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quinta-feira, 24 de agosto de 2023

O NOVO MUSEU DA LÍNGUA PORTUGUESA

Visão do corredor com 106 metros de projeção. Foto RB.
Depois de sofrer um grande incêndio em 21 de dezembro de 2015 que destruiu totalmente todas as suas instalações o Museu da Língua Portuguesa foi reconstruindo e já está funcionando no conjunto arquitetônico da Estação da Luz, que é um dos prédios mais importantes e icônicos da capital paulista. Por lá passam trens desde 1860 e o atual prédio que foi reconstruído onde hoje funciona o museu foi inaugurado em 1901, e é tombado como patrimônio nacional. Dizem os historiadores que durante o século XX a Estação da Luz foi a principal porta de chegada a São Paulo de milhões de migrantes e imigrantes de todo o mundo. Estive lá e pude constatar que até hoje é uma das estações de trem e metrô de grande importância para os paulistas e visitantes, e é um lugar de encontros com as pessoas e com a língua portuguesa.

A Estação da Luz com trem trafegando e
pessoas esperando o metrô do outro
lado. Foto RB.
Ao entrar você tem uma experiência inesquecível sendo envolvido em fantásticos jogos de luz e um conjunto de projeções de imagens que passam em velocidades variáveis. Para quebrar este clima tecnológico você quase sempre se encontrará com grupos de crianças e jovens acompanhados de seus professores. Eles andam para lá e para cá, deitam-se no chão para fazer suas anotações com vistas a elaborar seus trabalhos escolares. Mas, as imagens e o som das salas que visita são mais fortes e chamam mais sua atenção e assim você consegue se concentrar naquilo que lhe interessa, mesmo com a bagunça natural e saudável da criançada.  Digo ao que interessa porque é realmente uma experiência que nos enriquece, inesquecível mesmo, porque está enaltecendo uma língua falada por 260 milhões de pessoas em vários países. Ali você pode ver a língua falada nas ruas, que é criada e recriada diariamente por pessoas comuns como nós. Esta língua viva não pode e nunca deve ser imposta por ideologias. Temos que deixá-la fluir normalmente porque será mais verdadeira.

                       EXPOSIÇÃO

Diz o portfólio distribuído na entrada do Museu da Língua Portuguesa "uma língua é muito mais do que uma ferramenta de comunicação: é através dela que organizamos pensamentos sentimentos e interpretamos o mundo". A exposição principal " é um mergulho nessa forma muito particular de pensar, sentir e perceber o que nos cerca partilhada por brasileiros, portugueses, moçambicanos, angolanos..."  É uma maneira de aprender de forma divertida imerso nas projeções e no áudio e saber toda a grandiosidade da língua portuguesa. 

Aí vemos a genealogia da nossa língua portuguesa. Foto Luciana Brito.

Foto Luciana Brito
 

Em minha opinião achei que existe um pouco de exagero com a presença de muitos cantores de rap, que poderiam ser contrabalançados com cantores de forró, de músicas gaúchas e até sertaneja. Os sambistas e cantores da MPB estão bem representados. Assim, cobriria todos os espectros com mais equidade.  São três andares e o térreo. No primeiro fica a sala das exposições temporárias. No segundo andar a Rua da Língua que tem um telão de 106 metros mostrando fragmentos de poesia visual e sonora; Laços de Família onde você vê a árvore genealógica da língua portuguesa e os caminhos percorridos a partir do tronco indo-europeu; Beco das Palavras onde você é envolvido num jogo para formar palavras e descobrir sua origem; Línguas do Mundo; Palavras Cruzadas com totens interativos mostrando a influência de outros idiomas na língua portuguesa. Enfim, tem muito mais.

Mas, para finalizar devo dizer que estive visitando antes do incêndio a primeira versão do Museu da Língua Portuguesa e confesso que o impacto foi bem maior que desta vez, talvez porque mesmo sendo reconstruído nunca conseguem refazer como na primeira versão. Se visitar a Capital paulista reserve uma tarde inteira para ir à Estação da Luz conhecer o Museu da Língua Portuguesa.

 

 


sábado, 19 de agosto de 2023

ÂNGELA CUNHA UMA TRAJETÓRIA DE ARTE

Foto 1 - Ângela Cunha em foto atual tirada
por mim em seu ateliê. Foto 2- Em 1976
recortando  gravura para expor no MAM-Ba.
Conheci a Ângela Cunha na década de 70 recém-chegada dos Estados Unidos quando veio morar em Salvador atraída pela efervescência cultural que vivia a Bahia  na década de 70, e que teve repercussões em todo o país e até no exterior. Ela é natural de Londrina, no Paraná,  e quando tinha por volta de dezessete anos resolveu   estudar nos Estados Unidos, mas seus pais não tinham condições financeiras de bancar seus estudos fora do país. Foi ai que seu pai soube que  a Associação Cultural Brasil-Estados Unidos - ACBEU iria realizar  uma seleção para levar alguns estudantes brasileiros para a América através do American Field Service, uma instituição de intercâmbio cultural. Participou da seleção e ficou em segundo lugar, mas como a vencedora tinha idade superior à permitida na seleção ela foi chamada, e assim pode estudar e se aperfeiçoar na Tenafly High School quando foi estudar inglês, espanhol e artes, dentre outras disciplinas. Esta escola fica localizada no condado de Bergen, no estado de Nova Jersey, perto de New York. "Aí me apaixonei pela arte, e tive a felicidade de fazer amizade com minha colega Sherryl Belinsky que era uma artista que fazia belos desenhos em bico de pena. Conservamos esta amizade até hoje, e tem uns anos que ela passou quinze dias aqui comigo. Foi uma maravilha", relembra com alegria
Gravura em três tonalidades , de 1977.
Ângela Cunha. Sua amiga casou chegaram filhos e netos  e não prosseguiu com a carreira artística. Concluiu o intercâmbio e ao chegar dos Estados Unidos passou seis meses em Londrina ensinando inglês num colégio. Em seguida resolveu vir morar na Bahia e seu pai preocupado lhe perguntou como iria sobreviver ao que respondeu "ensinando inglês". Veio para a  Bahia e seu objetivo era continuar desenhando e fazendo joias porque foi o ramo da arte que mais a entusiasmou enquanto esteve nos Estados Unidos. Mas, aqui chegando o professor de origem alemã August Adolf Buck, que ensinava joalheria na Escola de Belas Artes, da Universidade Federal da Bahia, onde ela veio a ingressar em 1974 já estava em processo de  aposentadoria, e assim não encontrou um ambiente propício para continuar criando joias. Diante da dificuldade de fazer joias resolveu abraçar a arte da gravura. Naquela época tinha um forte movimento de gravura na Bahia especialmente na Escola de Belas Artes, da UFBA,  onde ela estudou de 1974 a 1980. Fez algumas exposições individuais e participou de várias coletivas, sendo premiada em 1994 com o Prêmio Aquisição no I Salão do Museu de Arte Moderna da Bahia. 

