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terça-feira, 29 de abril de 2025

FALECEU EDVALDO ASSIS ARTISTA QUE PINTAVA A ALMA DA CIDADE

 

Edvaldo e duas obras de sua autoria.
Fiz esta foto em 2016.
Faleceu hoje o artista plástico Edvaldo Assis aos 84 anos de idade um dos melhores pintores da cena baiana, especialmente dos casarios coloniais, que pintava com maestria. Após o falecimento recente de sua esposa apresentou problemas cardíacos, e a doença evoluiu com outras complicações paralelas até o seu falecimento. Lembro dele na redação do jornal levando algumas telas para anunciar uma exposição ou mesmo vender aos diretores da empresa. Natural de Santo Amaro da Purificação, onde nasceu em 9 de agosto de 1941 e começou a pintar aos 17 anos. Edvaldo Assis é da mesma leva de Jaime Hora, e outros pintores que viviam no Centro da Cidade, e teve ateliê no Sodré, no Centro Histórico. Suas obras quase sempre eram vendidas aos comerciantes da Avenida Sete de Setembro e adjacências, e da Cidade Baixa. Também vendiam aos profissionais liberais entre eles médicos, advogados e outros que tinham escritórios e consultórios na área. Eles mesmos, na sua simplicidade levavam as obras debaixo do braço aos escritórios e outros locais de trabalho dos seus possíveis clientes. Era viúvo, teve quatro filhos. Trabalhou como gráfico, desenhista publicitário e em seguida se dedicou à sua arte.

Quando  completou 76 anos em 2016 fiz um texto falando de sua obra em seu atual ateliê no bairro da Saúde, que depois passou a dividir o espaço com seu colega e amigo Leonel Mattos. Vejamos um trecho do texto que escrevi:Estamos vivendo num mundo digital de amores e relações fluídas que se dissipam num clic de uma tela de computador ou celular. Um mundo onde as relações entre as pessoas se transformam em imagens que nem são guardadas. Elas desaparecem na "nuvem, como estão desaparecendo as amizades devido à distância, polarização de ideias e posições políticas ou sociais. Mas, longe deste mundo fervilhante e insensível gravitam outras pessoas que carregam em si aquele calor da amizade, aquela chama de criatividade, aquela calma que nos leva a pensar que ainda há salvação. Não a salvação divina, mas a salvação das coisas simples, salvação da amizade sincera, e aquela sensação e emoção quando as encontramos depois de algum tempo.

Sua visão do Solar do Unhão em óleo
sobre tela.

Este calor humano é uma característica forte neste homem simples de Santo Amaro da Purificação que constrói o seu mundo em seu imenso atelier, cheio de salões repletos de livros, quadros e esculturas. Senti que ele está deslocado do tempo e de lugar. Ao olhar os seus quadros onde retrata, dentro de sua visão pictórica impressionista a paisagem baiana, com seus casarios centenários, suas igrejas plantadas no alto dos morros, e outros prédios históricos, como o antigo e já desaparecido Mercado Modelo, Edvaldo de Assis apresenta-se como   um lutador que quer mostrar ao mundo que ele tem uma memória que precisa ser compartilhada e vivenciada por todos aqueles que se dispõem a perder um tempo, e fixar os olhos alguns minutos em uma de suas telas cheias de luz dos trópicos, o romantismo e a saudade do passado. Também pinta cenas da atualidade com a luz e a mesma intensidade de suas cores bem distribuídas.”Ler mais em reynivaldobritoartesvisuais.blogspot.com

 

segunda-feira, 28 de abril de 2025

CAETANO DIAS E CLÉO DIAS FREITAS NA MOSTRA AFRO BRASILIDADE


Artistas Caetano Dias e Cléo Dias Freitas
 com o curador da exposição Paulo 
  Herkenhoff , no Rio de Janeiro.
Os artistas baianos Caetano Dias e Cléo Dias Freitas estão participando da mostra coletiva  intitulada Afro Brasilidade, na Fundação Getúlio Vargas, na Praia de Botafogo, no Rio de Janeiro, tendo como curadores Paulo Herkenhoff e João Victor Guimarães.  Esta é segunda coletiva que a Cléo Dias Freitas , de 92 anos de idade, participa, e   Caetano Dias, seu filho, revelou estar preparando a sua primeira mostra individual “como muito carinho.” Os trabalhos dela são feitos de bordados diferenciados que atestam a sua criatividade na apresentação das figuras, composição e escolha das cores num clima de realismo fantástico.  Já Caetano Dias está apresentando uma instalação reunindo três obras que anteriormente foram expostas separadamente, e agora ele resolveu articular. São obras inspiradas na Guerra de Canudos e “na busca do protagonista em uma tríade que une Antônio Conselheiro, Xangô e Oxalá."

Um dos bordados de Cléo Dias Freitas.
A obra de Caetano Dias inclui um vídeo, três cabeças de albinos (ou três Exus Castiços de Oxalá),feitas em resina poliester , além de uma das capas da série de oito livros sobre o massacre de Canudos, no caso Os Sertões, de Euclides da Cunha, cujos textos foram criptografados com a fonte Guerra de Canudos utilizando ideogramas criados pelo artista, baseado em fotografias dos artefatos da guerra que estão expostos no Museu Histórico de Canudos. Segundo o artista tudo isto foi pensado como sendo a “linguagem dos mortos. A obra se ancora no conceito da diáspora simbólica, guiada por um paradoxo temporal: como contar a um povo morto a sua própria história?  Para ele é a partir desta pergunta que organizou a poética e o sentido do conjunto das obras expostas na FGV.

                                                             ALEGRIA IMENSA

Com seu jeito manso e cordial o artista Caetano Dias expressou que “é uma alegria imensa participar desta exposição ao lado de minha mãe com seu bordado que beira ao realismo fantástico. Ela é a mais jovem artista brasileira aos 92 anos de idade”. E continuou: “Com sua bela obra – uma pintura bordada com linhas coloridas pela vida e marcada sobre o linho preto - ela agora recebe o merecido acolhimento, enquanto também apresento a minha produção”. O nome de sua mãe é Cleonice Dias Rodrigues, mas escolheu assinar suas obras como Cléo Dias Freitas, sendo que o Freitas, é uma homenagem a sua mãe, portanto a avó do Caetano Dias. Ao lado vemos os três Oris feitos de resina de poliester. Esta é a instalação Aterramento do Ori : entre mundos.

