JORNAL A TARDE, SALVADOR, SÁBADO, 31 DE MAIO
DE 1975
Detalhe do trabalho que será levado à Bienal paulista |
Como podemos observar, é um
trabalho de um grupo integrado porque os membros de Etsedrom deixam de lado sua
individualidade para trabalhar em comum.A propósito, o gravador Edison da Luz
afirma que "não posso trabalhar sozinho porque se a arte é voltada para o
coletivo ela deve ser feita por várias pessoas. Além disto, procuramos
valorizar o nosso material, porque não tem sentido um artista baiano trabalhar
com materiais sofisticados, só encontrados em países super-desenvolvidos." Exemplifica afirmando que " na Bienal passada levamos um trabalho feito de cipós.
Este ano também mostraremos um trabalho feito com cordéis e couros."
Quanto às dificuldades que
encontra na falta de alguns artistas Edison da Luz explica que a Bahia já foi
considerada o berço da cultura e hoje é o anti-berço da cultura. O baiano de
modo geral é muito pretensioso e não temos salões e galerias à altura de uma
exposição de trabalho sério. O que temos são pequenas salas chamadas de
galerias, que ainda por cima não procuram valorizar os artistas. Visam apenas a
parte comercial e muitas obrigam o artista a colocar o seu quadro debaixo do
braço e procurar uma pauta para exposição. Basta dizer que também muitos
artistas são culpados porque não contribuem para melhorar a mentalidade dessa
gente. Imagine que ainda estamos numa terra onde pessoas ficam admirando ou
retratando o mar, alagados e outros motivos. O que interessa é interpretar estes
motivos, e posso assegurar que pouca gente faz isto na Bahia. A nossa arte
ainda é primitiva pelos nossos valores culturais e isto é um reflexo da falta
de história do povo brasileiro, o que não permite ao artista fazer uma
transposição. O negro, por exemplo, continua ainda escravo e o candomblé, sua
religião, continua sendo desvirtuada.
Diz ainda Edison da Luz que tenho
consciência de que a arte não tem fronteiras.Tudo é a mesma coisa. Mas o
artista brasileiro precisa conhecer seu país para sentir e observar os motivos
que estão por aí
Dentro da cultura indígena, por
exemplo, está a meu ver a tradução da verdadeira arte brasileira e isto podemos
constatar nos seus trabalhos artesanais."
TENDÊNCIA DA ARTE
O escultor Edison da Luz mostra-se
pessimista com a arte brasileira que se não tomar um novo rumo não escapará da
decadência. Enquanto o artista brasileiro colocar a arte como simples processo
de sobrevivência ela tenderá a ser decadente. Acredito que a arte é imaginação,
criação e não vive de rótulos. Não é um simples trabalho como de um médico ou
de um comerciante.
E continua: outra coisa que tenho
observado é uma preocupação em se fazer arte erótica agredindo a todos. Isto é
uma necessidade de valorização de pseudos artistas, os quais devem deixar o
sexo para as ocasiões propícias. Arte é uma coisa muito diferente.
Quanto ao casario tão utilizado
por artistas baianos, Edison da Luz qualifica como sendo o câncer da arte
brasileira. No casario, o artista emprega o mínimo de imaginação e consegue
vender a colecionadores que no fim traduzem uma mentalidade estreita. Quando
não é um turista ávido por uma lembrança da Bahia. Ele vai à galeria, compra o
casario e chega ao hotel, embala o seu quadrinho que será mostrado a seus
familiares e amigos quando retornar a seu País ou Estado de origem como sendo
um troféu, que conquistou num safári na África.
TRABALHO SÉRIO
" Daí o nosso trabalho se propõe a
interpretar os motivos que escolhemos com uma participação de sociólogos,
arquitetos, poetas, artistas plásticos, ginastas, dançarinos etc. Tudo é
fundamentado no realismo social, tendo o homem no centro. O nosso grupo é
aberto a todos aqueles que se propõem a fazer um trabalho sério. Sei que
estamos trabalhando para o futuro e que é mais fácil fazer um casario e vender
imediatamente. E, todas às vezes que converso com uma pessoa que quer trabalhar
conosco mostro exatamente estes dois caminhos. Infelizmente muitos optam por
fazer um quadrinho e vender", adianta Edison da Luz.
E continua "O nosso trabalho é de criação
contínua e mesmo dentro do salão da Bienal estamos criando. O trabalho do
artista difere do trabalho do artesão. O primeiro, deve interpretar
continuamente os motivos dando sua parcela de criação. Já o segundo, fica na
repetição. O artesão que faz uma xícara morre fazendo xícara, e isto nunca deve
acontecer com o verdadeiro artista. É por isto que até agora só fiz duas
exposições na Bahia, porque ainda estou trabalhando naquela fase que mostrei há
poucos anos. Daí não saber quando farei outra exposição porque ela só será
feita quando tiver alguma coisa nova para mostrar. Isto não ocorre com outras
pessoas que vivem eternamente fazendo explicações, uma atrás da outra, sem
mostrar nada de novo."
