A ARTE PRESENTE NUM FESTIVAL QUE PASSOU
Arembepe, um lugar próprio para manifestações artísticas integradas com a natureza. |
Acampados
à beira-mar em centenas de barracas de todos os tamanhos, os participantes do
festival deixaram por quatro dias a comodidade de suas casas e apartamentos e
outras vantagens da sociedade de consumo para viver o mais louco e saudável
sonho de verão tropical. Enfrentaram com tranqüilidade os banhos coletivos, a
poeira causada pelo movimento de veículos, a falta de uma refeição mais
transada e as facilidades dos aparelhos domésticos. Mas, é certo que cultuaram
seus ídolos, falaram uma linguagem uníssona sobre a necessidade de proteger a
natureza, exercitaram seus corpos, cantaram suas canções prediletas e
compartilharam de novas emoções.
Jovens pintam seus corpos com composições que enaltecem a natureza |
Certamente
que esses instantes vividos com intensidade em contato com a beleza natural de
Arembepe, momentos recheados de novas emoções, experiências e muita liberdade,
serão lembrados e relembrados no decorrer da existência de cada um dos
participantes. Arembepe será lembrado como um lugar quase sagrado, como um Olinto
onde os deuses baixaram e falaram um linguajar descontraído pautado em palavras
de paz, de respeito ao homem e á natureza, contra o horror da guerra e também
da violência que campeia nos gabinetes oficiais e nas ruas asfaltadas das
grandes metrópoles.
“O
melhor lugar do mundo, é aqui e agora”, bradou Gilberto Gil do alto do imenso
palco armado em campo aberto, provocando um verdadeiro delírio entre as
centenas de jovens que acompanhavam atentamente o seu show cantando e dançando.
Realmente esta frase de Gil traduz tudo. O melhor lugar e o mais bonito não
apenas pela exuberância natural mas também pela presença de gente bonita, gente
jovem com os corpus seminus banhando-se nas lagoas ou na Praia de Arembepe
entre um show e outro. Um local adequado para eliminar preconceitos, para
transar novas idéias e unir pessoas até de gerações diferentes que antes
experimentavam conflitos e discordâncias. Os quatro dias vividos em Arembepe,
lugar paraíso, lugar sagrado, serão inesquecíveis. Momentos experimentados sob
um sol ardente e noites estreladas, suavizados pela brisa do mar.
O artista Paulo Serra falando de seu personagem Mero, estampado numa camisa, em defesa da Lagoa do Abaeté |
Organização
falhou.
Uma
reclamação ouvida com muita insistência durante a realização do Festival de
Arembepe foi quanto à organização. Alegavam alguns participantes de vários
shows de que atividades paralelas anunciadas com antecipação não foram
realizadas. Outros reclamavam de que o Festival estava muito fechado e centenas
de jovens não puderam dele participar porque não conseguiram arrumar os CR$ 15
mil para acampar no local.
Realmente
alguns espetáculos e atividades outras não foram cumpridos com presteza, mas
isto, segundo outros participantes, é normal neste tipo de promoção e como
disse Gerson Pereira Reis, de 21 anos, “acontece com todos os festivais. Já
participei de alguns e posso dar meu testemunho que sempre acontecem falhas”.
Ele
também alertou que os que reclamavam muito “são os caras que estão acostumados
com as coisas muito arrumadinhas. O que a gente tem que fazer num Festival deste
é curtir a vida a cada momento”.
É
verdade que muitos jovens vindo de vários estados do país atraídos pela
propaganda estampada nos vídeos e nos outdoors esperavam participar livremente
dos shows e outras atividades culturais. Mas o que encontraram foi toda a área
cercada com arame farpado, e um “eficiente” sistema de segurança com jovens portando
pedaços de pau, bem maiores que os tradicionais cassetetes dos guardas das
policiais militares. Mesmo assim, muita gente conseguiu ludibriar os
“seguranças” pulando os nove fios de arame da cerca.
Outros
preferiram acampar nas cercanias de onde puderam acompanhar tudo, inclusive os
shows que foram vistos à grande distância, porque o palco era alto e o som, tão
potente, que se espalhava por mais de três quilômetros.
Também,
é verdade que organizadores conseguiram instalar uma relativa infra-estrutura.
Vários banheiros coletivos, sanitários, venda de todo o tipo de comida, desde
as tradicionais da culinária baiana às pizzas e alimentação natural. Cervejas e
refrigerantes foram comercializados por uma única indústria que adquiriu a
exclusividade, mas não houve exploração desenfreada nos preços desses produtos. Para os que curtem leite, uma empresa baiana colocou dois grandes caminhões
frigoríficos para vender o produto além de iogurtes e outros alimentos
derivados do leite. Do lado de fora uma verdadeira feira livre foi instalada
com pessoas residentes em Salvador e nas imediações de Arembepe vendendo de
tudo. Você podia tomar desde um caldo-de- cana, uma batida de caju e outras a
preços acessíveis. Portanto, mesmo aqueles que não trouxeram comida para suas
barracas não sentiram grande dificuldade em adquirir. Deixando
de lado a alimentação, em várias outras barracas instaladas você podia pintar o
seu corpo com desenhos modernos e ao gosto da juventude e exibir cores e formas
plásticas bem contemporâneas. A arte viva, que desaparecia com um simples banho
na lagoa ou no mar. Vários artistas engajados na política ecológica, tão em
moda e tão curtida pelos participantes do festival, estavam lá, entre os quais
Paulo Serra, com Mero, seu personagem defensor da natureza.
Vestidos,blusas e bolsas criados com exclusividade foram também vendidos em Arembepe. |
Pelos
espetáculos e oportunidade de curtir sons e discutir idéias novas num local
paradisíaco, a dose não pode deixar de ser repetida no próximo ano, quando
certamente haverá novas atrações e os problemas surgidos nesta primeira
experiência podem ser evitados. E, principalmente que não haja arame farpado
para que todos possam andar livremente pelos seus campos e suas praias. Arembepe
pode ser, todos os anos o paraíso dos jovens que curtem som, a natureza e amam
a arte.
Os
possíveis abusos que sempre são cometidos por alguns não devem ser tomados como
algo definitivo que venha prejudicar uma manifestação tão válida como um
festival. A arte necessita sair das galerias, dos museus e dos teatros para uma
presença maior nas praias, nos campos e nas praças. É preciso enxergar o lado
positivo e incentivar nossas manifestações artísticas em todos os seus
segmentos.
(Fotos: Fred Passos).
(Fotos: Fred Passos).
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