JORNAL A TARDE,SALVADOR,
SEGUNDA-FEIRA 19 DE JUNHO DE 1989.
GRAVURA BAIANA PRECISA RETOMAR A
SUA PRODUÇÃO
Já
era tempo de mudança. Finalmente as oficinas que vinham funcionando no Solar do
Unhão vão receber uma dose de incentivo. Sempre vi o trabalho das oficinas como
de grande importância para o movimento de arte da Bahia e aplaudi a iniciativa
dos seus fundadores. Porém as oficinas caíram na mesmice e não prosperavam, não
procuravam inovar, trazendo á Bahia artistas de outros estados para que os
alunos pudessem tomar conhecimento de novas informações e habilidades.
Não
estou aqui discutindo o talento dos artistas, que lá ensinaram Todos são de
reconhecido valor. O que questiono é exatamente a necessidade, inclusive para
os seus professores das oficinas que aqui aportassem artistas conceituados de
outros lugares, porque entendia ser muito importante a troca de informações.
Agora
parece que esta idéia que sempre tive com relação ás oficinas, vai ser
concretizada. Os cursos foram suspensos pelo Departamento de Artes Plásticas,
da Secretaria da Cultura, e o barracão onde funcionam as oficinas foi
reformado. A produção do filme Orquídea Negra patrocinou a reforma de alguns
equipamentos e a Secretaria de Cultura as obras do prédio.
O
programa antigo vai continuar, na parte da manhã, e, à tarde, um
professor-artista de preferência de fora, vai repassar suas experiências para
os baianos. O primeiro convidado é Sérvulo Esmeraldo, um gravador e escultor
cearense de gabarito. Com muitos anos de profícuo trabalho ele vai mostrar aqui
a sua arte numa exposição, e, ao mesmo tempo, contribuíra para o
desenvolvimento da gravura baiana. Sabemos que a Bahia já foi um grande centro
produtor de gravuras, e diga-se de passagem, gravuras de qualidade. Hansen
Bahia, Edson da Luz, Juarez Paraíso, Calasans Neto e muitos outros contribuíram
para que ostentássemos um lugar de destaque na gravura nacional.
Alguns
quase deixariam de fazer gravuras, outros morreram e a produção caiu Hoje, a
gravura baiana tem pouca produção e qualidade duvidosa. Será, portanto, uma
oportunidade da retomada da gravura baiana.
Uma
notícia me deixa mais tranqüilo. O dinheiro arrecadado com o aluguel do
restaurante do Solar do Unhão está sendo repassado para o Departamento de Artes
Plásticas e, assim, será possível manter este programa, juntando algum recurso
do orçamento da própria Secretaria da Cultura.
Por
outro lado, informa Zivé Giudice, do Departamento de Artes Plásticas que serão
redimensionados os espaços das oficinas de escultura e cerâmica as quais terão
lugares próprios, evitando que fiquem misturadas com a de gravura em papel. Esta terá uma
atividade bem maior, nesta nova fase das oficinas. Concordo com a colocação de
cada oficina num determinado espaço desde que integradas, e vamos agora
aguardar o cumprimento das promessas. Estaremos daqui de plantão para aplaudir
as boas iniciativas e exigir o benefício do próprio artista e da cultura dos
baianos. Também
os artistas daqui, mesmo os profissionais, poderão utilizar o espaço, e vamos
torcer para que a gravura baiana retome o seu lugar no cenário artístico
nacional. Já era tempo.
ZAU
SEABRA QUESTIONA A ESSÊNCIA DA MODERNIDADE
Nesta tela intitulada Sublimação, Zau Seabra mostra e questiona o consumismo desenfreado |
Uma
guerra civil não declarada e quase sempre quando a Polícia bate num barraco lá
encontra fatalmente os aparelhos eletrônicos e outros bens de consumo da
sociedade moderna, os quais foram roubados de alguém que os comprara. Muitos
ficam neuróticos, incapazes de entender as dificuldades que lhes são postas á
frente.
A
ânsia pela liberdade varre o mundo. Na China 1.400 jovens foram tragicamente
massacrados pelas armas automáticas e os possantes tanques. Na Rússia, várias
minorias étnicas lutam por liberdade e Gorbachev acena com a possibilidade de
derrubar o vergonhoso muro de Berlim. Na Argentina, a hiperinflação se
encarrega de espalhar a miséria e alertar nós brasileiros de que também podemos
sofrer deste mal. É exatamente este universo de contradições e de incertezas
que Zau Seabra, uma aluna da Escola de Belas Artes faz o seu discurso pictórico
intitulado.
Nóias
Urbanas, onde mostra a modernização do universo urbano e suas conseqüências
positivas ou negativas em contraponto com os sonhos de liberdades, facilidades
desenvolvimento tencológico onde o medo do presente do futuro se encontram.
Seu
trabalho é calcado nesse mundo e tem forte conteúdo social tendo o ser humano
como centro de tudo. Ela já participou de algumas coletivas e expôs no Salão
Universitário de Artes Visuais promovido pela Universidade Federal da Bahia,
sob a coordenação do professor Ivo Vellame. Evidente que ainda jovem, dando seus
primeiros passos no mercado de arte, Zau
Seabra tem muito que aprender com relação á técnica e sua relação com outros
materiais. Pelo menos ela já demonstra uma disposição e alguma informação sobre
o mundo que lhe cerca. Não é uma simples pessoa que tem alguma habilidade.
Considero
que a informação é o elemento primeiro para o início de um trabalho pictórico
consciente e questiona dor da realidade. Aí sim, está o toque inovador e o
papel do artista de estar sempre na frente. Zau Seabra está expondo na Galeria
do Aluno.
MARIA
ADAIR EXPÕE SUAS TRAMAS EM CONQUISTA
Maria Adair convida: Sente-se na Trama |
Nascida
em Itiruçu, no interior da Bahia, certamente, as tão decantadas raízes tenham
contribuído para esta volta, com toda força de sua pintura, que antes de tudo
demonstra uma potencialidade de ação muito grande. São linhas que se cruzam ora
mostrando tensões contidas, ora a vontade de sair, por aí sem destino, como os
milhares de jovens que colocaram uma mochila nas costas e perambularam por este
mundo afora até retornarem ás casas dos pais...
A
artista consegue nos levar a percorrer aqueles caminhos quase superpostos em
busca de novas emoções.
Qualquer
objeto serve para a sua busca incessante. Uma cadeira, uma gamela, enfim, o que
estiver ao seu redor pode servir de suporte para a explosão de sua força
criativa. Esta abstração da realidade que está presente na obra de Maria Adair
nos distancia de uma representação objetiva, mas também nos envolve em tramas
de cores fortes e emocionantes. A energia transmitida pelas linhas que se
entrecruzam e a luminosidade do cromatismo nos levam a momentos de prazer,
quando nem pensamos, já estamos navegando por um mundo cheio de fantasias e
subjetividades. Verdadeiros sonhos, onde muitas vezes procuramos o princípio
das linhas e encontramos outra saída e tudo volta ao princípio. Uma trama
perfeita rica em sensibilidade e energia.
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