Ângela  Cunha com os filhos
na Galeria Atrium - 1994
.
Para sobreviver foi ensinar inglês que aprendera fluentemente durante sua permanência nos Estados Unidos. Foi então que procurou a jornalista Regina Coeli, de saudosa lembrança, que dirigia a escola de inglês Yes, que funcionava na Ladeira da Barra. Dedicou-se também neste período à pintura, mais especificamente a técnica de nanquim sobre papel em grande formato. Atualmente continua pintando em nanquim. Ela tem uma necessidade intrínseca de se expressar em grandes formatos, o que contrasta com seu jeito aparentemente calmo de ser. Seu relacionamento foi se expandindo conhecendo outras pessoas em Salvador e terminou sendo convidada para ensinar inglês na Associação Cultural Brasil-Estados Unidos, ACBEU, por James Mc Gillivery, que era o secretário executivo da instituição. Passou a ganhar mais e assim a vida foi melhorando e pode fazer seu curso de graduação sem maiores dificuldades. Ela vinha de outra região do país, com cultura e modos diferentes, embora já estivesse com a cabeça mais aberta devido ao período que passou nos Estados Unidos. Mas, mesmo assim estranhou um pouco aquele ambiente da EBA que na época enfrentava muitas greves, tinha uma grande militância política e também o modo descontraído de viver dos colegas.

                                                             QUEM É 

Ângela lembrando que o pai quase tem um enfarte quando
foram ao cartório e ela disse que viria para a Bahia.
A artista Ângela Cunha é natural de Londrina, no Paraná, onde nasceu em vinte e seis de agosto de 1954 filha de Maria José Assis Fonseca Cunha e Mário Cunha, que era correspondente do jornal a Folha de São Paulo para o norte do Paraná e sua atividade principal era a Filatelia, que é o estudo e pesquisa dos selos empregados nas postagens dos mais diversos países. Ela lembra que na época ele mantinha correspondência por cartas com colecionadores de muitos países, inclusive da China, de onde recebia os novos selos que iam circular em todo o mundo. É bom ressaltar que não havia internet e nem celular. Tudo era feito através de cartas, que demoravam muito a chegar de um destino tão longínquo como a China. Ele criou o Clube de Filatelista de Londrina e escrevia semanalmente um artigo no jornal a Folha de Londrina contando as últimas novidades da filatelia.

Obra em nanquim sobre papel
Canson de 1,5m por 1m.
Era uma família de classe média e Ângela Cunha tem um casal de irmãos. Estudou o primário na Escola Maria Aparecida, que era de freiras, e fez o ginásio num estabelecimento público chamado Ginásio Pio XII, e  não esqueceu que o uniforme tinha as cores verde e marrom. Quanto ao colegial foi também num colégio público o Colégio Professor Vicente Rijo. Disse que "naquela época as escolas e colégios públicos de Londrina eram muito bons". Quando terminou o colegial que encasquetou de estudar fora seu pai sempre preocupado com a harmonia e segurança da família reagiu com muita cautela e até espanto. Conta que ele disse que não tinha condições de mandar estudar fora. “Até descobrir a seleção que estava sendo feita pela American Field Service - AFS,  na Associação Cultural Brasil-Estados Unidos, em Londrina, no Paraná.”

Obra em nanquim sobre
papel .Hoje ela está pintando
em cores mais escuras.

Outra boa lembrança é que seu pai gostava de ler e sempre lhe apresentava novos livros para que lesse e isto contribuiu para que ela tivesse uma boa colocação na seleção do intercâmbio cultural, e durante toda sua vida. Falava com grande prazer e alegria desta oportunidade impar de estudar nos Estados Unidos. Já tinha concluído o curso colegial aqui e foi novamente fazer na High School Thenafly onde passou a ter contatos com novas disciplinas inclusive com as artes. Recordou que ao retornar estava com a cabeça mudada com as informações que recebera e o modo de vida do povo americano. Nos seis meses  que ficou em Londrina ao retornar ensinando inglês foi preparando silenciosamente seu novo salto que seria sua vinda para a Bahia. Depois que estava tudo pronto revelou a seu pai. "Ele quase tem um enfarte e me perguntou como você vai sobreviver na Bahia minha filha? Eu não tenho condições de lhe manter lá." Respondeu que ia ser professora de inglês já que fala fluentemente a língua inglesa. Seu pai teve que acompanhá-la ao cartório e na entrada parou e colocou a mão na testa, disse Ângela Cunha. "Uma cena que não esqueço, ele estava muito preocupado."

Obra de 2000 já na cor escura.
Veio para a Bahia onde está até hoje ao lado de seus dois filhos que teve com grande fotógrafo Mário Cravo Neto, o Mariozinho. São eles o Akira Cravo, que segue a profissão do pai, e o Lukas Cravo também fotografo e impressor de FineArt, que é o  único Canson Certified Printer na Bahia. Segundo a Wikipédia “a fotografia fine art é a fotografia criada de acordo com a visão do artista fotógrafo, que utiliza o meio para expressar algo que apenas vive em sua mente." Portanto, Lukas Cravo faz a impressão das fotografias e também de pinturas e gravuras de clientes com alta resolução e tem valor de mercado por ser exclusiva.

Confessa que o casamento e a convivência com Mariozinho  foi um aprendizado muito importante porque "ele era muito competente e profissional. Quase todo o ano viajava para o exterior  onde ele fazia suas exposições em Nova Iorque, Berlim, Amsterdã, Paris, Copenhague e outras cidades europeias. Quando nos separamos foi um choque para mim, porque a separação é traumática, é como uma morte.” E confessa rindo: "foi ele que separou de mim. Viver artista com artista não é fácil. Mas, continuamos grandes amigos e na época ele vinha ver os filhos com certa frequência. Confesso que quando ele morreu eu senti muito, mas quando da separação senti muito mais".

                                                     FORMAÇÃO

Ângela falando do Prêmio Aquisição que ganhou em 1994
com esta obra no I Salão MAM-BA de Artes Plásticas.
A artista Ângela Cunha quando chegou decidiu fazer vestibular para a Escola de Belas Artes, da Universidade Federal da Bahia. Disse que ficou muito ansiosa e preocupada com o vestibular e em , especial com a prova de Desenho que tinha como examinador  Juarez Paraíso. Não era boa em desenhar figura humana e treinei muito e na hora da prova fiz bem meu desenho e passei. As outras provas foram tranquilas. Depois de alguns meses na escola como não conseguiu fazer joalheria pensou em desistir e voltar para casa. Durante as férias foi para Londrina  e falou com seu pai que não ia continuar o curso na EBA e ele não gostou. "O quê? Você é macaco para pular de galho em galho”? "Ai ele comprou uma passagem de volta para Salvador e me despachou”, conta rindo. 

Voltei e fui estudar até concluir o curso de Belas Artes. Durante o curso tive uma professora Zélia Maria e um dia ela escolheu uma gravura grande de 1,5 metro por 1 metro e exibiu na sala de aula para os meus colegas e disse e segurando a gravura : "Nasce uma gravadora!" "Fiquei muito feliz e passei a fazer muitas gravuras. O professor Juarez Paraíso me emprestava uma prensa que ele tinha em seu ateliê no bairro de Itapuã. Eu ia aos domingos e ficava lá sozinha com o vigia e fazia muitas impressões. Vendi muita gravura e isto ajudava a minha sobrevivência que já estava bem mais tranquila porque recebia um bom salário pelas aulas de inglês na ACBEU. Na época a EBA não deixava os alunos usarem a prensa fora da hora da aula. Foi quando participei de muitos salões e exposições. Até 1980 quando parei de fazer gravura e passei a pintar em 1984", conta Ângela Cunha.

