SETENTA E TRÊS OBRAS DE ERNST BARLACH NA CAÑIZARES
Este Corpo ao Bom Espírito, xilogravura de 1927, de autoria de Ernst Barlach, mostra sua dramaticidade. |
Antes
de 1900 esteve duas vezes em Paris, mas foi em 1906, quando fez uma viagem pela
Rússia, que pôde experimentar a emoção da auto-afirmação artística, se
dispondo, inclusive, a abandonar “sem remorsos, tudo que tinha realizado antes
dos 35 anos”.
Ernst
Barlach nasceu em 2 de janeiro de 1870, em Wedel, uma pequena cidade às margens
do Baixo Elbe. É 30 anos mais jovem que Rodin, nove mais novo que Maillol e tem
11 anos a mais que Lehmbruck. Dezessete anos o separam de Van Gogh e sete anos
de Munch.
Ele
defendia que não há necessidade de pressa. “Aqui no norte a natureza não é
precipitada”. Essa natureza nórdica, com sua severidade e amplitude, foi o que
determinou a maneira de ser deste grande artista e sua própria arte. Retraído e
solitário, no entanto sem uma concentração obsessiva na sua própria pessoa,
porque sempre procurou fora encontrar bons resultados para desenvolver os seus
temas e formas.
Sua
presença em Paris não foi boa para o artista. Doente e passando fome com certa
freqüência, ele não teve acesso aos outros artistas, passando todo o tempo
refugiado no Museu do Louvre, onde mantinha uma paixão desenfreada pelos
egípcios.
Foto de Ernst Barlach |
Em
1909, esteve na Villa Romana, em Florença, e estava com 40 anos de idade.
Marcado pela paisagem e pela gente russa, confessou naquela época, que “a
Itália me teria arrasado se eu tivesse sido pintor”. Mas, para suas gravuras em
preto e branco, a cor era coisa supérflua.
No
ano seguinte, se instala em Gustrow onde acontece a sua evolução e se inicia
uma obra que é contemplada e aplaudida com o passar dos anos. Ele trabalha
segundo um plano que obedece à ordem das estações do ano e às horas de um dia,
onde previu as horas de luz, para os trabalhos de escultura, e as do anoitecer
e da noite, para os trabalhos gráficos e literários. Suas obras esculpidas são
baseadas em esboços previamente desenhados, que delineiam o tema e a figuração
fixados no papel, no momento da primeira inspiração. Costumava guardar seus
esboços até a hora da realização final.
“Com respeito à pedra, ele não tinha relação especial nenhuma. Seria abusar, querer ilustrar aqui toda a evolução de Barlach. Ninguém melhor que Käthe Kollwitz soube, de modo evidente, caracterizar esse desenvolvimento como sendo um todo: “Se eu me pergunto em que consiste a forte impressão que as obras de Barlach desde sempre exerceram sobre mim, acredito que seja aquilo que ele próprio uma vez formulou assim: É por fora como o é por dentro”. O seu trabalho consiste por fora como por dentro; a forma e o conteúdo são perfeitamente congruentes. Em parte alguma há disparidade, nada é supérfluo. Tudo que ele expunha de si, digamos, “o aspecto exterior, o interior, o gesto da devoção e o gesto da ira”, era em si conforme. A forma e o conteúdo se ajustaram. Isto é o convincente de sua obra. È preciso chamar a tenção ao fato que Barlach, fora raras exceções, nunca tem presentado o corpo nu, pois este não se tornou parábola de sua arte. O nu, com suas articulações e funções, não lhe é lícito; ele não reconhece estas tradições das artes plásticas. O seu assunto é o gesto e o gesto extremo”, a intensidade da expressão, a concisão do gesto exprimindo a tensão do tema e que não é mais produzida pelo homem, pois a “escultura virou gesto ela mesma” isso reclama a forma definitiva e exige que a obra esteja concentrada sobre”um” ponto de vista relevante e ainda condicionou a continuidade entre o homem e o hábito, tão típico para Barlach. Assim, a concentração tem seu êxito quanto à imutabilidade, à dor, tristeza e morte, à paixão, vingança, aflição e fuga, à solidão, meditação profunda, dedicação e esperança.
