CLARIVAL PARTIU DEIXANDO UM
RASTRO
DE CRIATIVIDADE
DE CRIATIVIDADE
O telefone toca e do outro lado da linha um cidadão informa que o mestre Clarival Prado Valladares estava morto. “Ele morreu por volta das 15 horas, no Rio de Janeiro, devido a problemas respiratórios. O seu sepultamento será amanhã, sábado, no Cemitério São João Batista”. Fiquei quase mudo e no esforço maior ainda consegui saber alguns detalhes, inclusive da possibilidade futura de seus restos mortais serem trasladados para Salvador, como era seu desejo.
O velho se foi. É verdade. Mas,
não se foi como um cometa, deixando apenas por algumas horas ou minutos o
rastro de sua cauda luminosa. O velho se foi deixando atrás de si uma obra
monumental feita com garra e muita capacidade. O velho se foi, mas ficou aqui
marcada a sua figura esguia, calma e perspicaz. Um homem moldado para cuidar e
descobrir coisas nobres, grandiosas. Foi neste contato com o monumental da arte
existente neste país que soube trabalhar e acima de tudo redescobrir. Assim, obrigou,
como conseqüência, uma presença maior de órgãos religiosos, privados e próprio
governo a darem uma atenção maior a muitas obras de arte que povoam templos e
outros monumentos históricos.
Não sou de sua geração. Mas tive
a oportunidade de manter vários contatos e conversamos muito sobre o seu
trabalho e, principalmente venho acompanhando sua obra e sentindo sua força
interior. Mesmo doente, continuava trabalhando, ajudado por sua mulher Érica, a
filha Kátia e, até o seu neto Marcos Antônio. Unidos saíam por este país afora
em busca de plasticidade revelando aos brasileiros a riqueza inesgotável das
obras de arte.
“Reunir do acaso aquilo que as
mãos de outrem fizeram em consagração a imagem de Deus”, uma afirmação que
norteou muito o seu trabalho, que em grande parte tem uma ligação muito
profunda, com os sentimentos de religiosidade de nosso povo.
O velho era médico. Aliás, tinha
se formado em medicina, e até especializou-se em patologia. Porém ,
desde 1957 que sua paixão maior não era o estetoscópio que ausculta os
pacientes, e, sim outro “estetoscópio” que ausculta o palpitar das figuras
linhas retas e curvas, e o colorido forte ou tênue das obras de arte. Era um
descobridor ou redescobridor, pois saia a procura de tesouros, que muitas vezes
estava à vista, mas os insensíveis passavam e nunca imaginaram ou dedicaram-lhe
a importância merecida.
Foi assim que aconteceu com o
Castelo da Torre, aqui mesmo na Praia do Forte, tão pertinho de nós, mas que
lhe dedicaram importância maior depois que ele passou a divulgá-lo. Aí algumas
providências forma tomadas evitando que as intempéries do tempo não o
destruíssem totalmente.
Também, esteve freqüentando os
cemitérios, e através um financiamento do Conselho Federal de Cultura, em 1972,
produziu “Arte Cemiterial Brasileira”, onde aparecem destacados importantes
monumentos fúnebres, que passavam despercebidos, por muita gente ligada à arte.
São obras de artistas anônimos, que foram por ele ressaltadas.
Era assim o velho! Gostava de
descobrir coisas, às vezes, tidas como ruínas, esquecidas nos tetos das
igrejas, nas sacristias, ao ar livre e mesmo nos cemitérios. Lugar que só
freqüenta quem acaba de perder um ente querido ou mesmo àquelas pessoas que
guardam consigo saudades de alguém que já morreu há algum tempo.
Agora, o velho repousa no
cemitério, onde buscou inspiração para o seu próprio trabalho. Porém mesmo tem
um desejo ainda por ser cumprido, ou seja, que seus restos mortais sejam
trasladados para Salvador, sua terra natal, e também, seu ponto de partida para
a construção da obra grandiosa, que legou a este país.
Clarival morreu aos 65 anos de
idade. Diplomado pela Faculdade de Medicina da Bahia. EM 1941, mudou-se para o
Rio, ingressando em 1949 no quadro do Hospital dos Servidores do Estado. Em 1952, a convite do reitor
Edgard Santos, voltou a Salvador como assistente do diretor do serviço da
Anatomia Patológica do Hospital das Clínicas. Defendeu tesa de doutoramento
também em 52 e fez curso de pós-graduação na Hrvard University, em Boston. Em 1956,
tornou-se docente de Anatomia Patalógica na Universidade Federal da Bahia.
