JORNAL A TARDE, SALVADOR, 11 DE JANEIRO DE 1988.
ESPECIALISTAS ESTUDAM COMO VAN GOGH VIVIA
EM CONFLITOS
Chicago (UPI)- Quando os aficionados de arte vêem Os Íris, percebem uma tela a óleo com um brilhante conjunto de flor azul-púrpura: quando os investidores examinam a tela de 71 por93
centímetros vêem 53 milhões 900 mil dólares.Mas
quando os psiquiatras se debruçam sobre as pinceladas nervosas e a composição
agressiva- o sol é fraco e Os Íris cresceram no Manicômio de Saint-Remy-,
vêem um indivíduo com profunda desordem mental.
EM CONFLITOS
A obra Os Íris foi arrematada por US$53,9 milhões, dinheiro suficiente para a compra de três aviões Boeings 747.Suas obras vêm alcançando os mais altos preços nos leilões internacionais. |
Chicago (UPI)- Quando os aficionados de arte vêem Os Íris, percebem uma tela a óleo com um brilhante conjunto de flor azul-púrpura: quando os investidores examinam a tela de 71 por
“Vicent
sempre despertou interesse na comunidade psiquiátrica”, afirmou o Dr. John
Curtis, da Universidade de Dalhouse, em Halifax, Nova Escócia, acrescentando:
“Ele poderia ter sido mais ajudado enquanto vivo”.
Virtualmente
ignorado no seu tempo tanto pelas comunidades de saúde mental quanto das artes,
Van Gogh hoje é uma instituição em ambos os círculos. E se o recorde de preço
alcançado por uma de suas últimas telas sacudiu o meio artístico mundial, a
psique de Van Gogh recentemente foi motivo de outra controvérsia em ter os
psiquiatras.
Em
um encontro de especialistas sobre diversas desordens da personalidade, Curtis
sustentou que Van Gogh sofria de uma profunda divisão de personalidade tanto
que freqüentemente se comportava como duas pessoas diferentes.“Penso
que está claro que ele sofria uma espécie de desordem dissociativa, já que
apresentava todos os sintomas clássicos”, sustentou Curtis.
“Fundamentalmente
óbvio é o fato de que isso não está provado, embora não deixe de ser
intrigante”, comentou o Dr. Bennett Braum, psiquiatra de Chicargo e que
organizou a conferência sobre personalidades divididas.
Curtis
não é o primeiro nem será o último a levantar teorias sobre Van Gogh. Nos 40
anos que se seguiram ao suicídio do pintor, mais de 100 teses acadêmicas foram
publicadas com especulações sobre a sua aflição, com diversos diagnósticos:
equizofrenia, ansiedade, demência, além de outros como a de que o artista era
maníaco depressivo ou sofria de anorexia.
Tal
como psiquiatras que investiram o pintor antes, Curtis baseou seus estudos em
leituras dos cinco volumes de cartas de Van Gogh, incluindo a correspondência
que o artista travou com seu irmão Theo, a irmã Wilhimena, além das observações
do colega Paul Gauguin.
“Essas
cartas documentam com uma clareza nítida os distúrbios mentais de Van Gogh”,
insistiu Curtis.
Van Gogh passou muitas dificuldades na vida.Morto, seus quadros valem milhões de dólares como Os Girassóis que uma empresa japonesa arrematou num leilão em Londres por 39,9 milhões de dólares. |
“Tive
ao todo quatro grandes crises”, escreveu o pintor, “ durante as quais eu não
soube o que eu disse, o que eu queria ou que eu fazia”.
Van
Gogh também descreveu seu sofrimento como “horríveis acessos de ansiedade sem
causa aparente”, o que é outro sintoma de personalidade dissociada.
Sempre,
segundo explicação de Curtis, ao tentar e não conseguir superar eventos
traumáticos ou sentimentos do passado, algumas pessoas desenvolvem memórias
fragmentais (personalidades divididas) como um mecanismo de defesa. Essas
pessoas podem, entretanto permanecer altamente produtivas em conseqüência da
crise, pelo menos por um tempo.
Van
Gogh chegou a escrever especulando que podia ser reduzido à loucura e que
talvez ele “quase” tivesse uma dupla natureza, de pintor e de macaco.
Segundo
hipótese de Curtis, Van Gogh pode ter colocado toda a sua confusão e raiva na
sua personalidade de pintor, criando as imagens vividas que o tornariam
postumamente famoso, embora ao mesmo tempo criasse muitas dificuldades para os
amigos e parentes, que tinham de explicar seu estranho comportamento.
Os Girassóis custou milhares de dólares |
Quando
Van Gogh passou dois meses com Gauguim, no outono de 1888, ele já estava
passando por violentos episódios de que aparentemente não conseguia se lembrar.
Gauguim descreveu a estranha vida com Van Gogh na “Casa Amarela”, em Áries,
França:
“Por
várias noites, surpreendi Vincent que se levantava e vinha em direção a minha
cama” disse Gauguin a um biógrafo. “E toda vez eu apenas tinha que lhe dizer
muito firmemente: “O que está acontecendo, Vicent? “E ele voltava para a sua
cama e dormia pesadamente”.
Os temperamentos de ambos os artistas e as situações triviais de convivência culminaram com um Van Gogh correndo atrás do amigo com uma faca de açougueiro.
Mas
Gauguin relatou que deve ter sido uma grande influência sobre o amigo. “Devo
ter olhado para ele com um olho bem de comando, porque ele parou, baixou a
cabeça e deu meia volta, retornando a casa”.
Na
véspera do Natal de 1888, van Gogh decepou parte de sua própria orelha
esquerda, precipitando a partida de Gauguin bem como motivando o “auto-retrato
com uma bandagem na orelha”.
Em
abril de 1889, o próprio Van Gogh havia se comprometido com o Asilo de
Saint-Remy de Provença, onde permaneceu por um ano e pintou Os Íris e o Jardim do Asilo, entre outras telas que não conseguia vender.
A
saída de Van Gogh em maio de 1890 foi seguida de um curto período de intensa
atividade criativa. Três meses depois, o suicídio.
Curtis
acha que “várias partes” estão faltando para o diagnóstico de Van Gogh, em
especial relativas a possíveis traumas que teriam causado a divisão de sua
personalidade. Segundo o médico, cerca de 90% das desordens dissociativas
decorrem de violentos abusos físicos ou sexuais durante a infância.
Curtia
sugeriu ainda que o próprio nascimento de Van Gogh pode ter sido já o fator
inicial de sua doença.
“Vicent
nasceu em 30 de março de 1853, exatamente um ano depois do dia em que seu
irmão, também chamado Vicent, nasceu e foi enterrado numa propriedade da
família”: lembrou Curtis, concluindo: “Não tenho certeza, mas me parece que
crescer andando e vendo sempre o seu nome e data de nascimento na lápide da
sepultura pode ser traumático”
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