Uma bela escultura de Barlach. |
Barlach
procura o diálogo e o encontra no que está acima do homem. Ele é capaz de
configurar o ato de esperar indefinido. No “friso dos espreitantes” e na
“comunidade dos santos”, destinados à igreja Katharina de Lubeck, as figuras em
pé, receptivas, aplicam o ouvido para fora, para captar o que lhes é transmitido.
Uma figura que está lendo não percorre com as vistas as letras, mas, sim, está
comovida e dedicada ao que lhe está sendo participado. Um canto absorto parece
estar desembaraçando-se em prol da própria existência e soando no universo.
Barlach sabe conferir a mais profunda evidência e duração àquilo que é amorfo.
Foi com razão que se ressaltou ser Barlach um poeta “porque é escultor”,
pois”as suas visões podem ser talhadas tanto na madeira como na linguagem”.
Nestas
esculturas, a originalidade dos personagens de seus dramas é inerente, sendo
que, infelizmente, hoje parece ser muito difícil de apresentá-los no palco.
Igual
a gravidade de imagem consta nos seus desenhos e folhas gráficas impressas, ou
seja, nas seqüências aos seus dramas, nas apresentações com relação aos poemas
de Goethe, ao “Cântico à Alegria” de Schiller, e a temas que são tocados numa
escultura ou que lhe correspondem.
Não
são ilustrações, mas sim situações inferiores que tratam de atitude, de espaço,
espaço corporal e espiritual, e que apóiam estes personagens e molduram a cena.
Tudo tem por base a fé de Barlach que é imperturbável, sempre e continuamente reconfortada e reconfirmada pela dúvida, pois a fé e a dúvida são para ele automaticamente complementares. A sua fé dá prova de bons resultados no setor eclesiástico, nos monumentos de exortação para as catedrais em Gustrow e Magdeburg para a igreja de St. Nicolai,em Keil. Em 1918 foi fundido um crucifixo destinado
a igreja Elizabeth em Magdeburg o mesmo molde um para Bremen e Lubeck. Um Cristo
ocupa-o em 1931 e ele fez nada menos que seis versões dos semblantes que ficaram preservadas, uma situação de vez,
que Deus não pode mais ser configurado.
Tudo tem por base a fé de Barlach que é imperturbável, sempre e continuamente reconfortada e reconfirmada pela dúvida, pois a fé e a dúvida são para ele automaticamente complementares. A sua fé dá prova de bons resultados no setor eclesiástico, nos monumentos de exortação para as catedrais em Gustrow e Magdeburg para a igreja de St. Nicolai,
Tudo
isso não é para Barlach simplemente evidente, mas sim, sofrimento, luta, nunca
considerado gratuito e menos ainda seguro. Na insegurança confirma-se a fé,
quer dizer, na existência entre o céu e a terra. O Homem na sua nudez está
exposto a um Todo Poderoso”. É assim aos que estão auscultando espreitam o
Universo, é assim que os estudantes dos mosteiros lêem as sagradas escrituras,
é assim que os personagens anônimos de Barlach cantam.
Em
1926, é apresentada a escultura O Tomás Incrédulo. Não é a mão que apalpa a
cicatriz lateral do corpo, não é o ato de apalpar que importa, mas, sim, o
acontecimento que assevera a fé e que se transfigurou num encontro e ao qual
Barlach deu a designação significativa de O Reencontro. O reencontro como
ato de franqueza na devoção e na preservação, como certeza enternecida, todavia
constituída de uma pergunta sem resposta. O próprio Barlach , tendo uma vez
definido a sua incredulidade como sendo “ a sorte da insuficiência”. Ele se
propôs “ muitas vezes de não proferir a palavra Deus, pois sentia como sendo
destruidora a diferença entre a capacidade humana de sensação e divisão e o
conceito abrangendo toda a essência e a existência”.
Auto-retrato I, de 1928, litografia |
Barlach morreu aos 67 anos, no dia 24 de outubro de 1938.Junto ao túmulo o pastor evangélico Schwartzkopff , seu amigo e companheiro fiel , citou o pastor do Dilúvio”, de Barlach, o único personagem que Barlach uma vez apontou como sendo porta-voz. “Tenho vergonha de falar em Deus", e também, em geral não falava nele”. Mas uma vez citando Barlach: Só aquele que compreende é o verdadeiro religioso, só aquele que ouve o murmúrio do sangue de uma vida superior através das pranchas do navio da trivialidae”.Kurt Martin, Munique.
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