JORNAL A TARDE SALVADOR,
TERÇA-FEIRA, 26 DE DEZEMBRO DE 1983
IVONETE DIAS REVELA O QUE
ACONTECE
DENTRO DE CASA
Sem qualquer exagero Ivonete é a
melhor artista primitiva que surge na Bahia depois da morte de João Alves.
Existem vários outros, de valor. Mas, aqueles que já tiveram a oportunidade de
parar e refletir sobre a sua obra já constataram a sua extrema habilidade,
aliada a uma capacidade de reter cenas interioranas e transportar para a tela em
toda a sua plenitude.
Quando falo em Ivonete fico muito
à vontade porque tenho conhecimento da sua vida novelesca, de sua força que lhe
permite sobreviver depois de mil peripécias e que os problemas são enfrentados
com muita garra, ao lado de seus quatro filhos.
É um Nordeste colorido, onde
aqueles personagens que vivem distantes dos mísseis, bombas atômicas, do
egoísmo e individualismo das metrópoles vão desfilando garbosos, com suas
roupas domingueiras nas procissões ou mesmo nas feiras livres.
Agora, Ivonete dá um mergulho
para dentro de casa. Ela está construindo cenas belíssimas do dia-a-dia da
dona-de-casa. São mulheres costurando, fazendo comida, varrendo a casa, a
família inteira almoçando, tendo ao lado o cachorro vira-lata roendo um osso, o
pagode e assim por diante. São cenas comuns a todos aqueles que vêm e moram no
interior. Forte por revelar este dia-a-dia, pois estamos acostumados com as
pinturas de profissões, bumba-meu-boi e assim por diante, Ivonete agora nos
revela o seu lado de dona-de-casa interiorana fixado em sua mente.
Mesmo cheia de problemas é capaz
de esquecê-los quando está sentada diante de uma tela branca e compor estas
cenas ricas em detalhes e expressividade. Lembram as tão reclamadas raízes. E,
Ivonete é realmente uma pessoa do interior no seu jeito de falar, na sua
maneira de tratar, e mesmo na simplicidade com que diz às coisas que gosta ou
não gosta. E, sua pintura reflete um pouco desta maneira de ver o mundo, um
mundo ainda ingênuo, embora sofrido.
Fico portanto à vontade para
falar de sua arte que vai ser mostrada na primeira exposição de 1984 da Galeria
Época, a partir de 27 de janeiro: serão cerca de 20 quadros em sua maioria de
40 x 50 e será uma boa oportunidade para aqueles que ainda não tiveram
oportunidade de examinar a sua obra possam ver a representação das coisas do
interior.
Ivonete é de Rio Tinto, na
Paraíba.
Residia no interior da Bahia.
Atualmente, mora com seus filhos, próximo ao bairro de Santo Antônio, de onde
recompõe através de suas telas, situações e cenas, que dentro de alguns anos
terão desaparecido com a sanha destruidora do progresso. Mas, enquanto ainda
podemos falar de coisas simples, deixemos que as telas de Ivonete Dias povoem
os salões e as galerias porque são pedaços do que existe de significativo na
vida desta gente simples que mora no interior.
E, como boa dona-de-casa e mãe
extremada, Ivonete ainda consegue pintar.
Deixemos que ela nos brinde com
as belas composições simples e graciosas. E aí está o seu valor porque tem o
equilíbrio necessário entre a simplicidade e o valor artístico.
Esta sua volta para o interior de
uma família, para o fazer diário da dona-de-casa possibilita uma variedade
imensa de cenas, quase desconhecidas de muita gente, mas que representam grande
parte da existência de milhões de nordestinos. Com uma grande sensibilidade e
criatividade além de conhecedora deste mundo, que já viveu tantos anos, Ivonete
nos abre a cortina e nos permite ver o que acontece dentro de casa.
AS “PREVISÕES” DO SERRA
O Paulo Serra não é vidente. É um
cartunista de mão cheia e ultimamente todo final de ano ele generosamente
atendendo aos apelos de Papai Noel desenha alguns cartuns sobre o ano vindouro.
Para 84 ele faz cinco
“previsões”. No primeiro cartun, Serra acredita que o operário continuará
arrochado pelo patrão. No segundo, que a violência urbana vai imperar. No
terceiro, que o mundo clamará de joelhos diante do perigo de uma guerra
nuclear. No quarto, que aparecerá água no Nordeste bastando às autoridades
resolveram trabalhar. E, finalmente, a quinta “previsão” é que a paz povoará os
corações daqueles que acreditam no amor.
