JORNAL A TARDE, SALVADOR, SEGUNDA-FEIRA, 8
DE FEVEREIRO DE 1988
ARCOS DA CONTORNO SERÃO PÓLOS DE
ARTE
Mais
um projeto na prancheta e nós daqui torcendo pra que dê certo. Trata-se do
Projeto Arco-Íris que, em suma, pretende aproveitar os bonitos e relegados
arcos da Avenida Contorno em ateliês e oficinas de arte e artesanato. Será, na
opinião de seus idealizadores, “um importante espaço”. Com o grande privilégio
de descortinar-se a bela baía com seus poucos saveiros, e, na linha do
horizonte, as ilhas, principalmente a de Itaparica. Uma bela paisagem, um local
privilegiado, mas continuo afirmando de difícil acesso. Para ver de perto os
arcos da Contorno eu tive que fazer uma verdadeira viagem. Encontrava-me no
Campo da Pólvora e tive que ir até a Rua Chile, descer na Rua Pau da Bandeira,
Ladeira da Conceição, fazer o retorno em frente ao prédio da Marinha para, em
seguida, tornar a pista que dá acesso ao prédio do Solar do Unhão. A pé, nem
pensar!
Seria
mais um número da estatística macabra controlada pelos funcionários do Nina e
editores de páginas policiais.
Portanto,
junto com a realização deste projeto, tem que ser feito um estudo para repensar
o acesso áquele espaço. Não basta a instalação de um posto policial, porque
inclusive os policiais instalados nos módulos são instruídos para não arrear um
centímetros do local. Eles são como verdadeiros robôs que atendem às
necessidades a que foram programados, naquele espaço (não o cultural, é claro!)
Ormindo ajudou na recuperação |
Estive
visitando o local com Zivé e realmente fiquei a imaginar aquele espaço ocupado
por oficinas, por um pequeno bar que servisse de encontros dos artistas
baianos, com pequenas apresentações de jovens músicos, leitura de poesias,
enfim um espaço aberto às manifestações emergentes.
Para
isto lembrei-me da necessidade de uma pessoa que tivesse a capacidade de
envolver esta gente num projeto deste porte e que ao mesmo tempo atraísse
permanentemente público para o local. Confesso que não me surgiu ninguém. É um
desafio. Também é um grande desafio este projeto de Zivé e como estamos num
país onde a tônica é a falta de apoio à cultura e a descontinuidade
administrativa, confesso que estou com meu desconfiômetro ligado.
pretende
ainda dar uma abertura maior às oficinas
de gravura, que já vinham funcionando no Solar do Unhão, sob direção de Juarez
Paraíso, mas que no meu entender pecou por fechar-se num grupo que se abre e
fecha em torno do mestre. É preciso que as oficinas sejam um pólo aglutinador
de tendências variadas e, acima de tudo, que sejam abertas a ponto de sempre
atrair o interesse de novos artistas. As oficinas poderiam ser um instrumento
importante de formação de bons impressores e uma espécie de cooperativa poderia
ser criada para reproduzir gravuras de jovens artistas e comercializá-las.
Está
ainda no programa a criação de uma oficina de cenografia, uma atividade onde já
militaram grandes artistas nacionais e estrangeiros.
Núcleo
Porém,
a retomada dos salões e da Bienal de Artes Plásticas da Bahia será realmente o
ponto alto da administração da Secretaria da Cultura e do atual chefe de Departamento de Artes Plásticas, Zivé Giudice, se conseguirem concretizar.
Estou sempre colocando a condição se realizar, porque sempre estou atento para
futuras cobranças. Este é o papel do colunista. Tenho o compromisso com os
leitores, e, principalmente, com minha responsabilidade como profissional.
Portanto, divulgo com toda a abertura e alegria, mas, cobro com a mesma desenvoltura
a sinceridade.
Zivé
reconhece as dificuldades financeiras que ora atravessa este estado e sabe das
limitações orçamentárias para os eventos culturais da Bahia.
Porém,
acredita que vai realizar tudo isto e, para tanto, vem mantendo contato com
algumas grandes empresas sediadas no estado para que ajudem às manifestações
artísticas utilizando a Lei Sarney.
