JORNAL A TARDE, SALVADOR, SÁBADO, 14 DE MAIO
DE 1977
BRAYNER HUMANIZA A NATUREZA MORTA
Os movimentos das fitas de Leonel Brayner |
Agora
Leonel Brayner está em Salvador acerca de um ano e aqui pretende fixar-se
definitivamente, porém, realizando exposições no eixo Rio-São Paulo e outros.
Desde
ontem que sua exposição está aberta ao público na Galeria O Cavalete, no Rio
Vermelho. São trinta trabalhos, todos óleos sobre tela, focalizando de um a
forma bem expressiva objetos e receptáculos. Sem dúvida que Salvador está
presente influenciando através da explosão de suas cores os trabalhos de
Leonel. Basta dizer que dos simples e individuais objetos estáticos ele parte
para a paisagem estilizando-a de uma forma excepcional.
Destaco
principalmente, uma que fez da lagoa do Abaeté, que traz consigo toda
homogeneidade de outros trabalhos expostos. Quanto á segunda paisagem Farol da
Barra , Leonel não foi tão feliz. Ele quis retratar com mais realidade e a
composição perdeu um pouco a homogeneidade e a qualidade em relação aos demais
trabalhos. Quebrou a linha que vinha sendo seguida pelo artista. Porém, isto é
compreensível porque o próprio Leonel explica que não é paisagista.
A
influência de Salvador foi tão grande, que embora sendo um paisagista ele
atirou-se conscientemente à paisagem. Isto porque suas fitas estáticas ganharam
movimentos, surgiram as dobras e depois como uma evolução as paisagens, que
começa a fazer sem uma segurança ainda como afirmou a mim e a Ivo Vellame,
quando estivemos em seu atelier. Leonel é um artista com disciplina
profissional e consciente do papel que exerce, coisa rara em jovens artistas.
Leva o seu trabalho com extrema seriedade ao ponto de fotografar e manter um
arquivo codificado de todas as telas já feitas. Seu trabalho resulta também de
uma disciplina técnica e pesquisas feitas com muita tranqüilidade.
Ele
sempre queria sair da natureza morta tradicional. Continuou trabalhando e com o
passar do tempo descobriu a beleza unitária dos objetos. Com a atmosfera
envolvente, aquela primeira atmosfera envolvente do objeto em repouso, que é
bonita. A individualidade ou seja a nobreza que tem. Então Leonel perguntava
porque vinte tomates? Porque uma cesta de tomates? Se posso ter soluções e dar
os efeitos desejados com um. Porque um é bonito. Se coloco vários acho que
despersonaliza o objeto. Aí fui sentindo a necessidade de detalhar mais a
beleza dos objetos individualmente. Como elemento componente achava que ficava
muito solto e surgiram os receptáculos como as gamelas, que são automaticamente
brasileiras. È evidente que estilizei a gamela da madeira. Quanto ao prato acho
uma coisa afetiva, carinhosa e até poética e romântica, também, Ele serve como
elemento condutor, que realça a beleza do objeto em si. Quando faço ou
procuro mostrar a beleza, as características de um objeto que estou descrevendo
procuro reproduzir com um prato que define melhor o que estou querendo mostrar.
Comecei a trabalhar em tela.
Eu mesmo preparava a tela artesanalmente.
Daí
começou a usar a tela colada em Eucatex e redescobriu que também podia
sintetizar o espaço pictórico. Assim não precisaria utilizar todo o espaço de
uma tela inteira, isto é uma coisa muito pessoal, que não podemos generalizar.
Assim passou a usar o suporte como elemento componente do quadro. E o Eucatex é
um suporte nobre, e difícil de se estragar.
Como
você vê Leonel é um pouco artesanal. O critico Walmir Ayala disse a esse
respeito que ele acabaria escultor. É verdade que maneja muito os elementos.
Foi cortando as telas e aplicando nos suportes as partes que desejava. Os
cortes foram evoluindo, ia cortando mais e sintetizando.
Isto
sem forçar a barra.
Chegou às tiras, às faixas, que de uma forma ou de outra poderiam ser uma estilização
das fitas do Bonfim, que lhe impressionam muito. Mas, na realidade não é nada
disto. Surgiram como uma síntese dos cortes. Esses trabalhos atuais são a
essencialidade que chegou a te agora.
