JORNAL A TARDE, SALVADOR, SEGUNDA-FEIRA, 19 DE SETEMBRO DE 1988.
NEWTON MESQUITA VEM ABRIR
GALERIA PROVA DO ARTISTA
Newton Mesquita traz oito gravuras de seu novo álbum |
Para
a inauguração, no dia 22, da Galeria Prova do Artista, no Salvador o artista
Newton Mesquita com suas gravuras baseadas na peça Eu Te Amo, com Bruna
Lombardi e Paulo José.
Newton Mesquita nasceu em 1949,em
São Paulo. É um dos artistas de maior importância dentro da
arte atual brasileira, já tendo ganhos vários prêmios e sua obra incluída em
acervos de empresas, coleções particulares e museus como o MASP Museu de Arte
de São Paulo, MAB Museu de Arte Brasileira, e a Galeria Degli Uffizzi,
Florença, Itália. Há dois anos sem expor na Bahia, Newton retorna com uma
mostra feita com exclusividade para a Galeria Prova do Artista.
Newton Mesquita nasceu em 1949,
Apresentando
a mostra, Caio Fernando Abreu escreveu um texto onde cria uma história sua
sobre a obra de Newton Mesquita. Vejamos “Mal vejo você, entre as sombras.Os
retalhos de luz que vêm de fora e entram pela janela aberta iluminam trechos do
seu corpo parado na porta. A curva do braço, na altura do ombro, a cintura, o
cabelo quando bate no ombro. Detalhes tão pequenos de nós dois. Não sei se você
me olha, não sei se você me vê. Que longo, penso, que longo caminho que eu tive
de percorrer para chegar até você. De onde estou, parado no extremo oposto da
porta de onde você está, também não sei se o que vejo será mesmo um corpo real- o seu, seu corpo exato,
particular, inconfundível ou apenas uma ilusão dos meus sentidos. Estes que
nunca mais se recuperaram da loucura de ter mergulhado um dia no seu gosto, no
seu cheiro, no seu tato.
Foto recente do artista |
Imagem de Leitura,de Newton Mesquita |
E vou deixando de sentir medo, e não me importo que você ria na minha cara ou me chame muitas vezes de ridículo, quando finalmente, sem compromisso algum com qualquer outra coisa a não ser nos dois aqui parados, um em frente ao outro, conseguir dizer aquilo que irá nos unir ou separar para sempre. Eu abro a boca, você dá um passo. De ouro, seu corpo brota da sombra. Eu sei que você me olha, eu sei que você me vê. De ouro, minhas palavras tombam sobre seu corpo. Você sorri e eu te proponho."
DOS
MUROS DA CIDADE ELES CHEGAM AO FOYER DO TCA
Os artistas do Grupo Interferência , vendo-se ao fundo alguns trabalhos da mostra do TCA |
O
escultor é Ademir Tuy que começou a trabalhar em madeira, passando para a
pedra-sabão e, hoje, trabalha metarenito. Ele concebe formas humanas onde a
desfiguração e a mutilação são constantes. Uma crítica, segundo informa, à
própria autodestruição do homem que vive guerreando em defesa de ideologias e
sentimentos religiosos duvidosos.
Donizete
sofre uma influência da pintura rupestre, daquelas primeiras manifestações tão
decantadas por estudiosos de civilização do passado.
Paulo
Portela é mais intimista. Os elementos de sua pintura não apresentam contornos.
Carlos Rodrigues é um pintor do cotidiano, são pinceladas vibrantes e fica entre o figurativo e o abstracionismo. Uma influência da sua atividade de publicitário quando com traços rápidos é capaz de definir suas pinturasem movimento. Ele está
fazendo um trabalho de programação visual de excepcional qualidade aqui em A TARDE , principalmente no
Caderno Lazer & informação que acompanha as edições de domingo.
Carlos Rodrigues é um pintor do cotidiano, são pinceladas vibrantes e fica entre o figurativo e o abstracionismo. Uma influência da sua atividade de publicitário quando com traços rápidos é capaz de definir suas pinturas
Finalmente,
Caetano Dias que tem uma pintura de formas orgânicas. Segundo César Romero há
uma sensualidade nos cortes e insinuações breves, criando um clima de mistério e busca. Há o prazer de
pintar, o cuidado com a textura, transparência e ritmo.
INTERFERÊNCIA
A
pintura mural é realizada ao ar livre e tem como suporte, geralmente, as
paredes dos muros e viadutos da cidade. São superfícies de textura riquíssima,
verdadeiros corredores dominados pelo cinza da civilização. Interferir neste
cenário é privilégio de artistas
contemporâneos, uma tentativa de rememorar a pintura rupestre dos primitivos
que celebravam sua relação com a natureza. Seu universo cotidiano, sobre
pedras, mostrava a ação intuitiva de perseguição e fuga, dor e prazer, vida e
morte e liberdade.
Hoje
a selva é outra, as feras, mais civilizadas e mortíferas. O homem volta a
imprimir seus símbolos, agora sobre pedras armadas em concreto. Em atitude
intelectual e gesto instintivo volta a celebrar, sobre os muros marcados,
fazendo ressurgir do cinza das paredes a natureza humana.
O
mural de rua é um estímulo objetivo, a resposta é a mais diversa. Os atos dos
espectadores denunciam aceitação e rejeição. São manifestações peculiares que
vão do aplauso mais fervoroso ao protesto mais agressivo. Restitui-se a vida,
quebrando a indiferença cinza da cidade.
A
produção artística contemporânea de Salvador está ocupando outros espaços.
São
as superfícies dos muros e viadutos, impiedosamente poluída com pichações de
todo o tipo. Em oposição a toda essa sujeira, artista contemporâneos vem
colorindo a cidade com seus trabalhos. A cada esquina instante há uma surpresa:
são belas pinturas que surgem refletidas nas faces das pessoas, mudando a cara
da nossa cidade e atuando junto ao público na questão estética, incitando a uma
visão mais crítica da sociedade moderna.
A
incursão pictórica no panorama urbano de Salvador teve sua origem nas pesquisas
desenvolvidas em estúdio, pelos integrantes do grupo, em caráter individual. As
primeiras interferências foram feitas no viaduto do Largo da Graça por Massola,
Donizete e Caetano Dias. Em seguida foram feitos painéis, juntamente com
Portela, Carlos Rodrigues e Ademir Tuy. Os painéis estendem-se por vários
locais da cidade como nos viadutos do Politeama, Campo Grande, Contorno,
Centenário, Ogunjá e no muro de contenção da Vila Olímpica e no Rio Vermelho.
O
trabalho de estúdio funcionou como base para a pintura de rua. Atualmente, a
interação entre os dois tem levado a uma produtividade muito grande e de
maneira bastante espontânea.
Ademar
Tuy, Caetano Dias, Carlos Rodrigues, Donizete e Paulo Portela, são artistas
profissionais que fazem parte de uma nova geração, vindos de um longo percurso
com passagens por salões, galerias e museus é nesta fase a pintura mural surgiu
como um espaço alternativo para um contato mais direto dos seus trabalhos com o
povo.
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