MÁRIO CRAVO JÚNIOR
“Não sabia que a sociedade impunha tanta responsabilidade ao
sexagenário”, desabafou o escultor Mário Cravo Júnior, que volta a expor
individualmente numa galeria baiana depois de 13 anos de ausência. É verdade
que tem comparecido em várias coletivas, e que fez há dois anos, uma exposição
ao ar livre no Farol da Barra de várias esculturas feitas em polietileno. Porém ,
individualmente, é esta exposição programada e já armada na galeria MAB, na Rua
Guanabara, cujo vernissage ocorrerá no próximo dia 26 que representa não apenas
o seu retorno individual a uma galeria baiana como um dos eventos comemorativos
de seu sexagenário.
Além desta está idealizando uma grande exposição ao ar
livre, cujo local ainda não foi definido. Pensa em colocar suas esculturas de
ferro, de dois a quatro metros de altura, na Praça da Sé ou no canteiro central
da Garibaldi. Mas tudo ainda depende de alguns detalhes e levantamentos que o
artista está fazendo, principalmente, para que a mesma seja vista por um grande
número de pessoas.
Outro evento dos seus 60 anos será o lançamento do livro
“Cravo”, que seu filho Mário Cravo Neto está acompanhando de perto, em São Paulo , onde está
sendo impresso. Serão poucos exemplares, cerca de Hum mil, os quais serão
divididos entre os patrocinadores e o artista. O livro contém 30 fotografias
feitas por Mário Cravo Neto sobre o trabalho do pai.
A ESPONTANEIDADE
Lembro certa vez que o artista foi convidado pela direção do
Colégio da Bahia para fazer uma palestra para os alunos e professores sobre a
Arte na Bahia. As organizadoras estavam eufóricas, todas emperiquitadas à
espera do conferencistas na porta do colégio. Eis que de repente surge a figura
de Mário. Que pára diante de um menino que vendia picolés, compre um, de limão,
e sai chupando entre as professoras desconsertadas. Assim, subiu as escadas que
dão acesso ao auditório e iniciou a sua conversa com os alunos do central. Este
fato demonstra exatamente a personalidade descontraída e espontânea de Mário,
que embora seja um artista consagrado no Brasil inteiro, e mesmo no exterior, è
despojado de vaidades, o que não acontece com outros, muitas vezes menos
talentosos.
Para conhecer os seus novos trabalhos concebidos entre 1982
e este ano, marcamos um encontro na Galeria Mab. Ás 16 horas, da última
quinta-feira lá estava o Mário.
Foi logo dizendo que estava muito satisfeito em realizar
esta exposição, embora lhe agrade muito fazer exposição ao ar livre, como
aquela que fez no Farol da barra. Porém, treze anos depois exporá na Galeria
Mab com esculturas de menor porte e vários desenhos, que funcionam como um
instrumento didático de complementação do seu trabalho escultórico para que as
pessoas sintam como tudo acontece. Neste período ele executou muitas esculturas
de maior porte para praças públicas e edifícios. Daí a importância desta
exposição, porque mostrará desenhos dos últimos 15 anos de sua carreira e
trabalhos de escultura de duas fases geminadas. A de metais não ferrosos,
(especialmente o latão), que apresenta elementos mais angulosos e as pequenas
esculturas em cobre, que estão no interior da galeria. A da segunda fase são
feitas em alumínio repuxado, sendo que algumas serão apresentadas dentro da
galeria e outras no jardim.
Esta exposição de Mário Cravo tem, portanto um caráter
também didático, porque nos seus desenhos podem sentir as suas inquietações
plásticas e os tipos de formas idealizados. O desenho é o esqueleto , a idéia
passado para o papel que depois transforma-se em esculturas, ganhando os espaços.
Fiquei sensibilizado com a força expressiva das esculturas
principalmente das feitas em alumínio repuxado, que têm toda uma ligação
orgânica. Parece que os elementos que as compõem estão em movimento, estão
pulsando ou brotando como o botão de uma flor no momento de sua abertura.