Já a instalação Aterramento do Ori “cria um espaço de tensão e circulação simbólica ao articular uma complexa tessitura entre materiais e energia espiritual. A obra propõe uma operação estética que desloca a ênfase convencional do Olhar sobre a materialidade para o campo da memória, energia e matéria participam de um fluxo contínuo. O projeto utiliza referências

afro-diaspóricas, semióticas e espirituais para afirmar a arte contemporânea com prática do encruzilhamento e reencontro dos sentidos”. Atualmente vemos muitas manifestações artísticas voltadas para a cultura afro-brasileira, especialmente depois que o artista Emanoel Araújo criou em São Paulo o Museu Afro Brasil, e recolheu obras nos quatro cantos deste país de artistas que tinham alguma referência afro. De lá para cá houve uma valorização deste tema e passou a ser foco de grande número de artistas, principalmente aqui na Bahia. É bom salientar que aqui existem dois museus dedicados à arte afro-brasileira  o Afro-Brasileiro, da Ufba, que fica no Terreiro de Jesus, e o Museu Nacional da Cultura Afro-Brasileira- Muncab, na Rua das Vassouras, ambos localizados na região do Centro Histórico da capital baiana. Ao lado Foto 1- Curadores Paulo Herkenhoff e João Victor, e Caetano Dias. Foto 2 -Cartaz da mostra. Foto 3 -  Capa do livro Os Sertões criptografada.

 

 

 

sábado, 26 de abril de 2025

ZUARTE BUSCA A LIBERDADE E SENTIMENTO NA SUA ARTE

Zuarte trabalhando numa de suas obras.
O Zuarte é um desses artistas que vive da arte e para isto cria cenografias, figurinos, pinta, desenha, faz esculturas, objetos e ainda arranja tempo para escrever poesias. Numa linguagem mais popular dizemos que “se vira nos trinta’. Consegue uma produção rica e de qualidade, porque é um artista que está envolvido e antenado com a arte e o que está sendo produzida nos principias centros culturais do mundo , procurando sempre para fazer o melhor. Já o conhecia desde 1995 quando fez uma exposição juntamente com Ricardo Fernandes, na ACBEU, intitulada A Cozinha do Sentimento. Num freezer colocou rosas naturais e formas de bolo em formato de coração cheias de água com corantes vermelhos. Disse na ocasião que “quero, com isto, realçar e enaltecer a vida do sentimento num momento tão confuso como este, em que temos que estar no coração. Cada vez que abria o freezer  ficava emocionado.“Este trabalho merece ser refeito porque mexe com as pessoas”, falou Zuarte.

Cinco esculturas  em resina  fazem parte
do Projeto Rua, na Praça da Inglaterra.
Zuarte  homenageou  Eckenberger.
Desde criança que é envolvido com a arte. Em sua terra natal Morro do Chapéu ainda jovem sempre estava ornamentando os andores dos santos da igreja matriz nas festas da padroeira Nossa Senhora da Graça, nos festejos do Divino Espírito Santo e de São Benedito. Também montava peças de teatro e foi aí que os cenários e os figurinos passaram a lhe interessar. Os presépios de Natal, principalmente o de d. Hilda Oliveira, lhes chamavam a atenção pelos detalhes e  pela quantidade de elementos que continha. Fez o primário no Grupo Escolar Coronel Francisco Dias Coelho,  um comerciante negro de pedras preciosas que fez fortuna e fama no século XIX comercializando diamantes, esmeraldas e outras pedras preciosas, que eram garimpadas na região, e ele vendia para os franceses, holandeses e alemães. O coronel  tinha uma farmácia e o Horácio de Matos trabalhou como aprendiz e depois se tornou um dos mais famosos líderes do coronelismo no Brasil. Já adulto o Dias Coelho   lhe presenteou com a patente de coronel da Guarda Nacional. O coronel nasceu em dezembro de 1864 e faleceu em fevereiro de 1919. Voltando ao Zuarte depois de fazer o primário no Grupo Escolar Francisco Dias Coelho foi para o Colégio Nossa Senhora da Graça e fez o ginasial e em seguida o curso técnico, também em Morro do Chapéu.

                                CONHECEU A GRAVURA

As rosas e corações congelados na mostra
 de 1995, na ACBEU.
Em 1981 veio para Salvador e interessado nas artes plásticas tomou conhecimento que estava sendo ministrado um curso de Litogravura nas Oficinas do Museu de Arte Moderna da Bahia, no Solar do Unhão ministrado por Antônio Grosso, tendo o desenhista e gravador Paulo Rufino como assistente. Matriculou-se e passou a frequentar . Lembra que foi um deslumbramento, e que  conheceu várias outras técnicas de gravura. No ano seguinte fez vestibular para a Escola de Belas Artes e foi aluno de Carlos Eduardo da Rocha, Mercedes Kruschewisky, Ivo Vellame, Riolan Coutinho, Juarez Paraíso, Ailton Lima, Maria Helena Flexor e Sônia Rangel, com a qual mantém ainda um relacionamento profissional e de amizade. Formou-se em Bacharel em Artes Plásticas. Durante o curso tinha uma disciplina chamada de Integração Artística com quatro professores os quais  ministravam aulas de Teatro, Artes Plásticas, Música e Dança. Chegou a ser monitor da disciplina até ela ser retirada do currículo. Portanto, mantinha contatos com alunos e professores dessas linguagens artísticas e para ele isto foi muito importante e definitivo porque através de Sônia Rangel e Carlos Petrovich passou a se interessar mais pelo teatro, e a fazer cenografias e figurinos. Entre as peças de teatro que fez cenários e figurinos citou a Vida de Galileu, tendo como diretora Elisa Mendes; A Paixão de Cristo, com Paulo Dourado, dentre muitas outras. Durante dez anos assumiu a cenografia do Teatro Castro Alves.  Com Francisco Medeiros fez a cenografia de uma peça os Iks,  uma tribo que foi dizimada na África, inclusive escolheu como tema de sua tese de Mestrado “A Cenoplastia no Espetáculo Teatral Os Iks”.

