JORNAL A TARDE, SALVADOR, SÁBADO, 20 DE
AGOSTO DE 1977
Duas
exposições pobres em qualidade: a de Aderbal Rodrigues e Nilza Barude, na
Minigaleria ACBEU, e a de Antônio Sibassoly, na Galeria Panorama. É duro o
papel do crítico que tem de apontar os erros. Quando aos elogios todos gostam
de recebê-los. Mas, tenho uma responsabilidade para com os leitores deste
jornal, e, especialmente, desta coluna daí a razão dos comentários que faço
sobre essas duas exposições, que em minha opinião não deveriam ter acontecido.
Aliás, é ora de chamar a atenção dos responsáveis pelas galerias da Cidade que
devem também respeitar seus clientes e público de maneira geral. É preciso um
certo critério para realizar exposições. Se as obras são de péssima qualidade
ou mesmo de qualidade duvidosa, digam aos artistas que trabalhem melhor e
voltem. Exposições pobres servem para prejudicar o nome da galeria e frustrar o
próprio artista iniciante.
Felizmente
esta semana finda, com a exposição de trabalhos de boa qualidade de Carl
Brussel, na Galeria O Cavalete, e na próxima semana, estão anunciadas as
exposições de Guel, no Panorama, com uma série de marinhas com tendência ao
abstracionismo, a exposição de Murilo e Antenor, na Galeria Teresa antiga
Sereia, e a Lígia Milton, que exporá na Galeria do Hotel Méridien.
Quero
desta forma mostrar a necessidade de critérios para realização de exposições.
Constato tristemente que alguns proprietários de galerias de Salvador querem
vender obra de arte como um balconista vende um quilo de sabão ou açúcar. A
tela é um objeto, uma mercadoria nobre, que necessita de certos cuidados. É
preferível não realizá-la de qualquer jeito. Será que é a disputa dessas pessoas
para ver quem fica mais tempo nas páginas dos jornais? Será que simplesmente
desejam suas galerias repletas de bebedores de batida e visitantes
inconsequentes?
Chamo
a atenção para o critério na escolha dos expositores. Leia:
O
CONFIANTE ANTONIO SIBASOLLY
É necessário estudar e amadurecer,antes de expor |
Talvez Sibasolly queria justificar o primarismo em algumas de suas telas. Uma delas mostra uma paisagem onde aparece duas árvores que estão praticamente soltas no espaço. Ele não soube prendê-las ao chão. Noutras notamos a sua dificuldade no sombreamento e uma marinha exposta é simplesmente terrível. Um jovem artista que tem certo talento, mas que deve trabalhar mais antes de programar outra exposição. O que salva sua mostra é um quadro intitulado Vila Rural e três mini quadros que não definem as figuras. As demais telas carecem de técnica e contemporaneidade. Ele tenta ainda justificar sua escolha por paisagens, casarios e marinhas dizendo que "sou grande admirador de Arte Moderna, o que não posso admirar, são os rabiscos e garatuxos de apedeutas esnobes sem autocrítica que se dizem pintores modernos, outros pensam que a arte se faz da noite para o dia, simplesmente por não saber que, a arte não se improvisa, é fruto de um estudo sério e constante."
Acredito que Antônio Sibasolly precisa de autocrítica antes de partir para julgamentos outros, que devem ser emitidos pelos críticos especializados. Acho que deve contentar-se com seu papel de um jovem artista que precisa trabalhar e estudar. Acredito em seu talento o chamo a sua atenção para tal Arte Moderna que tenta criticar. O que existe é que a arte que ora faz já passou. É de outros tempos. Estamos no final de um século e coisas novas são apresentadas e mostradas.
Quanto
ao entendimento dos garatujos ou rabiscos é um problema de educação. Alguns
dispõem das informações necessárias para compreensão das mensagens.
