JORNAL A TARDE, SALVADOR, 25 DE MARÇO DE 1985.
TREZE CERAMISTAS DIA 29 NO MUSEU DE ARTE
Quando vejo uma cerâmica lembro dos Índios Kiriris, de Mirandela, que através dos séculos amassam o barro confeccionando potes e panelas e às sextas-feiras vão exibi-los na feira da Ribeira do Pombal: Irregulares na forma, mas vigorosos, capazes de suportar o trote dos burros pelas estradas tortuosas das roças até a cidade. Durante o dia elas as poteiras, como costumamos chamá-las, ficam esparramadas no chão com suas saias bem rondadas comercializando os seus potes e panelas de barro.
Aqui
na cidade grande a cerâmica é mais bem tratada, as formas são regulares e suas
superfície bem lisa. O barro é mais acurado, branco ou moreno, e as peças finas
são exibidas nas galerias e boutiques como objetos de arte, utilitários ou
adornos.
Na
realidade existe um relacionamento muito grande entre o homem e a terra, afinal
dela vivemos e é nela onde vão descansar os nossos restos mortais.
O
ato de amassar o barro, de dar-lhe formas sempre encanta. Fico realmente
entusiasmado quando o torno começa a girar e aquele bolo disforme de barro vai
se afinando até surgir, com o auxílio de mãos hábeis um vasilhame ou objeto
qualquer.
Agora,
Ana Teresa, Suca, Grace, Davi, Messias, Betânia, Hylda, Osmundo, Eckenberg,
Regina, Yola, Cate e Udo vão expor, a partir do dia 29, no Museu de Arte da
Bahia, os seus trabalhos em cerâmica.
Será
um acontecimento importante, especialmente porque são raras as exposições de
cerâmicas realizadas em Salvador, e um grupo tão heterogêneo possibilitará que
apreciemos os vários estilos e formas.
“Cerâmica
a arte da transformação” é o encontro de 13 ceramistas que durante 15 dias vão
mostrar o que de mais significativo fizeram ultimamente.
No
dia da inauguração está prevista a apresentação de um grupo de dança sob a
coordenação de Maria Saback com um espetáculo de expressão corporal,
simbolizando os elementos vivos que compõem o processo de evolução da cerâmica:
terra, água, ar e fogo.
Além
disto, a exposição tem um caráter didático porque o visitante terá oportunidade
de observar um painel fotográfico com registro das diversas etapas de
transformação do barro.
As
fotos registram desde a retirada do barro na jazida, o seu transporte, a
mistura, armazenamento, as técnicas de modelagem e cozedura. O grande
homenageado é o velho mestre ceramista de Maragojipinho, Vitorino Moreira.
Diz
o Gênesis que Deus com um pouco de barro fez o homem à sua semelhança. E à sua
semelhança vieram outros homens e também os ceramistas que agora nos apresentam
trabalhos simples ou sofisticados, tudo dentro de um critério criativo. Eles
sabem dar vida ao barro com a explosão de suas formas que brotam do
inconsciente e que vão se compondo quando começa a funcionar a razão.
UMA
FOTO ESQUECIDA NO FUNDO DA GAVETA
Faz
algum tempo que guardo esta foto na gaveta. Cada vez que abro a gaveta ele me
toca perto dos sentimentos mais caros que ainda conservo ou consigo conservar.
Foi feita pelo fotógrafo Valdir Argolo, e, nem mesmo ele sabe, exatamente,
quando flagrou esta criancinha com sua boneca e nem tampouco, lembra do local
onde isto ocorreu. Mas, nada disto é importante. O que importa verdadeiramente
é a lição de afeto, a lição de amor, o carinho que transborda deste ato
inocente! Cada dedinho da garota acaricia com mais ou menos intensidade a
bonequinha de plástico, sem pernas e braços, com seus cabelos de nylon,
revoltos. Talvez até a tenha encontrado num canto qualquer ou numa esquina,
abandonada. Talvez até sua mãe tenha trazido de uma residência mais abastada.
Porém, tudo isto é insignificante, porque o relacionamento entre esta criança
momentânea de uma criança abastada quando recebe um presente caro e pula de
contentamento. Minutos depois, o brinquedo caro e sofisticado está largado num
canto qualquer da casa ou foi preterido por outro brinquedo, entre tantos que
possui. Isto muitas vezes frustra o pai que chegou pensando em agradá-la
eternamente.
Aqui
não existem outras bonecas. Apenas esta. Todo carinho da criança é expresso na
sua face, no seu abraço terno. Para complementar esta bela foto, vemos ao fundo
outra criancinha, observando contrita o carinho que sua coleguinha dispensa a
sua boneca de plástico !
Não
estamos em época de Natal. Mas, certamente não existe época para se falar de
ternura e também da plasticidade de um momento que foi captado em toda sua
extensão por uma objetiva de um fotógrafo de jornal. Repito: de um fotógrafo de
jornal, porque a rapidez da notícia, a corrida diária atrás do fato jornalismo
muitas vezes provoca uma certa cegueira em nós. É preciso estar atento para que
a sensibilidade esteja viva em nós e que enxerguemos o sorriso ou um ato de
amor, por mais singelo que seja. Nós, acostumamos em noticias fatos ruins, a
divulgar atentados que ceifam vidas, achamos, erradamente, que um abraço terno
é insignificante. A destruição e o horror da guerra é que são
insignificantes e devem ser abolidos dos
corações. É preciso procurar e encontrar significado maior no gesto simples,
numa mão estendida e num ato qualquer de uma criança anônima ou de um adulto.
E, nesta Cidade grande de tantos encontros e desencontros, de tantas incertezas
e perplexidades, vamos enaltecer e cultivar os atos ternos, os quais podem
muito bem ser representados por esta simples foto de Waldir Argolo. Eu a trazia
guardada no fundo da minha gaveta e agora mostro a você leitor para que medite
quanto pode significar um gesto de amor.
O
BARBEIRO DE PABLO PICASSO
Arias corta o cabelo de Picasso |
Desde
aquela época, Arias passa os dias entre Vallauris, sudeste da França, e
Buitrago sua terra natal, a setenta quilômetros de Madri onde ele acaba de
abrir um museu dedicado a Picasso, que considera como segundo pai.
Arias passou 26 anos de sua vida com Picasso " e não apenas fazendo-lhe a barba ou cabelo", como faz questão de ressaltar.
Prova desta amizade são as obras que ganhou de Picasso e que doou à sua terra
natal. Diversos quadros, cerâmicas, litografias e peças de arte, reunidas numa
sala transformada em museu, inaugurada no dia 5 de março pelo prefeito da Comunidade Autônoma de Madri, Joaquim Leguina.
Sobre
seu célebre cliente, Eugenio Arias, afirma que " tratava-se de um incompreendido
que trabalhou durante toda a vida, e que foi muito maltratado”.
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