Fotos 1 e 3 - A peça Os Iks. Foto 2-Cenário
para Balé do TCA, O Eterno Silêncio do
Começo,1999. Foto 4- Montagem do
 cenário da peça Os Iks.
O artista Zuarte entende que “o teatro tem uma integração maior com os espectadores, tudo é feito para o outro. Cada apresentação é única e o olhar do outro ajuda a modelação do espetáculo. Vemos que a grafia é o bidimensional, e a plastia   envolve a tridimensionalidade, as tecnologias novas, é outra dimensão.”  Tem poucas  pinturas em telas e a sua criatividade vai mais para os objetos. Está pintando menos e com planos de pintar cada vez mais. Diz que a cenografia lhe completa e o ocupou  muito. Mas, claro que quer desenhar e pintar com mais assiduidade. Gosta também de recolher coisas. Nos anos 90 fez uma série de carbogravuras sob a influência do amigo e conterrâneo o Joelito Modesto, que também se formou em Belas Artes, mas decidiu trilhar pelo caminho da educação. Esta técnica usa o negro fumo do papel carbono e um ferro quente. É quase uma monogravura, e o artista recorta a forma que deseja no papel carbono e com o ferro quente vai controlando onde quer mais claro ou escuro. Para conseguir mais claridade  raspa por baixo usando palha de aço com muita delicadeza. Este trabalho tem várias nuances que se apresentam e o artista tem que ter muita paciência.  Expôs uma série de carbogravuras na Bienal Internacional da Gravura. É um processo de alquimia e foi convidado para ilustrar o livro Dias Malditos, com textos organizados por Sérgio Cerviño Rivero, no ano 2004, sobre a ditadura militar. Começou a fazer as ilustrações usando o 

Zuarte  recolhe materiais e reutiliza em
suas obras. Ai usou pneus velhos para criar
esculturas que lembram discos voadores.
carbono, mas não gostou do resultado e decidiu trabalhar com a fumaça. São trabalhos abstratos que ele fez usando um candeeiro e deixava a fumaça se fixar numa folha de papel em branco e ia controlando as formas, com uma máscara recortada previamente. Depois retirava a máscara e ficava a forma que tentava controlar.  Para fotografar teve que levar cada trabalho numa caixa, porque é muito frágil. Tem uma série destas obras exposta no Museu Nacional de Brasília, e é um trabalho quase efêmero. Da fumaça foi trabalhar com pneus usados  criando objetos   que chamou de Reservas. Eram bolsas feitas de câmaras de ar de pneus cheias de água, leite e mel e tinham torneiras. Fez  uns casulos e uns bojos de pneus, e esculturas que lembram OVNIS. "Eu não escolhi isto veio acontecendo, e é o mesmo fio," segundo ele, do carbono e da fumaça porque o negro de fumo  também está nos pneus. 

                             PINTURA É LIBERDADE 

Duas  pinturas e  uma escultura onde
o gesto prevalece.
Para Zuarte a pintura “tem um gosto de liberdade, mas é sempre sofrimento." Nestas pinturas das mãos o que para ele o importante é transmitir o sentimento do gesto, do toque. Quando indaguei como fazia àquelas pinturas das mãos e dos peitos ele disse que faz o desenho, pinta, e  usa o silicone líquido passando com um pincel sobre o desenho para protege-lo. Em seguida faz outras camadas de tintas ou usa outros materiais, e o desenho fica protegido numa espécie de baixo relevo. Depois  retira o silicone e está pronta a obra.

Lembrei e lhe falei do pintor americano Keith Haring, o qual passou uma temporada em Trancoso, no sul da Bahia, e chegou a fazer um mural por lá. É que algumas obras do Zuarte lembram às de Keith. Ele disse que realmente ficou surpreso quando conheceu o trabalho do americano, mas isto aconteceu nos anos 2000, inclusive visitou uma exposição do americano em São Paulo. Reconhece que vê alguma relação na distribuição e uso do espaço. Mas, que foi apenas uma coincidência porque suas obras surgiram bem antes de conhecer os trabalhos de Keith Haring. O artista americano nasceu na Pensilvânia em 4 de maio de 1958 e faleceu de aids em Nova Iorque em 4 de maio de 1990, com apenas 31 anos de idade. Seu desejo era tornar a arte acessível a um número cada vez maior de pessoas e optou pela arte pop.

                                                   MAIS TEATRO

Esta cama idealizada pelo artista feita de 
carroceria de caminhão foi para a coletiva
Imaginário do Rei, em homenagem a Luiz 
Gonzaga. Percorreu várias capitais e a
curadoria foi de Bené Fonteles.
Aí  o Zuarte lembrou do espetáculo O Santo Inquérito  escrito pelo baiano Dias Gomes que denuncia a repressão e a tortura durante a ditadura militar. A peça é baseada na história de Branca Dias, uma vítima da Inquisição. Foi montada pela companhia do Colégio Antônio Vieira, dirigido por Luiz Pondé, que hoje é um famoso professor e filósofo festejado nas televisões e redes sociais. Sete atrizes faziam a Branca Dias. Zuarte queimou parcialmente o cenário da igreja e as vestes das atrizes, e no final do espetáculo vinha o Anjo da Morte todo vestido de preto e queimava rosas brancas, que são símbolos da pureza. Adiantou ainda o artista que o Pondé estudou teatro e trabalhou numa peça chamada Prometeu Acorrentado, e que ele fez o cenário e o figurino do espetáculo.

Zuarte ainda tem  Psicletas 
no seu ateliê do Rio Vermelho.
Quando saiu da Escola de Belas Artes ele e seus colegas decidiram criar o Grupo Intregue, composto por Zuarte, Júlio Maia, hoje restaurador de obras de arte, e Salviano Filho, que trabalha como diretor artístico das Ganhadeiras de Itapuã, a  artista plástica Maria Luedy, e os demais não seguiram a carreira artística. Este grupo realizou várias exposições aqui e em outras cidades do país. Disse o Zuarte que nesta época já fazia também alguns trabalhos com  Carlos Petrovich, Emília Biancardi, Elisa Mendes e Paulo Dourado. Hoje  reconhece que o teatro está passando por mais uma crise e reflete no seu próprio trabalho, porque os diretores estão usando mais uma linguagem minimalista, onde as coisas são enxutas para redução de custos. 
Tem várias bicicletas com asas da série que chamou de Psicletas.  Na Terceira Bienal da Bahia, em 2014, ele apresentou dezesseis Psicletas do projeto As Psicletas em Liberdade Desbandeirada, a convite de Maxim Malhado que aprsentou três casas de taipa. Lembrou que  na época  retrabalhava o objeto e dando outro significado,  mostrando a função transformadora da arte. As bicicletas estão enferrujadas e possuem asas que ele acrescentou . Disse ainda que "a ferrugem representa a passagem do tempo. As asas são a possibilidade para qualquer desejo, da liberdade sem fronteiras, sem bandeiras".