                                                                     EXPOSIÇÕES 

Capa do livro-catálogo da exposição no Museu Afro Brasil,
em São Paulo, e as quatro mil bolinhas de argila que
 compõem a sua obra Quando o Último Rio Secar,
de 2009.
Ela disse que sua primeira exposição individual foi na Galeria da ACBEU, que promovia muitas exposições de qualidade. A segunda foi no Museu de Arte de Londrina. Quando morava com Mário Cravo Neto, o Mariozinho, um dia ele foi ler o currículo dela e notou que tinha umas vinte exposições coletivas e participação em salões. Foi quando resolveu eliminar e assim só ficaram registradas estas aqui relacionadas.
Exposições Individuais: 2009- Exposição  Os Mágicos Olhos da América, no Museu Afro Brasil, em São Paulo, quando ela apresentou o trabalho Quando último Rio Secar. Foram quatro mil bolinhas argila numa caixa de madeira, denunciando o que estão fazendo com nossos rios. Lembra que telefonou para Emanoel Araújo que era diretor do Museu e ele disse: "Você tem uma semana para enviar a sua obra." Imagine que tive que embalar quatro mil bolinhas de argila, um pouco maiores que uma bola de golfe, conseguir a grana e enviar. Foi um trabalhão, mas consegui e exibe o livro onde aparece sua obra com um texto que  Mariozinho tinha feito pouco antes de falecer. 2002 - Exposição na Bahia Design Center, Salvador, Bahia; 2000- Museu de Arte Moderna da Bahia, Salvador; 1994 - Exposição na Galeria Atrium, Salvador; 1990 - Galeria Artenata, Salvador; 1987 - Galeria Arte Viva, Salvador; 1978 - Museu de Arte de Londrina; 1978 - Exposição de gravuras na Galeria ACBEU, em Salvador. Exposições Coletivas: 1998 - Exposição Tropicália 30 Anos, no Museu de Arte Moderna da Bahia; 1998 -
Obra inspirada em máscara
africana feita  em nanquim.
Exposição Coleção de Arte Contemporânea, no Museu de Arte Moderna da Bahia; 1998 - Exposição no Museu de Arte Moderna, do Rio de Janeiro; 1997 - Workshop, Artistas Brasileiros e Alemães, Museu de Arte Moderna da Bahia, Salvador; 1996 - III Salão MAM-Bahia, no Museu de Arte Moderna da Bahia; 1994 - I Salão MAM -Bahia, no Museu de Arte Moderna da Bahia; 1988 - Exposição Artistas Baianos, no Museu de Arte Moderna da Bahia; 1987 - Exposição Escotilhas para o Aberto, no Museu de Arte Moderna da Bahia; 1980- Exposição Jovens Artistas, no Museu de Arte Moderna da Bahia; 1979 - Exposição 13 Artistas, na Galeria Baguettes, em Salvador; 1978 - I Salão Universitário de Artes Plásticas, no foyer do Teatro Castro Alves, em Salvador.

                                                    REFERÊNCIAS

Mariozinho examinando negativos de fotos suas.
Foto do Google.
Vou relembrar aqui o texto de Mário Cravo Neto fez pouco tempo antes de sua morte falando da obra de Ângela Cunha "Quando o Último Rio Secar", que tem uma história. Com a vinda de sua amiga Sherryl Belinsky a Ângela Cunha foi andar por várias vezes num pedacinho de Mata Atlântica que existe em Patamares e que está ameaçado de destruição. As pessoas que andam por lá o chamam de Vale Encantado, e sempre iam em comapnhia do arista Ramiro Bernabó, que é filho de Carybé e mora nas redondezas, e outras pessoas. Eles lutaram para a preservação deste local e ai veio a preocupação com a Ecologia e a ideia de fazer a obra. Veja o  que escreveu o Mariozinho: "As esferas moldadas de barro simbolizam as mãos que se elevam,que cobrem o rosto, são o pranto de lágrimas do leito seco do rio. O barro amassado e cozido é a síntese de um momento poético - e o rio  seca, o corpo oferece a água - com o passar do tempo tudo volta à sua normalidade. Enquanto passamos por esta terra nos confrontamos com pequenas ilhas de emoção, não necessitamos de ir muito longe à procura da verdade. Sempre nos esquecemos de que há muitos lugares dentro de nós mesmos e que pouca importância damos a eles, na sua maioria até os desconhecemos. No universo das possibilidades não convém ao artista limitações de uma geografia descritiva, ele deve descobrir a sua própria através da ação, do movimento que é vida, que está contida na auto suficiência do seu ato e do seu ser. 

Regamos a terra com as lágrimas do sofrimento, ao mesmo tempo sentimos o prazer de vivenciar o que por nós foi construído, posteriormente devemos deixá-los de lado e dar mais um passo. Assim sempre foi, assim sempre será, assim como os dedos que amassam a terra e moldam a natureza à sua imagem, assim também tateamos no escuro em busca de um caminho desconhecido. Os ninhos de barro de Ângela, também são construídos por certos pássaros e outras espécies  - todos eles servem para abrigar , para dar proteção a si mesmo ou aos outros". Mário Cravo Neto.

Ângela Cunha com o crítico Wilson Rocha.

Já Wilson Rocha no seu livro Artes Plásticas em Questão  escreveu:"A magnitude de desejo inconsciente é que, a nosso entender, mobiliza a ação do artista. Quando isso ocorre, a arte cobra vigor e energia e capta os vestígios do mundo e os fragmentos de vida. Assim são os profundos enígmas das vigorosas reflexões estéticas de Ângela Cunha. A visibilidade de seu universo plástico exige este modo de conceber o processo criativo nessas dimensões fantásticas. A visão e as metas de sua realização artística são suplamente proveitosas. de um lado, a figuração voltada para a evolução e decomposição da forma, de outro, há algo mais profundo através da dimensão oculta e original do ser, que produz atuações distintas, de inconsciente a inconsciente, para significar o fenômeno da essência e da aparência, a gêneses do signo com sua assemântica não-convencional,como verdadeira emergência estética". ......

Noutro trecho ele escreveu: Ângela Cunha é uma artista lúcida e profundamente informada, certamente a personalidade de artista mais monoestilística de nosso ambiente, a artista que encontrou mais cedo a sua fonte e o seu caminho criativo. Com uma obra reveladora e estimulante, ela é ainda impressionante pela sua admirável relação técnica com o espaço".

                                                 NANQUIM

Obra em nanquim preto e sépia.
A artista Ângela Cunha atendendo uma recomendação de Mário Cravo Neto com quem conviveu por dezessete anos passou a usar a tinta nanquim para pintar em grandes formatos e expressar suas emoções. Antes o nanquim só tinha na cor preta, mas atualmente existe em várias cores. Mesmo assim ela prefere o preto e a sépia para a sua criação artística e pintar sobre o papel Canson de 1,5m por 1 m. 

Segundo a Wikipédia "o nanquim é originário da China e é também chamado de tinta da China  preparado com negro de fumo coloidal , também conhecido por pó de sapato e empregado em desenhos aquarelas e na escrita. Foi desenvolvida pelos chineses há mais de dois mil anos, a tinta é constituída por nanopartículas de carvão suspensas em uma solução aquosa. Como nanopartículas dissolvidas em líquido se agreguem e formam micro e macropartículas que sedimentam no fundo do recipiente, os chineses antigos descobriram como estabilizar a solução ao acrescentar goma arábica (uma espécie de cola). A tinta nanquim é muito parecida com a tinta sumi, de origem japonesa para a arte sumi e que tem, como composição, fuligem, goma arábica, água e especiarias."

