Translate

quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

ESPECIALISTAS ESTUDAM COMO VAN GOGH VIVIA EM CONFLITOS -- 11 DE JANEIRO DE 1988.


JORNAL A TARDE, SALVADOR, 11 DE JANEIRO DE 1988.

ESPECIALISTAS ESTUDAM COMO VAN GOGH VIVIA
 EM CONFLITOS
A obra Os Íris foi arrematada por US$53,9 milhões, dinheiro suficiente para a compra de três aviões Boeings 747.Suas obras vêm alcançando os mais altos preços nos leilões internacionais.

Chicago (UPI)- Quando os aficionados de arte vêem Os Íris, percebem uma tela a óleo com um brilhante conjunto de flor azul-púrpura: quando os investidores examinam a tela de 71 por 93 centímetros vêem 53 milhões 900 mil dólares.Mas quando os psiquiatras se debruçam sobre as pinceladas nervosas e a composição agressiva- o sol é fraco e Os Íris cresceram no Manicômio de Saint-Remy-, vêem um indivíduo com profunda desordem mental.
“Vicent sempre despertou interesse na comunidade psiquiátrica”, afirmou o Dr. John Curtis, da Universidade de Dalhouse, em Halifax, Nova Escócia, acrescentando: “Ele poderia ter sido mais ajudado enquanto vivo”.
Virtualmente ignorado no seu tempo tanto pelas comunidades de saúde mental quanto das artes, Van Gogh hoje é uma instituição em ambos os círculos. E se o recorde de preço alcançado por uma de suas últimas telas sacudiu o meio artístico mundial, a psique de Van Gogh recentemente foi motivo de outra controvérsia em ter os psiquiatras.
Em um encontro de especialistas sobre diversas desordens da personalidade, Curtis sustentou que Van Gogh sofria de uma profunda divisão de personalidade tanto que freqüentemente se comportava como duas pessoas diferentes.“Penso que está claro que ele sofria uma espécie de desordem dissociativa, já que apresentava todos os sintomas clássicos”, sustentou Curtis.
Outros especialistas em equizofrenia, mesmo não abraçando a teoria de Curtis, não a rechaçaram de imediato.
“Fundamentalmente óbvio é o fato de que isso não está provado, embora não deixe de ser intrigante”, comentou o Dr. Bennett Braum, psiquiatra de Chicargo e que organizou a conferência sobre personalidades divididas.
Curtis não é o primeiro nem será o último a levantar teorias sobre Van Gogh. Nos 40 anos que se seguiram ao suicídio do pintor, mais de 100 teses acadêmicas foram publicadas com especulações sobre a sua aflição, com diversos diagnósticos: equizofrenia, ansiedade, demência, além de outros como a de que o artista era maníaco depressivo ou sofria de anorexia.
Tal como psiquiatras que investiram o pintor antes, Curtis baseou seus estudos em leituras dos cinco volumes de cartas de Van Gogh, incluindo a correspondência que o artista travou com seu irmão Theo, a irmã Wilhimena, além das observações do colega Paul Gauguin.
“Essas cartas documentam com uma clareza nítida os distúrbios mentais de Van Gogh”, insistiu Curtis.
Van Gogh passou muitas dificuldades
na vida.Morto, seus quadros valem
milhões de dólares como Os Girassóis
que uma empresa japonesa arrematou
num leilão em Londres por 39,9
milhões de dólares.
Artista temperamental que passou a maior parte de seus dois últimos anos de vida internado, Van Gogh próprio suspeitava de que alguma coisa estava errada.
“Tive ao todo quatro grandes crises”, escreveu o pintor, “ durante as quais eu não soube o que eu disse, o que eu queria ou que eu fazia”.
Van Gogh também descreveu seu sofrimento como “horríveis acessos de ansiedade sem causa aparente”, o que é outro sintoma de personalidade dissociada.
Sempre, segundo explicação de Curtis, ao tentar e não conseguir superar eventos traumáticos ou sentimentos do passado, algumas pessoas desenvolvem memórias fragmentais (personalidades divididas) como um mecanismo de defesa. Essas pessoas podem, entretanto permanecer altamente produtivas em conseqüência da crise, pelo menos por um tempo.
Van Gogh chegou a escrever especulando que podia ser reduzido à loucura e que talvez ele “quase” tivesse uma dupla natureza, de pintor e de macaco.
Segundo hipótese de Curtis, Van Gogh pode ter colocado toda a sua confusão e raiva na sua personalidade de pintor, criando as imagens vividas que o tornariam postumamente famoso, embora ao mesmo tempo criasse muitas dificuldades para os amigos e parentes, que tinham de explicar seu estranho comportamento.
 Os Girassóis  custou milhares de dólares
“Parece que havia duas pessoas”, escreveu seu irmão: “uma era maravilhosamente dotada, suave e refinada. A outra, egoísta com um coração cheio de ódio: essas pessoas se apresentavam uma de cada vez, de modo que alguém o ouvia falar de um jeito depois de outro, mas sempre com muitos argumentos”.
Quando Van Gogh passou dois meses com Gauguim, no outono de 1888, ele já estava passando por violentos episódios de que aparentemente não conseguia se lembrar. Gauguim descreveu a estranha vida com Van Gogh na “Casa Amarela”, em Áries, França:
“Por várias noites, surpreendi Vincent que se levantava e vinha em direção a minha cama” disse Gauguin a um biógrafo. “E toda vez eu apenas tinha que lhe dizer muito firmemente: “O que está acontecendo, Vicent? “E ele voltava para a sua cama e dormia pesadamente”.

Os temperamentos de ambos os artistas e as situações triviais de convivência culminaram com um Van Gogh correndo atrás do amigo com uma faca de açougueiro.
Mas Gauguin relatou que deve ter sido uma grande influência sobre o amigo. “Devo ter olhado para ele com um olho bem de comando, porque ele parou, baixou a cabeça e deu meia volta, retornando a casa”.
Na véspera do Natal de 1888, van Gogh decepou parte de sua própria orelha esquerda, precipitando a partida de Gauguin bem como motivando o “auto-retrato com uma bandagem na orelha”.
Em abril de 1889, o próprio Van Gogh havia se comprometido com o Asilo de Saint-Remy de Provença, onde permaneceu por um ano e pintou Os Íris e o Jardim do Asilo, entre outras telas que não conseguia vender.
A saída de Van Gogh em maio de 1890 foi seguida de um curto período de intensa atividade criativa. Três meses depois, o suicídio.
Curtis acha que “várias partes” estão faltando para o diagnóstico de Van Gogh, em especial relativas a possíveis traumas que teriam causado a divisão de sua personalidade. Segundo o médico, cerca de 90% das desordens dissociativas decorrem de violentos abusos físicos ou sexuais durante a infância.
Curtia sugeriu ainda que o próprio nascimento de Van Gogh pode ter sido já o fator inicial de sua doença.
“Vicent nasceu em 30 de março de 1853, exatamente um ano depois do dia em que seu irmão, também chamado Vicent, nasceu e foi enterrado numa propriedade da família”: lembrou Curtis, concluindo: “Não tenho certeza, mas me parece que crescer andando e vendo sempre o seu nome e data de nascimento na lápide da sepultura pode ser traumático”

Nenhum comentário:

Postar um comentário