                                     SUA TRAJETÓRIA E EXPOSIÇÕES

Catálogo da mostra Água e Cooperação e a
obra de Zuarte feita com globos de luz cheios
de água poluída da praia do Rio Vermelho.
Seu nome é Zuarte Neiva Barbosa Júnior, filho de Zuarte Neiva   Barbosa e Eluiza Silva Barbosa. Nasceu em 14 de dezembro de 1961 na cidade de Morro do Chapéu, na Chapada Diamantina. Vemos que a arte já está incorporada no seu próprio nome de batismo. Lá permaneceu até os dezoito anos e toda sua base e fecundação artística vem do interior. Na sua rua tinha um conterrâneo que era o mestre do Reisado, e cultuava  todo aquele aparato das festas religiosas e profanas. Isto lhe possibilitou um deslumbramento artístico e quando cresceu já participou dos festejos de Nossa Senhora da Graça, do Divino Espírito Santos e de São Benedito. Para ele hoje essas festas estão mais restritas ao sentimento religioso e diminuíram de tamanho. Recorda  que os cânticos e o aparato plástico das bandeiras, dos alferes, e das esmolas onde os fiéis saíam de casa em casa recolhendo donativos. As pessoas beijavam a bandeira e davam sua contribuição. "A gente do interior sabe onde começa e termina o desenho da Cidade". Falou dos presépios incríveis, que faziam, e ele também fez presépios, só que bem menor em relação aos grandes presépios, como o da d. Hilda Oliveira, que tinha até criança brincando no telhado da casa, casamentos e outras cenas que compunham o seu rico presépio.

Obra Dis Respeito, latex
sobre tela.
O Zuarte Neiva Barbosa Júnior é mestrando pelo Programa de Pós Graduação da Escola de Teatro da Universidade Federal da Bahia, artista plástico – Universidade Federal da Bahia 1987, cenógrafo e figurinista desde meados dos anos 80. Trabalha também como diretor de arte para cinema e produções em vídeos. Fez cenários e figurinos para os espetáculos: 2023 - A Resistência Cabocla, com o Bando de Teatro Olodum ; figurinos para a ópera Dulcinéia e Trancoso, com a orquestra e coro da Neojibá ; atuou em montagens junto à Escola de Teatro da Universidade Federal da Bahia, Núcleo de Teatro do Teatro Castro Alves : A Vida de Galileu, Os Iks - cenografia premiada no Prêmio Braskem de Teatro, Hamlet, Dias de Folia ; Com o Balé do Teatro Castro Alves criou figurinos para Você Sabia? ;  A História do Soldado, Urbis in Motus, Por Favor não Aperte o Mamão, O Eterno Silêncio do Começo, Waikuru...

Junto ao Bando de Teatro Olodum e Universidade Livre do Teatro V. Velha: A Tempestade, Projeto Três e Pronto, Sonhos de uma Noite de Verão, Áfricas (figurino indicado ao Prêmio Braskem de Teatro), Bença. Criou figurinos para a o grupo musical Rumpilez e cenários para outros trabalhos como Lampião e Maria Bonita , cenografia premiada no Festival de teatro de São José do Rio Preto – SP); Bispo -

A palavra sempre está presente na obra do
Zuarte. Esta acima integrou uma série que 
mostrou na I Bienal do Recôncavo,
em São Félix, ano 2013.
cenografia premiada no Festival de Guaramiranga – CE; A Outra Tempestade , cenografia e figurinos; Lego , cenografia e figurinos; A Paixão de Cristo, Camila Baker, Joana D’Arc ,cenografia e figurinos; Murmúrios, O Amor Comeu , cenografia indicada a prêmio, Uma Vez Nada Mais , cenografia e figurinos; direção de arte e figurinos para o filme longa metragem Revoada – Prêmio de melhor figurino no 10 Encontro Nacional de Cinema e Vídeo dos Sertões, dentre outros.

Integra o Projeto RUA – Roteiro Urbano de Arte da Prefeitura de Salvador com 5 esculturas permanentes na Praça da Inglaterra. Tem realizado exposições individuais : As Psicletas em Liberdade Desbandeirada, Sim Tese para o Abraço; 1995 - A Cozinha do Sentimento, na Galeria ACBEU; Viva A Dança dos Braços, Que Peitaria é essa?) e várias coletivas. Participado de salões de arte, feito curadorias, expografias e participado como jurado em vários projetos de premiação. Ministra oficinas de Investigação da criatividade, direção de arte, cenografia, figurinos e poesia. É autor dos livros: 2021 - Vestidinho de Vastidão – Poesia - Editora P55; 1990 - Em Busca do Sol de Si – No Mimetismo abstrato de Todas as Coisas - Poesia – Sec. De Cultura do Estado da Bahia.


sábado, 19 de abril de 2025

RICARDO SENA E A ARTE DE PENSAR A FOTOGRAFIA

Ricardo num barco fotografando 
no Amazonas.
A nossa Bahia sempre despertou interesse dos fotógrafos por sua arquitetura, natureza, gente e manifestações populares. Aqui é um ambiente rico para 0s praticantes  da fotografia e cada profissional tem sua visão única e especial na hora de clicar. Além das fotografias documentais eles criam composições admiráveis enriquecendo as fotografias com sua criatividade. Um desses fotógrafos é o Ricardo Sena que deixou a engenharia pelo caminho, e há anos vive envolvido com esta arte secular. É proprietário da Galeria Alma, que fica na Rua Bartolomeu Gusmão, no bairro do Rio Vermelho, e se diz fascinado pela fotografia surrealista porque ela permite aflorar imagens do seu subconsciente e algumas de suas fotos recentes se situam entre na fronteira do surreal e do sensual. Só que ele não foca no sensual como elemento principal de suas fotos, por não ser o objetivo  que busca.Gosta de fazer excursões por este Brasil afora. Já visitou a Amazônia inúmeras vezes, a Chapada Diamantina, entre outros lugares em busca de pessoas, animais, objetos e locais para fazer novas fotos. Ele prefere trabalhar em séries, assim capta e apresenta melhor a essência daquele local e de sua gente. Ultimamente tem retornado à Amazônia  levando consigo colegas ou pessoas que se