 

 

 


sábado, 5 de agosto de 2023

DOIS ARTISTAS QUE TRABALHAM EM SINTONIA

Os artistas José Henrique  e Luiz Cláudio no seu
Estúdio 391, no bairro da Pituba, Salvador.
 Estive visitando o Stúdio 391 que fica localizado na Avenida Manoel Dias da Silva, no bairro da Pituba, em Salvador, onde os artistas Luiz Claudio Campos e José Henrique Barreto têm seu ateliê. É um prédio de dois pavimentos que foi todo reformado e o espaço está sendo transformado num centro cultural para realização de eventos e será construído um café bistrô. Tudo funcionará com agendamento, inclusive como eles trabalham com antiguidades e objetos de reuso a dupla de artistas têm uma relação profissional com muitos arquitetos e decoradores que ali encontram uma infinidade de objetos e obras de arte como telas, imagens, cerâmicas, porcelanas, prataria, móveis etc.  Eles informaram que têm o imóvel há mais de trinta anos, era uma casa antiga e que foi reformada e transformada em dois grandes salões   adaptados para funcionar como um estúdio e centro cultural.  O trabalho de arte desenvolvido pela dupla de artistas já é conhecido no mercado de arte baiano e no meio artístico e cultural porque eles já fizeram várias exposições, participaram de coletivas e de algumas edições da   Bienal do Recôncavo e sempre estão presentes em movimentos ligados à cultura. Trabalham juntos desde 2000, embora cada um desenvolva um estilo de pintura diferenciada. O Luiz Claudio tem uma pintura mais descontraída, contemporânea, e o José Henrique uma pintura realista, mais ligada à fotografia. Eles unem as suas habilidades diferenciadas e constroem uma arte conceitual de grande impacto visual e criativo.

Super-Sagrado : técnica mista, plotagem
sobre madeira e luz.
Diria que o trabalho que desenvolvem com muita competência e sintonia é fruto de um amadurecimento profissional e pessoal, além da cumplicidade porque às vezes no meio artístico encontramos muita manifestação do ego. Para trabalhar juntos é preciso deixar o ego de lado e dar as mãos, esquecer os caprichos, vaidades e outras posturas que costumam estar presentes entre aqueles que trabalham criando. E a dupla embora tenha formação profissional diferenciada eles se entendem e tocam a vida em harmonia. O Luiz Claudio Campos é graduado em Licenciatura de Desenho e Plástica, pela Escola de Belas Artes, da Universidade Federal da Bahia. Já o José Henrique Barreto é Graduado em Medicina, pela Escola de Medicina Saúde Pública da Bahia e Mestre em Artes Visuais, pela EBA. Um é professor de arte e o outro é médico oncologista pediátrico. O que os une é a sensibilidade e o amor pela arte que escolheram para expressar seus sentimentos mais nobres. na conversa que tivemos o José Henrique disse que "trabalhamos juntos explorando a brasilidade, as relíquias e objetos variados de reuso". Eles têm realmente visões aguçadas em buscar e selecionar objetos quer seja num leilão, num brechó, numa loja de antiguidades ou até mesmo numa praia, na rua e em outros locais onde possam encontrá-los.

                                                                   AS BONECAS           

José Henrique Barreto com pinturas de sua autoria . Seu
  pai quando criança e de uma  boneca de sua coleção.
A dupla possui uma coleção de bonecas antigas feitas de massa, que é um trabalho quase artesanal as quais são utilizadas como modelos para José Henrique Barreto fotografar e trabalhar em suas pinturas realistas, e como elementos em suas instalações e outras manifestações artísticas conceituais. Eles contam que a primeira boneca da coleção foi comprada através da internet. Confesso que fui olhar na internet e constatei que realmente existe um comércio forte de bonecas de todos os tipos e devem existir muitos colecionadores por este Brasil afora. Tem bonecas que custam mais de 1 mil reais. As bonecas antigas de massa que a dupla costuma adquirir e ganhar são da década de 40. Mas, eles costumam até encontrar na praia bonecas danificadas, não tão antigas, mas que trazem marcas do tempo e do abandono que depois foram relegadas, e em outros locais, recolhem e trazem para o Stúdio 391.

Luiz Cláudio Campos ao lado de uma pintura onde mostra 
sua arte voltada para a contemporaneidade.
Antes da popularização do telefone celular as meninas ganhavam e brincavam mais com as bonecas . Surgiam muitos modelos a cada Natal. Atualmente existem bonecas que  são tão parecidas com o ser humano que nós adultos somos instados a apertar os bracinhos ou mesmo suas bochechas.  As bonecas são representações de um ser humano e segundo os estudiosos contribuem por meio do ato de brincar para o desenvolvimento emocional das crianças em relação a elas próprias e aos coleguinhas. Para a pediatra Luiza Menezes, também autora do livro “Livres brincar” e produtora de conteúdo no perfil “Infâncias fora da caixa”, brincar de boneca se relaciona com o que a criança vê ou não na sociedade. “A boneca pode ser um instrumento para gerar mais autoconfiança, porque a criança se reconhece ali. Ou, ainda, para praticar empatia ao brincar com uma boneca diferente de si”. Também existem crianças e até adultos que têm medo de bonecas que representam crianças e constitui até uma doença chamada de pedofobia que segundo o dicionário "é o medo de bonecas injustificado, irracional e persistente. É uma fobia específica pertencente à categoria de automatonofobia - medo específico causado por figuras semelhantes a humanos. Conheço duas pessoas que têm medo de palhaços, que também é uma doença e chama-se coulrofobia e que geralmente acontece com crianças de 2 a 7 anos de idade.  A dupla fez uma exposição com as bonecas e pinturas de José Henrique na Galeria Objetos do Olhar, que fica na Rua Augusta, em São Paulo, e que foi muito bem visitada e avaliada.

                                                             OS ARTISTAS

"O Santo e a Devoção", caixas 
com imagens de santos e fotos
3 x 4 dos seus devotos.
O Luís Cláudio Ferreira Campos é natural de Ilhéus, Bahia onde nasceu em 1960 e é graduado em Licenciatura em Desenho e Plástica pela Escola de Belas Artes da Universidade Federal da Bahia, em 1990, e em 1999 fez a Pós-graduação em Arte Contemporânea no Centro Nacional de Estudos de Pós-Graduação, Pesquisa e Extensão e o mestrado em Artes Visuais pelo PPGAV/EBA/UFBA no ano de 2009, logo após adotou o nome artístico de Luiz Cláudio Campos. Já fez inúmeras curadorias de exposições de artistas e tem textos publicados. Tem obras nos acervos de alguns museus como o Museu de Arte Moderna da Bahia, no Museu Regional de Vitória da Conquista, Bahia; no Museu do Presépio, na Sagrada Família, em Salvador, no Museu de Arte Contemporânea de Senhor do Bonfim, Bahia, e em outros centros culturais. Já o José Henrique Silva Barreto, é natural de Salvador, graduou-se em 1983 na Escola de Medicina e Saúde Pública da Bahia e se especializou em Oncologia no ano de 1986 pela Sociedade de Oncologia da Bahia Ltda e pelo Hospital Martagão Gesteira, em Salvador. Também é Mestre em Saúde Coletiva pelo Instituto da Coletiva da Universidade Federal da Bahia. E em seguida fez o doutorado pelo PPGMS/UFBA, em 2010.  

