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sexta-feira, 1 de março de 2013

FOGO E UMIDADE ! -19 DE JANEIRO DE 1981.


JORNAL A TARDE, SALVADOR, 19 DE JANEIRO DE 1981.

                                             
                            FOGO E UMIDADE !
Depois do triste episódio que consumiu importantes obras de arte como o incêndio no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro somos novamente surpreendidos com novo incêndio, desta vez, no Museu da Imagem e do Som, também do Rio. Todos nós sabemos que a cultura neste País tem recebido das autoridades um tratamento inadequado e estúpido.
Cultura não interessa porque não dá votos – quando existe eleições – e os promotores pouco aparecem. Além de ser difícil fazer uma mensuração visual, o que não acontece com a construção de um elefante branco qualquer!
Vejamos que em pleno Rio de Janeiro, no sul maravilha, o Museu que guarda parte da memória nacional funcionava num velho prédio e sua sede data de 1922, uma construção precária que não tinha recebido nem o visto do bombeiro.
Por sorte e, chegam até a dizer que Deus é brasileiro as 80 mil fotos, 40 mil discos , os arquivos de Jacob do Bandolim, Almirante e da Rádio Nacional e, mais de 300 depoimentos de personalidades de nossa cultura, muitos dos quais já falecidos foram salvos pelos zelosos funcionários que em fila indiana iam passando os documentos de mãos em mãos salvando milagrosamente o Museu da Imagem e do Som.
É preciso cuidado com o que nos resta da cultura e da memória nacional. É preciso olhar os nossos museus baianos, carentes de verbas, de pessoal especializado e de movimentação cultural.
Lembro-me agora que há pouco tempo tive o desprazer de presenciar como são guardados - o termo não é este certamente ! - obras importantes do Modernismo brasileiro. Assim, você encontra telas de Tarsila do Amaral, Di Cavalcanti, Portinari,e outros amontoadas em rústicos armários do Museu de Arte Moderna da Bahia, sujeitos a umidade que vem do mar e bate nas paredes do velho Solar do Unhão. Em primeiro lugar, pela própria localização do Museu, no Solar do Unhão, torna-se difícil a conservação das obras porque o salitre danifica com muita facilidade e é quase impossível recuperá-las. O ideal seria a construção de um Museu de Arte Moderna num local mais acessível. Arte não é supérfluo ,como podem pensar alguns insensíveis burocratas tecnocratas da administração estadual. Arte é uma necessidade inerente ao homem civilizado. É hora do Conselho de Cultura, da Academia de Letras e outros importantes órgãos de nossa cultura levantar voz em defesa do patrimônio que está sendo danificado no Museu de Arte Moderna da Bahia, que de museu só tem o nome.