A ribeirinha d. Rosa Soares mostra a foto 
de sua filha falecida aos 28 anos de idade.
interessam pela fotografia. Costuma cuidar de toda a logística, dos roteiros, das pessoas que vão servir de guia em cada localidade e desta forma consegue realizar um trabalho que garante melhor aproveitamento do tempo. Como estudou engenharia tem esta vibe de organização cartesiana. Quando lhe perguntei se já enfrentou alguma dificuldade em suas expedições, lembrou apenas de uma viagem por um rio da bacia Amazônica e que o motor do barco parou de vez e em seguida um dos remos quebrou. Teve a sorte, ele e seus companheiros, que depois de algumas horas de muita apreensão, apareceu um barco de pesca pirata. Os pescadores relutaram em rebocar o seu barco à deriva e disse que precisou muita conversa e grana para convencer o pessoal do barco pirata a rebocar.

                               COMPANHEIRA ANTIGA

Quatro fotos do Terno das Almas, feitas  
no Xique-Xique de Igatu, na Chapada
  Diamantina.Por iniciativa do crítico
de arte  Paulo Herkennhoff farão
parte do acervo do Museu Nacional
de Belas Artes.
Seu nome de batismo é Ricardo 
Antônio Sena da Silva e nasceu em Salvador no dia treze de fevereiro de 1973. É filho de José Carlos Barros da Silva e Maria Hortência Sena. Seu pai trabalhava numa empresa que comercializava cacau, e depois migrou para trabalhar no  ramo da construção civil, portanto é de uma família de classe média. Morou inicialmente no bairro da Barra e depois no Jardim Apipema. Fez o primário no Colégio Nossa Senhora das Mercês, na Avenida Sete de Setembro, em Salvador, Bahia. Em seguida foi fazer o ginásio e o colegial no Instituto Social da Bahia, no bairro de Ondina, o qual não existe mais, e até o prédio foi demolido, e em seu lugar estão construindo um novo empreendimento imobiliário. Fez vestibular para Engenharia Civil, na Universidade Federal da Bahia e chegou a cursar durante três anos. Também estudou e concluiu Administração na Universidade Católica de Salvador. Foi trabalhar no setor das telecomunicações e em algumas instituições financeiras tendo ido morar em São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. Mesmo assim nunca deixou a fotografia de lado. Afirmou que mesmo antes do Instagram e do Facebook a fotografia lhe acompanhava e que era um processo muito slitário o seu fazer fotográfico e do pensar fotografia. Para ele não é só fotografar porque a fotografia tem todo um arcabouço por trás que ela abraça como a literatura, a pintura, escultura e a música. “Todas estas formas de expressão eu alimento, e me expresso através da linguagem fotográfica que elegi para me expressar,” diz com satisfação Ricardo Sena. 

                                 O MERCADO

Fotos de  composições criativas num clima 
surrealista. Ele exerce  o controle da luz.
Quando falei se sobrevivia com a fotografia respondeu que a fotografia está realmente em crise, e quando  faz esta afirmação algumas pessoas envolvidas retrucam dizendo que atualmente tem muito mais gente fotografando.  É uma provocação do Ricardo Sena  aos seus interlocutores e quando as pessoas se incomodam e insistem negando a crise da fotografia, ele tem uma resposta para isto, dizendo que “se a Fotografia fosse Literatura 95% por cento ou mais dos escritores estavam escrevendo os mesmos livro; se fosse Pintura 95% dos pintores estavam pintando os mesmos quadros; se a Fotografia fosse Poesia 95% dos poetas estariam escrevendo os mesmos poemas, e se fosse Música compondo e cantando as mesmas músicas”.

Hoje as pessoas estão fazendo as mesmas fotografias, só 5% têm realmente um trabalho pensado, autoral, mais profundo e,  é aí que ele se identifica. Acha que a arte é o aprofundamento, o mergulhar. O seu processo está dentro disto. Os seus projetos são longos, tem projetos que começou em 2013 e não terminou ainda como o Pele Primária. Neste projeto que podemos chamar de série de fotografias ele trabalha fotografando pessoas com os corpos pintados  com pigmentos naturais, a exemplo da tabatinga, e outras argilas e materiais que colhe aqui, na Chapada Diamantina, na Amazônia e onde estiver trabalhando.

Ribeirinha com a ossada da cabeça de  
um grande jacaré-açu .
Quando começou a fotografar e 1990 estava apaixonado pelas fotografias de Natureza e tinha a certeza que era um fotógrafo de Natureza. Resolveu ir para a Chapada Diamantina. Revelou que na época tinha duas opções: Chapada Diamantina ou o Litoral. Achou que o Litoral era mais fácil e decidiu ir para a Chapada Diamantina porque gosta de desafios, coisas mais difíceis. Fez muitas fotos da Natureza e quando estava fotografando e acontecia  passar um homem da roça, um garimpeiro ou vaqueiro esperava eles passarem para não atrapalhar a cena que queria fotografar, para não interferir na sua fotografia. Mesmo assim de quando em vez àqueles personagens anônimos surgiam nas fotografias e “fui percebendo que eles ajudavam e enriqueciam a composição de minhas fotografias, me ajudavam a contar as histórias. Portanto, fui do macro, do grande panorama, das paisagens e aos poucos  incorporando o elemento humano." Daí resolveu se aprofundar naqueles personagens e passou a conversar e ouvir as pessoas, observando as expressões corporais, entender as suas vidas simples, seus dramas pessoais. Começou a se interessar pelo humano na fotografia. Saiu das belas paisagens e grandiosos cenários para a paisagem humana.