No
projeto, entre as justificativas de sua execução está inscrito que “os espaços
existentes em Salvador não parecem suficientes para abrigar a demanda de
espetáculos e eventos, sobretudo aqueles de caráter experimental. Daí a
proposta: se faz necessária a criação de uma estrutura mínima capaz de
assegurar as manifestações comprometidas com as práticas renovadoras dos
conceitos. É preocupação desse Centro de Arte Plásticas do Solar do Unhão”
criar espaços para apoio das manifestações citadas.
Finalmente,
o projeto prevê a instalação de serviços de apoio, com cantina e choparia, como
falei acima
Exposição
Porém,
pouca gente sabe que uma boa exposição está montadas nas instalações do Solar
do Unhão. Trata-se de uma exposição que objetiva mostrar a produção
contemporânea baiana. Coisa pra turista ver. E baiano também. Os que aparecem
para visitar aquele monumento (Solar do Unhão) ou em busca do restaurante que
funciona no local, encontra a exposição montada. Mas, não existe um catálogo ou
mesmo um impresso qualquer que sirva de suporte, que fale um pouco sobre cada
um dos expositores, para que o visitante passe a reconhecer a obra e o autor.
Por que não tem catálogo? Indaguei a Zivè, que francamente me respondeu que não
houve verba para confeccioná-lo.
Portanto,
mesmos os baianos que visitam a exposição não conhecem bem vários artistas que estão expondo.
Porém,
vamos acreditar a fazer figa, para que tudo dê certo, porque só temos a lucrar
e a cidade está precisando de espaços alternativos.
A
PALAVRA DE ZIVÉ
Os
anos 60 representaram para as Artes Plásticas na Bahia o último grande momento
da efervescência.
A
cassação das bienais baianas interrompeu um processo de consolidação da Bahia
como centro de reflexão da produção das artes plásticas.
A
Bahia apresentava-se como uma proposta de descentralização das decisões e
discussões teóricas na medida em que as Bienais se incorporam no calendário
nacional de Artes Plásticas e despertavam o interesse de artistas de outros
centros.
Zivé chegou cheio de ideias |
As
Bienais da Bahia não tiveram só a importância de espetáculo visual, elas
suscitavam o debate do ponto de vista conceitual e formal, transferiram
informações, antes do patrimônio de grupos dominadores e influíram nos meios de
produção. E, na produção, estimularam o exercício da teorização e da critica, contribuíram
para a ruptura do pensamento ainda
afeito a valores acadêmicos e revelaram a um mercado de conceitos ortodoxos e extemporâneos,
verdades de uma produção contemporânea.
Todos
esses processos fora interrompido com a instalação dos governos de força que,
através de instrumentos repressivos como o Al-5, impediram a livre expressão da
sociedade no campo da ciência, da política e das artes. Essa situação perdurou
nos anos subsequentes. A Bahia sofria de uma paralisia, no que se refere ás
Artes Plásticas. As instituições limitavam-se à organização de eventos que
reproduziam o ideal do sistema.
A
Escola de Belas Artes era, por vezes, uma exceção. Timidamente, fazia um ou
outro Salão de efeitos domésticos, mais importantes. Artistas de uma geração
surgida na década de 70 e alguns outros de gerações anteriores formavam a
resistência á situação, com propostas de trabalhos comprometidos com o novo,
mas ainda longe de devolver à Bahia o conceito perdido.
Reverter
tal situação é o compromisso assumido pelo departamento de Artes Plásticas da
Fundação Cultural do Estado da Bahia perante a comunidade dos artistas
plásticos e de toda a sociedade. Para tanto, entendemos necessário a retomada
das Bienais, a implantação de um Salão anual baiano, a promoção do intercâmbio
com outros centros, como forma de trocar experiências e idéias, do fomento aos
projetos aos projetos de pesquisas em artes plásticas e a implantação do Centro
de Artes Plásticas.
Observação - As fotos de Paulo Ormindo e de Zié Giiudice são do Google e atuais ( 2013)
Observação - As fotos de Paulo Ormindo e de Zié Giiudice são do Google e atuais ( 2013)
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