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sábado, 18 de outubro de 2025

ANDERSON SANTOS MISTURA PINTURA TRADICIONAL COM ELEMENTOS DIGITAIS

O artista Anderson Santos pintando
em seu ateliê de Milão, na Itália.
Foto de Cecília Templenizza.

O artista visual  Anderson Santos é desenhista, pintor e estudioso das mídias digitais. Foi membro do coletivo internacional responsável pela publicação online da revista Boardilla onde fazia a curadoria de arte e promovia exposições de artistas de vários países. Atualmente é diretor artístico da Ripensarte, e também participa da Magazinno, ambas publicações digitais. Está sempre procurando novas ferramentas nas mídias digitais para integrar com a pintura tradicional feita a óleo sobre tela ou outro suporte escolhido. Este encontro do contemporâneo com o tradicional lhe proporciona uma produção diferenciada extrapolando o figurativo com a utilização de camadas de recursos digitais, e quando decide que era aquilo que procurava parte para pintar na tela. É exigente, organizado, e focado no que vai realizar. Inicialmente produzia uma arte que lembrava a do pintor irlandês Francis Bacon conhecido por suas imagens cruas, dilaceradas e perturbadoras. Porém, hoje embora sua obra ainda esteja concentrada no corpo humano, o Anderson Santos apresenta uma pintura que dialoga mais com o real introduzindo também na composição elementos que são encontrados no nosso dia a dia nesta cidade repleta de diversidades. Vejo sua pintura como uma exaltação à vida, uma apresentação de imagens pulsantes de cores fortes, mas que também possuem momentos de nuances de opacidade e sombras. É um exercício de criação de novas imagens que aos mais perceptivos provoca reflexão e inquietação. Sabemos que cada pessoa que olha uma obra de arte faz sua própria leitura dentro das informações que acumulou durante sua existência e também depende da sua sensibilidade. Ao apresentar essas imagens de corpos despidos eles não chocam e também não levam o observador para o caminho do sexismo barato,

"Um tratado tropical 3", óleo
sobre tela , 2024.
ao contrário, os coloca numa posição de respeito e contemplação da beleza da arte feita por Anderson Santos.  Escreveu o artista na apresentação de sua tese de mestrado que “considera o processo criativo como uma atividade que não diz respeito somente à uma obra ou a um conjunto de obras, mas que envolve a vida do artista, feita de caminhos, escolhas e incertezas”. É neste caminhar que o artista vai construindo sua arte incorporando experiências que vão se apresentando e se acumulando com o passar do tempo. E com o seu olhar aguçado da realidade que vivenciou em sua cidade natal e que atualmente  vive na Europa ele vai edificando e sedimentando a sua arte.

A nossa conversa aconteceu no último dia doze através de vídeo já que ele está em Milão, onde reside com sua família e divide seu tempo entre Salvador e esta cidade italiana. É casado com a fotógrafa /antropóloga italiana Cecília Tamplenizza, e o casal tem dois filhos. Tem uma forte ligação com Salvador, cidade onde nasceu em vinte e quatro de fevereiro de 1973, sendo um artista negro sua arte não foge de suas raízes, mas não fica presa ao identitarismo, porque ele tem uma visão e reflexão mais abrangente  procurando fazer uma arte contemporânea que aborde os mais variados conteúdos temáticos. Numa entrevista que deu em 2021 a um jornal local afirmou que todo seu imaginário “foi construído daqui a partir da luz do sol da Bahia, como ela incide nos corpos, mas posso dar também como exemplo o grafismo das plantas que coloquei no mural que pintei na fachada do edifício Guarabira, na Avenida Estados Unidos, no Comércio, que me lembram aquelas que minha avó paterna me benzia, ou as histórias que imagino ao pensar na Floresta Negra dos irmãos Grimm”. Agora está escrevendo sua tese de doutorado  que tem o título "Floresta Negra: A Remixibilidade no Encontro da Pintura a Óleo Com o Digital." E cita Lev Manovich que escreveu em 2005 “que o processo transformativo por meio do qual os meios e as informações que organizamos e compartilhamos podem ser recombinados e construídos de modo a criar novas

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"Presenza 45", óleo sobre 
 tela, de 2025.
formas, conceitos, ideias, mashups e serviços”. O russo Lev Manovich é crítico de cinema e professor universitário, estabelecido nos Estados Unidos. É pesquisador na área de novas mídias, mídias digitais, design e estudos do software. Nasceu em 1960 na Rússia e foi morar em  Nova Iorque nos anos 1980, onde realizou seus estudos em cinema e computação. Quanto a mashups é uma canção criada de combinações de duas canções preexistentes. Portanto, o Anderson Santos ao colocar o título de sua tese  revela que utiliza o método autobiográfico como parte de sua escolha metodológica para construí-la.
Já a sua tese de mestrado "A Vida Nua Remediações da Pintura e Afrofuturismo na Sociedade do Cansaço", ele investigou "o lugar da pintura em tempo saturado de imagens digitais, algoritmos e próteses tecnológicas da percepção tomando como núcleo a série A Vida Nua que expôs na Galeria Paulo Darzé, a qual foi desenvolvida durante a pandemia. Anderson Santos  pintou sua família, pessoas do seu relacionamento,  e a si próprio, e segundo escreveu "a pintura é abordada aqui não como resistência heróica, mas como insistência mínima, como gesto capaz de convocar presenças em meio à lógica da exaustão e da mercantilização das imagens. "