                                   CERTEZA DA MUDANÇA

Menino,  que lá chamam de curumim,
envolvido em plantas áquaticas , 
no Rio Negro, na Amazônia.
“O melhor da fotografia é a certeza da mudança”, disse Ricardo Sena que no começo de sua carreira tinha certeza e jurava que era um fotógrafo da Natureza. Mas, depois imaginou que era fotógrafo Documental do humano, via como se apresentava e fotografava. Uma fotografia documental clássica. Sempre mergulhando nesses universos do sertanejo, do garimpeiro, dos remanescentes de quilombos, pequenos agricultores, focando nas suas expressões humanas. Portanto, imaginava que jamais deveria compor uma imagem, tudo teria que ser natural. Aí confessa que de novo a fotografia lhe deu outra rasteira e migrou da Documental para a fotografia Performática, onde passou a compor as cenas. Chama a atenção que “isto não significa que estas fotografias Performáticas sejam maiores ou menores que as demais linguagens. Hoje fotografo como estivesse pintando uma tela. Penso na composição, penso na expressão. Para mim na arte a beleza não basta! O decorar pra mim não basta! Busco a relação do pensar e dentro disto me volto para analisar a condição humana. Vejo metaforicamente a minha fotografia como um trem com vagões. Num está a questão mitológica, noutro a sexual, depois vem a religiosa. Nas minhas fotos tem alguma reflexão. Penso na foto, procuro fazer uma dissertação dela, acompanhando a minha reflexão, o meu pensar. Apesar de estar contactado com a tecnologia não sou um fissurado em postar algo todos os dias. Estamos na era fotografia digital e como passei muitos 
Pescador jogando a tarrafa no Rio
Solimões,na Amazônia.
anos fotografando com equipamentos analógicos, penso minhas fotos analogicamente. Sem ansiedade, um fazer mais consciente. Antes usava um filme de 24 ou 36 fotos, hoje com um cartão de memória posso armazenar até 10 mil fotos.” Brincando disse: “hoje a máquina fotográfica não faz mais clic, e sim chilique.”

O fotógrafo Ricardo Sena entende que suas fotos são autobiográficas.  Citou que quando se separou fez uma série chamada Ectoplasma Ceifado, que mostra isto, mas de uma forma muito poética. Quando a mãe faleceu, e este fato triste coincidiu com a pandemia voltou para as questões existenciais e da fé, e daí fez uma série que mostra muito aquele momento que estava vivenciando. Para ele é também fundamental a parte do pensar e a estética. Cuida muito da luz. A fotografia é o seu meio de transporte, é a forma que encontrou de aumentar seu conhecimento dos lugares, de aumentar seu ciclo de relacionamento e diz ser um eterno inconformado. Gosta de desafios e se acha com seus 52 anos de idade um jovem e que tem muita energia para se dedicar à fotografia.

Imagine o isolamento e o dia a dia desta
família, no Lago de Piranhas.
Chegou à Amazônia através da leitura em 2016, antes deste foco internacional que hoje está. “Se eu tiver três vidas não vou conhecer todo aquele universo. Já fiz cinco viagens pra lá em um ano, são viagens longas e caras, os deslocamentos são grandes e cada vez que vou me fascino e me surpreendo.” Começou indo só, e hoje vai com pequenos grupos de fotógrafos, artistas e outras pessoas que se interessam pela Amazônia . Assim viabiliza suas expedições e fica mais tempo por lá. Foi a solução que encontrou e vem dando certo. Alguns desses companheiros de viagem  já voltaram duas ou  três vezes. Está preparando um livro sobre a região chamado de Amazônia Incógnita. Neste livro constarão fotos do natural, o humano e o mitológico. Pretende enfocar esta tríade e elegeu o Lago de Balbina, que é o maior paliteiro de árvores mortas do mundo. Estou falando de uma área tamanho do Estado de São Paulo onde tem milhares de árvores morreram  devido a inundação para construção da Hidroelétrica de Balbina. O Lago tem mais de três mil pequenas ilhas, na região do município de Presidente Figueiredo,no estado do Amazonas, e a usina foi construída nos anos 80. Ressalta que na área a natureza  criou um novo ecossistema e tem uma quantidade de peixes considerável, principalmente de tucunaré.

sexta-feira, 18 de abril de 2025

MURAL DE BEL BORBA NO COMPLEXO DE IRMÃ DULCE

Detalhes do mural de Bel com  8m x 3m.
O artista Bel Borba é muito conhecido dos baianos por suas incursões pelos muros da cidade com seus murais de azulejos onde ele vai compondo figuras e criando composições num ambiente visual particular contribuindo assim para que as pessoas comecem a apreciar a arte.  Ele tem feito estas incursões nos mais inusitados locais. Agora está finalizando um grande mural de 8m x 3m para o complexo das obras sociais de Irmã Dulce, no setor geriátrico do hospital, onde  ficarão os velhinhos acolhidos. Ele escolheu falar da vida, colocou uma criança, se referindo ao surgimento de uma nova vida, de uma nova existência. Um olho lembrando da onipresença. Tem uma árvore da vida, e as pessoas circulando, descendo e subindo numa escada. Tem a mulher representada. Enfim, fez algumas estrelas de cinco pontas e uma alegoria de imagens inclusive da Imaculada Conceição, que é a padroeira da congregação de irmã Dulce. Tudo integrado e envolvido por belos anjinhos barrocos.

A técnica que ele usou foi a majólica aquela trazida pelos mouros quando invadiram Península Ibérica, a Sicília, Malta e parte da França. Isto ocorreu na Idade Média. Eram povos oriundos do Norte da África e praticantes do islã entre os quais marroquinos, argelinos, mauritanos e do Saara Ocidental.  Quando da reconstrução de Lisboa depois do terremoto que dizimou milhares de habitantes e destruiu quase completamente a cidade o Marquês de Pombal reconstruiu, e os azulejos voltaram usando esta técnica, e foi batizado de azulejos no estilo pombalino, como os que estão no Convento do São Francisco, em Salvador.

O artista Bel Borba levou quatro meses para confeccionar o mural. Ele adquiriu os azulejos em São Paulo ,e ao chegarem esmaltou todas as pedras, uma por uma e construiu um cavalete de seis metros para pintar as pedras. Numerou e depois levou ao forno para uma queima, que exigiu  quarenta e oito fornadas. Cada queima tinha três metros de azulejos. Depois deixou para resfriar e em seguida com uso de argamassa foi colocando obedecendo a numeração preestabelecida. Foram usadas 1008 pedras de azulejos de 15cm x 15cm. Um empresário ajudou a financiar a obra e fez a doação a instituição.


