JORNAL A TARDE, SALVADOR, SÁBADO, 03 DE MAIO
DE 1975
O mar exerce uma grande
influência na pintura do sergipano-baiano Leonardo Alencar. Assim ele vai
criando seus pescadores, peixes e barcos de seu atelier, cuja janela
descortina a praia de Amaralina. É o
casamento entre o criador e a temática que diariamente estão em perfeito
contato.
Agora ele está trabalhando para
sua próxima exposição que será realizada
no corrente mês, na Galeria Cañizares, onde mostrará 48 gravuras inéditas com a
temática pescadores e todas realizadas no seu segundo atelier que fica na praia
do Jauá.
Ele explica o seu fascínio pelo
mar dizendo que 'sempre fui muito motivado pela presença do mar e do homem do
mar. Hoje, por exemplo, vejo com tristeza duas poderosas máquinas destruindo ou
aniquilando o mar e o pescador. A primeira delas é a indústria, a tecnologia
que lança diariamente toneladas de detritos os mais diversos, e, a segunda é o
turismo, que traz como consequência a quebra da ingenuidade, do calor e aconchego
humano da gente simples humano da gente simples que é o pescador."
E continua "sua vida está cada vez mais
difícil porque os peixes estão cada vez mais longe da beira da praia, devido a poluição e o barulho das cidades. Assim, sua vida, além de mais difícil, corre
maior risco porque são obrigados e velejar por várias milhas em busca do
sustento."
Seu trabalho artístico sempre foi
calculado numa realidade brasileira e Leonardo Alencar participou ativamente do
movimento artístico há poucos anos atrás.
Hoje, muita gente pensa assim,
ele diz: "Quando se fala em particular da vida artística baiana, lembro-me que
existia uma disputa muito séria entre os chamados pintores acadêmicos e os
jovens. Acontece que eu era jovem pintor e tive uma participação ativa nos mais
variados setores em busca de uma oportunidade para arte que fazíamos naquela
época. Assim organizamos seminários, palestras, debates, íamos aos jornais para
divulgar nosso trabalho. Hoje, vejo que não exerço uma participação tão intensa
porque realizo o meu trabalho no atelier e faço minhas exposições."
Mas isto não significa que tenha
me ausentado de um compromisso, ou mesmo que não devo participar do movimento
artístico baiano. Devo dizer que tenho um imenso respeito pelos pintores jovens
e constantemente procuro discutir tudo aquilo que é novidade. O que não aceito
é a presença de grande número de pintores que erradamente são chamados de
primitivos. Sim, erradamente porque muitos deles são primários e não
primitivos. Considero primitivos autênticos e representantes de uma cultura
popular os riscados de ex-votos, os que fazem as tabuletas de circos mambembes,
os quais não receberam ainda influência dos apelos visuais do mundo moderno.
Basta dizer que normalmente
recebemos centenas de apelos visuais e fora outras circunstâncias que envolvem
o homem. Ora, um indivíduo que mora em Salvador já sofre grande influência de algo
que assiste a televisão, vai ao cinema, lê jornais e revistas, vive numa cidade
urbana, não pode ser um autêntico primitivo. Certamente os seus valores e
costumes já sofreram grande alteração, daí não aceitar esta confusão
estabelecida entre o primário e o primitivo.
Diz ainda Leonardo Alencar que
também está um pouco ausente da vida artista baiana, porque durante três dias
na semana está viajando para Aracaju, atendendo a um chamado da Universidade
Federal de Sergipe, onde ministra um curso de Desenho. É um trabalho diz
Leonardo Alencar muito importante porque estou levando para aquele Estado
técnicas que muitos não conheciam.
Hoje estamos com um grupo que
trabalha em continuidade, uma espécie de laboratório onde fazemos pesquisas e
estudos.
Leonardo Alencar ministrou por
três meses um curso de xilogravura e atualmente ensina desenho e pintura, em
regime de atelier livre. Considera este seu trabalho semelhante aquele feito
pelo gravador Hansen-Bahia há uns 15 anos atrás. E conclui. Acredito que a
participação do artista não pode ser medida com fronteiras pois ela tem que ser
globalizada. É por isto que estou ainda participando.
DIFÍCIL
O artista Leonardo Alencar também
está fazendo uma série de trabalhos tendo o cavalo como temática.
Ele acha que a forma do cavalo é
uma das mais difíceis de ser executada em termos plásticos. Além do mais, é
preciso ver que os animais que retrato transmitem tudo aquilo que penso e vejo
na vida, A propósito, estou preparando um álbum onde aparecerão os cavalos mais
importantes entre os quais: Silver, do Zorro, de Napoleão, Átila e outros. O
cavalo sempre teve participação muito importante para humanidade, como meio de
transporte em tempos de paz ou na guerra. Até na Alquimia, o cavalo está
presente e veio a figura do cavalo selvagem aquele que melhor representa uma
artista criador.
O cavalo selvagem, sou eu e todos
aqueles que tem força de criar.
Quanto aos peixes, estou trabalhando
numa série de 25 trabalhos a óleo. Acho que é a forma plástica mais fácil,
porém de grande conotação simbólica. Mas creio a relação plano objeto na figura
do peixe é muito difícil e exige uma participação criadora muito forte. Aí o
artista tem de dar tudo de si para uma boa composição plástica.
Falando sobre a arte
contemporânea, Leonardo Alencar acredita que dentro de poucos anos retornar ao
cavalete. Esta volta não diz nada de regressão e sim uma maneira de
humanização. Como membro do Instituto de Arte Contemporânea, de Londres,
Leonardo afirma que o Instituto está obrigando a seus integrantes a trabalhar
com o cavalete. Porque do contrário ficamos naquele momento em que se fundem o
artista e o projetista industrial.
