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sábado, 22 de março de 2025

LITTUSILVA PINTA E ESTUDA A INFLUÊNCIA INDÍGENA NA CULTURA

O artista Littusilva pintando em seu ateliê.
Vamos conhecer mais um   pouco da obra e a trajetória do artista Littusilva, residente na cidade de Alagoinhas-BA. Ele vem quase diariamente postando uma nova obra no Instagram para deleite de seus seguidores. É um artista visual criativo e de muitas habilidades. Já projetou e até construiu casas residenciais, clínicas médicas, igrejas e móveis. É pintor, desenhista, escultor, e ativista cultural há mais de cinquenta anos integrado com a cultura da cidade onde nasceu e vive até hoje. Desde 2001 vem questionando a identidade sociocultural de sua cidade enaltecendo a herança antropológica e cultural deixada pelos índios tupis e falando da miscigenação das culturas indígenas e africanas. Para ele muitos dos elementos culturais atribuídos aos africanos em sua região são na realidade de origem indígenas. O Littusilva escreveu um livro chamado África Tupi que publicará em breve defendendo esta tese.

Quatro obras com a temática indígena
feitas em técnica mista sobre papel.
Sua produção artística atual reflete esta preocupação com as culturas indígena e africana e ele vem criando uma série de obras trazendo nos seus traços livres e em cores muitas vezes de tonalidades fortes figuras dessa iconografia. São homens e mulheres em seus afazeres, principalmente indígenas com suas ferramentas e símbolos sagrados  dentro da visão contemporânea do artista. Tomei conhecimento da sua obra através dessas postagens que me chamaram a atenção pela qualidade e temática. Ao manter contato com Littusilva imediatamente se estabeleceu uma empatia e conversamos sobre sua rica trajetória de um artista que vem lutando para sobreviver de sua arte com dignidade numa cidade do interior baiano. Sou do interior e sei que não é fácil viver de arte, porque as demandas são limitadas, e o artista precisa se prover de recursos para continuar criando. Hoje as redes sociais, com a sua visibilidade e abrangência ajudam, mas nem tanto. Muitas vezes a contemplação e o gostar de uma obra de arte postada nas redes sociais para por ali mesmo, não avança para uma negociação.

                                                         LEMBRANÇAS

"Mulheres de Lagoinha", obras de Littusilva.
O Littusilva desde criança está envolvido com a arte e este despertar se fortaleceu quando no curso ginasial num trabalho de escola desenhou uma versão do Homem Universal, de Leonardo Da Vinci, acrescentando elementos sensuais. Isto despertou o interesse de professores e alunos de sua escola. Aos treze anos de idade seu pai que era maçom comprou um cavalete, papeis, telas e tintas, e lhe presenteou. Também lhe deu uma tarefa que foi pintar símbolos da maçonaria para serem colocados nas paredes da loja maçônica que fundou em Alagoinhas.
Seu pai José Cornélio Ramos era um artesão que fabricava sapatos sob encomenda para seus conterrâneos. Naquela época muitos dos sapatos usados no interior eram fabricados nas próprias comunidades por hábeis artesãos. E o Cornélio fazia além de sapatos, sandálias, chinelos, cinturões e outros objetos de couro. Já sua mãe Maria José da Silva Ramos era dona de casa e quando jovem pertenceu a juventude do Partido Comunista da Cidade de Alagoinhas. Naquela época as ferrovias estavam em pleno desenvolvimento no Brasil e por lá transitavam vários trens e haviam muitos ferroviários. É possível que esta militância seja resultado da atividade sindical na região. Brincando o Littusilva disse que sua mãe “era a único xamã comunista que conheci”. Isto porque a d. Maria José colocava cartas de Tarô e praticava outras atividades ligadas à espiritualidade.
Foto I - Casa residencial. Foto 2 - Clínica
médica ; Foto 3 - Catedral de Santo
Antônio, com a fachada projetada por
Littus . No  ano passado foi reformada
 perdendo sua identidade cultural.
O Littusilva é autodidata nas artes visuais, porém concluiu o curso de Técnico em  
Arquitetura, no Centro Integrado Luiz Navarro de Brito, em Alagoinhas, que funcionou de 1968 a 1979. Foi o primeiro curso secundário da cidade e sua turma de Técnica em Arquitetura foi a primeira e única. Neste Centro foram implantados os cursos ginasial e colegial, além dos cursos técnicos. Seu objetivo era ser um arquiteto, mas este sonho se realizou posteriormente com a formatura de uma filha que é arquiteta. Devido ao curso de Técnico em Arquitetura foi trabalhar no escritório do arquiteto Gildo Improta, que projetou muitos imóveis em Alagoinhas, e depois se transferiu para outra cidade. O Littusilva   se destacou desenhando projetos no escritória do professor Gildo Improta  e na ausência do seu empregador passou a fazer seus próprios projetos. Fez também o curso de design na EBADE – Escola Baiana de Arte e Decoração. Aos vinte e cinco anos criou uma construtora e passou a projetar e construir casas residenciais, clínicas e até reforma de igrejas. Disse que até a catedral de Santo Antônio, de Alagoinhas, ganhou uma identidade arquitetônica própria e lá fez um grande painel de concreto. Mas, o atual bispo resolveu reformular e a identidade sumiu, ficando apenas o painel que representa o santo casamenteiro conduzindo a comunidade. Nesta catedral tem também um grande galo feito de bronze de autoria de Mário Cravo Júnior. Littusilva disse que o galo está voltado para a antiga casa dos pais do escultor. Segundo ele o pai de Mário Cravo foi prefeito da Cidade, e Mário teria ficado por lá parte da sua infância.  O Mário Cravo Júnior  o presenteou com um livro alemão de arquitetura, que foi importante para fazer seus projetos arquitetônicos, e guarda até hoje. Quando projetava e construía casas e outros imóveis notou que havia dificuldade em mobiliar as casas e outras construções modernas por falta de móveis compatíveis.

