JORNAL A TARDE , SALVADOR, 24 DE
FEVEREIRO DE 1986.
RECONHECIMENTO DA OBRA DE SANTE
SCALDAFERRI
O artista Sante Scaldaferri ao lado de dois quadros. O reconhecimento merecido está chegando |
Sante
desnuda o homem e o coloca diante do espelho para que sinta as qualidades que
esconde por trás da pele de cordeiro.Escrevi
aqui várias vezes enaltecendo sua obra. Agora, fico mais contente ainda porque
vejo confirmada a vitória de Sante e, conseqüentemente, também, estou alegre
porque indiretamente, é também o reconhecimento do que escrevi sobre este
artista que deve ser orgulho da Bahia.
Informa-me
Sante que em setembro realizará duas exposições nas Itália. Uma na Galleria
D’Arte Citá di Pontofino, outra na Cívica Galleria D’Arte Contemporânea, de
Milão; outra em Nova
Iorque , todas com curadoria de Daniele Crippa, um dos mais
eficientes profissionais italianos.
Publico
aqui alguns trechos de Ferreira Gullar, da revista Isto É; Frederico de Morais,
do jornal O Globo, e Walmir Ayala, do Jornal do Comércio, do Rio de Janeiro.
Veja o que diz Walmir Ayala:
Veja o que diz Walmir Ayala:
SCALDAFERRI , BOAS VINDAS .
Um dos grandes vitoriosos do 8º Salão Nacional de Artes Plásticas foi o baiano Sante Scaldaferri. Obteve um Prêmio de Aquisição quando, na opinião de muitos, deveria ter recebido o Prêmio Viagem ao Exterior.
Mas
Scaldaferri não é da “panelinha” protegida pelo júri, nem é parente dos cabos
eleitorais dos mesmos, não é aluno das escolinhas que os melhores amigos do júri orientam, nem é tão rico que possa
convencer o júri a lhe conceder as honrarias curriculares, mesmo que sob a
imagem cabal da injustiça. Sante Scaldaferri é apenas um grande pintor, um dos
maiores do País, e isto conta muito pouco no atual estágio do Salão. A voz de
protesto que se vem avolumando, se ramificando em vários espaços especializados
do Rio de Janeiro, parece não chegar aos ouvidos dos maiores responsáveis por
esta opereta, como o chargista Ziraldo Alves Pinto e o próprio Ministro Aluísio
Pimenta.
Mas
voltemos à Scaldaferri. Não tendo obtido o Prêmio Viagem ao Exterior, juntou
suas economias e realizou uma modesta viagem à Europa. De volta, nos comunica
que vai realizar um painel para a nova sede da Bahiatursa, no Palácio da
Aclamação. Foi-lhe proposta ainda, que uma colecionadora francesa, quer uma
nova versão de Guernica. Já tem propostas para aquisição dos quadros do Salão N
acional
de Artes Plásticas e dos que expôs na Bienal de São Paulo. Considerando que
Scaldaferri não faz concessão, nem á moda nem ao decorativismo, este, consumo
inteligente e crescente é de se aplaudir. Honra mais o colecionador do que o
próprio artista.
Um
trecho do artista de Frederico de Morais de O Globo, que foi ilustrado com a
obra O Namoro, de Sante, com esta legenda: Pintura de Sante Scaldaferri,
artista baiano que trata de assuntos nossos, locais, em linguagem
internacional.
Eis
o trecho do texto:
“As
obras dos 20 artistas que receberam prêmios aquisitivos no 8º Salão Nacional de
Artes Plásticas, encerrado no último domingo, estarão expostas na Galeria
Sérgio Milliet, na Funarte. O Salão foi muito malhado pela crítica
especializada e, na opinião deste colunista, os prêmios de viagem foram
equivocados. Contudo, algumas das melhores presenças do salão foram
contempladas com a aquisição de suas obras. É o caso dos cuiabanos Adir Sodré e
Nilson Pimenta, o primeiro com obra deliciosamente erótica; dos desenhistas
mineiros Castaño, Glaura Pereira e Isaura Pena; dos paulistas Fábio Miguez e
Rodrigo Andrade, do grupo Casa 7 e, Sobretudo, do baiano Sante Scaldaferri,
tratando de assuntos nossos, locais, em linguagem moderna e internacional. As
aquisições confirmaram a tendência do júri de privilegiar sobretudo a pintura”.