                                       SUA CAMINHADA

O artista Anderson Santos nasceu no bairro de Nazaré, em Salvador, é filho de José Pereira dos Santos e d. Eunice Silva Santos. Depois sua família morou na Liberdade e em outros bairros da Cidade.  O casal teve três filhos. Estudou no Instituto Central Isaias Alves – ICEIA que na época era um complexo educacional onde o aluno tinha oportunidade de praticar vários tipos de esportes, estudar teatro e dança. Disse Anderson Santos que já encontrou o ICEIA com alguns problemas. Sabemos que o ensino público na Bahia vem sofrendo há décadas com as más gestões que não priorizam a educação, principalmente a básica. Ao concluir o ginásio foi estudar na Escola Eletromecânica da Bahia onde seu pai tinha estudado, e assim quis que ele seguisse uma carreira técnica. O pai é desenhista técnico e já trabalhou em várias empresas importantes na área da construção civil e industrial.

"Um tratado tropical 3", desenho sobre papel
Velata Avario 300g, de 2023.

Lembrou Anderson Santos que quando o pai percebeu seu dom para o desenho lhe presenteou com uma prancheta para que pudesse exercitar sua habilidade de desenhista. Escolheu cursar Mecânica por causa do desenho técnico das engrenagens, e quando foi estagiar não se adaptou. Por não ter uma compleição física capaz de movimentar motores e outros equipamentos pesados decidiu que seria melhor procurar outra profissão, e foi assim que em 1993 resolveu fazer vestibular para a Escola de Belas Artes, da Universidade Federal da Bahia. Quando foi comunicar ao seu pai José Pereira que tinha sido aprovado ele pensou inicialmente que tinha feito o vestibular para arquitetura. A maioria dos pais fica preocupado quando os filhos decidem estudar arte porque entendem ser muito difícil viver de arte neste país. De certa forma eles têm razão é mesmo difícil viver de arte, especialmente no início da carreira, e sempre digo que é bom ter um plano B, que lhes garanta uma sobrevivência digna.

"Sobre a vida 11",óleo e lápis
sobre tela, de 2024.
Quando lhe perguntei o que a Escola de Belas Artes – a EBA o tinha acrescentado como artista e de pronto citou a contribuição das professoras Maria Adair, Célia Mallet e Nanci Novais, e do professor de gravura Francisco Macedo acrescentando "que foram muito  importantes na mina formação". Graduou-se , foi morar em Milão e conta que durante a pandemia em 2021 passou a pintar sua família e a si próprio. 

Desde 2015 quando iniciou sua produção pictórica profissional não mais parou e vem se aprofundando pesquisando e estudando as novas mídias que não cessam de inovar a cada dia. Declarou que “não tenho predileção por uma temática. Tenho pintado pessoas que encontro perto de mim a exemplo dos membros da minha família, amigos e amigas principalmente no período da pandemia”. Prefere pintar nus, e citou uma frase do escritor português José Saramago que no seu livro A Caverna onde o personagem Marçal diz  : Na vida tudo são fardas, o corpo só é civil verdadeiramente quando está despido”. Neste processo de pintar as pessoas do seu relacionamento notou que elas já estavam cansadas de serem usadas como modelos, e ele partiu para usar a Inteligência Artificial. Pega uma imagem de referência, que pode ser uma fotografia que ele fez ou outra imagem escolhida   e vai colocando elementos digitais  até formar a imagem que deseja para em seguida pintar a óleo na tela.

Mural pintado na fachada do Edifício Guarabira ,
na Avenida Estados Unidos, no Comércio, 2021
.
O artista está atento às inovações e gosta de experimentar. No ano 2000  veio com a família, alugou um imóvel no bairro de Santo Antônio Além do Carmo, no Centro Histórico de Salvador .Era uma casa  vizinha onde mora Mark Dayves do clube da Seri. Segundo Anderson Santos ele faz parte do coletivo GIA e tem seu ateliê Candeias, na Rua dos Carvões, no bairro de Santo Antônio. No seu ateliê funciona o Clube da Seri onde ensina serigrafia para crianças, jovens e adultos. Foi aí onde aprendeu a fazer serigrafia e fez uma série de obras inspiradas nas plantas que marcaram a sua infância. O Grupo GIA se apresenta como um grupo sem definição e “é formado por artistas visuais, designers, arte-educadores e  músicos que têm em comum, além da amizade, uma admiração pelas linguagens artísticas contemporâneas e sua pluralidade, mais especificamente àquelas relacionadas à arte e ao espaço público.” Dizem ainda que se inspiram na arte conceitual. 

