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sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

CONTRIBUIÇÃO JAPONESA NAS ARTES PLÁSTICAS BRASILEIRAS -20 DE JUNHO DE 1988


JORNAL A TARDE, SALVADOR,  SEGUNDA-FEIRA, 20 DE JUNHO DE 1988

CONTRIBUIÇÃO JAPONESA NAS ARTES 
Ascensão, trabalho de Tsukiya Okayama 
PLÁSTICAS BRASILEIRAS

Os imigrantes japoneses estão comemorando 80 anos de Brasil. Aqui eles encontraram um País receptivo, constituíram novas famílias, se misturaram com brasileiros, surgiram os nisseis, a segunda geração e, depois, os sanseis, a terceira geração. Na Bahia, alguns foram instalados no Núcleo JK, que teve um período áureo. Depois as autoridades não lhes deram o apoio necessário, e a própria instabilidade política e econômica do País terminou por influir muito negativamente. O núcleo chegou a contar com 120 famílias e, hoje, está reduzido a pouco mais de duas dezenas. Porém, o que nos interessa mais de perto neste espaço é a contribuição nas artes plásticas. E, para comemorar esta data significativa, foi montada no Museu de Arte de São Paulo MASP uma grande exposição reunindo o que existe de mais representativo da arte produzida pelos imigrantes e seus descendentes, que é conhecida pela escola nipo-brasileira. A exposição não obedeceu a critérios de escolas ou tendências. É um apanhado geral do que existe de melhor.
A exposição apresenta desde as naturezas-mortas, as paisagens e os retratos, temas preferidos dos pioneiros e constantes nas primeiras décadas, ao abstracionismo que marcou os anos 50, até as manifestações contemporâneas. Assim, estão lado a lado Tomoo Handa, Tsukiya Okayama, Kichzaemon Takahashi, Shigeto Tanaka, Yuji Tamaki, representantes da primeira geração, com obra iniciada nos anos 20 ou antes; Flávio Shiró, Yoshiya Takaoka, Jorge Mori, de grande participação no movimento artístico paulista desde os anos 40, Manabu Mabe, Tomie Ohtake, Fukushima e outros que despontaram nos anos 50, com as bienais, desenvolvendo um abstracionismo marcante no panorama das nossas artes, até Lídia Okumura, Tomoshigue Kusuno, Kazuo Wakabayashi, Yutaka Toyota, Bin Kondo. Megumi Yuasa e tantos outros que apareceram a partir dos anos 60, robustecendo as expressões mais variadas do nosso modernismo.
Constam da exposição obras de cinco artistas já falecidos- Kichizamon Takahashi, Shigueto Tanaka, Tadashi Kaminagai, Yoshiya Takaoka e Yuji Tamaki- e dezenas de obras criadas especialmente para esse evento.
Um conjunto de cerâmicas de Sholo Suzuki
As técnicas expostas são a pintura, a escultura, a cerâmica e o charão. No que respeita à cerâmica, é importante frisar a categoria artística do objeto, às vezes com status de obra única e valor escultório inusitado, como aqueles assinados por Megumi Yuasa. Mesmo as peças utilitárias são elaboradas cuidadosa e pacientemente, trazendo a marca pessoal do artesão ceramista.
Os nipo-brasileiros merecem destaque na produção cerâmica entre nós, como observa Cecília França Lourenço. A cerâmica brasileira vem de longa tradição indígena, porém ficou isolada ás regiões interioranas sem estímulo ao desenvolvimento e difusão. Assim, o resgate da dignidade dessa técnica tem sido encetado pelos ceramistas nipo-brasileiros, com dificuldades. No oriente há um enorme aproveitamento das possibilidades cerâmicas, que vem sendo adaptadas, conforme a introdução de hábitos religiosos, funerários, ritualísticos e mesmo do cotidiano.
Uma técnica pouco conhecida entre nós, cultivada quase exclusivamente por artista da colônia, é o charão, e o charão em corpo cerâmico, consistindo na aplicação de várias camadas de resina, obtendo efeito brilhante e duradouro, consignando à peça de cerâmica sofisticado acabamento. O público terá oportunidade de comparar a arte cerâmica desenvolvida pelos nossos japoneses com aquela produzida no Japão. É que, paralelamente à exposição de Arte da Colônia Japonesa no Brasil, será aberta no MASP, mesmo dia e hora, a mostra de cerâmica vinda daquele país por iniciativa da Fundação Japão.
No artigo que escreveu para o catálogo, o professor Pietro Maria Bardi, diretor do MASP e curador da exposição, fala dos muitos eventos ligados à arte japonesa ou ao Japão, levados a efeito pelo MASP desde o início dos anos 50, quando realizou mostra de kakemono - pinturas em rolo. Destaca o professor Bardi:
Atualmente continuamos com nossa política de intercâmbio com o Japão, tão bem iniciada, assumindo inclusive aspectos singulares pois temos apresentado, além de pintura, manifestações sobre a cultura japonesa, como o ikebana  - arranjo de flores-, cerimônia do chá, embalagem, piões, papagaios, xilogravura, arquitetura, caligrafia e várias outras.
Japoneses chegam para trabalhar na lavoura do café