Mário é um artista espontâneo, mas disciplinado e metódico
em seu ofício. Não aceita que qualquer artista deve parar a espera de
inspiração, porque como já disse outras vezes, inspiração “é um sal da
história, mas um blefe”. Ele acredita no trabalho sério, disciplinado, onde o
indivíduo vai conseguindo melhorar a técnica de sua obra. Mas, reconhece que é
preciso ter talento e acima de tudo desenvolvê-lo. É neste exercício diário que
Mário vem desenvolvendo o talento que lhe é inato. Suas esculturas, por vezes
monumentais, provocam inquietações e debates. Lembro-me daquela escultura que
implantou na Cidade Baixa, na Praça Cairu, em perfeito contraste com os velhos
casarões da Conceição da Praia e o Elevador Lacerda. Hoje, passados os anos,
parece que a peça está totalmente integrada à própria paisagem. Agora,
discute-se o monumento que idealizou e executou em homenagem ao Dr. Cleriston
Andrade. Sem dúvida, que é um marco na sua vida artística e com o passar do
tempo estará perfeitamente aceito e integrado àquela paisagem. É um princípio
da própria Sociologia, que mudança provoca reação. E, Mário Cravo é acima de
tudo um inovador. Como artista qualificado e criativo que é, ele ousa com suas
formas e também com a utilização de materiais industrializados e sofisticados.
Ousa dominá-los, dando-lhes formas angulosas ou orgânicas e expressividade.
Mário Cravo Júnior nasceu em salvador em 13 de abril de
1923, iniciando seu trabalho por volta da década de 50, e nunca mais parou de
criar, além de ser um grande incentivador de jovens artistas. Fotos de Carlo
Santana.
UMA FOTÓGRAFA E UM PINTOR NO MAB
A exposição que acontecerá a partir do próximo dia 26, às 21
horas, no Museu de Arte Moderna, do artista português João Gripo e da fotógrafa
paulista Améris Paolini reúne trabalhos de técnicas completamente diferentes,
mas existe uma perfeita identidade, nas formas, ou seja, na geometria dos
elementos e principalmente na sensibilidade em captar a plasticidade e na força
da expressão em objetos que passam quase despercebidos pela grande maioria das
pessoas. Alguns vão lembrar que o Mário Cravo Neto já tratou da temática
escolhida ou eleita por Améris. Só que a linguagem foi outra. Um trabalho não
invalida o outro ao contrário, eles são complementares, pois o detalhamento de
Améris vem enriquecer o estudo do fotógrafo baiano. Porém, voltando á exposição
de Grijó-Améris, fiquei gratificado em verificar a identidade de expressão, o
cuidado quase que artesanal dos dois artistas, desde a maneira de trabalhar
como também de apresentar suas respectivas obras.
Grijó tem uma formação acadêmica e uma vivência que lhe
garantem liberdade de ousar. Ele, insatisfeito com espaços e limites das telas,
ousa ultrapassá-las, e quando não consegue, corta-se e as superpõe conseguindo
efeitos geométricos interaesantíssimos. Pode parecer que suas formas são
simplórias, á primeira vista.
Mas, asseguro que é um engano. São formas trabalhadas e
pensadas e que dão resultados surpreendentes.
Já Améris, de posse de sua câmera com lentes macro e uma 85 mm conseguiu detalhar os
tamboretes, as barracas das festas de largo e os cascos de barcos ancorados. No
detalhamento aparecem superposições de tábuas, rendas, palhas e outros
materiais acrescidos com o próprio envelhecimento e o uso. O sol e a chuva
provocam ranhuras, rachaduras, além do próprio homem pintando e repintando os
tamboretes, barracas e barcos a cada ano, criando belas texturas. Assim,
enquanto Améris fotografa, o Grijó transfere parte destes elementos para suas
telas recortadas e superpostas. Aí está justamente a identidade nas formas, nas
superposições e na sensibilidade criadora de ambos.
Outro ponto positivo desta exposição são dois artistas de
fora que trabalharam em cima de nossas coisas, ou seja, é uma mostra plástica que
revela a visão deles de nossa realidade pictórica e plástica.
Estive visitando o casal de artistas em seu apartamento no
bairro da graça. Ao entrar, percebi a presença marcante da criatividade na
maneira de dispor os móveis, na apropriação de objetos, os quais ganharam
especial destaque, não só pela maneira de dispô-los, mas também pela própria
utilidade que lhes foi dedicada.
Lembro, por exemplo, que esteiras de palha são usadas como
cortinas, grandes potes como jarros cheios de folhagens secas e assim por
diante, dando um tom natural a seu apartamento, que fica num alto prédio, na
Rua Manoel Barreto.
Lá assisti à projeção de vários slides da Améris, e pude
sentir de perto a grandiosidade plástica, as superposições, a utilização de
cores destoantes, a presença das cores da bandeira da Bahia, a intensidade das
cores que são usadas nas pinturas de barracas e barcos e o pouco uso do
amarelo. Sim, o pouco uso do amarelo, embora no cartaz que anuncia a exposição
um trabalho impresso tem a cor amarela.Certamente a preferência maior é pelo azul, vermelho e
branco.
Nenhum comentário:
Postar um comentário