JORNAL A TARDE, SALVADOR, SEGUNDA-FEIRA, 9 DE MAIO DE 1988
PROJETO NORDESTE AGORA APRESENTADO EM MACEIÓ
Grupo de artistas que integra o Projeto Nordeste |
Por
falar em isolamento vale lembrar que não existe em Salvador um movimento, uma
cooperativa, ou outra qualquer denominação que possamos dar que motive os
produtores de arte a um encontro sistemático. Tudo é feito e realizado
isoladamente em cada atelier. Os encontros são esporádicos, ligeiros e
fortuitos. Geralmente acontecem durante uma exposição, na hora do coquetel, dos
comes e bebes e tudo termina por ali.
Houve
uma tentativa de aglutinação quando organizamos a exposição Geração 70, que não
teve a pretensão de isolar, ao contrário, visava, através de etapas, englobar
os principais produtores de arte. Porém, alguns desentendimentos e vaidades
pessoais afloraram de tal sorte que terminei por desistir de correr atrás do
trem. É preciso consciência de grupo, é preciso determinação e desprendimento
para realizar um trabalho em grupo.
Acredito
que o pessoal que integra este Projeto Nordeste leve adiante esta ideia como
forma de fortalecer a produção e o futuro mercado de arte baianos.
Este
artigo foi feito antes da ida do pessoal para Maceió. Fui convidado a
participar da experiência da qual falarei da próxima coluna, mostrando os prós
e os contras. Afinal, este é o meu papel como profissional, que vem há vários
anos incentivando o mercado de arte baiano.
A
exposição do Projeto Nordeste vai acontecer na Galeria Karandashe de 6 a 14 de maio, na Avenida
Moreira e Silva, 89, no Centro de Maceió. No Recife a mostra acontecerá no dia
22 de julho a 31 do mesmo mês na Galeria Metropolitana de Arte Aluísio
Magalhães, que fica na Rua da Aurora, 265, Boa Vista. O grupo está documentando
toas as exposições visando depois um estudo detalhado do que ocorreu para em
seguida se tirar as lições. Espero que outros artistas, que não integram este
projeto, possam participar ouvindo os relatos, lendo os relatórios e mesmo
assistindo aos vídeos.
Se
não for feito um trabalho de grupo mais cuidadoso entre os artistas baianos
vamos continuar enfraquecidos, e com isto torna-se mais difícil alcançarmos os
mercados mais desenvolvidos.
Acabo
de ler que no Rio de Janeiro os donos de galerias estão realizando inúmeras
reuniões objetivando a criação de uma revista de arte e discutindo vários
aspectos desde a produção até a comercialização. Aqui os galeristas ficam a
mercê que os artistas batam em suas portas com um trabalho debaixo do braço ou
mesmo a contatos telefônicos com artistas já consagrados, querendo expor seus
trabalhos. Não existe um trabalho em cima de novos artistas, não existe
interesse, porque buscam o lucro imediato. È hora também de aliar o lucro ao
importante trabalho cultural que às galerias devem exercer.
PINTOR
SERGIPANO TEM BANANEIRA COMO TEMA
J.Inácio mostrando sua arte com as bananeiras |
Desde
adolescência demonstrava pendor para o desenho e a pintura, tendo recebido em
1930, do então governador de Sergipe, Augusto Maynard, uma bolsa de estudos
para se aperfeiçoar em pintura e desenho na Escola de Belas- Artes do Rio de
Janeiro, com uma pensão garantida do Estado, enquanto lá estudasse. Foi seu
professor o mestre Marques Júnior.
Uma pintura do artista sergipano |
Após
a conclusão da bolsa, passou J. Inácio cerca de 25 anos no Rio de Janeiro e
nesta ocasião fez várias viagens para São Paulo, Bahia e principalmente para
Sergipe. Chegou a participar do Grupo Bernadelli composto pelo saudoso José
Rescala, Martinho Diário, José Menezes, Edson Motta, Takoaça, Malagoli e ainda
freqüentado esporadicamente por Pancetti e Portinari. Eles não se submetiam às
formas clássicas da pintura impostas pelos professores da Escola de Belas Artes
do Rio de Janeiro.
O velho J. Inácio com uma obra recente |
Além de pintar J. Inácio gosta de posar de filósofo popular, mas é acima de tudo um andarilho. A idade não conseguiu aplacar o gosto pelo novo. Gosta de elaborar algumas poesias e por muitos anos dedicou-se à literatura de cordel e à caricatura como meios de sobrevivência.
Mas,
certamente são suas pinturas enfocando as folhas largas das bananeiras no reino
do tropicalismo e as casas de farinha, onde predominam os tons verdes e
amarelos fortes que ele demonstra seu
próprio estilo, com grande elegância.
Já
fez exposições individuais no Rio de Janeiro, São Paulo, Bahia e Sergipe. Tem
obras no Museu de Belas-Artes do Rio de Janeiro e em condições particulares
espalhadas pelo Brasil e até no exterior.
Disse
que sua vida é gostosa por fora. “Dentro das minhas estranhas, geme”. Mas
acredita que a purificação da alma só acontece através do sofrimento. E, por
falar em sofrimento, relembra que quando morou no Rio de Janeiro habitava um
humilde barraco e lá teve que sofrer muito para sobreviver. Chegava extenuado
depois do dia inteiro de batalha para garantir o mínimo de sobrevivência.
Talvez por isto, hoje continua levando uma vida muito simples, sem uma
organização profissional maior, que lhe assegure condições melhores. É do tipo
imediatista, que vai consumindo o que produz.
ESCULTURA
COM UM TOQUE SUTIL DE AGRESSIVIDADE
Ele
trabalha quase em silêncio.
Vai construindo seus painéis, murais e suas esculturas em
madeira, em ferro e até com fibras sintéticas. Seu relacionamento é maior com
os arquitetos e não com as galerias, como acontece com a maioria dos artistas.
Seu nome é Celso Cunha, que recentemente entregou mais uma escultura, deste
vez no Edifício Palácio Itaigara, no bairro do mesmo nome. Explica o artista
que sua nova proposta que norteou esta escultura foi dar uma concepção plástica
contemporânea. Ele criou zonas de tensão harmônicas, com movimentos que
considera sensuais e dotados de uma sutil sugestão de agressividade, resultando
numa composição dinâmica e equilibrada.
Pintou
a escultura de um vermelho intenso, contrastando com os tons sóbrios dos
materiais empregados no revestimento do edifício e a simetria da construção.
Com isto Celso Cunha conseguiu uma integração plástica de grande impacto visual
e prazeirosa leitura. Ele já tem outros trabalhos em agências do Banco
Econômico, em São Paulo ,
em Salvador, em prédios da Petrobrás, Centro de Convenções e muitos prédios
particulares. Trabalha em painéis de madeira desde 1971 e depois de um bom
período de profissionalização resolveu estudar Arquitetura. Esta sua nova
escultura é um verdadeiro sanduíche de fibra de vidro com estrutura de alumínio
e pintada com tinta automotiva.
A
escultura tem 3,5m x 4,5m e pesa em torno de 700 quilos.
Vista
de certos ângulos a escultura parece uma flor em movimento, noutros destaca-se
sua porta rompendo os espaços.Ele confessa que tem vários projetos que deverão ser executados à medida que
arranjar espaço para colocar suas obras.
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