JORNAL A TARDE, SALVADOR, 13 DE OUTUBRO DE 1979
CADASTRAR O QUÊ?
Na entrada principal do Solar do Unhão aparece o ambiente do matadouro de Chico |
Murilo merece destaque |
Obra de Zivé, bom trabalho |
Para
o público porque fica obrigado a percorrer quatro grandes salões onde estão
expostas baboseiras, tendo o trabalho de selecionar o que realmente
serve.Isto caberia aos organizadores que
deveriam ter evitado a exposição de quadros de borboletas e igrejinhas sem
perspectivas. Para o artista, repito, porque deram oportunidade a incompetentes.
Acredito que no fundo os realmente artistas estão insatisfeitos com este
nivelamento.Ficaram mais interessados na quantidade do que na qualidade.
Cheguei a ouvir que a coisa teria tomado nível de uma bienal. É verdade que
críticas tem sido feitas às bienais, mas esta comparação é bestialógica.
PREVISÃO
Ao
reler o Jornal Cadastro deparei-me com
uma previsão de Ivo Vellame: Acredito que nós veremos nesta mostra da
Fundação Cultural da Bahia o que creio ser o caos em termos de artes plásticas
no Brasil, onde se faz de tudo, onde todo mundo acha que é artista, sem ter
mesmo o mínimo requisito técnico e qualquer vocação de criatividade. Até ai
concordo com Ivo , e sua previsão é hoje uma realidade palpável. Quem duvidar
basta percorrer os salões do conjunto do Solar do Unhão. Mais discordo quando
Ivo defende que mostrar isto, entretanto, significa verificar o que a Bahia
está produzindo, permitindo fazer uma seleção...A seleção a meu ver caberia
antes da mostra.Expor o imprestável é incentivar o desqualificado, é incentivar
o incompetente, é incentivar o desprezível. Acho que todos tem o direito de
pintar, mas não cabe a um órgão cultural expor tudo. Cabe a qualquer órgão
cultural educar e para isto deve criar as suas oficinas de trabalho para
ensinar esta gente a trabalhar uma tela ou um pedaço de compensado para fazer
uma gravura, e quando tiver amadurecido que o trabalho seja mostrado.
Outro
aspecto é a responsabilidade que tem uma instituição como o Museu de Arte
Moderna da Bahia. Muitos desses pseudo artistas vão ostentar seus nomes com o
nome inserido na relação dos expositores nos famigerados currículos:uma
exposição no Museu de Arte Moderna da Bahia, outubro de 1979. Portanto, está ai
o comprometimento de uma instituição que deve ser respeitada e acima de tudo
preservada destas tristes cenas.
O
JEITO BRASILEIRO DE AGIR
Tive meu nome inserido na programação dos eventos (?) que deveriam acontecer durante a Exposição Cadastro para um debate juntamente com Matilde Matos, Ivo Vellame, Chico Liberato e outros, no último dia 8. O convite me foi formulado através de um telefonema. Com toda boa vontade compareci no horário determinado e quando lá cheguei encontrei uma porção de artistas misturados com outras pessoas alheias às atividades culturais. De início estavam criticando os jornais e estações de rádio e televisão por não darem destaques aos eventos (?), subseqüente à Exposição Cadastro. Fiz ver que os eventos ( ?) não tinham sido sistematizados e que os órgãos de comunicação nada tinham a fazer ali, porque nada estava acontecendo. Foi ai que as discussões enveredaram pelo caminho do que vamos fazer a partir de agora. Ora, a programação deveria ter sido estudada, sistematizada e formalizada. As discussões infantis ou juvenis que presenciei vieram apenas somar ao meu desalento. Nada foi acrescentado. O que fizeram mercê uma reparação através de uma promoção organizada onde os verdadeiros artistas ter o necessário apoio inclusive poderia se pensar
E
O CADASTRO?
Tive
o cuidado de examinar até a denominação da mostra. Exposição-Cadastro.
E o velho Aurélio Buarque de Holanda Ferreira em sua obra Novo Dicionário da
Língua Portuguesa, 1ª edição, na página 247 nos ensina: Cadastrar. Fazer o
cadastro, e a seguir: Cadastro: 1 registro público dos bens imóveis de
determinado território .2. Registro que bancos ou casas comerciais mantêm de
seus clientes, sua probidade mercantil e situação patrimonial. 3. Registro
policial de criminosos ou contraventores. 4. Conjunto de operações pelas quais
se estabelece este registro. 5. Censo, recenseamento.
Portanto,
o que constatamos é que a palavra cadastro destoa do trabalho artístico. O
trabalho de um artista é muito mais de que um móvel ou coisa semelhante. A
criatividade é de difícil mensuração e a obra de um artista não se completa
numa exposição como esta. O que deveria ter feito a Fundação Cultural do Estado
era destacar a obra dos valores artísticos baianos e em seguida promover uma
grande exposição. Espero que este cadastro que pretendem fazer, seja um castigo
para aqueles que colocaram obras de má qualidade, que são os verdadeiros
contraventores deste mercado de arte incipiente. Vieram piorar a situação e por
isto merecem o castigo do cadastro, do censo ou recenseamento. Os bons artistas
devem estar longe do cutelo deste cadastro.
Nenhum comentário:
Postar um comentário