                                                  REFERÊNCIAS

"Escapulários", de José Henrique Barreto.Técnica mista com
metal (enxadas),corda, luz e sombra, de2008.
Escrevendo sobre a exposição que a dupla de artistas  , em 2008 a crítica de arte Matilde Matos, já falecida, disse; "Nessa exposição A Voz do Povo é a Voz de Deus que o Centro Cultural dos Correios apresenta, Luiz Claúdio Campos e José Henrique Barreto unificam a pureza da fé às crendices do nosso povo , de modo irretórquível e surpreendente.Recorrendo à fotografia e montagens fotográficas , alguma intura, frases escritas e objetos de cera, lançam mão do ready-made de caixas , tampas de tonéis, enxadas, lâmpadas, santinhos diminutos, não gratuitamente, mas trabalhando com ou sobre eles, sabendo tirar efeitos inusitados da transparência das peles de carneiro, suporte da pintura que sob a luz ganha sombras admitáveis,na sala dos ex-votos. com igual desenvoltura, jogam com o vaziona pintura da cruz sem o Cristo, e o do Santo Antônio no seu nicho, e dos santos que se destacam na instalação das trezes caixas recobertas de fotos dos seus fiéis, escolhidos pela devoção."

O também crítico e artista plástico César Romero disse que "Cada artista tem seu modo particular. Dividir com o outro a experiência criativa é uma tarefa que exige cumplicidade, renúncia, observação aguda do que aproxima ou afasta, relação do abdicar e somar, tomando o produto  final obrado Self e não no Ego.  Os egóicos não partilham. Partilhar é conectar-se com o centro interno do outro, unificando emoção e razão em comunhão com o cosmo. ..... E em outros parágrafos da sua escrita diz o Cesar Romero "A confrontação entre ideias ,linguagens em efeitos de luz e sombras, resultam em instalações como O Santo ea de Promessas, Super Sagrado e as individuais Caixas de Luz ( LCC) e Escapulários (JHB). O ser humano, em sua escaladas na vida, adentra o espiritual, a transcendência e a inspiração com o divino. O Sagrado é revelação, o milagre está em cada um de nós, com as mais diferentes crenças e destinos".

                                                  EXPOSIÇÕES 

"Sala dos Milagres", de Luiz Cláudio Campos. Técnica
mista com madeira, couro, luz e sombra, de 2008.
Participaram de vários  salões e antes do ano 2000 cada um deles realizou algumas exposições individualmente. Vejamos : 2005- “Ainda Pulsa...” - III Salão Nacional de Artes Plásticas de Curvelo, Minas Gerais (dezembro/ 2004); “O Santo e a Devoção” - 12o Salão da Bahia, Salvador, BA ; 2006 - O Dom da Vida – Salão da Fundação Cultural do Estado da Bahia, Valença, BA ; 2006 -  Martírio - autos de Fé - Salão da Fundação Cultural do Estado da Bahia, Valença, BA ;  2006 ; “Rogai por nós” - Salão da Fundação Cultural do Estado da Bahia, Alagoinhas, BA ; 2006 - Corações - Salão da Fundação Cultural do Estado da Bahia, Alagoinhas, BA ;2006 - Vox Populi, Vox Dei - VIII Bienal do Recôncavo, São Félix, BA ;2006 - Pagadores de Promessas – 13o Salão da Bahia, Salvador, BA ; 2008 -  Super-Sagrado – IX Bienal do Recôncavo, São Félix, BA ;2008 - Água Santa – IX Bienal do Recôncavo, São Félix, BA ;2010  - Larôye – X Bienal do Recôncavo, São Félix, BA ;2012 -  Coração de Vidro – XI Bienal do Recôncavo, São Félix, BA .PRÊMIOS: Em 2006  nos Salões Regionais de Artes Plásticas da Bahia / Fundação Cultural – Alagoinhas, Bahia (Prêmio Fundação cultural do Estado da Bahia). Também em 2006 na VIII Bienal do Recôncavo / Centro Cultural Dannemann – São Félix, Bahia -Prêmio Aquisição; em 2007 foi selecionado através de edital público para expor na Caixa Cultural em Salvador. Em 2008 foi Menção Especial na IX Bienal do Recôncavo / Centro Cultural Dannemann – São Félix, Bahia; em 2008 - selecionado para expor no Centro Cultural dos Correios, em Salvador e finalmente em 2015 no Museu Universitário da Arte da Universidade Federal de Uberlândia,ambos através de editais públicos.

"Cédulas", fotografia modificada com imagens de santos.
Eles mostram a relação do profano e do religioso com
o dinheiro como forma de pagamento ou agradecimento.


Suas principais exposições foram: 1. O Avesso da Pele. Museu de Arte da Bahia
– MAB, Salvador, BA, 2017; 2. Doce de Santo – Exposição processual e itinerante de um coletivo de artistas. Museu de Arte Moderna -MAM, Salvador, BA (2017); 3. Corações sem tórax ou abrigos efêmeros. Galeria B. Arte, Salvador, BA (2015); 4. Doce de Santo – Exposição processual e itinerante de um coletivo de artistas. MUnA – Universidade Federal de Uberlândia, MG (2015); 5. Coleção Matilde Matos. Palacete das Artes. Salvador, Bahia (2014); 6. 50 Anos de Arte Na Bahia. Uma homenagem à Matilde Matos - Caixa Cultural Salvador, Salvador, Bahia (2013); 7. Salvador-Paris - Galeria da Aliança Francesa, Salvador, Bahia (2013); 8. Sacres-Cöeurs – Galeria da Aliança Francesa, Salvador, Bahia (2012); 9. Mostra Internacional de Gravura Imprima, 2012 – Sobral, CE (2012); 10. Circuito das Artes / Museu Rodin - Salvador, Bahia (2012); 11. Entre Amigos – Foyer da Biblioteca Pública do Estado da Bahia,
Salvador, BA (2012); 12. X Bienal do Recôncavo / Centro Cultural Dannemann – São Félix, BA. Larôye (2010); 13. Doce de Santo – Galeria ACBEU. Salvador, Bahia (2010); 14. Rememoráveis – Museu de Arte Sacra da UFBA. Salvador, Bahia (2009); 15. IX Bienal do Recôncavo / Centro Cultural Dannemann – São Félix, BA. Super-Sagrado (2008); Água Santa (2008); 16. A Voz do Povo é a Voz de Deus – Centro Cultural Correios, Salvador, BA (2008); 17. Long Trip for Beautiful Global Village – The Korea-International Association for Pure Formative Arts. Galeria Cañizares, Salvador, BA (2008); 18. Afetos Roubados no Tempo - Fundação Espaço Cultural da Paraíba, João Pessoa, PB (2008); 19. Corredor das Artes – Instituto Goethe, Salvador, BA (2007); 20. Matéria Presente – Galeria Cañizares, Salvador, BA (2007) 21. Relíquias do Cotidiano – Caixa Cultural Salvador, Salvador, BA (2007); 22. VIII Bienal do Recôncavo, São Félix, BA. Vox Populi Vox Dei (2006); 23. Ruínas Frateli Vita – Processos Criativos. Fratelli Vita, Salvador, BA (2006); 24. 13o Salão da Bahia. Salvador, BA. Pagadores de Promessas (2006); 25. Salão Regional da FUNCEB. Alagoinhas, BA - “Rogai por nós” (2006), Corações (2006) -; 26. Salão Regional da FUNCEB. Valença, BA - O Dom da Vida (2006); Martírio – Autos de Fé (2006) ; 27. Mirabile Visu – Galeria ACBEU. Salvador, BA. (2006); 28. Afetos Roubados no Tempo – Galeria ICBA. Salvador, BA (2005); Maceió, AL (2006); Recife, PE (2006); São Paulo, SP (2006);29. 12º Salão da Bahia. Salvador, BA. O Santo e a Devoção (2005); 30. Art for Today – Galeria ACBEU. Salvador, BA (2005); 31. Corpus Solus – Galeria EBEC Pituba. Salvador, BA (2005); 32. O Mimetismo na Arte – Galeria EBEC Pituba. Salvador, BA (2005); 33. III Salão Nacional de Artes Plásticas de Curvelo. MG. Ainda Pulsa (2004); 34. Arte em Revezamento – III Etapa. Galeria EBEC, Salvador, BA (2004); 35. Mutualismo em uma produção de esculturas – Instalação Biblioteca Central do Estado da Bahia, Salvador, BA (1999); 36. Arte e Natureza – Ecodramas 98 - Galeria Cañizares – EBA - UFBA, Salvador, BA (1998); 37. Em Busca da Forma
Instalação de garrafas com imagens de santos e pinga.
Foi apresentada numa das versões da Bienal do 
Recôncavo, e causou polêmica.
 - Galeria Solar Ferrão do IPAC, Salvador, BA (1997); 38. Papel - Uma obra de Arte - Galeria ACBEU, Salvador, BA (1993); 39. Objetos de Papel Marché e Papel Artesanal - Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia - Museu Regional de Vitória da Conquista, Vitória da (1992);  BA BA(1992); 40. Fórum Bahia na ECO 92 - Rio ECO 92, Rio de Janeiro, RJ (1992); 41. Índio Através da Arte - Galeria Cañizares – EBA/UFBA, Salvador, BA (1992); 42. Xilogravura em Papel Artesanal - Galeria do Banco do Brasil – Barra Avenida, Salvador, BA (1992).