EXPERIÊNCIAS URBANAS DE CINCO ARTISTAS PAULISTAS

Com interesse de divulgar para fora de sua cidade de origem os trabalhos que refletem suas experiências urbanas de intensa mistura cultural, estão participando de uma exposição coletiva os artistas plásticos paulistas Carlos Motta, Circe Bernardes, Gregório, Maique Buser e Maninho.
A coletiva inaugurada dia 15 no Solar do Unhão é uma promoção da Fundação Cultural e reúne trabalhos em diversas técnicas de desenho em pastel, esculturas de ferro, óleo,gravuras em metal a objetos e móveis de madeira.
Painel de Circe Bernardes e Maique Buser , na Rua da
 Consolação, em São Paulo
Para Circe a única mulher do grupo, seus desenhos são o resultado de seu momento atual. Fiz estes desenhos quando , recentemente, passei uma temporada na praia. Já participou muitas vezes de hapennings nas ruas de São Paulo e uma das experiências mais excitantes foi quando realizou um painel de 8 por 4 metros com tinta de parede na movimentadíssima Rua da Consolação. Essa e tantas outra realizações justificam muito bem a sua atenção voltada para a vida e necessidade da grande cidade. Ela atribui e reconhece em si este interesse pela rua como uma influência naturalmente absorvida por seus contatos constantes com as festas populares do interior paulista, onde a prática espontânea de expansão da comunidade é ainda hoje muito forte.Gosto do desenho, do gesto de desenhar, virar a mão e ver surgir a imagem, a cor, a luz, a sombra. Gosto de ver os objetos , as coisa vivas, examinar particularidades de cada um, a forma, o modo de absorver a luz para si ou refleti-la para meus olhos. É desta maneira prazerosa que Cissi , também graduado em arquitetura, se aproxima da arte.
Carlos Motta é arquiteto. Quando cursava o terceiro ano de faculdade iniciou uma pesquisa em madeiras e mobiliário. Usou a oficina da escola executando os primeiro protótipos, muito simples, pois até então não conhecia as técnica de marcenaria.
Carlos passou o ano de 1977  na Califórnia, nos Estados Unidos, estudando e trabalhando com técnica de construção de madeira e ferro e lá fez suas primeiras esculturas. De volta ao Brasil no ano seguinte, abriu uma oficina em São Paulo onde vem executando móveis, objetos e esculturas.
Já se contam seis anos que Carlos desenvolve esta pesquisa onde não faltam visitadas as matas brasileiras e as serrarias espalhadas por todo o país. É com certo orgulho que ele se define como um artesão, um marceneiro que vem observando os diversos tipos de madeira, de encaixe,de acabamento e o tipo de mão de obra utilizado nas marcenarias populares.
Segundo Carlos, seu trabalho com madeira é feito de modo a compatibilizar às necessidades de consumo com a realidade brasileira e é uma atitude crítica que comenta o desmatamento irracional, burro e até mesmo anti-econômico das nossas reservas florestais. Os prejuízos sociais e ecológicos da exploração madeireira no país já vem sendo por demais denunciadas, mas o que é de espantar, num sistema onde os lucros e dividendos automáticos são o todo poderoso, que esta prática seja anti-econômica.
E, ele dá um exemplo: aqui abatem-se árvores de 10 metros cúbicos e só quatro a cinco metros são aproveitados, o resto eles queimam, perdendo uma enorme quantidade de matéria orgânica perfeitamente aproveitáveis para fonte de energia, adubo, aglomerados e componentes industriais.
Maninho :uma forma de sentir a paz", óleo sobre tela
Maninho, outro artista do grupo expõe telas em óleo. Seu trabalho é um estado de espírito uma busca de liberdade. Uma forma de me sentir em paz. É o único baiano mas já há algum tempo radicado na capital paulista onde participou de diversas coletivas e de uma individual na Galeria Manduri.
Gregório  é desenhista ,pintor, gravador, escultor, que vem expondo desde 1971 em diversos eventos importantes como por exemplo na Bienal Internacional de São Paulo em 1979 e na Bienal dos Jogos de Paris em 1980 e em várias individuais entre o Rio de Janeiro, Brasília, Porto Alegre e agora em Salvador traz parte do seu trabalho em gravura sobre cobre e zinco. A temática que aborda gira em torno da vida cotidiana da grande cidade.
Fazendo parte desta coletiva está também o artista Maique Buser que expõe esculturas em ferro. Seu depoimento é o seguinte; Conhecemos nosso corpo por sensações, observação e analogia. As sensações nos localizam parte do corpo em relação ao resto, tanto na pele como nos órgãos interiores, contudo as sensações não nos informam o que não é corpo.
A imagem do corpo expressa pela sensações será então uma esfera. Pela observação vemos parte do nosso corpo mas não conseguimos ver globalmente. Nossas costas são vistas pelos outros, deduzimos nossa conformação corporal e é apoiado nessas premissas que pretendo aproveitar estudos de expressão tridimensional.

                  UM SOLITÁRIO PINTOR HOLANDÊS

Uma das mais importantes contribuições para a recente Bienal de Paris foi a obra de Kees Smits nascido na Holanda  em 1945 o qual pode ser considerado um verdadeiro solitário no mundo da arte holandesa.
Ao contrário do trabalho da maior parte dos artistas sua pintura é realmente única, e não pode ser comparada. Não é definível e nem se enquadra em uma escola específica; tão pouco demonstra influências claras; é um trabalho raro e arbitrário.
Uma explicação desta sua atitude diferente seria o fato dele trabalhar dentro da tradição da pintura: na verdade ele mistura o nível pictórico e o nível do imaginário.
Deveras , ele não está interessado no resultado material ou visual e nas referências ilusionistas  ou simbólicas, nem busca obter uma clara e demonstrável reconhecibilidade, mas está interessado na ação, com referência ao plano, está interessado na maneira pela qual ela se origina .
Kees Smits busca a união indivisibilidade  convertibildade da forma ou do pensamento. Com a ação mão fazendo. Na verdade, ele retoma uma atitude semelhante a de Cézanne. Porém, onde Cézanne parte de um certo número de premissas, as imagens de Kees Smits se originam por assim dizer impulsivamnete  e neste aspecto ele clara ou diretamente se deixa ligar às condições dos Impressionistas quer dizer: esta imagem resulta de um momento de ação, quando pintar não é mais que dar forma a um evento.
A pintura, como resultado da ação está subordinada ao tempo e como tal, é incidental.Como conclusão ou conceito final a imagem não pode ser definida de forma absoluta mas deve ser observada ou avaliada  segundo o histórico de sua execução. Isto de fato representa o ponto de ruptura com a arte do século XX no qual, como é sabido, forma e ação se tornaram totalmente independentes.




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