JORNAL A TARDE, SALVADOR, 25 DE NOVEMBRO DE 1985.
CERAMISTAS DÃO EXEMPLO DO TRABALHO EM CONJUNTO
Ceramistas estão criando novas formas com o barro |
Nas
duas exposições já realizadas, e o mesmo está ocorrendo na atual, esse grupo de
ceramistas baianos mostrou que não pretende apenas produzir egoisticamente suas
obras e expô-las. Eles não fazem segredo das técnicas utilizadas e ainda educam
aqueles que participam de seus eventos a respeito das origens e significado da
arte da cerâmica.
Assim,
o grupo esclarece, por exemplo, que a arte da cerâmica tem seu começo na
Pré-História, e, como não poderia deixar de ser, vem sofrendo constantes
transformações em função dos progressos tecnológicos (o forno de mão substituído
pelo forno elétrico, os fornos de
lenha pelos de gás, óleo, querosene ou
eletricidade). Os esmaltes também mudaram: deixaram de ser produzidos com base
em rochas e minérios no estado natural e passaram a ser químicos.
EMOÇÃO
Enganam-se,
porém, aqueles que, diante de tantas considerações técnicas e históricas,
pensam que a cerâmica é uma atividade desprovida de emoção e envolvimento
pessoal do artista.Como
todas as artes, ele produz muito de emoção e isto pode ser notado nas
declarações dos artistas que compõem o grupo “Cerâmica, Arte da Transformação”.Ana
Thereza Ferreira, por exemplo, declara que fazer cerâmica é, para ela, “um
trabalho de paz e foi esta, aliás, a minha proposta na primeira exposição”. Ela
diz que modelar o barro e ver surgir da mistura da argila com água e fogo as
formas e objetos “que você mesmo criou, é uma emoção, uma alegria muito grande,
principalmente quando você vê que pode transmitir para outras pessoas a mesma
emoção, a mesma alegria”.
A
beleza é muito importante na vida das pessoas, conclui Ana Thereza, qualquer
que seja ela. No caso, falamos sobre a beleza plástica de uma peça de cerâmica.
Portanto, é também muito importante você, através da cerâmica, dar sua
contribuição para proporcionar um pouco mais de beleza á vida.
EDUCAR
A MENTE
Outro
membro do grupo, Suca, acha que a cerâmica é, um trabalho de educação da mente
nos sentidos da beleza da forma e da cor: “é tentar compreender a forma não por
uma análise, mas sim por uma identificação com outras mentes”.
Para
o artista, o trabalho no grupo “Cerâmica, Arte da Transformação” está sendo
muito gratificante, e ele ultrapassa até mesmo a análise da simples colaboração
artística mútua ao justificar a importância do grupo: “vivemos numa época em
que devemos nos unir e viver em comunidade, em grupos que, comungando da mesma
idéia, conseguem crescer e se comunicar, não somente no plano emocional, mas no
plano racional”.
Cerâmica
é como cachaça: mais a gente toma, mais a gente quer”. A artista Cate inicia
com
esta citação de um amigo uma declaração a respeito do seu relacionamento com a
arte da cerâmica. Ela acha que há uma verdade na frase citada, “pois quando se
descobre o barro, descobre-se o quanto se pode fazer com ele”.
O toque feminino está presente nesta peça |
CRIATIVIDADE
Na
opinião de Vitória Regina, o trabalho com o barro não se restringe a uma
atividade puramente artesanal, uma vez que a cerâmica é “uma fonte inesgotável
para a criatividade humana, onde a técnica entra de forma imprescindível”.
A
propósito da plasticidade que envolve o trabalho com a argila, Vitória Regina
lembra o que J. P. Guilford diz sobre criatividade no seu livro “A Soucre Book
for Creative Thinking” (1950): “O indivíduo pode diferir em capacidade de
redefinir as coisas”. Na cerâmica, conforme Vitória Regina, existe a
redefinição no trabalho de cada artista, de acordo com as capacidades mais
características de cada um.
Por
esta razão, segundo o artista, é que, “num grupo de 12, como o nosso, o
trabalho é individualizado, cada um se dedicando ás mais diversificadas formas,
texturas, esculturas, de acordo com as suas sensibilidades”.
Vitória
Regina lembrou, por outro lado, que o grupo, porém, está bastante ligado em
torno do objetivo comum de divulgar não apenas os seus trabalhos, como também
expor um material didático-informativo sobre as diversas técnicas utilizadas na
cerâmica
SANTOS
QUEIMADOS
A
artista Yola confessa que sua maior surpresa, nas exposições já realizadas, foi
a reação das pessoas que observavam os trabalhos: “elas faziam perguntas sobre
as peças e ficavam encantadas ao ver como se conseguiam texturas tão bonitas
com materiais tão simples. Vendo isto, percebiam que não é o suficiente dominar
a argila: tem que haver ma harmonia entre o artista, seus materiais e sua
imaginação”.
Osmundo
Teixeira, outro membro do grupo, começou a trabalhar com a cerâmica fazendo
formas simples, como panelas, potes e pratos, sem nenhuma técnica. Depois,
vieram as formas mais elaboradas, como construções (arquitetônicas). Até esta
fase ele ainda não queimava o barro.
A
partir do momento em que comecei a trabalhar com a figura humana esclarece o
artista.-foi que comecei a usar forno elétrico e fazer experiências em cor. Foi quando comecei a
trabalhar com Udo e a me entusiasmar com o Barroco. Daí a coisa começou a ficar
séria e os planejamentos começaram a cobrir minhas figuras. Atualmente, contínuo
com santos queimados em forno de lenha e com os baixo-relevos.
BUSTO DE TANCREDO
O
grupo Cerâmica, Arte da Tansformação, é composto pelos artistas Eckenberger,
Ana Thereza, Cate, David, Grace, Hylda, Messias, Osmundo, Suca, Vitória Regina,
Vitorino e Yola.
Quando
esteve em Brasília, houve grande repercussão em torno de um trabalho de Hylda,
o busto do ex-presidente Tancredo Neves.
Em
cerimônia solene no Palácio do Planalto, a ceramista Hylda Luacena de Mello
entregou a D. Risoleta Neves, na presença do presidente José Sarney, o busto de
Tancredo, fato que mereceu destaque com fotos de primeira página nos jornais da
capital federal.
O
grupo aceitou o desafio de mostrar fora da Bahia o seu trabalho, lembra Grace
Gradin, e “saiu e mostrou que o barro é material nobre e se transforma em
arte”. E, pelo visto, os artistas do Cerâmica, Arte da Transformação”
continuarão mostrando seus trabalhos Brasil afora: Já está com exposição
prevista para Recife, em outubro de 1986, a convite da Fundação Joaquim Nabuco (de
Alexandre Ferraz).
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