Outros
simplesmente não entendem porque não tiveram oportunidade de aprender e absorver essas informações para decodificar
as mensagens. Antônio, é preciso antes de tecer considerações sobre Arte
Moderna cuidar melhor dos seus trabalhos, aceitar as críticas com resignação e
também olhar para frente. O artista não pode parar. Ele deve estar engajado num
processo de busca constante de novas técnicas e formas de expressão. Veja
grandes artistas contemporâneos que passará entender a razão das coisas que
revela não entender em sua própria apresentação. Você chegou ao cúmulo da
confiança e falta de autocrítica que embora desconhecido do público baiano, faz
uma apresentação que é simplesmente bizarra.
O
ENCONTRO INFELIZ: ADERBAL
RODRIGUES E NILZA BARUDE
Um trabalho insólito de Aderbal |
Voltando à exposição, encontrei algumas peças de cerâmica feitas a quatro mãos. A moeda
invertida. O Aderbal que é pintor teria dado formas ao barro e a Nilza Barude,
que nada mais é do que uma artesã imatura, teria colorido as primeiras peças
feitas por Aderbal. Talvez a saída para Aderbal seja a cerâmica, é o que posso
compreender do que vi exposto. Quanto a sua companheira de infortúnio Nilza Barude
posso dizer que é mais uma senhora que
colore bules, jarras e panelas comprados prontos. Não tem portanto qualquer
identificação com o barro e com as formas. Simplesmente se apodera de formas
bonitas e sugestivas de outras pessoas e joga tinta por cima. O único mérito do
seu trabalho é a técnica de esmaltar, técnica esta que pode era aprendida por
qualquer pessoa num cursinho de um mês numa escolinha de prendas domésticas.
Encantada
com a Bahia a Nilza Barude arranjou alguns nomes sugestivos para as peças que
podemos tirar de bom nesta mostra, que nada mais é do que um encontro infeliz
entre um jovem que precisa trabalhar com mais cuidado antes de realizar
exposições, e de uma senhora que deve guardar suas panelas, bules e jarrinhos
pintados para distribuir com suas amigas em chás vespertinos.
CARL BRUSSEL NA GALERIA O CAVALETE
Brussel é um pintor que está preocupado com a profissionalização. Não é um pintor de domingo. É um artista que tem consciência do seu papel, do que deseja expressar e acima de tudo inconformado com certas conotações que possam atribuir-lhe por sua condição social privilegiada. Sua arte merece ser refletida porque ele consegue superar tudo e parte para uma concepção formal de alta qualidade, com uma pintura dina e acima de tudo livre. As figuras sugeridas nos dão oportunidade de concebê-las prontas ou feitas com um exercício lúdico. As linhas retas, firmes e os contornos fortes dão um realce maior.
Logo abaixo no mesmo catálogo diz: Wilson Rocha: "Sua pintura que envolve uma condensação expressionista onde a linha tem por vezes qualidades gestuais enriquecidas por vigorosas cores terrosas e belos cinzas intimistas, pinturas de ritmo, luz e cor, cor velada, saída do sentimento e revertida ao espírito através da essência e do instinto, da poesia, e do amor das coisas, mas que de sua realidade material, do cálculo e dos valores estritamente pictóricos, supera o impressionismo pela profundidade do conteúdo e por seu amor á ordem e a harmonia conjugados com liberdade, acima da marginalidade acadêmica."
Estas palavras que dedicamos ao trabalho pictórico representa exatamente a essência desta exposição que está aberta ao público na galeria O Cavalete, no Rio Vermelho, onde estão expostos vinte e cinco trabalhos que tem unidade formal e de cores. Um trabalho de um homem amadurecido que sabe o valor da sua profissão e no momento deseja dedicar-se de corpo e alma. Fiquei impressionado com a força de vontade deste artista que prefere ficar plantado em frente a seu cavalete do que cuidar de outros afazeres comerciais. Um homem, que já maduro, reencontrou aquilo que mais desejava fazer. Não que tenha deixado de pintar, porque a pintura é parte da vida de Brussel que agora apresenta uma pintura mais forte, de melhor qualidade e mais livre em elação a outras épocas.
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