sábado, 12 de abril de 2025

CÉLIA MALLETT E SUA PASSAGEM PARA O CONTEMPORÂNEO

Célia Mallett pintando no ateliê.
A Célia Mallett é uma artista visual conhecida nos meios culturais baianos onde sempre está presente participando ou visitando exposições de seus colegas e amigos. Ela  desenvolveu sua produção artística “numa relação estreita com a escrita: a linha, o gesto, a exposição da individualidade, o peso da veracidade contido num “ponto branco”. Com fortes pinceladas se expressava. Também passou pelo abstracionismo, portanto, se distanciando do aprendizado na Inglaterra onde aprendeu a desenhar a figura humana, paisagens e objetos. Assim o figurativo foi desaparecendo em meio aos gestos e outros elementos que compõem suas obras gestuais e abstratas. É conhecida também por sua arte artesanal com seus bordados, lembranças da infância quando seus ancestrais gostavam de bordar para matar o tempo . É licenciada em  Filosofia pela Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas e bacharela em Artes Plásticas em Pintura e Desenho pela Escola de Belas Artes, pela Universidade Federal da Bahia, concluindo o Mestrado em Artes Visuais. Foi professora substituta na EBA de Desenho I, II, III, Modelo ao Vivo, Teoria e Técnica de Pintura e Composição Decorativa I. Vem apresentando trabalhos em exposições individuais e coletivas desde 1989. Seu nome de batismo é Célia Maria Baldas  e nasceu em Salvador no dia vinte e seis de outubro de 1937. É filha de Roberto Baldas e Joana Martins Baldas. Fez parte do primário em Salvador e em seguida foram morar em São Gonçalo dos Campos, interior da Bahia. Estudou no Grupo Escolar Antônio Carlos Pedreira, sendo aluna da professora Theonila da Silva Correa, que também foi professora de Emanoel Araújo, que vem a ser a mãe da artista Yedamaria. Voltaram para Salvador e estudou no Colégio Nossa Senhora da Salete, nos Barris , e no Colégio Severino Vieira, que fica no bairro de Nazaré. Em seguida se transferiu para o Colégio Central da Bahia.  Fez vestibular para Licenciatura de Psicologia e Filosofia na
Estudos a óleo sobre compensado feitos 
durante seu aprendizado na Inglaterra.
Universidade Federal da Bahia e trabalhava no Banco Nacional de Minas Gerais, que ficava na Praça da Inglaterra, no bairro do Comércio. Era recepcionista e lembra da farda das recepcionistas que era de cor verde oliva, camisa branca, sapatos pretos fechados e meias brancas. Na época o banco atendia aos estivadores do Porto de Salvador e lembra que era muito movimentado. Trabalhou ainda na Cesmel com o empresário Ulisses Barbosa Filho, que foi inclusive Presidente da Federação da Indústria da Bahia; e com o filho do ex-governador Landulfo Alves na Empreendimentos da Bahia, onde Antônio Luís Alves de Almeida coordenou importantes projetos como do Centro Industrial de Aratu, da Sibra, Frigoríficos da Bahia outros para depois serem financiados através a SUDENE. Ela classifica que este  trabalho onde exercia a função de secretária de projetos como o mais importante e que foi uma experiência enriquecedora.

Desenhos em bico de pena, crayon e
carvão  com modelos vivos.
Uma curiosidade é que ele era esposo da famosa artista americana Betty King de Almeida, a Betty King, pintora e escultora que chegou ao Brasil em 1958, fixando-se em Salvador até 1966. Tenho uma passagem interessante com Betty King. Estava na redação no jornal num certo dia de julho de 1980 durante à noite quando recebi um telefonema que ela estava em Salvador, numa casa do bairro de Amaralina, e gostaria de conversar sobre seus últimos trabalhos. Lá fui eu e o fotógrafo Arestides Baptista. Escrevi um texto com o título “Betty King: A Família como Referencial”, foi publicado  em vinte e cinco de julho de 1980, no jornal A Tarde e está  no blog Artes Visuais, é só colocar em Pesquisar. Esta exposição de Betty King foi na galeria  ACBEU, no Corredor da Vitória, em Salvador.

Voltando para a  conversa com Célia Mallett ela me disse que já tinha três filhos do seu casamento   com o inglês Henry John Mallett o qual foi transferido para Londres pela empresa Corrêa Ribeiro S.A. Comércio e Indústria. A empresa foi fundada em 1926 com o objetivo de exportação de produtos primários dentre os quais se destacavam cacau em bagas e café. Lá ficaram durante seis anos, enquanto seu esposo trabalhava em Londres envolvido com o seu trabalho de acompanhar de perto a cotação do cacau na bolsa de Londres e de outros afazeres ligados à comercialização dos produtos que a empresa exportava. O local onde moravam distava de Londres apenas vinte minutos de trem.  Depois de matricular  seus filhos na escola decidiu procurar algo para fazer. Foi quando a proprietária do apartamento onde moravam sugeriu se matricular numa instituição que oferecia vários cursos para adultos. Célia Mallett se matriculou na Escola Sir John Cass, da Politécnica de Londres. Lá aprendeu as principais técnicas de Desenho e Pintura, inclusive com modelo  vivo. Um detalhe que a artista lembrou foi que a professora de pintura só trabalhava com tinta a óleo, não usava acrílica . Ao retornar para Salvador esteve com a professora e artista Ana Maria Villar que lhe indicou procurar Maria Adair que estava ministrando um curso de extensão na Escola de Belas Artes. Se inscreveu no curso e em seguida decidiu prosseguir seus estudos em artes visuais.

Obras contemporâneas que mostram o
talento versátil da artista.

Também já trabalhou com Mário Cravo Jr e Renato Ferraz quando o museu estava iniciando. Não era ainda o Museu de Arte Moderna. É  conhecida na arte artesanal por executar intervenções nas tramas de antigos bordados, uma lembrança de sua infância. Quando lhe perguntei se chamava de bordados ou abordados ela disse que nunca tinha pensado nisto, mas gostou de bordados abordados. São bordados que ela desfaz uma trama pré-estabelecida e  “ recria uma nova que diz mais de você, que fala da sua vontade em superar o que está estabelecido, criar e recriar. Emprestando um novo significado , a vontade, o desejo de expressão.” Me falou ainda das rodilhas, inclusive fez uma escultura de rodilhas. Quando lhe falei da origem africana das rodilhas onde as mulheres sempre utilizam para carregar cestas, feixes de lenha e todo tipo de objetos sobre as suas cabeças, ela disse que a ideia das rodilhas veio bem diferente. Certa vez estava pensando em vários problemas pessoais, e nos de fora de outras pessoas, parentes e conhecidas aí imaginou que sua cabeça era uma verdadeira rodilha amparando tantos problemas. Daí passou a fazer as rodilhas, inclusive nas pinturas.