 

 

quarta-feira, 2 de agosto de 2023

ROGÉRIA MATTOS A SAGA DE UMA ARTISTA GUERREIRA

Foto 1 - Rogéria Mattos pintando em seu ateliê em São
Paulo, 2023 .Fotos 2  e 3  em dois momentos quando
tudo parecia uma explosão de cores e criatividade.
Foi através de uma entrevista por telefone e lendo alguns textos que já escrevi sobre ela na coluna que semanalmente publicava no jornal A Tarde, de Salvador, que fui rever a trajetória desta artista que decidiu ficar em São Paulo e enfrentar as dificuldades que se apresentaram e ainda estão presentes no seu dia a dia. Não é fácil viver de arte, especialmente quando você está começando, ainda mais numa megalópole como a capital paulista onde o mercado é amplo, mas disputadíssimo. Foi assim que Rogéria Teixeira Mattos, ou simplesmente Rogéria Mattos natural de Salvador, da Cidade Baixa, teve que seguir o seu caminho com sua  filha fruto do casamento com o artista Leonel Mattos.  É uma artista de talento reconhecido em vários salões onde foi premiada e trabalha tanto com pintura e a escultura. Lembrei de uma frase do saudoso Wilson Rocha que diz: "Rogéria concentra-se na essência da própria escultura - essa dinâmica da matéria e da forma, esse ritmo entre volume e espaço aliados ao caráter intuitivo necessário na obra de arte - onde a artista estabelece o diálogo entre a pedra e a linguagem antiga da escultura." Acrescento que ela tem uma força expressiva muito forte especialmente  na sua pintura onde se revela nos espaços das telas. Tenho uma pintura em tons vermelhos onde a gente sente esta vibração positiva e a presença do seu talento expresso em elementos que compõem esta obra. É como uma música de Beethoven onde os tons e a sonoridade vão se revelando a cada frase musical. É só vibração e harmonia! É a exaltação da pintura pela pintura no mundo das cores.

Desenho integrante do seu trabalho de
graduação pela Faculdade Paulista de Artes.
Influenciada pelo acolhimento que São Paulo se notabilizou por ser uma das
cidades onde residem mais nordestinos fora do Nordeste, Rogéria Mattos escolheu para seu trabalho de conclusão do curso de graduação em Artes Plásticas pela Faculdade Paulista de Artes, realizar uma instalação que denominou de Memória - Chão de São Paulo. Ela apresentou fragmentos urbanos em preto e branco porque “eles expressam a vivência na metrópole. Tem forte influência da fenomenologia de Merleau-Ponty, cuja tarefa é revelar o mistério do mundo e o mistério da razão."  Escreveu o professor Walter Benjamim em uma de suas teses “Sobre o Conceito de História" que " as cidades são protagonistas de histórias, tecem o enredo das recordações, e esta memória topográfica articula aquelas recordações que vêm do coração a espaços vividos, carregando-os de sentido simbólico. Torna os lugares testemunhas da história".
Ela explodiu no mercado de arte sendo premiada e aceita em vários salões e foi festejada com alegria por sua pintura cheia de cores e energia. Mas, dois fatos externos modelaram esta explosão que foi a separação e a necessidade de buscar um caminho para sobreviver . Um fardo muito pesado para uma jovem artista que tinha apenas quatro anos produzindo sua arte em São Paulo. Com isto teve que interromper aquela explosão inicial para enfrentar um problema de saúde decorrente desses fatores. Hoje, totalmente restabelecida acreditamos que está retomando com força a sua caminhada interrompida.

                                                          EVOLUÇÃO

Obras que atestam a qualidade
e a força de sua pintura .
.
Nos anos 70 chegou a tentar ser atriz de teatro, produzia cenários teatrais e iniciou a criação de esculturas de argila. Porém, no início dos anos 80 começou a pintar com acrílica sobre tela e como toda autodidata desenvolvia sua criação intuitivamente e "essencialmente trabalhava cor sobre cor", revela Rogéria Mattos em seu TCC de graduação.  Sua temática estava focada na fauna e flora da floresta amazônica onde surgiram séries de jacarés, tatus, pássaros, a exuberante vitória régia, e as lembranças de sua infância em Salvador. "No começo não pintava sobre a tela branca. A base inicial da obra sempre era o preto. Por falta de habilidade com o desenho, utilizava imagens de revistas, livros e coleções infantis como referência. Trocava o lápis pelos pincéis para desenhar diretamente sobre a tela. A modelagem em barro era a base para os estudos preparatórios para as esculturas", afirma.

