JORNAL A TARDE, SALVADOR , 07 DE MAIO DE 1984.
A ARTE DE JENNER É UM CONTÍNUO
APRENDIZADO
Auto-retrato datado de 1948 |
“Pintor
dos que mais sabem e mais aprendem”, como escreveu o poeta Vinícius de Moraes,
posso acrescentar que sua obra é fruto de um trabalho constante, cuidadoso e
meticuloso. Um trabalho buscado com muita garra e talento. Este sergipano, meio
desconfiado, como de resto é a maioria dos sergipanos, sabe como ninguém do
sofrimento da sua gente e mesmo enxergando a beleza das flores e das paisagens
marinhas não esqueceu de registrar a sua desaprovação com a miséria de
Alagados, a violência da guerra em uma forma mais extrema.
Coroinhas e Pássaros , obra de 1979 |
Sendo
Jenner sergipano de nascimento, fico mais à vontade para escrever porque sou
meio sergipano. Filho de uma sergipana de Riachão dos Dantas, uma cidadezinha
escondida no interior deste estado-irmão, onde vivi quase toda minha infância,
numa fazenda às margens do Rio Piauí..
A tela Itapuã, também de 1979, na visão de Jenner |
A sua interpretação inconfundível de Alagados |
Esta reprodução dá ideia do seu colorido |
Soldado Morto, 1975. |
ESTA
EXPOSIÇÃO
Agora
volta Jenner Augusto a brindar a Bahia, que abraçou como pouso para sua
existência, com uma exposição de 27 quadros, na Galeria Época, no Rio Vermelho,
até o próximo dia 12 do corrente mês. São telas onde a presença da natureza
dá-se em todo esplendor, através de paisagens e mesmo nas figuras humanas.Toda
a exposição de Jenner Augusto está vendida. Os preços variam de CR$750 a
CR$1,500,00.
Um
traço característico de sua arte é que mesmo mostrando os horrores da miséria
de Alagados do Nordeste, ele ainda consegue ser lírico sem ser simplório,contraste
com o irreal. Vejo nele a permanência de um pintor, através desses anos, rico
em criatividade, inesgotável nas formas de conceber. A sua obra é inconfundível.
Recentemente
falei de Pancetti, das suas marinhas, de sua ligação com o mar.Também Jenner,
morador do Rio Vermelho, onde o mar se escancara azul é um amante deste gigante
que urra nas noites
Consegue
traduzir através de suas pinceladas seguras aquele outro lado belo, em chuvosas
e sussurra baixinho no entardecer, com suas pequeninas vagas beijando a areia.
E Jenner, de ouvidos e olhos alertos acompanha este movimento. Ouve estes sons
e examina suas cores, ora esverdeadas, ora mais azuladas, ora com um azul mais
forte. É um penetrar de emoções que resulta em altos momentos de arte; os céus
pintados por Jenner têm mais significado, são um canto de amor. Mais belo ainda
é o encontro do céu com o mar nas extremidades de suas telas. Quando as olhamos
na vertical, nos dão uma sensação de paz e harmonia.
Jenner
é um homem em paz com a vida. Sua obra rica em sensualidade é resultado do seu
papel de intérprete de paisagem e da gente baiana. Entendo que ninguém soube
captar, tão bem, a alma da gente baiana,
como este sergipano..
“A
tela é o espaço em branco: a cor, o universo”, esta frase de Jenner tem um
significado muito profundo. A tela, este espaço branco a ser preenchido pelo
talento do artista. Lembro-me agora dos momentos, dos segundos, vivenciados por
todo artista diante deste espaço em branco, no desejo ardente de preenchê-lo
com algo que reflita este desejo. A cor, como uma visão mais aberta do universo
que será criado naquele instante. Sairá uma figura humana, um coroinha, um
carneirinho ou uma paisagem marinha. Depende das formas que vão brotar do
pincel de Jenner,depende do universo da cor que ele vai viajar.
“Não
alimente monstros. E, sim, motivos plásticos!”, os monstros que alimentamos
diariamente nos momentos de ira, nos momentos de fraquezas não têm lugar
porque um olho vidrado de cólera não vê
a transparência das folhas verdes nem o azul do céu. Pinta embaçadas
circunferências desumanas”.
Assim
nosso Jenner sai ao encontro da cor e a encontra grandiosa na natureza
exuberante e bela deste país tropical.
UM
POUCO DE SUA VIDA
Paisagem da Bahia, de Jenner Augusto |
Para os mais jovens e variados leitores desta coluna, vou dar uma rápida pincelada sobre a vida de Jenner Augusto.Nasceu em 11 de novembro de 1924 em Aracaju, Sergipe , filho do funcionário Augusto Esteves da Silveira e Maria Catarina Mendes da Silveira. Residiu em Rosário, São Cristovão, Itabaianinha, Lagarto e Laranjeiras, todas cidades sergipanas. Acompanhando a mãe , professora pública, volta com seu irmão, o nosso professor Junot da Silveira, para Aracaju, em 1944. Realiza sua primeira exposição em 1945. Vende um quadro. Em 1947 já estava mais integrado aos movimentos artísticos da capital. Em 1948 faz sua segunda exposição onde desponta rompendo com o academicismo reinante. Vieram novas exposições. Em 1950 participa do Salão baiano de Artes, travando conhecimento com Mário Cravo Junior, Rubem Valentim e outros. Em 1951 já figura na Bienal de São Paulo. Casa-se com D. Maria Luiza Mendonça. Em 1953 obtém o Prêmio Universidade Federal da Bahia no V Salão Baiano de Belas Artes. Em 1955 passa a morar no Rio Vermelho e daí em diante veio uma série interminável de exposições do Sul do país. Obtém outros prêmios, e vários livros, artigos e reportagens são publicada sobre sua obra, que hoje continua sendo enriquecida pelo seu talento e amadurecimento plástico.
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