e Graciliano Ramos, o artista Floriano Teixeira está mostrando o
que pintou nos últimos meses. Uma síntese da evolução do seu trabalho.
QUATRO BOAS EXPOSIÇÕES ESTÃO ABERTAS
Quatro grandes exposições foram
abertas ao público em
Salvador. A de J. Cunha, na Galeria O Cavalete; a de Paolo
Ricci, na Galeria Panorama; a coletiva de artistas baianos no atelier de Manoel Bonfim,
que transformou-se em Galeria; e finalmente, a de Floriano Teixeira, na Galeria
Tempo, no Salvador Praia Hotel.
São exposições que marcam
o ano de 1975 que se finda. São quatro exposições que contam com a participação
de expoentes das artes plásticas. É o encerramento do ano com chave de ouro, o
que demonstra que as artes plásticas na Bahia estão passando por um processo de
desenvolvimento e consequente crescimento do mercado.
Todos nós sabemos que o mercado
de arte ainda é pequeno e mesmo ingrato para aqueles que se dedicam a
comercialização.
Altos e baixos refletem a falta
de poder aquisitivo. No entanto a arte sempre foi consumida por uma elite e os
múltiplos certamente representam um caminho para a popularização da arte. As
gravuras, as litografias e mesmo os álbuns possibilitam que trabalhos de
artistas famosos sejam adquiridos a preços accessíveis. Espero que o ano de
1976 seja mais ainda promissor para este setor.
PAOLO RICCI NA GALERIA PANORAMA
Soltando Balão, trabalho de Ricci |
O escritor Jorge Amado muito
solicitado para apresentar artistas em seu depoimento sobre o trabalho de Paulo
Ricci escreveu : "Os noturnos de Paolo Ricci expostos em Salvador, têm uma força de
sugestão, um encanto de intimidade e segredo, consegue transmitir certas
atmosferas onde o casario quase é animado de uma alma e de uma vida. Lá estão
as ruas, as esquinas, os becos de Belém do Pará, tudo envolto em névoa e em
distância. E estão também dois momentos de paisagem noturna da Bahia, onde uma
luz mais forte se impõe.Tudo isto nos é dado numa pintura
feita com seriedade e boa qualidade. O moço paraense não é muito de modas, não
é muito novidadeiro. Prefere trabalhar e obter resultados de seu trabalho.
Estamos vivendo momentos dos festejos que antecede ao Natal. A figura do
velhinho invade nossos olhos no vídeo da TV, nas páginas de jornais e revistas.
Acontece que mesmo com a invasão das imagens natalinas um quadro de Paolo Ricci
me chamou a atenção. Soltando Balão, onde três figuras de mulher aparecem com
os braços estirados para o alto acompanhando o movimento do balão que parte
para o infinito. Uma pintura rica em tons e demonstra que o artista está pouco
preocupado com os modismos. Está ligado a uma temática popular em refletir
aquilo que lhe diz de perto, que fala mais alto em seus sentimentos. De um modo
geral gostei do trabalho de Paolo Ricci."
BONFIM REÚNE ORIXÁS E ARTISTA
O alegre escultor Manoel Bonfim
está movimentando o seu atelier no Morro do Conselho, o qual já virou galeria.
Assim ele conseguiu com a magia dos Orixás que o protegem reunir trabalhos de
Juarez Paraíso, Ângelo Roberto, Jenner Augusto, Mário Cravo, Edson da Luz,
Hilda de Oliveira, Leonardo Alencar, Edson Barbosa, Udo, Calasans Neto, Riolan
Coutinho, Tati Moreno, Oswaldo, Lygia Milton, Réscala, Floriano Teixeira,
Carybé e Mário Cravo Neto. Um grupo significativo de artistas baianos que deram
a mãos a Manoel Bonfim e em companhia dos Orixás vão balançar o Morro do
Conselho. A maioria dos artistas expositores é conhecida do público baiano o
que dispensa maiores comentários.
A mostrar foi aberta ontem e
prosseguirá até o próximo dia 4 de janeiro de 1976.
NÃO DESTRUIU POR ENQUANTO
A industrialização ainda não
destruiu a cultura popular no Médio São Francisco. Ela está representada em
algumas peças utilitárias, gravações de fotografias no Museu de Arte de São
Paulo. Não é apenas uma simples demonstração de objetos típicos, mas de um
levantamento do processo de formação desta cultura, influenciada basicamente
pela criação de gado, pela pesca, pela navegação e pela cana de açúcar.
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