UM TRIO DE GÊNIOS MARCOU A
PRESENÇA
DA CATALUNHA
Paris (AFP)- De todos os pintores do século XX, o espanhol Joan Miró, que
morreu no último dia 25, aos 90 anos, em sua casa de Palma de Majorca, foi sem
dúvida o único, junto com o francês, Matisse, que manteve contato com as novas
gerações de artistas.
DA CATALUNHA
Miró vivia quase isolado produzindo |
De
Jackson Pollock a Tapies, são muitos os pintores contemporâneos que reconhecem
o que devem a este eterno pesquisador da arte, cuja evolução só terminou com a sua
morte.
Na
verdade, em cada retrospectiva, Miró desejava que as suas novas obras marcassem
um equilíbrio com as anteriores, pois temia ser considerado um pintor oficial,
um pintor de passado. A pintura gestual, a arte da harmonia, a abstração lírica
devem muito a um artista que jamais deixou de repetir que “a pintura está em
decadência desde o tempo das cavernas”. Homem simples, Miró escondeu-se toda a
sua vida atrás de seu trabalho. Ao contrário de Pablo Picasso, sua vida
praticamente não deu motivos para piada. Pequeno, frágil, o rosto redondo e
delicado, Miró sempre cuidou da sua pessoa como um Dandy, e nada demonstrava o
artista revolucionário que fixou como objetivo no início de sua carreira,
“assassinar alegremente a pintura”.
O
primeiro período de Miró foi marcado por um profundo senso do detalhe. Pinta a
Catalunha, os vinhedos, as terras lavradas, as fazendas, os pássaros, as
montanhas distantes. Nessa época, Miró já estava em busca de um vocabulário e
nestas cenas agrícolas Marcel Duchamp descobriria “um sentido marcado da
intensidade irreal”. O escritor Hemingway comprou de Miró o quadro mais
representativo deste período: “La
Granja ”. “Há nesse quadro, dizia Hemingway, tudo o que se
sente quando se está na Espanha e, também, tudo o que se sente quando já não se
está mais e se gostaria de estar. As personagens de seu país natal transformam-se em criaturas de
contos de fadas, em
símbolos. A árvore, o caracol, a lagartixa têm uma alma”.
No
entanto, foi em Paris que nasceu outro Miró. Numa pequena galeria da esquina da
Rua Vavin e Di Boulevard Raspail, o pintor catalão viu vários quadros de Paul
Klee que o fizeram compreender que existia outra coisa além da pintura. A
partir deste momento os quadros de Miró serão as imagens de seus sonhos. Em
1930, ele declarou: “Não desenho mais coisas reais”.
Neste
momento, Miró começou a remontar o curso do tempo, a volta à infância da arte e
inventa uma linguagem muito simples feita de símbolos: o pássaro, o sexo
feminino, as estrelas, o sol, manchas de cor sobre um fundo branco. Com esta
linguagem limitada a sua obra escapa de qualquer definição e progressivamente
conquista o mundo.
O enterro de Miró com todas as pompas oficiais. |
Esta
ausência de vaidade, esta recusa a cumprir um papel, deixaram livre a sua
capacidade de ser infatigável artesão.
Quando
fazia uma litografia ou um desenho, Miró, jogado no chão, passava com
delicadeza um dedo na pintura: “Se fizer isto com o pincel, é o fim”, comentava
o velho pintor.
Esta
pintura gestual cada vez mais negra foi a última descoberta deste pudico pintor
que nunca quis lamentar-se, mas cujo universo estrelado não parava de
escurecer.
A marca do gestual de Miró |
Após
uma segunda retrospectiva no Museu de Arte Moderna de Nova Iorque (1959), Miró
expõe na Tate Gallery, de Londres (1963), em Barcelona (1968), em Munique
(1969), em Cleveland e em Paris (1974).
Em
1975 inaugura em Barcelona a Fundação Miró, organizada por seu amigo José Luís
Sert, arquiteto da Fundação Maeght. O núcleo da coleção é formado por telas
reunidas por Joan Prats, também amigo do pintor, ao longo de sua vida. Miró
completa o magnífico acervo de 150 telas, gravuras e desenhos.
Nos
últimos anos, cansado e freqüentemente adoentado Miró continua trabalhando
sempre e avançando permanentemente em sua obra. Só a morte, aos 90 anos,
conseguiu interromper essa incansável busca.