Móveis projetados e feitos na marcenaria
de Littusilva.
Aconteceu que diante das constantes crises da economia brasileira sua construtora foi afetada e decidiu fechar e se dedicar inicialmente a desenhar móveis. Em seguida montou uma marcenaria especializada na fabricação de móveis modernos e chegou a ter mais de quarenta funcionários. A clientela era das classes média e alta e muito exigentes, e ele procurava cada vez mais aprimorar seus móveis. Porém, sabem que o empreendedorismo não é o forte dos artistas. Foi se chateando com fornecedores, clientes e com a burocracia estatal terminando por fechar sua marcenaria. O Littusilva confessa que formou muitos mestres de marcenaria que hoje estão trabalhando em suas oficinas atendendo sua clientela. Nesta época da marcenaria havia ainda em Alagoinhas muitos bons funileiros e outros profissionais que trabalhavam na estrada de ferro. Ele afirmou também que este período coincidiu com seu divórcio da mãe dos seus três filhos, e que hoje sua ex-mulher e filhos residem em Minas Gerais onde são instrutores de yoga. Declarou que também chegou a praticar e ensinar yoga. Diante desses fatos aos quarenta e sete anos desistiu definitivamente de ser empresário e passou a se dedicar à sua arte. Disse que foi e ainda é um grande desafio para ele. Atualmente pinta e desenha diariamente em seu ateliê e que também é um militante cultural muito ativo. Nesta sua militância confessa que após realizar o movimento etnoarqueológico na sua região conseguiu catalogar vários objetos materiais e imateriais marcantes do modo de sentir e pensar dos povos tradicionais caiçaras.

                                     PINTURA

Observem a leveza do traço e a composição
equilibrada nas figuras que ele pinta.
Sua pintura tem uma figuração,composição e colorido diferenciados. Seus traços são livres e cntornam parcialmente as figuras que desenha e pinta. Reconhece que pode ter sido influenciado por importantes pintores inclusive Carybé, o próprio Mário Cravo Júnior, com quem teve uma boa aproximação, mas que atualmente gosta muito do trabalho do pintor paulista Paulo Sayeg.  Ele se refere ao Paulo Eduardo Sayeg,  nascido em 1960, em São Paulo, e é pintor e desenhista. Porém, enfatiza que hoje tem sua própria linguagem artística e que “não quero desenhar simplesmente o ser humano. Desenho dentro de uma visão e todo o conjunto cultural de uma ancestralidade e conto histórias através dos meus desenhos e pinturas. Extraio da minha memória as figuras dos índios tupinambás, dos vaqueiros que rompem a caatinga em busca de uma rês perdida, e assim vou celebrando e homenageando a nossa gente. Este imaginário e símbolos precisam ser preservados e sempre lembrados porque nós descendemos e também dependemos deles.” E continuou: “Pra mim a arte é o silêncio visível. Procuro trazer para o campo da observação com poesia. Minha arte é uma expressão do silêncio fora das gavetas, algo que provoca no outro uma inquietação."

                                                      QUEM É

Totens que criou nas ruas de Alagoinhas.
Seu nome de batismo é Joselito 
da Silva Ramos, nasceu em treze de fevereiro de 1953, na cidade de Alagoinhas, interior da Bahia. É filho de José Cornélio Ramos e Maria José da Silva Ramos. Poetizando disse que enquanto nascia “o apito longo do trem anunciava partida. E o caboclo de olhos azuis, o sapateiro poeta, partia. Deixava esperança e medo na futura Casa Deyse, senti o cheiro da alfazema e ouvi o som do acordeon. Um grito sussurrado: É Homem! Nasci na oficina do sapateiro poeta, na cama do belo xamã comunista.”

Conta que sua infância “foi numa rua de areia branca, perto de tudo: das dores, ao lado da Delegacia; dos prazeres, à direita, com as doces mulheres da vida; das fantasias, na esquina, o Parque de diversões; e da sobrevivência, em frente, o Mercado das Carnes. Aprendi a acreditar em cegonhas, Papai Noel e em Homens Santos. Pintei o belo, desenhei sonhos. Vi a morte e seus mistérios, vi o som e a cor do tempo… Só não vi a cegonha, nem o Papai Noel e nem os Homens Santos. Hoje, escrevo, desenho, pinto e modelo peças mensageiras da minha África Tupi, como Littusilva.” Hoje ocupa uma cadeira na Academia de Artes e Letras de Alagoinhas.