Diz Edison da Luz que tem consciência
que o tipo da arte que Etsedron está fazendo não dá para ganhar dinheiro. Mas
vê a sua obra com grandes perspectivas para o futuro. Sei do pioneirismo e isto
certamente nos proporcionará no futuro alguns privilégios. Temos, inclusive,
uma ideia arrojada que é a criação de um centro de arte na Bahia, o qual não
deve ser dirigido por artista. Artista nasceu para criar e não deve misturar-se
com burocracia ou administração. Este centro deverá ser dirigido por pessoas
que gostam das artes. Creio que as confusões que observamos nas bienais e
salões já realizados na Bahia originaram-se porque forma dirigidos por
artistas.
Certamente o trabalho que será
apresentado pelo Grupo Etsedron vai agradar e representará bem a Bahia, a
exemplo da Bienal Nacional -74, cuja obra foi
considerada a mais explosiva. A palavra Etsedron, que significa Nordeste,
lido de trás para a frente, tem um sentido mais especial pois está
revolucionando o conceito de arte brasileira, não se limitando às técnicas
convencionais e menos ainda ao tipo clássico do artista.
COPERARTE, UM SUCESSO
Foi aberta na última terça-feira
a Feira de Gravuras promovida pelos integrantes da Coperarte, no Instituto
Goethe. Uma feira perfeita, aberta sem qualquer discriminação a nível da fama
maior ou menor e mesmo da qualidade do trabalho. Assim, encontramos trabalhos
do artista Juarez Paraíso e de outros ainda iniciantes ou completamente
desconhecidos do público.
A título de ilustração vemosduas gravuras aíso |
A maioria dos integrantes da
Coperarte são alunos da Escola de Belas Artes e outros ligados ao movimento. O
que interessa a eles é mostrar o seu trabalho que agora está sendo difundido
através desta primeira feira de arte. Espero que outras feiras sejam realizadas
e que o público baiano, o homem de classe média, o profissional liberal que não
dispõe de milhões para dar por um quadro de um artista famoso, tenha outras
oportunidades de adquirir um trabalho de um jovem artista, que dentro em breve
terá seu lugar no palco da fama.
Ao meu ver, faltou nos artistas
um maior cuidado na divulgação da feira e talvez a escolha de um local mais
aberto ao público, como por exemplo, o Jardim da Piedade, onde certamente seus
trabalhos seriam ainda mais disputados.
NICK SUERDICK
O artista Nick Suerdick vai expor
alguns quadros de 10 a
25 de junho no Instituto Goethe, na Vitória. Já participou de algumas
coletivas, sendo esta a primeira vez que coloca seus quadros à venda.
Serão mostrados apenas trabalhos
a óleo, embora Nick
faça estamparia, serigrafia e tapeçaria. É sempre bom ver o que os novos estão
produzindo. Vamos aguardar a sua exposição.
PRÊMIOS
Os melhores do ano em 1974
receberam prêmios dos críticos paulistas em vários setores. No setor das Artes
Visuais foram premiados: Grande Prêmio da Critica, a Walter Levy; Personalidade
do Ano, ao Professor Walter Zanini; Pintor, foi Tomie Ohtake; Desenhista,
Juarez Magno; Escultor, Nicolas Vlavianos; Tapeçaria, Burle Marx; Jóia, Kjeld
Boesen; Fotografia, Leonid Strelav e Artes Gráficas, Emile Chamie.
Já o Júri do 24.º Salão Nacional
de Arte Moderna premiou os artistas: Siron Franco, (pintura) com uma Viagem ao Estrangeiro; Inácio Rodrigues (pintura), com Viagem ao País; Wilma Martins
(desenho), Viagem ao Estrangeiro e José Lima (gravura) Viagem ao País.
COPISMO
O Professor Clarival do Prado
Valadares, membro do Conselho Federal de Cultura, acusou os dirigentes de
museus no Brasil de enaltecerem a arte estrangeira, esquecendo-se da arte
nacional.
Disse ainda que ha incentivos ao
artista brasileiro, mas falta qualidade em suas obras. Assim, estamos ainda
vivendo a predominância da imposição do copismo de modelos estrangeiros.
CORRE-CORRE
Os organizadores da Bienal de São
Paulo resolveram preencher a lacuna da fraca representação brasileira da mostra
de outubro próximo, abrindo inscrições para artistas com propostas de
vanguarda, que serão julgados por dois júris, sendo um secreto. Acreditamos que
os trabalhos selecionados sejam mostrados lado a lado, com os selecionados na
pré-Bienal do ano passado. O recurso de última hora não está agradando a muita
gente, embora possa representar uma tábua de salvação para melhorar o nível da
representação brasileira.
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