DALÍ ESTÁ ADOENTADO E QUER MORRER
Em 1979 Dalí ainda exibia muito vigor |
Dono
ainda de seu próprio destino, o mestre escolheu três amigos para serem
testemunhas de seu lento caminhar para a morte.
Dali
não quer visitantes no castelo. Com 79 anos de idade, ele aprecia sua solidão,
sua depressão e seu tipo original de gênio ou de loucura.
Durante
uma rara entrevista no castelo de Dali, Pixot, Descharnes e Domenech falaram de
seu amigo com afeição e também com tristeza. Desapareceram os vestígios do
impetuoso empresário de espetáculos que se deleitava com suas chocantes
esquisitices, desapareceu seu impulso criador. Desde a morte de sua mulher Gala
no dia 10 de junho de 1982. Dali não saiu mais do castelo Gala, morreu com 91
anos.
O
castelo, que Dali deu a sua mulher, é um verdadeiro santuário dedicado a sua
memória, com a inicial do nome de Gala em todas as portas. O salão principal
apresenta no teto abobado sobre uma espécie de altar há um crucifixo envolvido
em folhas de alumínio, uma espada e um revólver.
Gala,
trajando um vestido longo e esvoaçante e com as asas de anjo, aparece sobre as
nuvens em cima da porta do quarto.
Em
frente à entrada principal do castelo, há uma porta pintada que não leva parte
alguma ou pretende levar ao infinito.
Dali,
recentemente proclamado Marquês de Pujol, jamais se atreve a visitar seus
súbitos, camponeses ocupados demais com seus porcos e seus filhos para se impressionarem
com o drama do pintor, que há 18 meses vive oculto no castelo, pendurado como
uma cidadela junto ao bucólico povoado, no Norte da Espanha.
Os
dias e as noites do pintor estão confinados ao seu quarto e as duas pequenas
salas, cujas janelas estão perenemente fechadas. Seu próximo passeio pelo
castelo poderá ser quando for levado a cripta construída no porão, para fazer
para sempre ao lado de Gala.
Os
amigos de Dali dizem que a saúde do mestre, embora delicada, tem sido estável e
que ele não sofre nenhuma doença grave, embora pese apenas 48 quilos. A
imprensa disse que ele sofre da doença de Parkinson e de arteriosclerose.
“Pouco
a pouco ele vai definhando” disse Domenech . Pitxot acrescenta que o mestre
está sofrendo”.
Nenhum
de seus três amigos – um deles pelo menos está sempre no Castelo, consegue
levantar-lhe o ânimo e o instinto criador.
“Ele
se refugia em seu silêncio, em suas elucubrações ou nos poucos desejos desejos
de fazer alguma coisa”, disse Pitxot.
“Dali
está sempre muito consciente de seu próprio pensamento”, diz Pitxot. “Suas
obras sempre exprimem suas experiências mais íntimas e transcendentais.Agora
ele está muito confinado em si mesmo, dentro de suas paredes, dentro do seu
mundo interior, contemplando seu lento processo – eu não diria de
desaparecimento, mas sim de abandono das coisas vitais”, disse Pitxot.
Esta obra obra mostra a sua grandeza |
Pitxot
disse que quando a saúde de Dalí começou a definhar há alguns anos, ele se
preparou mentalmente para a morte e agora deseja morrer.
Raramente
evoca as lembranças do passado, pois “ estas lhe causam sofrimento”. Só lamenta
não ter entendido a teoria Matemática – um de seus desejos insatisfeitos. No
mês de março, o matemático norte americano Thomas Banchoff , da Universidade de
Rhode Island , veio visitá-lo. Apesar de tudo isto “Dalí é um homem
surpreendente”, diz Pitxot. Algumas de suas frase ainda causam espanto por sua
lucidez, seu brilho. Ele é um homem de verdade, um humanista, um arrogante
humanista”.
Embora
ainda haja muita procura de obra do famosos pintor, ele não está mais
interessado em produzir ou vender. “ Não me aborreçam com estas pequenas
misérias”, diz a seus amigos.
Um
estúdio localizado dentro do Castelo há grande número de obras de Dalí que
futuramente serão transferidas para uma Fundação que ele e seus amigos estão
criando perto de Figueiras, sua terra natal. Por enquanto, um destacamento da
guarda civil espanhola vigia permanentemente o precioso estúdio do pintor.
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