Na abertura da exposição foi lançado o livro Vida e Arte os Japoneses no Brasil do qual o catálogo é separata. Todo esse projeto foi patrocinado pelo Banco América do Sul, instituição financeira que tem história fortemente vinculada à da colônia japonesa no Brasil. As peças publicitárias foram desenvolvidas visando o envolvimento em papel estão sendo distribuídos às crianças. O próprio convite é uma dobradura. E a imagem constante, aparecendo nos cartazes, adesivos e no convite, com as bandeiras do Brasil e do Japão dividindo o espaço, significa a integração da colônia à cultura brasileira.
Encerra o volume um trabalho de Teiiti Suzuki -também artista plástico- rico em dados estatísticos sobre a imigração japonesa no Brasil. Aborda os fluxos migratórios em fases que vão de 1908 até os anos 70; as fases que vão de 1908 até os anos de 70; as características dos imigrantes; a composição por sexo e idade; a evolução da colônia; as mudanças sócio-econômicas. Assim, complementa as informações contidas nos estudos anteriores.
Na apresentação do livro, Fujio Tachibana, presidente do Conselho de Administração do Banco América do Sul, ressalta:
Julgamos que essa missão de documentar as lutas, sofrimentos e glórias dos artistas é ingente e incontestável, e muito nos honra a designação para cumpri-la, pois a nossa organização mantém fortes laços com a colônia japonesa desde a sua fundação. Este fato possibilita-nos cobrir uma lacuna existente no registro histórico da imigração, pois os aspectos econômicos e sociais da integração nipo-brasileira fá foram amplamente difundidos."
A exposição tem a participação de 42 artistas com um total de 84 obras. São os seguintes os artistas: Flávio Shiró, Tihashi Fukushima, Tomoo Handa, Hagime Higaki, Kenjiro Ikoma, Hiro Kai, Tadashi Kaminagai, Taro Kaneko, Mitsutake Kogure, Bin Kondo, Sachiko Koshikoku, Tomoshique Kusuno, Manabu Mabe, Yoshiyuki Miura, Jorge Mori, Shozo Nagata, Iwao Nakajima, Yasuo Nakamura, Akinori Nakatani, Hisao Ohara, Tomie Ohtake, Tsukiya, Massao Okinaka, Lídia Okumura, Hisão Sakakibara, Masayuki Sato, Hisãi Shirai, Milton Sogabe, Celso Suetake, Shoko Suzuki, Teiiti Suzuki, Kichizaemon Takahashi, Isao takai, Yoshiya Takaoka, Yuji Tamaki, Shigueto Tanaka, Nobuo Toriy, Yutaka Toyota, Masumi Tsuchimoto, Massanori Uragami, Kazuo Wakabayashi e Megumi Yuasa.

O LIVRO

Vida e Arte dos Japoneses no Brasil é obra destinada a enriquecer a bibliografia sobre a experiência dos imigrantes japoneses. Reúne três estudos. O primeiro, Senso Estético na Vida dos Imigrantes Japoneses escrito por Tomoo Handa: o segundo,Nipo-brasileiros da Luta nos Primeiros Anos a Assimilação Local, é de Cecília França Loureiro e o terceiro A Imigração Japonesa no Brasil, é de Teiiti Suzuki.
Tomoo Handa, além de artista plástico e escritor. Estava entre os primeiros imigrantes que chegaram ao Brasil. Viveu em fazendas e, observador arguto, registrou as mínimas diferenças entre a vida dos caboclos e da sua própria gente em sofrido processo de adaptação. Já adulto, morando em São Paulo, foi um dos fundadores do Seibi-kai (Grupo de Artistas Plásticos de São Paulo), do qual lavrou a, primeira ata, a 30 de março de 1935. A importância do Seibi-Kai na arte paulista é comparável á do Grupo Santa Helena. Graças às atas lavradas por Tomoo Handa ao longo do tempo, é possível conhecer os percursos dos artistas japoneses em São Paulo  na primeira metade do século.
Ano passado, com o apoio da Fundação Japão, e patrocínio do Banco América do Sul, T.A. Queiroz, editor publicou a volumosa obra O Imigrante Japonês - História de Sua Vida no Brasil, em que Tomoo Handa revela-se pesquisador atento, realizando fiel retrato da saga dos imigrantes. Seu estudo publicado neste Vida e Arte dos Japoneses no Brasil, foi originalmente apresentado ao simpósio. O Japonês em São Paulo e no Brasil, realizado em 1968. Nele, Handa trata do senso estético e do gosto artístico manifestados na vida dos imigrantes japoneses, fruto da experiência direta e da observação de imigrante, que também era ao longo de 50 anos, como diz na abertura.
O choque cultural vivido pelos imigrantes é observado por Handa através do cotidiano, dos hábitos que vão da arrumação da casa até as festas populares, passando pela alimentação, pelo vestuário etc. É um ensaio revelador, que interessa não apenas a colônia, mas a todos os que estudam a formação da sociedade brasileira.
O estudo de Cecília França Lourenço, que foi reproduzido no catálogo da exposição, levanta os movimentos dos artistas da colônia japonesa em São Paulo em integração com outros movimentos de artistas plásticos ocorridos a partir de 1922. Com rigor na pesquisa aliado à observação crítica. Cecília França Lourenço discorre sobre as adaptações dos artistas ao meio e, nestas adaptações, a incorporação de elementos do meio na sua obra. Tomando o Seibi-Kai por fio condutor, analisa os grupos e os momentos artísticos são em busca de analogias, e sim observando as linhas, os pontos de convergência e de divergência. Do estudo resulta formidável painel da arte paulista e brasileira neste século, trazendo elementos inéditos, logo que realiza a primeira abordagem em profundidade da arte dos japoneses no Brasil, arrotando-a entre as manifestações que contribuíram para o encontro de formas expressivas que hoje caracterizam nossa arte.

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