Assim aparecem os múltiplos e a
natureza é desprezada pelo artista. Aparecem os múltiplos e o artista esquece a
realidade social em que vive. É certo que a arte contemporânea, a arte cinética
ou qualquer nome que dermos não perde a sua importância e o sentido de pesquisa.
O que afirmo é ela chegará a um ponto de saturação e haverá o retorno à
natureza. Ela deve ser estudada e pesquisada mais não reflete nossa realidade
brasileira. Assim a arte industrializada terá de recorrer á arte de cavalete
como forma de abrir os seus caminhos para a humanização.
A arte é um processo de
sedimentação. Não devem existir fórmulas. Ela traz segundo alguns teóricos um
sentido de complexo de Édipo, de volta as origens.
No entanto o artista plástico
precisa conhecer tudo que está sendo feito no campo das artes plásticas. Deve
desenhar e pintar muito mais também ler para ter informações. É por isto que
olho com muito carinho a arte contemporânea, os jovens artista. Procuro também
fazer um trabalho onde os meus desenhos representem uma continuidade do meu eu.
É uma extensão espontânea da minha própria personalidade, pois somente assim
surge a individualidade e a criação no trabalho de arte.
Seu temperamento inquieto
resultava em certos problemas familiares. Mas o que o menino Leonardo queria era
pintar. Assim partiu para uma cidade no interior de Alagoas, á beira do São
Francisco onde foi trabalhar com um mestre de obras pintando paredes de uma
igreja. Teve um professor de desenho Valter Barros, que foi o responsável por
uma verdadeira revolução da arquitetura no Nordeste. Este professor morreu
jovem mais não desanimou Leonardo. Ele aprendera com o mestre de obras Olívio
Martins e respeitar o seu material de trabalho, lavando os grandes pincéis,
lavando os grandes pincéis a tinta. Mas sua família continuava irredutível. Uma
família de juristas que tinha um filho com grande facilidade para aprender
línguas não entendia porque ele insistiria em ser pintor. Queriam transformá-lo
num diplomata ou talvez num professor de línguas; nunca um artista. Mas
Leonardo não desistiu e passou a exercer outras atividades paralelas como
locutor de rádio, rádio-ator, produtor, adaptador de novelas, chegando a
aterrorizar o Estado com um trabalho de adaptação que fez.
Mesmo assim, o dinheiro que
conseguia ganhar em grande parte era aplicado na arte.
Em 1957 começou a ter suas
primeiras experiências com a cenografia. Houve um concurso de Teatro Amador em
Sergipe e teve a oportunidade de conhecer Pascoal Carlos Magno. Fazendo
cenografia, viajou por alguns Estados e conheceu a Bahia.
Ficou encantado com nossas praias
e com o cheiro do mar e o azul do céu de Salvador. sabia que ia voltar.
Acontece que em 1960 foi
apresentado por seu tio Emílio Fontes a Vasconcelos Maia, então Diretor de
Turismo. Assim realizou sua primeira exposição no Belvedere da Sé, Depois
passou dois anos como bolsista da Biblioteca Pública, que era dirigida por
Péricles Diniz, grande incentivador das artes na Bahia. Nesta mesma época, foi
ao Rio de Janeiro onde realizou uma individual na Biblioteca Nacional. Quando
terminou a bolsa no atelier de Mário Cravo e Jenner Augusto muito lhe ajudou.
Assim, a pintura de Leonardo
Alencar pode ser dividida, do ponto de vista técnico, em duas partes: antes
conhecer inclusive, técnicas de mistura de tintas, melhoria do desenho etc. Já
do ponto de vista de motivação não houve qualquer mudança, apenas ele captou as
cores da cidade mágica que é Salvador.
É por isto que ele chega a ver
com certo pessimismo o que estamos assistindo passivamente: o processo de
desumanização de Salvador.
Quanto ao movimento artístico
baiano, ele considera excesso de gestação. Estamos vivendo um
hiato que vai definir os artistas da nossa geração como: José
Maria, Calasans, Sante, Emanoel e outros. O mercado é o suporte de um movimento
artístico e no momento ele quase não existe, é insignificante. Além de achar
que nós estaremos no clímax do processo criador daqui a alguns anos.
O SURREALISMO DE ANITA BUCHERER
A pintora e desenhista alemã Anita Bucherer
inaugurou no último dia 29 uma a sua primeira exposição individual no MAM no
Rio de Janeiro de temática surrealista-fantástica .Ela apresenta 36
desenhos. É um trabalho de atualização das fábulas e lendas de seus país, onde a
artista adota uma linguagem plástica muito semelhantes as liberdades morfológicas de um Breughel. Ela nasceu evidente junto de um Bosch, em Bonn. Estudou na
Escola Paulo Colin, em Paris; na Escola de Belas Artes ,de Berlim e, no atelier de W. G. Haiter, em Paris. Como
ilustradora, trabalha em importantes
jornais americanos como o New York Times, o Chicago Sunday Tribune. Já realizou
12 exposições individuais em vários países.
ABELARDO ZALUAR CONVICTO
"Nunca tive nenhuma dúvida sobre a
profissão a seguir: desde que me entendo por gente, quis ser pintor."
Assim se expressou em 1972 o
pintor Abelardo Zaluar que está realizando uma retrospectiva no MAM. De seu
pai herdou os instrumentos de trabalho, os compassos de precisão que usava para
fazer as grandes superfícies coloridas de seus mapas.
Desde cedo conciliou sua
atividades de artista e professor. Realizou sua primeira exposição de aquarelas
em 1947, seguindo-se com bastante
regularidade outras exposições e hoje
com 50 anos, dos quais 30 dedicados a arte Zaluar é um artista realizado.
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