Mas nessa época já iniciava
atividades de pesquisa em arte que o projetariam como um dos mais prestigiosos
críticos do país. EM 1967, escreveu “Riscadores de Milagres”, pesquisa sobre
desenhistas de ex-votos, e em 1972 conquistou o Prêmio Crítica de Arte com o
livro “Arte e Sociedade nos Cemitérios do Brasil”, editado pelo Conselho
Federal de Cultura de 1970 a
1972 percorreu as cidades históricas de Minas Gerais documentando, através da
fotografia e outras obras de arte de importância. Na Argentina, editou um livro
de pesquisa sobre a arte de Di Cavalcanti que não foi, entretanto, traduzido no
Brasil. No final do ano passado, lançou dois livros nos quais reuniu volumosa
parte de suas pesquisas,
“Nordeste Histórico e Monumental”
e “Os 400 Anos do Mosteiro de São Bento da Bahia”. Era o último filho
sobrevivente do casal Antônio Prado Valladares e D. Clarice Valladares.
CENTO E CINQÜENTA OBRAS DO SÉCULO
XIX
Desde o último dia 10 de maio que
está aberta a visitação pública, no Rio de Janeiro, o mais completo e
abrangente painel da pintura brasileira do século XIX, composto por 150 obras
originais (seguradas em torno de CR$2 bilhões) e cedidas por 21 museus e colecionadores
particulares. É a exposição “História da Pintura Brasileira no Século XIX”,
patrocinada pela Vera Cruz Seguradora S.A. com o apoio da Fundação Roberto
Marinho e do Acervo Galeria de Arte, que até o final do ano será mostrada
também em Brasília, Porto Alegre, Curitiba e São Paulo.
Segundo os historiadores, o
século XIX foi de real importância para a cultura brasileira; daí então o
interesse em promover este evento cultural, no qual está sendo investido,
somente para a mostra do Rio de Janeiro, cifras superiores a CR$100 milhões.
Esses primeiros cem anos da
História do Brasil foram muitos ricos artisticamente, devido a fatos como a transferência
da família real portuguesa, a elevação do país a Reino Unido e depois a sede
provisória da Corte- acontecimentos exaustivamente retratados pelos pintores da
época. Verifica-se também nesse período a progressiva emancipação econômica e a
passagem do sistema escravagista para outro, baseado no trabalho assalariado e
conseqüentemente o aparecimento de uma classe urbana e um comércio aliado aos
grupos industriais que surgiram, e por fim o aparecimento da República.
OS SEGMENTOS
Esta mostra é dividida em cinco
segmentos, cada um representando um período específico, apresentados em cinco
locais diferentes.
No dia 10 de maio foi aberto o primeiro
segmento, denominado “A Pintura Remanescente da Colônia, 1800-1830” , na Casa do Bispo
(Avenida Paulo de Frontim, 568, Rio Comprido).
No mesmo local foi montado o
“Centro Lógico”, mostra que usará recursos audiovisuais, videotapes, displays,
etc, com o objetivo de oferecer ao visitante uma visão abrangendo as
manifestações artísticas ocorridas em todo o século XIX.
O segundo segmento, Intitulado “A
Missão Artística francesa e seus Discípulos, 1816-1840” inaugurado no dia 11 de
maio, no Museu do primeiro Reinado (Avenida Dom Pedro II, 293, São Cristovão),
reunido obras de 11 artistas, dentre os quais Jean Baptiste Debret e Johan
Moritz Rugendas.
O terceiro segmento, “A Pintura
Posterior à Missão Francesa, 1853-1870” ,
aberto no dia 12 de maio, no Museu Histórico Nacional (Praça Marechal Âncora
s/n, Centro-Castelo), com obras de Armand Jullien Palliére e François Auguste
Moreaux.
No dia 13 de maio inaugurou-se o
quarto segmento denominado “A Proteção do Imperador e os Pintores do Segundo
Reinado, 1850-1890”
no Museu Nacional de Belas Artes (Avenida Rio Branco, 189, Cinelândia), com
obras de Victor Meirelles de Lima e Pedro Américo de Figueiredo e Mello dentre
outros.
O quinto e último segmento, “A
República e a Decadência da Disciplina Neoclássica, 1890-1918” , será inaugurado hoje
no Acervo Galeria e Arte (Rua das Palmeiras, 19, Botafogo).
Será lançado também o livro que
inspirou a mostra, “História da Pintura Brasileira no Século XIX” do professor
Guirino Campofiorito. Cada segmento terá ainda catálogos específicos, também de
autoria de Campofiorito, publicado pelas Edições Pinakoteke. A mostra fica no
Rio de Janeiro até 12 de junho. E mais uma vez os baianos ficam de fora e não
verão tão importante exposição.
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