"Deleite das Cores".
1988, em acrílica .
Ainda dando seus primeiros passos na pintura seu talento já foi reconhecido com prêmios em salões de arte. Arrebatou o Prêmio Destaque para Aquisição no XVIII Salão Nacional de Belo Horizonte, em 1986; o prêmio Especial Medalha Pietro Maria Bardi no II Salão Pirelli de Pintura Jovem, no Masp, em 1985, sendo posteriormente convidada para participar do VII Salão Paulista de Arte Contemporânea Especial. Ai ganhou alguma visibilidade e foi convidada para fazer sua primeira exposição individual na Galeria Documenta, em 1994, em São Paulo e Curitiba, com a curadoria do crítico Olívio Tavares de Araújo. Depois veio a necessidade de sobrevivência com a separação e abraçou a arte-educação a partir dos anos 90, quando sentiu que deveria cursar uma faculdade de artes. Enquanto isto no seu ateliê continuava com seus desenhos, pinturas, modelando suas esculturas e fotografando. Reconhece que sua obra sofreu uma grande transformação depois que foi aprovada e passou a cursar a Faculdade Paulista de Artes "Minha obra transformou-se durante o tempo que passei na faculdade. Não me contentava mais com o fazer por fazer. Por isso adotei a pesquisa prévia em busca de conceitos, ideias e referências. Esta mudança de comportamento aconteceu com o convívio acadêmico. Durante esses períodos, os professores chamavam minha atenção para a busca desse olhar transformador, que refletia a minha memória".

                                                                         QUEM É 

Rogéria Mattos contente com o
 sucesso do seu trabalho artístico.
A artista Rogéria Teixeira Mattos nasceu em Salvador, no Hospital Português, no bairro da Barra Avenida, em Salvador, em 18 de abril de 1956. Passou sua infância nos bairros do Caminho de Areia e Jardim Cruzeiro, na Cidade Baixa, em Salvador, principalmente na casa de sua avó. As lembranças que ficaram são de suas idas à praia do Cantagalo para ver os barcos saindo e chegando e os banhos de mar. Estudou no Colégio Circulista, que era administrado pelo pessoal das obras da então irmã Dulce, hoje Santa Dulce, e se mostra emocionada quando lembra de seu rápido encontro com a freirinha frágil que se tornou santa. Disse que filava muita aula. Depois estudou no Ginásio Dom Bosco e no Educandário Duarte da Costa onde fez o curso chamado de colegial ou secundário. 

A pintura em toda sua
expressão
.
Casou-se e teve uma filha e foram residir em São Paulo onde sua arte floresceu. Depois veio a separação, que para ela foi traumática, e passou a viver de sua arte produzindo e ministrando cursos de Arte Educação. Dedicou-se a ensinar e assim se passaram 35 anos na ong Instituto Criança Cidadã e em outras instituições até se aposentar.  Entrou para o instituto quando já cursava a Faculdade Paulista de Artes e precisou de um estágio didático e por lá permaneceu esses anos. Disse que fazia muitas palestras, dava oficinas de arte nos Sescs dos bairros de Pompéia, Pinheiros, Belenzinho, dentre outros. Sempre trabalhando com crianças tentando incentivá-las a gostar da arte. Enquanto isto cuidava da filha que hoje é uma pequena empreendedora em São Paulo. Ela afirma que diminuiu sua produção, e que trabalhou muito tempo com exclusividade para a Galeria Documenta, que era uma das mais importantes da capital paulista. "Fiquei muito voltada para ajudar a filha e os netos ". A galeria deixou de funcionar, por algum tempo. Atualmente está funcionando. Nesta época alguns colecionadores continuaram comprando minhas obras e fui trabalhar monitorando exposições, bienais e fazendo alguns trabalhos como capas de livros etc. Tem uma boa quantidade de obras de pinturas. Quanto as esculturas nos anos 80 e 90 fazia as peças em argila e levava para uma pedreira nos arredores de São Paulo e lá eram esculpidas em pedra sob sua orientação obedecendo ao modelo original. Eram formas femininas que mostravam sensualidade.

Rogéria no Instituto da Criança Cidadã 
ensinando a pintar.
Fez vários cursos de especialização procurando aprimorar suas habilidades como artista e educadora de arte-educação entre eles : 1999 - Quarta Ciranda da Recreação, no Sesc Pompéia, em São Paulo; 1998 - Curso de Reciclagem na área das Artes Plásticas, no Sesc Pompeia, São Paulo; 1994 - Curso de Capacitação Básica para Arte Educadores -SCFBES, São Paulo; 1988 - Festival de Artes de Belo Horizonte, Curso de Pintura ; 1987 - Festival de Artes de Belo Horizonte,  curso de Circo e Pintura; 1986 - Festival de Artes de Belo Horizonte,   Oficina de Pintura e Objeto; 1985 - Curso de Especialização em Cerâmica na FAAP, São Paulo; 1985 - I Congresso Nacional de Técnica para a Arte Cerâmica , Embu, São Paulo; 1983 - Oficina de  Arte em Série no Museu de Arte Moderna da Bahia, curso de Cerâmica e Serigrafia; 1980 - Curso de Artes Cênicas, no Teatro Gamboa, Salvador, Bahia. 

                                         EXPOSIÇÕES E PRÊMIOS

Capa do Catálogo da sua primeira
 individual na Galeria Documenta,
em São Paulo e Curitiba , 1985.
Ela recebeu seis  premiações  em 1990, o Prêmio de Aquisição do VI Salão Brasileiro de Arte Fundação Mokiti Okada; 1989 - VII Salão Paulista de Arte Contemporânea - Salão Especial, convidada; 1988 - Prêmio Secretaria de Educação e Cultura - VI Salão Paulista de Arte Contemporânea; 1987 - Prêmio de Aquisição no XIX Salão Nacional de Arte de Belo Horizonte, Minas Gerais; 1986- Prêmio Menção Honrosa  - I Bienal ArteOeste em Presidente Prudente, em São Paulo; 1985 - Prêmio Especial com  Medalha Pietro Maria Bardi com aquisição e II Prêmio de Pintura Jovem Pirelli - MASP, em São Paulo.

Fez três exposições individuais na Galeria Documenta, em São Paulo, sendo duas na capital paulista e uma em Curitiba, no Paraná todas na Galeria Documenta. Tinha vínculo de exclusividade a primeira mostra aconteceu em 1985 chamada Buscas e Entusiasmos, e em 1990 fez outras duas, com a curadoria do crítico Olívio Tavares de Araújo.  Participou ainda de vários salões e

Ilustração de sua autoria da
capa deste livro de poesias.
coletivas. Vejamos: 1983 - Exposição Coletiva no Museu de Arte Moderna da Bahia; 1984 - Exposição Coletiva no Museu de Arte Moderna da Bahia ; 1984 - Exposição no Foyer do Teatro Castro Alves, em Salvador, Bahia; 1985 - VII Salão de Artes Plásticas de Presidente Prudente , em São Paulo; I Salão de Arte Contemporânea de Americana, São Paulo; 1985 -II Salão Pirelli Pintura Jovem, MASP, São Paulo; 1986 - IX Salão Funarte Sudeste de Belo Horizonte, Minas Gerais; 1986 - XXXIX Salão de Arte de Pernambuco, Recife, Pernambuco; 1986 - XXVII Salão Paranaense , em Curitiba, Paraná; 1986- Exposição coletiva da Galeria Tema Arte Contemporânea quando expôs esculturas, São Paulo; 1987 - III Salão de Arte de Curitiba, Paraná; 1987 -  Salão de Arte Contemporânea Paulista, São Paulo; 1988- VI Salão de Arte Contemporânea Paulista, São Paulo; I Salão Baiano de Arte, em Salvador, Bahia; 1988 - Exposição de Pintura na Chroma Galeria de Arte, em São Paulo; 1988 -Exposição 10 Artistas Funarte, São Paulo; 1989 - VII Salão Paulista de Arte Contemporânea Especial, São Paulo; 1990 - Exposição dos artistas Rogéria Mattos, Sérgio Guerini e Elizabeth Cortella no Museu de Arte do Paraná, em Curitiba;1991 - Exposição Coletiva no Museu de Arte Moderna da Bahia, Salvador; 1991 - Exposição Coletiva do Projeto Galaxy de Cultura, no MASP, São Paulo; 1993 - Exposição Luso Nipo-Brasileira no Museu de Arte Brasileira, em São Paulo, em comemoração dos 450 anos da chegada dos portugueses ao Japão; 1993 - Exposição na Galeria Documenta , Brasil Pequenos Formatos Poucas Palavras, em São Paulo;1993 - XVIII Salão de Arte de Ribeiro Preto, São Paulo; 1993 - Exposição Portugal- Japão - Mares Navegados, São Paulo ;1998 -Artista Convidada para a Exposição Uma Janela Para o Futuro do Bank of Boston, no Masp, São Paulo;1998 - V Salão de Arte Moderna da Bahia, Salvador; 1999 - V Salão UNAMA de Pequenos Formatos, São Paulo.

