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segunda-feira, 27 de outubro de 2014

LYGIA SAMPAIO EXPÕE AOS 86 ANOS DE IDADE

Lygia dando entrevista a uma
emissora de televisão na expo
.
Uma das primeiras  modernistas da Bahia , a artista Lygia Sampaio é hoje quase uma cult devido a sua vida pacata e ao afastamento do círculo cultural de nosso Estado. Aos 86 anos de idade ela volta a aparecer agora com uma exposição no Museu de Arte Sacra da UFBa ,o que é muito importante para as novas gerações conhecer esta artista de talento, mas, que não conseguiu ou não quis acompanhar de perto o movimento e a produção de arte. Talvez um pouco culpa do seu temperamento quieto ou mesmo por uma opção de ficar reclusa cuidando de sua vida como funcionária pública e doméstica.
Leonel Matos e Reynivaldo
Brito ao lado da artista
Porém, o que nos revela é que Lygia nunca deixou de pintar. É verdade que não é uma produção comum a um artista que esteja no mercado disputando o seu espaço. Porém, lhe permitiu  ficar com os  pincéis e outras ferramentas de trabalho expressando seus sentimentos através de sua arte.
Quando comecei a me interessar por arte já ouvia falar de Lygia Sampaio. Certo dia fui a uma exposição no antigo Desenbanco onde pude apreciar a qualidade, a expressividade  e a beleza de sua arte. Depois poucas vezes ouvi falar da artista, mesmo frequentando o círculo de arte e mantendo contatos com muitos artistas. Como uma monge Lygia vivia recolhida no seu mundo particular , longe das vernissages e dos encontros de arte.

Cici e Vardete, óleo de Lygia,1949
Recentemente ela falou mais ou menos assim, com seu jeito cheio de simplicidade, que tinha feito umas santinhas e que as achava bonitinhas. Em seguida arrematou : não sei se estou fazendo isto porque já estou velha. Esta é a Lygia Sampaio, com seu corpo frágil, falando baixinho dando mais uma demonstração do seu temperamento humilde.

Não vejo  indiferença do meio artístico com relação a ela. Todas às vezes que ouvi alguém falar de Lygia Sampaio surgiram os elogios. O que deve ter acontecido é quando um artista se esconde, fica recluso ele está dando sinais ao mercado e aos colegas que não quer ser importunado.Ora, o mercado é dinâmico, a vida é dura pra ser tocada, então o recluso vai ficando naturalmente de lado. Este distanciamento muitas vezes funciona como um start e o artista passa a produzir mais e mais . Outras vezes, a falta de estímulo de colegas e do mercado fazem com que o artista produza muito pouco e não evolua.
Centro histórico pintado por Lygia há algumas décadas.


Lygia frequentou a Escola de Belas Artes, mas terminou abandonando devido aos horários que eram conflitantes com os da Prefeitura onde trabalhava. Ela lembrou também que quando estava estressada  no trabalho dava uma volta pelo centro histórico e fazia alguns desenhos . Naquela época esta região da cidade era tomada por prostitutas e malandros especialmente a área do Pelourinho. Portanto, de certa forma ela se arriscava para praticar a sua arte.
Estive na abertura da exposição de Lygia e fiquei realmente impressionado com os desenhos, as xilogravuras e os quadros a óleo que ela pintou durante seus 60 anos de arte. Sendo uma das pioneiras do modernismo baiano e brasileiro Lygia Sampaio precisa ser melhor avaliada e valorizada pela qualidade de sua arte e por este legado que deixa para a arte brasileira. 
Senti de perto que esta mulher valorosa, hoje, frágil, devido aos seus 86 anos de idade , tem uma história de vida dedicada à arte. 
Estava  feliz e rodeada de muitos amigos . Poucos artistas das  novas gerações estiveram presentes na vernissage. Isto é uma demonstração de desinteresse  em aprender, em melhorar a arte que produzem, com uma artista que verdadeiramente sabe pintar.

quarta-feira, 15 de outubro de 2014

O PRETO NA PINTURA DE GIANFRANCO D'ANDREA



Ao chegar no espaço  do Restaurante Saúde Brasil, na Rua Humberto de Campos, no bairro da Graça, onde estava a exposição de Gianfranco D'Andrea chamou a minha atenção a cor preta, sempre presente em todos os quadros expostos. Não é um preto que encontramos constantemente na maioria das telas e outras manifestações visuais.Não, é um preto denso, onde seu olhar é deslocado e, em seguida passa a focar outros elementos da obra.
O preto dá uma dramaticidade inquietante. Em determinado momento, notamos que tem algo bem racional, que nos transporta à pintura de Francis Bacon, especialmente uma das obras,  que apresenta um homem sentado numa cadeira pisando numa mancha rósea.
Natural de Roma o pintor Gianfranco  observou que sua cidade veste-se de negro para aguentar o tráfego pesado do dia a dia em suas ruas e avenidas. É o preto do asfalto betuminoso que impede a penetração das águas das chuvas no solo e a deixa escorrer pelos esgotos, que vão poluir rios e mares. Enquanto os carros passam celeremente por cima do negro asfalto trazendo conforto a seus condutores e passageiros. 
Diante da sua reflexão o artista decidiu aplicar  o betume negro em suas telas dando-lhe um uso mais nobre para a contemplação daqueles que tem a sensibilidade de ver e refletir.


Num dos quadros expostos senti a presença da bela e romântica Veneza. Com seu ambiente triste ao entardecer, muito bem lembrada por Charles Aznavour na canção " Come'e'Triste Venezia".
 Numa viagem que fiz à Europa desembarquei em Veneza exatamente ao entardecer. Senti a tristeza cantada pelo cancioneiro armênio-francês e agora lembrada neste quadro acima.
Muitos dos quadros presentes na exposição tem uma áurea de saudade, de uma tristeza da terra que ficou para trás, além da tranquilidade que perpassa o nosso espírito.
Suas pinceladas definem os volumes sem detalhar. Suas telas fascinam também, por transportar-nos à quietude , embora estejamos numa metrópole barulhenta.