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terça-feira, 16 de outubro de 2012

QUATRO ARTISTAS DE A TARDE TÊM EXPOSIÇÃO DIA 16 NO TCA - 12 DE DEZEMBRO DE 1983.


JORNAL A TARDE SALVADOR, TERÇA-FEIRA, 12 DE DEZEMBRO DE 1983

QUATRO ARTISTAS DE A TARDE TÊM EXPOSIÇÃO 
DIA 16 NO TCA

       Os artistas Carlos França,Reinaldo Gonzaga,Menandro e Núbia

Depois da convivência diária com os quatro artistas que vão expor a partir do dia 16 de dezembro no foyer do Teatro Castro Alves, realmente torna-se um pouco difícil falar sobre suas obras. A convivência dá aquela sensação de aceitação pacífica. A emoção vai se desfiando com o tempo de convivência. Se alguma emoção esbocei nas palavras inseridas na apresentação do catálogo, o mérito é realmente da qualidade dos trabalhos que eles elaboram.
Escrevendo diariamente e acompanhando o noticiário internacional e nacional, estou sempre diante de problemas que emocionam e que aos poucos, vão nos desgastando física e psicologicamente.
São as guerras, no Líbano e em El Salvador, desempregados que roubam para comer, são os saques, as greves intermináveis, os atos de terror da direita e da esquerda, as ditaduras do Estado, as políticas econômicas desastrosas e o sofrimento secular do nordestino. Eu e os artistas que agora vão expor vivemos estas emoções, muitas vezes com mais intensidade que a maioria das pessoas, porque a notícia é a matéria-prima do nosso trabalho, do nosso dia-a-dia, e ultimamente, as notícias envolvendo assuntos desagradáveis que estão se multiplicando.
Eis a declaração que Reinaldo Gonzaga me enviou: “Agora estou de volta ao cavalete, procurando explorar as cores em todo seu potencial. Estou fazendo uma orquestração cromática, destacando o claro e escuro. E, nestas composições simplifico as formas para denunciar as injustiças social e econômica do nordestino, estigmatizado pela opressão e o sofrimento”.
Ao conversar com Menandro: “As expressões por vezes cansadas de homens e mulheres refletem a labuta inclemente a que são submetidos. São pessoas humildes, deserdadas da sorte, que vestem de maneira simples e que andam por caminhos tórridos. São crianças ariscas, são retirantes desalentados, são amantes enlevados”, Portanto, são palavras cheias de sentimentos, que são transportados para a tela através de suas composições, onde seus traços funcionam como verdadeiras lanças prontas para defender esta gente desprovida de tudo.
Já o Carlos França utiliza dos fantoches para denunciar a manipulação desenfreada, através do Estado ou da empresa. São milhões de manipulados por uma minoria enclausurada em Sales ermeticamente fechadas com ar artificial, que enxergam apenas o lucro e o próprio bem estar.
Núbia nos traz a doçura da feminilidade, o relaxar de toda envolvência para exaltar as paredes seculares dos casarões e as paisagens bucólicas onde eu, Reinaldo, Menandro, e França gostaríamos de ver todas as pessoas, descansando e usufruindo das delícias e beleza deste mundo, antes que chegue o holocausto e seja tarde demais.

                  A “CONFISSÃO DE MANDANTE”

“Assumo inteiramente a responsabilidade, ou, por outras palavras, confesso ser o mandante intelectual desta exposição, pois de mim e não dos artistas, pessoas extremamente modestas - partiu a idéia de sua realização. É uma paternidade que reivindico, com a perdoável vaidade de quem se interessa em promover o mérito alheio, quando realmente existente. Aliás, não teria necessidade de ser um expert em arte - o que, sabidamente não sou - para reconhecer o merecimento destes expositores, pois já os conhecem e reconhecem mais que suficientemente os leitores de A Tarde, que todos os dias se deliciam com as charges preparadas por Menandro, Carlos e Reinaldo, ou apreciam as ilustrações feitas por eles para artigos e matérias especiais. E se os leitores não sabem quem é Núbia Cerqueira, a razão está em que ela não trabalha no jornal como desenhista, mas como diagramadora, função que, por sinal, tem muito a ver com a arte, porque exige senso estético, criatividade, facilidade de composição, bom gosto, enfim diversos dos predicados que o verdadeiro artista tem de reunir.
Não vi os quadros preparados por Reinaldo, Carlos e Menandro para esta exposição. Mas, aposto que são muito bons. Trabalhos de todos três - e mais os de Núbia - vistos anteriormente, autorizam-me esta certeza. E fico contente com um bom êxito que certamente alcançará esta coletiva.
Contente por eles, grandes criaturas humanas, na sua modéstia e na maneira irrepreensível como exercem as suas funções no jornal; e contente pela A Tarde, por ter sob seu teto - e ilustrando suas páginas - estes jovens talentos. Jorge Calmon "
      Os Aguadeiros , de Reinaldo Gonzaga.                      O Casario , da artista Núbia Cerqueira.

