JORNAL A TARDE,SALVADOR,
SEGUNDA-FEIRA, 19 DE DEZEMBRO DE 1988
SALÃO DE ARTES VAI REUNIR 54
ARTISTAS NO
SOLAR DO UNHÃO
Pintura de Maurício Arraes,artista convidado de Pernambuco |
Finalmente
vamos ter oportunidade de conhecer as obras que foram selecionadas para
participarem do
I Salão Baiano de Artes Plásticas, cuja abertura será na próxima quarta-feira, às 20 horas, no Solar do Unhão. Neste dia será lançado um catálogo reunindo os artistas da Bahia e de outros estados, com um total de 56 reproduçõesem
policromia. Tive uma participação de certa forma ativa para a
concretização deste salão dando todo apoio necessário a Zivé Giudice, do Departamento de Artes Plásticas, da Fundação cultural do Estado, que vem
contando com apoio do presidente do órgão Florisvaldo Mattos. Depois da
exposição Geração 70 que organizamos não aconteceu nada de grandioso nas artes
plásticas baianas. Portanto, estou aguardando com muita expectativa e torcendo
para que este salão seja mais uma marca relevante na história das artes
plásticas da Bahia. Os mais antigos lembram da Bienal de Artes Plásticas,
realizada na segunda metade dos anos 60, porém, um evento que a maioria dos que
participam deste salão não teve oportunidade de ver, por razões óbvias.
I Salão Baiano de Artes Plásticas, cuja abertura será na próxima quarta-feira, às 20 horas, no Solar do Unhão. Neste dia será lançado um catálogo reunindo os artistas da Bahia e de outros estados, com um total de 56 reproduções
Não
acredito que este salão nos transporte de imediato a uma participação cada vez
maior no circuito nacional, mas é um passo a mais que a gente tenta dar, porque
pretendemos ocupar espaço. Não poderemos ficar no marasmo ou dependendo de
iniciativa de um outro artista mais corajoso que coloca o trabalho debaixo do
braço e ganha a estrada em busca de um reconhecimento no Sul do País. Mas o que
importa é que este salão mostra quanto pulsante é a arte feita na Bahia e acho
mesmo que a falta de informação de alguns e devido a individualidade em que
estão mergulhados. Ficam trancados, envolvidos por elogios gratuitos e
prejudiciais, sem procurar renovar sua linguagem expressiva, sem contato com
informações dos grandes centros produtores e, principalmente, andando à margem
da sua própria cultura. Por isto são vitimas do distanciamento, da total
incapacidade de produzir uma arte renovadora e que traga no seu bojo elementos
da contemporaneidade da criação plástica.
Sei
que este salão é uma etapa para a realização da I Bienal Latino-Americana de
Artes Plásticas da Bahia, que é um projeto até certo ponto ambicioso e que já
tramita nos birôs da Fundação Cultural da Bahia, envolvendo não somente
artistas brasileiros, mas de toda a América Latina.
ALGUMAS
CONSIDERAÇÕES SOBRE A IMPORTÂNCIA DESTE NOVO EVENTO
Obra em técnica mista do artista Ayrson Heráclito,da Bahia |
Todos
ainda se lembram do momento em que a Bahia, através da realização da Bienal,
esteve no primeiro plano nacional das artes plásticas. Mas eram tempos
difíceis, aqueles- a 2º metade dos anos 60, e a Bienal, como outras
manifestações culturais do país, estiolou. De lá para cá, manda a verdade que
se diga algo que provavelmente não agradaria aos baianos. Tanto no âmbito da
produção quanto no do consumo (o que não se significa posse individual,
aquisição, colecionismo), a Bahia saiu da ribalta das artes plásticas
brasileiras.
Não
nos passaria pela cabeça negar a existência de talentos surgidos na Bahia, ao
longo de um período tão extenso. Podem-se citar, por exemplo. Emanoel Araújo
como o mais ilustre deles, bem como Mário Cravo Neto, certamente o mais
inquieto. Por outro lado, A Velha Guarda que continuou morando na Bahia-Mário
Cravo Júnior, caribe, Jenner Augusto, todo o grupo famoso-também continuo a
produzir. Mas esse grupo usando de um direito legítimo optou por um tipo de
arte pouco questionador.
E
por causa deste quadro complexo que a realização deste
I Salão de Artes Plásticas nos parece tão importante não perca este tempo
discutindo o número um: é claro que este não é o primeiro salão que se faz na
Bahia; é o primeiro com esse nome, e depois de um silêncio prolongado), Os
salões continuam sendo, a nosso ver, o meio mais eficaz de dinamizar a arte a
explosão de talentos, de agitar, de fazer circular informação etc. E verdade
que as grandes exposições museológicas também cumprem todos esses papeis, até
um nível mais profundo. Mas o fazem em mão única. E nos salões que o jovem
artista tem feed bac”e pode aferir o significado real de sua obra, através da
aceitação ou do corte, e da posterior comparação com os demais aceitos.
Os
critérios que norteiam os trabalhos do júri desse salão poderiam ser resumidos
numa palavra só. Qualidade. Mas isso é muito simplista. O que entendemos por qualidade? É uma grandeza
absolutamente objetiva? Pode-se medir com precisão? Com que instrumentos?
Tríptico do artista e ilustrador Carlos Rodrigues, referência especial. |
Entre
eles, poderíamos citar:
a) A adequação entre a forma apresentada pela obra e a
intenção que dela se depreende (harmonia entre linguagem e conteúdo, conceitos
que colocamos entre aspas porque só são dissossiáveis didaticamente);
b) Habitação técnica suficiente pelo menos para que o
autor expresse sua intenção um grande talento inteiramente cru não se deixa
ainda perceber.
c) Um pouco que
seja de originalidade, já que, evidentemente, só os gênios são capazes de uma
originalidade radical.
d) A o mesmo tempo, sintonia com o que se anda
tentando fazer em todo o mundo, neste instante, embora com pluralidade de
tendências. Um júri correto não privilegia nenhuma tendência abstrata,
geométrica, figurativa, fantástica etc.; procura garimpar o que aconteceu de
melhor, entre os trabalhos enviados, em cada uma delas.
Tudo o que consta desse texto, esperamos poderá
ainda ser debatido pelos artistas e intelectuais baianos com o júri, que irá a salvador para esse fim.
Comissão de Seleção.
Marc Bercowitz - presidente, Olívio Tavares de
Araújo - relator, Ivo Vellame, Raul Córdula Filho e Reynivaldo Brito.
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