Leonel
utilizava muito beges, ocres e terras. Passou depois a outras cores
derivativas, complementares como elementos componentes do quadro. Vieram outras
cores e as telas ganharam mais vida. Vejam que as sombras atravessam várias
cores em seus quadros. Ao atravessar cada cor, a sombra é dada com
individualidade. Para conseguir isto, perdeu muitas telinhas. Mas o que importa
é que hoje o trabalho tem melhor qualidade. Como trabalha com muita
tranqüilidade, como trabalha estudando muito e discutindo com os artistas,
trocando idéias, tudo isto satisfaz o Leonel.
Numa
das telas expostas, Leonel Brayer colocou um estrofe. Portanto, é um novo
elemento dentro de sua pintura. Mas, para ele o elemento letra não tem muita
importância, são os outros elementos. Coloquei o verso porque achei que era bonito
e se encaixava. A solução ficou equilibrada. Nas minhas telas quase sempre
coloco uma parte pintada em branco, representando o papel e as pessoas devem
colocar o que desejam. O papel humaniza as minhas telas. Como dizia um
psiquiatra paulista Leonel quando você coloca o papel embaixo das gamelas,
pratos e outros receptáculos de seus objetos, você humaniza a natureza morta.
Ela deixa de ser morta e torna-se humana.
As
fitas deixaram de ser estáticas e ganharam movimentos. Ampliou e dobrou-as Na
realidade não importa a fita em si, mas a dobra. É o valor unitário da coisa
descrita. É isto que é importante. Assim o espectador sabe que tem gente que
dobrou isto. Isto não está dobrado por acaso.
Seus
trabalhos não podem ser vistos como colagem. Isto porque na colagem encontramos
elementos que na pintura, agregados e compondo. Ele só trabalha sobre a tela e
agora está dando apenas um novo estímulo visual, que acha muito mais denso e
dinâmica através dos movimentos de suas fitas. Porém Leonel deu tanta vida a
natureza morta, que já começa a dar os primeiros passos em busca da natureza,
da paisagem. Ele faz questão de dizer que não é paisagista. E que as duas paisagens
criadas Abaeté e Farol da Barra, foram resultados de algumas observações que
fez revendo locais já pintados por outros artistas. Diz que foi ao Abaeté,
sentei lá e fiquei decepcionado. Não com a beleza da lagoa.
Mas
com o descaso. Achei pequena suja, muito violada. Retalhei um quadro. Então
coloquei segmentos como se a lagoa estivesse sendo vista através de um vidro,
de um vídeo, de uma negativa de um filme ou de uma janela de uma Kombi, como
disse Wilson Rocha.
A
lagoa proibitiva, já distante. Utilizei um verde gaúcho não é um verde baiano
queimado. Fiz uma mistura também de verde e o mesmo tempo eu dupliquei aquele
pedaço como se estivesse trabalhando a duas mãos. Dei uma continuidade como ela
se repete, lembrando o cartão postal. Portanto, uma visão não livre como viu
Pancetti, que a pintou com grande ingenuidade, com grande beleza plástica. A
natureza morta torna-se, assim, o exercício formal mais elaborado e mais
elegante e o gênero dominante na era moderna, onde justamente, o maior
interesse se concentra nos valores formais.
Esta
citação de Antônio Bonfim faz-se necessário para compreendermos a obra de
Leonel Brayner, vai sofrendo no decorrer do tempo um processo evolutivo de
síntese formal.
Com
isto ele foi aprimorando sua técnica ao ponto de humanizar a natureza morta. Ao
invés de colocar em suas telas vários elementos, característica quase
obrigatória neste gênero artístico, Leonel elege apenas um elemento, e dele
capta toda a beleza formal e atmosfera que o envolve. É um trabalho de pesquisa
(oh) palavra desgastada) que vem desenvolvendo.
PAINEL
O artista Fred Schaeppi sempre experimentando |
Descobriu
que o Eucatex seria o suporte ideal e as tintas nos relevos foram substituídas
pelas massas. ao término da modelação é que as tintas surgem para
dar o colorido necessário às suas figuras.Os
relevos surgiram naturalmente na obra de Fred Schaeppi isto porque ele fazia
marinhas, uma influência talvez de sua infância que sempre teve o mar descortinado de cima do Morro do Ipiranga. As
pedras que eram conseguidas com a utilização de muita tinta resultarem na
presença constante de relevos em quase todos seus quadros. Não existe
possibilidade de rachadura porque isto ocorre no período de secagam das massas,
e, depois ele retoca com tintas. Seus quadros ganham mais resistência em
relação ás telas de pano.
Nenhum comentário:
Postar um comentário