                  O QUE ESCREVI NO CATÁLOGO

“Diariamente Reinaldo, Menandro, Carlos França estão debruçados sobre a prancheta lendo jornais para saber as últimas medidas desastrosas de Delfim Netto, o último capítulo da inexplicável corrida armamentista ou mesmo uma bobagem mais curiosa saída da boca de um político. Núbia, fica traçando no diagrama as fotos, matérias e vai assim preenchendo os espaços procurando a cada dia fazer uma página com melhor visual. Portanto, são quatro artistas que trabalham de lápis e borracha nas mãos procurando fazer melhor de si para que A Tarde saia melhor a cada edição. Na verdade a criatividade destes artistas não se esgota na charge ou na folha do diagrama. Todos são pintores. E uma prova do que afirmo é esta bela exposição, idealizada por Dr. Jorge Calmon, sempre sensível às manifestações artísticas, que agora realizam depois de marchas e contramarchas. É um projeto antigo dos três chargistas e foi o despertar de Núbia para a pintura que conseguiu reuni-los, nesta mostra onde serão apresentados quarenta e poucos trabalhos, sendo que a maioria com uma temática ligada ao Nordeste.
Todos são baianos do interior do estado, de onde vieram para a Capital em busca de uma melhor oportunidade. Reinaldo Gonzaga é de Buerarema, formado em Belas-Artes e já trabalhou como ilustrador, chargista e programador visual. A charge lhe possibilita com poucos traços definir as figuras estigmatizadas pelo sofrimento. Carrega consigo as lembranças e as imagens de sua terra onde os menos favorecidos são obrigados a enfrentar situações quase indescritíveis para sobreviver. Reinaldo é meio caladão e quando está trabalhando fica tão envolvido que se abstrai do barulho, tão comum em todas as redações de jornais. Simplificando as formas, ele valoriza as cores e o tema.Numa linguagem como ele mesmo faz questão de frisar realista-expressionista.
Tentando passar para a tela as injustiças social e econômica que castiga o nordestino.Carlos França, é de Itiruçu. Iniciou como publicitário. É ilustrador e chargista e agora nos apresenta seus trabalhos a óleo e com a temática Fantoches. Preocupado com a manipulação cada vez maior do homem. Sua pintura é mais solta, onde vai procurando soluções para cada elemento que surge espontaneamente na tela. Ele reconhece que no momento da composição de um quadro tem a sensação de estar trabalhando uma charge, tal a “semelhança do seu desenho em ambas as situações”. Esta observação serve para os demais. Isto porque o chargista desnuda as figuras através dos elementos que compõem a figura. Eles retiram do original apenas o essencial e este exercício exige muita criatividade e de certa forma leva todo chargista a simplificar as figuras, mesmo quando está pintando e quadro. Os Três também estão preocupados com a labuta dos homens comuns, tão presentes com seus sofrimentos em envolvimentos nas páginas dos jornais. Carlos França também é formado pela Escola de Belas Artes, é um ilustrador de mão cheia.
Menandro Ramos é de Riacho de Santana e retrata “as expressões por vezes cansadas de homens e mulheres que refletem a labuta inclemente em que são submetidos”. São imagens fixadas desde a sua infância quando os trabalhadores chegavam das fazendas cansados e desesperançados. Daí a sua preocupação em enaltecer a figura humana. Ele revela que há um conflito entre o chargista e o pintor. É que a charge tem sempre uma ponta de crítica o que não acontece necessariamente com a pintura. Mas, este conflito não está apenas em Menandro chargista-pintor, mas em todos nós que buscamos sobreviver com dignidade neste mundo paradoxal cheio de crueldade e lirismo. A saída é o encontro de um ponto de equilíbrio e Reinaldo, Carlos França e Menandro encontraram o equilíbrio. Finalmente, temos a Núbia Cerqueira que é de Juazeiro. Doçura de pessoa, sensível e cheia de amor pra dar. Suas cores são revestidas de um clima de entardecer, sombrias, calmas, como demonstra ser a própria autora. As águas de seus rios são mansas, as figuras humanas estáticas, completamente diversas destas que passam apressadas nas ruas das metrópoles dando tombos nas demais.Ela fixa na tela este tempo que está ficando cada vez mais afastado de nós.
Uma imagem poética, lírica, de sua infância, ao contrário dos chargistas, ela enxerga o lado belo, calmo e fascinante das coisas. Cada pincelada é como uma nota musical que vai enchendo nossos ouvidos de emoção. Em contraste com a pintura dos três companheiros de exposição, onde está marcante a preocupação com a denúncia. Núbia quer pintar e pinta ,com grande prazer e nostalgia”. Reynivaldo Brito
     Rosa do Sertão, uma obra de Menandro Ramos            Obras de Carlos França da série Fantoches


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