JORNAL A TARDE, SALVADOR, SEGUNDA-FEIRA, 30 DE MAIO DE 1988
QUATRO ARTISTAS EXALTAM MOVIMENTO
DOS CORPOS
A artista Vera Regina demonstra conhecer o desenho |
O
Alessandro é um contemplador da sensualidade gestual.Acompanha
com muito interesse os movimentos do corpo humano onde personagens andrógenos
fazem suas acrobacias. Para Célia Prata, orientadora do grupo, o artista tem um
traço que estrutura, amarra e cria o desenho a partir de uma descarga elétrica,
onde encontros perceptivos e anatomia de corpos obedecem à atmosfera expressiva
pretendida. Em pinceladas de ritmos e movimentos, em tons baixos ou vivos, em
manchas ou escorridos o acasalamento do masculino e o feminino na busca do
equilíbrio cromático entre o delírio e a razão.
Já
Araci Tanan curte deuses hindus, astrologia, taoismo, mitologia grega, enfim
trabalha envolvida numa atmosfera mística. É como se cada povo assimilasse esse
universo de acordo com sua cultura. Esses deuses saem de mim intuitivamente,
poeticamente, diz Tanan, cujo sobrenome já lembra personagens que habitaram
outras eras.
Vera
Regina prima por captar a expressão corporal inspirada em atletas e dançarinos.
Enquanto eles trabalham realizando expressivos movimentos, Vera vai se
inspirando. Seus modelos são imaginários, são momentos fixados em sua mente que
depois ressurgem dentro da visão do artista.
Mulheres
aladas de Ana Miranda tem um encanto daquelas figuras gregas que preenchem os
clássicos da literatura universal.Um
toque no tão almejado voo da liberdade feminina, no bater de asas no horizonte
sem compromissos terrenos.
OS
MOTIVOS FLORAIS DE HELENA AGRADAM
O
relacionamento com um suíço contribuiu para que Helena realizasse cedo um dos
seus projetos de vida mais importantes que era expor suas telas no exterior. Os
temas florais, os vãos chineses e mesmo o casario colonial agradaram em cheio
muitas pessoas que acorreram as suas exposições em La Paz , Paris e até na
Suíça. Ela tem viajado muito porém, não esquece às cores quentes e a
exuberância de nossa flora. O trabalho de Helena tem ainda uma forte dose de
pintura universal e, por isto, tem a aceitação em toda a parte. Espero que ela
continue com esta disposição em realizar um trabalho cada vez melhor,
principalmente frequentando cursos livres e ateliers para ganhar mais
experiência.
PROJETO
NORDESTE ATESTA O ISOLAMENTO
EM
QUE VIVEMOS
O inquieto Bel Borba cobrindo com seus desenhos a propaganda de um candidato a vereador em Maceió |
Artistas baianos pintando na Praça Deodoro,Maceió |
Foi uma discurseira infernal. Calmamente conversei com os dois senhores e eles sumiram numa esquina. Assim saboreando uma cervejinha o Bel concluir o seu mural, contribuindo para aumentar esta integração.
Insisto
na importância do Projeto Nordeste por ser uma semente em busca da quebra desse
isolacionismo reinante e, também, por ser um exemplo do esforço em busca de um
trabalho cooperativo. É um mal nacional, dirão alguns. Mas pior é que é um mal
regional. Um mal que nos toma mais fracos do que já somos, por vivermos numa
região que não conta com as benesses dos governos, especialmente do federal.
Vivemos em centros de produção localizados em estados economicamente fracos e
sem tradição no desenvolvimento das atividades culturais. Esta situação só pode
mudar, se juntos reivindicamos os nossos direitos e apresentamos sugestões que
sejam possíveis de concretização.
Não
estive em Sergipe com o Projeto Nordeste, mas fiquei sabendo através do critico
João de Barros, que falou durante o debate, que a situação teria mudado um
pouco depois da passagem do pessoal da Bahia. Se mudou, ótimo, Se não mudou,
pelo menos ficou lá uma mensagem, que certamente não se perderá por completo.
Também o Romeu de Mello-Loureiro, critico de arte de Maceió, além de demonstrar
o isolamento falou também do desinteresse de alguns artistas e da dificuldade em mobilizá-los. Isto
ficou patente, como já disse, pela pouca presença, tanto no debate como na
manifestação ao ar livre na Praça Deodoro.
Devo
dizer que timidamente alguns apareceram distribuindo folhetos sobre suas atividades,
mas insisto, foi uma minoria. Esta pouca participação não inviabiliza o Projeto
Nordeste. Ao contrário, mostra o quanto necessário ele é, também nos demonstra
como e grande o esforço que este grupo abnegado está fazendo para contribuir
para uma mudança em toda esta estrutura mobilista e caótica. Vão em frente
porque este trabalho é uma luz no fundo de um túnel, que precisa dar passagem a
uma leva de gente que tem muito a aprender.
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