Escolhendo objetos de fibras para a Feira
de Arte Popular que criou na sua cidade.
Criou uma Feira de Arte Popular, em Alagoinhas, para expor os trabalhos dos artesãos locais. Afirmou que foi muito difícil porque tanto o Instituto Mauá e o SEBRAE não lhes ajudaram nesta empreitada respondendo que Alagoinhas não tinha uma identidade cultural peculiar. Foi diante desta negativa que decidiu pesquisar nas feiras livres e na zona rural do município e recolher os objetos que fabricavam, os costumes, os símbolos culturais e religiosos. Com ajuda do Laguna Shopping conseguiu reunir objetos e informações e montou a Feira de Arte Popular.  Dai em diante não parou de estudar essas manifestações procurando mostrar que Alagoinhas tem sim, sua identidade cultural. Expôs muitos objetos, culinária e informações que hoje lhe permitem destacar a presença indígena nesses objetos e simbologias resistentes, muitos dos quais atribuídos de origem africana, quando na realidade são indígenas que se miscigenaram com a cultura dos africanos que aqui aportaram e se espalharam por todo interior do país.

                   ATIVIDADES E EXPOSIÇÕES

Instalações em cerâmica
e um caçuá feito de cipós.
Em 1972 - Conclui Curso Técnico de Arquitetura, No Centro Integrado  Estadual Luiz Navarro de Brito – ALAGOINHAS; 1973 - FEIRAM- Feira dos Municípios - Primeira exposição individual: Alagoinhas – Bahia – Brasil; 1983 - Conclui Curso de Design de Interiores na Escola Baiana de Decoração - EBADE- Salvador;  1985 a 1996 - Torna responsável do Asilo de Velhos Bezerra de Meneses como voluntário em Alagoinhas ; 1988 - Participa do curso de Yoga - extensão - Universidade Católica da Bahia; 1989 - Funda em Alagoinhas primeiro Núcleo de Yôga;  1999 - Coordena a primeira Campanha da Caminha da Paz em Alagoinhas a convite da Câmara de Vereadores;  2001 – Participa da coordenação de implantação da Escola de Pais do Brasil – EPB- em Alagoinhas; 2015 - Publicações na revista Ponto de Mutação do curso, Pós Critica de Cultura- Uneb ; 1978 a 80 - Coordena os primeiros Salões de Artes Plásticas de Alagoinhas - Na Faculdade de Professores de Alagoinhas.( Semana de Arte e cultura de Alagoinhas); 2001 – Torna-se membro da Academia de Letras e Arte de Alagoinhas - Funda o Ateliê Coletivo Waka, no Centro de Cultura de Alagoinhas. – Núcleo de Pesquisa da Identidade Cultural De Alagoinhas; 2006 - Participa do Salão Regional de Artes Visuais– Alagoinhas e Ganha o Prêmio de Destaque; 2008 - Participa do Salão Regional de Artes Visuais do Interior da Bahia como homenageado pelas pesquisas realizadas e pelo conjunto das obras. -Um dos trabalhos é a identidade Visual de 2009 dos Salões Regionais de Artes Visuais da Bahia; Participa da Bienal do Recôncavo da Bahia em S. Félix ; Curador e Organizador da exposição Coletiva de Artes Visuais na inauguração da Galeria de Arte Mário Cravo, na sede da FIGAM, em Alagoinhas; 2012 - Curador e Organizador do Encontro Mítico - Coletiva de Artes Visuais no Centro de Cultura de Alagoinhas;  2014- Coordena o Movimento dos Artistas Plásticos de Alagoinhas - MAPA ; Curador e Organizador da Exposição Coletiva de Artes Visuais - o Meu Quintal, no Centro de Cultura de Alagoinhas; Curador e Coordenador da
 Littusilva durante a nossa
conversa sobre sua trajetória.

Intervenção Artística do MAPA no CCA : Os Saberes do Meu Quintal; Coordenador e Curador da Ocupação Artística no Antigo Matadouro, Anexo do Centro de Cultura de Alagoinhas, com a denominação de Casa do Boi Encantado, em parceria com o MAM na Terceira Bienal da Bahia;
2015 – Através  a Galeria d’Arte Associazione Culturale da Itália, participa da Biennale dei Castelli dela Gera d’Adda; 2016 – Na Casa do Comércio em Salvador expõe na Coletiva de Artes Visuais “Outubro Rosa”; 2017 - Participa na Anjos Art. Gallery da exposição coletiva “Encontro de Tons ”;  2018 - passa a assinar como Littusilva e participa do Le Carrousel Du Louvre; 2019 - Exposição individual - Galeria Gotelib, Shopping Cassino Atlântico, Rio de Janeiro;  Expõe no  Salão de Arte Contemporânea Internacional em Maceió - AL, como convidado especial;  2022 – Recebe o Titulo Doutor Honoris Causa – Faculdade de Formação Brasileira e Internacional de Capelania.
 Este curso de Capelania prepara profissionais para oferecer assistência espiritual, conforto emocional e suporte moral às pessoas.


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