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sábado, 28 de janeiro de 2017

PICHADORES E GRAFITEIROS E O ESPAÇO

Ai está um exemplo da pichação que enfeia
tanto as grandes cidades.
Fico revoltado quando vejo uma cidade completamente tomada por pichações que só dizem respeito a atitude  de frustração de pessoas que invejam os que têm patrimônio. Eles não podem ver um muro pintado que chegam furtivamente nas madrugadas e picham. Não  conformados disputam entre si quem é capaz de pichar mais alto. Assim, prédios de até 10 andares são pichados. Os monumentos são preferidos pelos pichadores que também não respeitam nem os grafiteiros. Picham os grafites.
Existem grafites de qualidade e outros que são verdadeiras porcarias . Muitos não merecem espaço algum. São violentos, mal feitos, grosseiros ou fazem apologia de ditadores ou de ideologias carcomidas pelo tempo,  a exemplo de um  em São Paulo que trazia  o rosto do Chaves, da Venezuela. 
O grafite é uma arte efêmera que ocupa um espaço público ou privado e permanece ali enquanto o proprietário permitir ou mesmo o gestor público. Ninguém é dono do espaço pelo simples fato de estar ali um grafite de sua autoria ou porque chegou primeiro. Não é um jogo ganho. Simplesmente, o grafite está sujeito às intempéries, e também a ação de pessoas que não gostam e não querem aquelas figuras, algumas vezes horrorosas, que contribuem para a poluição visual que enfrentam as grandes cidades.
Sou daqueles que acham que o grafite bom deve ser documentado, fotografado e filmado para que fique registrado e até guardado num museu para ser mostrado quando bem convier. Mas, não sou a favor de sua perenidade nas ruas, porque esta não é a função da arte efêmera. O mesmo acontece com as performances, hoje, tão comuns nos salões, galerias e bienais.
Noto que existe um egocentrismo daqueles que fazem grafite a ponto de  considerar sua obra intocável. Não é, e não deve ser. Deve haver sempre uma rotatividade para que outros grafiteiros possam mostrar sua arte naquele lugar. Esta coisa de lugar marcado está errado, é um contra-senso porque o espaço é público, portanto, pertence a todos. E, se o proprietário do muro quiser mudar o grafite, apoio totalmente porque o espaço é dele e cede a quem quiser.
Kids  belo grafite do Eduardo Kobra,que merece
 ser fotografado e filmado para sua preservação.

Sei que existe muita diferença entre pichação e grafite. A pichação apresenta rabiscos sujando muros e fachadas de prédios, até monumentos importantes  com palavras incompreensíveis ou de protesto. Existe uma disputa entre verdadeiras gangs para ver quem picha mais alto e eles marcam territórios.
Já o grafite tem um cunho artístico, e atualmente vários grafiteiros já expõem em museus e galerias em todo o mundo. Esta arte de rua deve ser fotografada e filmada para ser preservada, porque  está sujeita a se deteriorar com a ação do sol, das chuvas, e também de pessoas que por alguma razão resolvem deixar ali a sua marca ou mesmo ser danificada por pichadores.




quinta-feira, 19 de janeiro de 2017

MANOEL BOMFIM O EMISSÁRIO DOS ORIXÁS

Manoel Bomfim na sua exposição na galeria da
Federação do Comércio
Quero registrar mais uma vez a obra de um dos

mais tradicionais artistas de origem popular de nossa Bahia. Trata-se de Manoel Bomfim que faleceu no dia 19 de março do ano passado , e está enterrado no Cemitério Bosque da Paz, no bairro de Nova Brasília, e poucas pessoas tiveram conhecimento do seu passamento.
Bomfim era um negro típico da Bahia, ligado ao candomblé, morador antigo do bairro do Rio Vermelho e depois mudou-se para um prédio na Boca do Rio.
 Tinha a conversa fácil e agradável , além de sua risada inconfundível, dando uma  aparência que era feliz eternamente. Gostava de falar de seus trabalhos plásticos sempre ligados a coisas do candomblé, principalmente os Orixás. Pintou,fez tapeçaria  e esculpiu centenas de Orixás que hoje estão espalhados em coleções daqui e de fora do país. Era ogã confirmado da Casa Branca,tinha portanto conhecimento e envolvimento com o mundo dos Orixás.
Esta escultura em forma de
uma telha retrata um Orixá.
Me foi presenteada pelo
saudoso Manoel Bomfim.
Trabalhou como servente na Escola de Belas Artes e foi através desta convivência com a arte e os professores e alunos  que descambou para iniciar seus primeiros passos na escultura dos Orixás. Terminou sendo professor auxiliar de Modelagem. Lembro que em novembro de 2002 ele comemorou 50 anos de arte. Estava visivelmente alegre com as exposições que iria realizar mostrando pinturas e esculturas. Era uma realização e reconhecimento de todos estes anos de muito trabalho e dificuldades. Na realidade o trabalho não veio lhe proporcionar uma vida mais confortável ou seja não lhe deu grandes vantagens financeiras.
 Sempre teve uma vida humilde com seus filhos e sua esposa Maria Augusta Gomes do Bonfim que era muito conhecida por preparar um gostosíssimo bacalhau de martelo e uma batida de limão inesquecíveis nos encontros com os colegas artistas. Numa conversa recente que tive com seu filho, e também artista João Augusto Bonfim  se queixou que não deram  a devida atenção à memória de seus pais, ambos falecidos,que eram  pessoas especias. Hoje,  João Augusto e o Manoel, filhos do mestre dos Orixás.estão formados pela Escola de Belas Artes da Ufba e trabalhando com arte.
O patriarca Manoel Bomfim - ele gostava de assinar com m, embora fosse batizado com n de Bonfim, uma homenagem ao Senhor do Bonfim - fez sua primeira exposição em 1963 na então Galeria Bazarte, de José de Almeida Castro,que ajudou muitos artistas que hoje estão ai como os líderes de mercado, sendo que muitos inclusive já faleceram.
Manoel Bomfim nasceu em 25 de maio de 1928,portanto, faleceu perto de completar 88 anos em 19 de março de 2016.Deixou um legado artístico que precisa ser estudado por algum aluno da Escola de Belas Artes através de uma tese de mestrado ou coisa que o valha mostrando esta sua trajetória de servente até professor auxiliar de Modelagem , sem esquecer que era  tapeceiro, pintor e escultor.
Lembro que em janeiro de 2003 ele estava expondo na Galeria da Casa do Comércio e fui encontrá-lo. Estava contentíssimo com a exposição  e na época reproduzi este pequeno texto de Jorge Amado que diz : "Manoel do Bonfim é um filho do povo da Bahia, cuja arte ingênua, porém verdadeira, nasce diretamente das fontes da cultura popular,e se mantém fiel às suas origens despida de artificialismos, modismos integrada nas tradições e na vida.
O caminho do artista Bonfim foi traçado por ele próprio, com seus próprios meios, com sua obstinação.Aprendeu com o povo, nas rodas de samba,nos candomblés,nas escolas de capoeira,nos carurus de Cosme e Damião, na rampa do Mercado , ao lado dos pescadores,dos barraqueiros, da gente pobre,aprendeu com os Orixás".
O festejado e saudoso escritor Jorge Amado sabia dizer em poucas linhas a essência da obra de um artista, principalmente quando se tratava de um artista que viesse do seio da cultura popular, fonte onde bebeu incansavelmente para escrever seus belos e grandiosos romances.