E
o que disse Ferreira Gullar:
“As
manifestações arrojadas ou supostamente arrojadas, freqüentes nos salões
anteriores, foram escasseando, e neste já não existem, a não ser uma ou outra
obra que soa defasada. Mesmo fazendo quadro sem moldura e sem chassi, o pessoal
voltou a pintar no retângulo e em grande formato. Gasta muita tinta e dizem
pouco. É em geral uma pintura suja, opaca, que não se abre para nada:
Sem
espírito de um novo tipo de formalismo ou de academicismo. Arte sem vitalidade,
sem poesia, é coisa morta, acadêmica. Não é imprescindível pintar tachos
brilhando para ser acadêmico. Há muito academicismo disfarçado de vanguardismo.
A retórica do grande formato pode ser ilusória; tem mais valor um pequeno
quadro bem pintado, desde que nele haja alguma manifestação que nos toca.
É,
por isso, um alívio, quando agente defronta, nesse salão, com os quadros de
Sante Scaldaferi, por exemplo, onde há domínio da técnica pictórica e riqueza
de expressão, uma expressão que bebe nas fontes populares mas não se rende ao
popularesco”.
LEONEL
MATTOS FARÁ UMA NOVA MOSTRA EM
SÃO PAULO
O
destemido Leonel Mattos está distribuindo o catálogo de uma exposição
individual, que fará, agora, em março na Galeria Paulo Prado, em São Paulo , com
apresentação do crítico Olney Kruze. Ele faz uma saudação a Leonel falando de
sua pintura como “fascinate”, perturbadora, bela e extravagante..- Evidente que
as mensagens inseridas na figuração de Leonel deixam perplexas todas àquelas
pessoas que não acompanharam de perto a
sua trajetória. Realmente não fico perplexo, porque sei do potencial criativo
que tem Leonel e conheço as suas inquietações. Sua pintura é acima de tudo impulsiva
e retrata a agilidade do seu pensamento. É aí que está o motor de sua febril
vontade de criar, porque ele tem um grande poder de inventividade. Lembro da
influência exercida pelos trabalhadores rurais e os pescadores da Ilha de
Itaparica, dos cajus e outras frutas silvestres, em sua obra, e que ele tanto
explorou em trabalhos anteriores. Leonel vibra que aquilo que toca de perto de
seus sentimentos, e é capaz de manter um discurso, evidente, fora dos limites
das cátedras ou do clássico, mas com aquela garra de um entusiasta. O colorido
é forte e casado com a própria figuração que pega desprevenidas algumas
pessoas.
Desta
série de trabalhos, que mostrará na Galeria Paulo, Prado consta esta tela que
ele chama de “Relógio da Metrópole” (que reproduzo), onde faz uma relação entre
o relógio, que marca o tempo e as pessoas enfrentando as caóticas fitas do
metrô ou dos ônibus. Nos mostradores, ao invés dos ponteiros, aparecem
situações de pontos de transporte coletivo e, no alto, a cabeça de um homem,
que anda sobre duas frágeis rodinhas. Este é um resumo da inquietação e da
criatividade deste baiano que começa a despontar no Sul do País.
BAHIA
VISTA PELO CHILENO GONZALO CÁRCAMO
Vinte e cinco aquarelas do artista chileno Gonzalo Cárcamo estão sendo apresentadas na galeria do Hotel Méridien. Ele fala da escolha desta técnica (aquarela), porque lhe permite a leveza, embora exija soluções muito rápidas, devido à sua secagem quase instantânea. Isto o estimula obrigando-o a um diálogo constante com o trabalho no momento que está realizando.
Gonzalo
está encantado, como qualquer visitante que aqui desembarca, com a luminosidade
baiana e “principalmente quando esta luz incide sobre a arquitetura, que quase
não respira, ela não se interrompe, apenas se contorce com suas ruas estreitas,
verdadeiros labirintos ondulantes, as escadarias intermináveis conduzem ao céu.
Toda esta magia combina harmoniosamente com o jingado baiano”.
Lembra
ainda Gonzalo que sua exposição “não é um registro da Bahia em sua magnitude, e
sim momentos que, com certeza, são relevantes na vida de Salvador, momentos que
todo mundo que mora aqui está acostumado. Mas, fica aqui a minha impressão mais
espontânea e singela do que me apaixona na Bahia.
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