                                                  REFERÊNCIAS

Obra icônica "O bicho e a Selva", 
em acrílica sobre tela ,de 1985.
Escolhi dois textos emblemáticos na carreira de Rogéria Mattos. O primeiro do curador de Olívio Tavares de Araújo da exposições que fez na Galeria Documenta, de São Paulo e Curitiba, e de Wilson Rocha para a exposição de esculturas na Galeria Crhoma, também em São Paulo. Vejamos. O título do texto de Olívio "A pintura, em lua-de-mel consigo mesma" diz: "Definitivamente, a ideia de artistas brotando e criando espontaneamente como uma força natural não está na moda. Está na moda assegurar que o artista é, antes de tudo, um ser pensante, mentalmente bem articulado, que desenvolve quase a frio seu projeto, às vezes com rigor de um filósofo. Não pretendo negar que há artistas assim, e sobretudo, não negaria que todo artista é , evidentemente, um ser pensante. Mas tampouco se pode radicalizar a questão. Os mecanismos mentais do artista são muito específicos, e - para usar uma dicotomia criada pelo esteta francês Pius Servien - trabalham com o "polo lírico", das linguagens, que se opõe ao "polo científico". No polo lírico, a intuição fala mais alto que a consciência objetiva.

Instalação de pesquisa 
de cores usando piões .
Por isso, há sempre espaço para o surgimento de artistas que, à primeira vista, parece florescerem quase do nada, assim como parece criarem com afluência de um regato. Mas digo parece porque, no fundo, preparam de alguma forma seu caminho por meios essencialmente intuitivos, sincronísticos, até inconscientes para eles mesmos. Acho que é o caso , por exemplo, de Rogéria Mattos, cuja primeira individual aqui se realiza. A trajetória de Rogéria, nos últimos quatro anos, foi meteórica. Ela começou a pintar sem nenhum projeto definido, apenas para botar certas energias para fora... Coincidindo com uma certa crise pessoal, sua pintura foi um processo nitidamente catártico.

Isso se manifestou de várias formas. No descompromisso de Rogéria com tendências, com estar na moda ou fora dela. Na fabulação onírica dos primeiros trabalhos, que tinham até alguma coisa de pintura "naif". No colorido despudoramente esfuziante, que é um traço que se conserva até hoje. E até na incapacidade da própria Rogéria de avaliar o que fazia. Foi o imediato sucesso exterior que lhe forneceu essa medida. Seus primeiros quadros - literalmente - receberam logo o prêmio mais importante da exposição Pirelli de Jovem Pintura, em 1985. Daí em diante, começou a mandar para salões, foi aceita em todos , e premiada em diversos.

Obra onde ressai a explosão de cores 
sugerindo movimento contínuo.
Mas sucesso nada mudou no comportamento de Rogéria. Ela não se achou dona do espaço, nem de uma fórmula fixa a ser indefinidamente explorada. Atravessou esses quatro  anos procurando, oscilando, um pouco, entre as possibilidades que entrevê , sozinha, para o futuro de sua pintura, e as lições da própria história da pintura. Por exemplo : ao frescor dos primeiros quadros, vem-se substituindo hoje, maior consciência artesanal e intelectual, que investiga o ato de pintar. Rogéria se tornou "erudita". 
O assunto de seus quadros ( apesar das alusões figurativas dos títulos) e, obviamente , a própria pintura. Sem este ângulo, a obra de Rogéria está mais contemporânea. Mas nem por isso perdeu o que lhe confere, a meu ver, seu sabor especial: um impulso vulcânico, numa necessidade incoercível de criar, o recurso à arte - recurso imemorial, vinculado ao mais fundo da psiquê - como um apelo ao diálogo.

É cedo, ainda- pois crítica de arte não é futurologia - para saber exatamente o porvir de Rogéria, a dimensão que ela tende a adquirir como artista. Por ora, reportemo-nos a seu presente. Observemos com interesse e prazer esta explosão que vem de dentro, visceralmente energética, e que, mesmo sem estar na moda, encarna , à sua maneira, a lua-de-mel da arte da pintura consigo mesma, tão perceptível de alguns anos para cá".

Catálogo da exposição de suas
esculturas na Galeria,
Chroma, São Paulo  . 
Já Wilson Rocha escreveu sobre as esculturas de pedra. "O universo da escultura é inesgotável,como os novos níveis de criatividade numa situação inédita de vigor e originalidade que aporta com as novas culturas de juventude, de onde surgem artistas de surpreendente maturidade e energia criadora,  como é o caso da jovem escultora baiana Rogéria Mattos, que traz em seu trabalho a marca profunda de uma aguda sensibilidade voltada para a concepção da escultura enquanto linguagem privilegiada de intervenção espacial. Rogéria concentra-se na essência da própria escultura - essa dinâmica da matéria e da forma, esse ritmo entre volume e espaço aliados ao caráter intuitivo necessário na obra de arte - onde a artista estabelece o diálogo entre a pedra e a linguagem antiga da escultura.

Rogéria aborda a escultura como um clássico dos nosso dias, com uma vontade artística determinada e consciente que dá vida e energia à forma e dinamismo ao espaço, inscrevendo-se o seu trabalho entre os mais importantes que têm sido feitos nos últimos anos no Brasil no domínio da escultura em pedra. O comportamento e o tratamento da matéria sem detrimento dos valores expressivos e sígnicos, o envolvimento, o fascínio, a riqueza e penetrabilidade das superfícies volumétricas, dos flancos graciosos de suas pedras , a textura magníficam a suave frescura de pigmentação dos seus granitos e mármores, no caso, encontraram um artista capaz de lhes dar expressão na sensibilidade e integridade desta vigorosa e apaixonante escultora. O respeito pela pureza dos meios utilizados por artistas como ela não é , evidentemente, uma novidade. Esse respeito surgiu em todos os momentos da modernidade. O respeito pela pureza dos meios e, portanto, acompanhado por uma vontade claramente assumida de apresentar a obra de arte como gênese e não como produto acabado - como abertura e não como fechamento. A eficácia de cada obra advém da sua exemplaridade, não de efeitos rebuscados, nem do que possa ilustrar. A obra é ato de expressão, de conhecimento original e de liberdade de espírito na criação. "....