JORNAL A TARDE, SALVADOR, 15 DE ABRIL DE 1985.
OLHE AS PINTURAS QUE ENFEITAM OS
BOTEQUINS
Uma pintura típica de botequim. As figuras e a composição são resultado de manifestação popular |
E
seus autores? Muitas vezes é gente muito humilde que mal sabe escrever o
próprio nome. Mas, são pessoas que transbordam de sensibilidade e é,
exatamente, esta sensibilidade que consegue sobrevier vencendo a desinformação
e mesmo a falta de apoio que me chama mais atenção.
Muitas
destas pinturas ricas em expressão e até como documento,porque algumas foram
pintadas no princípio do século,resistem bravamente às várias camadas de tintas
que os proprietários mandam colocar nas paredes de suas lojas. Às vezes estão
até esmaecidas ou sujas pela ação implacável do tempo e principalmente porque
ficam expostas.
Agora
sou informado com muita alegria que já existe há alguns anos o interesse por
parte de alguns pesquisadores em resgatar esta manifestação. O Instituto
Superior de Cultura Brasileira, uma instituição privada, sem fins lucrativo,
dedicada à pesquisas de etnologia,sociologia, e arqueologia está tentando
reestudar e retomar o projeto.Pinturas de Botequins, que deu início em 1983, a um levantamento
dessas obras no Meyer, no Rio de Janeiro.
Este
exemplo é bom que frutifique. E os nossos burocratas da Fundação Cultural da
Bahia precisam atentar para esta e outras manifestações da cultura popular que
precisam ser resgatadas e preservadas. Mas, este país é um país do – jeitinho –
e do improviso, tudo vai passado despercebido ou deixando para depois – deixa
pra outro dia - . Assim já perdemos muita coisa importante tanto nos setor da
arquitetura como do patrimônio histórico.
Quem
duvidar que dê uma olhada nas ruas adjacentes ao Conjunto Arquitetônico do
Pelourinho que ficará alarmado e até pensará que está visitando uma cidade
bombardeada pela aviação de um país inimigo durante a Segunda Grande Guerra,
tal é o número de prédios em completa ruína.
Estas
pinturas esquecidas e apreciadas por àqueles que têm maior sensibilidade
merecem ser estudadas e discutidas por seu valor como manifestação e também
porque muitos artistas conseguiram e ainda conseguem sobreviver graças a elas. Muitas
vezes elas estão escondidas por trás de garrafas de pinga, latas de leite em pó
e até engradados.
Em
Salvador estas pinturas estão presentes nas barracas que servem de centro de
animação nas festas populares. Algumas até com nomes sugestivos e outras
calcadas no caráter ingênuo do primitivo.
Atento
e sensível o fotógrafo Carlos Santana ao
passar pela barraca do Peléo, em Piatá, foi chamado a sua atenção por estas
pintura ingênua, mas que refletem elementos importantes da orla marítima.
O
Farol de Itapuã , sempre vigilante, ajudando os navegantes e o grave problema
da moradia que aflige o brasileiro e especialmente os baianos, onde grande
parte de sua população habita casebres infectos e ficam dependurados nas
encostas à espera das chuvas de abril para rolarem com seus ocupantes encosta
abaixo.
As
gaivotas amenizam um pouco a imagem e o coqueiro que oferece seus frutos para
matar a sede e a fome. A cor é forte, como é forte e espontânea esta
manifestação. O autor é Climério, o qual ainda não tive o prazer de conhecer.
No entanto, acredito que seja uma pessoa do povo onde realmente estão latente
as expressões mais vivas e significativas deste país.
PAULO
SERRA EXPÕE SEUS CARTUNS SOBRE O ÍNDIO
Mais
de sessenta cartuns de Paulo Serra o criador do personagem ecológico Mero, onde
figura a problemática indígena no país, serão apresentadas na Galeria Solar do
Ferrão, do Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia – Ipac – no
período de 18 de abril a 11 de maio deste ano, durante a exposição Brancos
Fora. A abertura da mostra promovida pelo Ipac será no dia 18 próximo, a partir
das 18 horas, mas antes às 15:30 minutos o cartunista fará uma palestra sobre o
tema da exposição para os estudantes das escolas da área do Pelourinho, Maciel
e a comunidade em geral. A
exposição da Galeria Solar do Ferrão, situada na rua Gregório de Mattos, número
45, Pelourinho,é um dos eventos programados em Salvador por ocasião das
comemorações do Dia do Ìndio, que
Transcorre
em 19 de abril. Os cartuns foram produzidos entre os anos de 1977 e 1985 e não
estão á venda, conforme esclarece Paulo Serra. Sua idéia é reuni-los num álbum
a ser editado futuramente, cuja renda será revertida em favor da causa
indígena.
LINGUAGEM
VISUAL
Embora
não tenha uma convivência direta com os índios, o artista diz ser apaixonado
pelo tema. Os trabalhos, afirma, são criados geralmente a partir da leitura de
algum assunto referente aos índios. “Sempre tento engajar a minha arte”,
confessa Paulo Serra.Através dos cartuns, ele procura transformar numa
linguagem visual uma situação real vivida pelos índios. A linguagem da arte
permite um retrato mais fiel da realidade”,comenta ainda Paulo Serra,
acrescentando que em seus trabalhos há sempre uma intenção de passar uma
verdade, uma crítica, de maneira que o cartum não se limita apenas ao humor.
Com
31 anos de idade , atualmente, formado em Comunicação Social
pelas Faculdades Integradas Alcântara Machado, de São Paulo, o artista é baiano
e dedica-se a sua atividade desde o ano de 1976, quando criou o personagem
Mero. A fama de Mero é tão intensa que normalmente a pessoa associam o nome do
cartunista a desse personagem ecológico.
Paulo
Serra tem realizado diversas exposições por ocasião da Semana do Índio. Em
1982, por exemplo, mostrou seus trabalhos na Escola de Administração da Bahia –
Trabuco . No ano seguinte fez exposição na ECUM – Extensão Cultural da Mulher,
e, no ano passado no Sindicato dos Professores, esta última uma coletiva com o
artista Fernando Hughes.
No
momento além de se dedicar com o habitual entusiasmo aos cartuns, ele faz
palestras em escolas abordando assuntos ecológicos, colabora com jornais e
presta serviço na área de programação visual a algumas empresas. Também é
membro do Grupo Ambientalista da Bahia – Gambá, da Comissão de Avaliação
Técnica Sobre Abaeté, Associação nacional de Apoio ao Índio – Anai-Bahia, e do
Conselho de Defesa da Paz – Condepaz.
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