Deixando as “previsões” de Serra,
podemos dizer que o Natal foi comemorado em todos os lares. Mesmo naqueles onde
a injustiça social esmaga as pessoas pela falta de recursos.
Mas, é necessário que comemoremos
não apenas o Natal, mas outros eventos para que esqueçamos por algum tempo o
sofrimento que todos nós vivemos neste mundo de incertezas.
Uma infinidade de violência,
praticada pelo próprio homem capaz de amar e odiar num simples fechar de olhos.
É preciso manter abertas as nossas consciências e acreditar na bondade de
muitos. Que a desesperança dê lugar a uma esperança cada vez maior na
capacidade de criar coisas boas.
OS PREMIADOS NO SALÃO NACIONAL
Os artistas Manoel Fernandes (desenho-Rio),
Luciano Pinheiro (pintura-Olinda-PE), Solange Oliveira (gravura-Rio) e Carlos
Mascarenhas (escultura-Rio) são os artistas que receberam os prêmios de viagem
no VI Salão Nacional de Artes Plásticas-MEC-SEC-Funarte. Cada artista recebeu
C$2 milhões. O Prêmio Gustavo Capanema, para pesquisa, foi dado este ano para o
artista brasiliense José Eduardo Garcia de Moraes, com a apresentação da
performance O Mágico Iludir. O prêmio tem o valor de CR$400 mil.
Receberam prêmios de aquisição os
seguintes artistas: Luiz Pizarro (pintura-Rio), Francisco Faria
(desenho-Curitiba-PR) e Felipe Artur Andery (pintura-SP). A subcomissão de
seleção e premiação do VI SNAP resolveu também indicar como referências
especiais do júri: Lívia Flores (desenho-Rio), Jair Jacquemont (desenho-
Amazonas), Santuza Andrade (pintura-São Paulo), Hilton Berredo (mídia-Rio),
Leonilson (pintura-São Paulo) e Gerardo (pintura-Rio). Como prêmio de aquisição
para o Museu Edison Carneiro do Instituto Nacional de Folclore da Funarte o
júri escolheu os artistas Alcides (MT), Oswaldina (MT) e Nilson Piamont (MT).
TRAJETÓRIA
Manoel Fernandes - 39 anos,
paulista, morando há quase três anos em Petrópolis. Formou-se
em Arquitetura em São Paulo ,
depois freqüentou a Escola Brasil e passou a fazer pintura e desenho. Nos anos
70 ficou durante dois anos viajando pela Itália, produzindo e vendo arte. Na
volta, resolveu deixar São Paulo por Petrópolis, onde dá aulas e organiza
exposições em museus e galerias. É também professor de Desenho no Museu de Arte
Moderna do Rio. Manoel Fernandes sempre participou de salões, mas já fazia três
anos que não se inscrevia no Salão Nacional de Artes Plásticas. Fez individual
na Galeria Paulo Figueiredo, de São Paulo, na Galeria de Arte Cândido Mendes e
Galeria Contemporânea, ambas no Rio. No VI SNAP apresentou trabalhos de desenho
com vários tipos de carvão.
Luciano Pinheiro- Luciano é do
Recife, e tem o seu atelier no Alto da Sé, em Olinda. Começou a
expor em 1965. Em 1966 integrou-se ao grupo da Ribeira, na Cooperativa de Artes
Plásticas Oficina 154, em Olinda, e nesse mesmo ano expôs na I Bienal nacional
de Artes Plásticas de Salvador, no XXV Salão Anual de Pintura do Museu do Estado de Pernambuco e
outras exposições coletivas e individuais. Em 70 foi premiado no I Salão dos
Novos, no Museu de Arte Contemporânea, em Olinda, e em 74 recebe o Prêmio de
Aquisição de Desenho no I Salão de Arte Global, de Pernambuco. Em 77 inicia
seus contatos com a técnica litográfica por intermédio de João Câmara. Em 78
foi premiado (aquarela) no XXXI Salão de Arte do Museu do Estado de Pernambuco;
em 79 foi premiado na I Mostra de Desenho Brasileiro, em Curitiba e no XXXII
Salão de Arte em Pernambuco (aquarela). Participa do Panorama/80 no MAM-SP em
81, no Panorama de Arte Atual em Pernambuco. Fez , em 82, uma individual na Galeria
Sérgio Milliet da Funarte. Em setembro de 83, expôs no espaço ABC- Arte
brasileira contemporânea- da Funarte, fazendo exposição do MAM-RJ e em São
Paulo.
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