Após aprender a arte da serigrafia Anderson Santos ficou durante seis meses fazendo um trabalho social com crianças do subúrbio de Periperi, em Salvador, na sede do bloco afro Araketu. Declarou que foi uma experiência única e muito prazerosa poder passar informações para essas crianças. Também fez uma residência em Barcelona, na Espanha onde aprendeu a pintar paisagens contemporâneas. Ao retornar de Barcelona viu uma amiga deitada nua e da janela descortinava a Baía de Todos os Santos. Foi quando teve um estalo e disse “é isto que quero pintar!”

Anderson Santos e seus
filhos pintando o mural
no bairro do Barbalho.
Participou de edições do projeto Mural que é desenvolvido pela Trevo Produções, e o artista Anderson Santos  tomou conhecimento através o Instagram em 2021, em plena pandemia. Resolveu participar da seleção que inclusive remunerava os selecionados para pintar os muros na segunda edição do Projeto. A primeira edição foi nos galpões das Docas da Bahia, e esta segunda edição pela primeira vez nas grandes paredes verticais dos prédios localizados no bairro do Comércio. Ele teve a assistência do artista visual Rodrigo Weill, que tem experiência na arte de rua. Não foi uma experiência nova para Anderson Santos embora  ele já tinha pintado um mural em Milão, na Itália, em 2015, mas num espaço interno de um centro social atendendo a um convite do antropólogo Andrea Staid. Infelizmente o mural foi destruído pouco tempo depois com o fechamento do espaço. O terceiro mural pintado pelo artista foi o da  Rua de Cima, no bairro do Barbalho, em Salvador, em homenagem ao 2 de Julho. O Cortejo da Independência passa por esta rua.

.  Ao lhe perguntar como as pessoas reagem quando se vêm retratadas em suas telas falou que algumas acham que estão parecendo mais velhas, outras mais bonitas. E algumas não gostam do resultado.” Como estamos na era do digital é preciso que as pessoas  entendam que o artista Anderson Santos  não faz  uma self tratada com filtros quando está pintando. Lembrei de uma das estórias contadas por Ariano Suassuna que disse que o grande mestre francês Henri Matisse fez uma exposição, e ao chegar notou que um senhor estava às gargalhadas olhando uma obra que ele tinha pintado de uma mulher com a barriga azul. Aproximou-se do risonho e perguntou por que o senhor está rindo tanto? Foi então que o homem respondeu da mulher com a barriga azul. Aí Matisse retrucou: Isto não é uma mulher senhor , é um quadro!”.

EXPOSIÇÕES INDIVIDUAIS

Capa do catálogo virtual da mostra
A Vida Nua,2025 ,na Paulo  Darzé.
Em 2025 – A Vida Nua – Galeria Paulo Darzé – Salvador, Bahia-Brasil. 2023 - Floresta Negra – Galeria Theodoro Braga – Belém, Pará- Brasil. 2020 – Floresta Negra – Galeria Paulo Darzé – Salvador, Bahia-Brasil. 2017 – Rastros – Galeria RV Cultura e Arte – Salvador, Bahia-Brasil.

COLETIVAS

Em 2025 – Quem Viaja Arrisca – Museu de Arte Moderna da Bahia – Salvador, Bahia- Brasil. 2024 – Raízes – Museu da Cultura Afro-Brasileira (MUNCAB) – Salvador, Bahia-Brasil; Projeto Mural 2 de Julho – Salvador, Bahia-Brasil. 2021 – SP-Arte 2021 – Galeria Paulo Darzé – Evento online Projeto Mural – Salvador, Bahia-Brasil. 2020 – Festival Zona Mundi – Galeria Inter-fluxos – Exposição online. 2017 - Pertencentes – Museu de Arte Moderna da Bahia – Salvador, Bahia-Brasil ; Só Cabeças – Museu de Arte Moderna da Bahia – Salvador, Bahia-Brasil. 2015 – ExpoArte Italiana – Varedo- Itália • 2014 – Esposizione Triennale di Arti Visive a Roma – Roma-Itália; Salão Regional de Camaçari – Camaçari, Bahia- Brasil; Circuito das Artes – Museu Rodin – Salvador, Bahia-Brasil;  Catálogo Boardilla – Luiz Fernando Landeiro Arte Contemporânea – Salvador, Bahia-Brasil ; Circuito das Artes: Triangulações – Museu Carlos Costa Pinto – Salvador, Bahia-Brasil; 2013/2014 – A Nova Mão Afro-Brasileira – Museu Afro Brasil – São Pau-brasil; Circuito das Artes: Triangulações – MAMAM – Recife, Pernambuco-Brasil; Circuito das Artes: Triangulações – Museu Nacional da República –Brasília-Brasil • 2012 – Bienal do Recôncavo – Centro Cultural Dannemann – São Félix, Bahia-Brasil; ARTIGO RIO – Centro de Convenções SulAmérica – Rio de Janeiro- Brasil;  Paraconsistentes – ICBA – Salvador, Bahia-Brasil • 2011 – Arte Pará – Museu Histórico do Estado do Pará – Belém, Pará-Brasil – 2º Grande Prêmio • 2010/2011 – Bienal do Recôncavo – Centro Cultural Dannemann – São Félix, Bahia-Brasil.

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