                                                         REFERÊNCIAS


Em 1990 o professor Herbert Magalhães reproduziu as palavras de Ailton Lima sobre uma exposição de alunos da Escola de Belas Artes entre os quais estava Célia Mallett.  “Sobre Célia Mallett, quem melhor a descreve é Ailton Lima, que inclusive lhe passou conhecimentos e muito a incentivou. Diz ter tido a honra de assistir ao nascimento dessa artista: "O que era semente tornou-se para ela uma constante busca intencional. Sua evolução como artista é uma consequência da seriedade com que encara sua permanência no elenco das artes plásticas”.

 Bordado que expôs na mostra - 50 Anos
 de Arte na Bahia.
"A Afirmação No Gesto,  essa é
a exposição da artista plástica Célia Mallett, na Galeria ACBEU em 12 de maio de 1997 e foi publicado no jornal A Tarde. “Com formação em Filosofia e Artes Plásticas, incluindo curso de especialização na Inglaterra, Célia Mallett tem no currículo dezenas de exposições coletivas e individuais, algumas delas realizadas na própria Galeria ACBEU. Apaixonada pelo estudo da gestualidade e pela perspectiva de traduzi-la em arte, a artista há algum tempo vem se dedicando a uma linha de trabalho que tem como referência ponto de partida o universo da caligrafia. Ela explica que no princípio o uso da caligrafia como referência para a criação de trabalhos abstratos surgiu quase que por acaso, pelo fato de representar uma das mais fortes marcas de individualidade do homem. “Sempre me interessei muito pelo prazer contido nos gestos, e a escrita, traduzida pela caligrafia, é um dos gestos mais individuais que conhecemos. Comecei trabalhando com curvas e retas, isso foi se ampliando e fugindo cada vez mais do figurativo", explica ela. Outro aspecto do seu trabalho é que, apesar de usar quase sempre os tons terrosos aliados aos azuis e verdes, tudo em acrílica sobre tela, ela nunca se preocupa com modo de aplicá-los, de forma que o resultado estético e plástico de seu trabalho é ímpar e não se presta a qualquer tentativa de rotulação.”

                                          EXPOSIÇÕES

Catálogos de algumas de suas exposições.
Entre as exposições : 2023 - 2 de Julho, A Independência do Brasil na Bahia, na Galeria Cañizares – Coletiva – Salvador-Ba; 2017 - Olhares para Matilde - 90 Anos de Vida, Galeria EBEC, Salvador-Ba; 2016 - A Produção da Mulher na Contemporaneidade, no MAB – coletiva – Salvador-Ba; 2015 - Circuito Arte e Moda- Salvador Shopping – Salvador-Ba; 2014 -Coleção Matilde Matos - Palacete das Artes – Salvador-Ba; Exposição Circuito das Artes- Aliança Francesa – Salvador-Ba; 2013 - 50 Anos de Arte na Bahia na Caixa Cultural – Salvador-Ba – coletiva 2012- Oferenda à Iemanjá - Ateliê Leonel Mattos – Salvador-Ba;  2011 - Oferenda a Yemanjá - Artistas 100 nomes, Salvador-Ba ;  2010 - Circuito das Artes no Museu Rodin – coletiva – Salvador-Ba; Colóquio Franco Brasileiro - Coletiva - Escola de Belas Arte – Salvador-Ba; 2009 - Doce de Santo, Galeria ACBEU- Salvador-Ba;  Mulheres em Movimento 2 - Galeria Cañizares -Salvador-Ba;  2007 - Circuitos das Artes, na Galeria Aliança Francesa – Afetos Roubados - coletiva – Salvador-Ba Caixa Cultural Salvador, "Espacio Cotidiano. Espacio de Supervivencia" - Museu de Arte Contemporânea Raimundo de Oliveira -Feira de Santana – Bahia; 2006 - "Ruínas", Intervenção - Fábrica de Cristais Fratelli Vita -Salvador; 2005- "Ora pro nobis " Instalação - Conjunto Cultural da Caixa – Salvador-Ba; 2003 - "Nós Mulheres!", EBEC Galeria de Arte – Salvador-Ba; 2002 - "ART FOR SALE" - Galeria ACBEU – Salvador-Ba; + 100 Artistas Plásticos da Bahia, Museu de Arte Sacra – Salvador-Ba; 2001 -Antônio! Tempo, Amor & Tradição"- Centro de Memória e Cultural dos Correios, Salvador-Ba; 1999 - “Tenho Uma Rima Solta Dentro de Mim"- Galeria ACBEU, Salvador-Ba; 1997 - Reeducação do Olhar- Museu de Arqueologia e Etnologia Salvador-Ba; Festival de Artes do Recôncavo"-
Célia Mallett na mostra  A Afirmação
 no Gesto.

Fundação Museu Hansen Bahia - Cachoeira - Bahia 1996- 2º Festival de Artes Visuais do Pelourinho - "Pinte no Pelô". SEBRAE- Salvador-Ba; “Orixás", Receptivo do ABAV - Aeroporto Internacional Dois de Julho; Ambientação da Sala de Carteado" Casa Cor - Bahia – Salvador-Ba; 1995 - "Afirmação no Gesto"- Galeria ACBEU – Salvador-Ba; 1992 - "Interpretando a América 2"- Galeria ACBEU – Salvador-Ba; 1990 - Interpretando a América 1"- Galeria ACBEU – Salvador-Ba; Caminhos" - Galeria ACBEU; - Salvador-Ba; "Técnica Mista'" Galeria Cañizares–Salvador-Ba. Participação em Salões e Bienais:Em 2008 -IX Bienal do Recôncavo - Centro Cultural Dannemann - São Felix – Bahia; 2006 -VIII Bienal do Recôncavo - Centro Cultural Dannemann - São Felix – Bahia; 1991 - I Bienal do Recôncavo - Centro Cultural Dannemann - São Felix - Bahia.Premiações1990 -1° Lugar - Categoria Pintura s/ tela, 27ª Feira de Arte; Menções Bibliográficas: +100 Artistas Plásticos da Bahia-Salvador: Prova do Artista; 2001 - 50 Anos de Arte na Bahia -Matilde Matos, 2011- Escola de Belas Artes UFBA, Salvador-Ba.