JORNAL A TARDE,SALVADOR, SEGUNDA-FEIRA, 29 DE AGOSTO DE 1988
18 DO PASCOAL VALORIZA A PARTE
ANTIGA DE SALVADOR
Particularmente
fico muito contente quando encontro alguém que diz com a voz vibrante que mora
no Centro Histórico do Salvador! É o caso de Eckenberger e da minha amiga
Eulampia com o seu Wolfgang, que residem no Carmo. Eles sabem valorizar a
história e a própria beleza plástica daquele conjunto arquitetônico, que
precisa realmente ser salvo da sanha incontida de especuladores de
proprietários, que vivem agarrados ao âmago da propriedade privada e nada fazem
para conservar os imóveis.
É
aquela estória da posse, de ter, de saber que aquele velho pardieiro lhe
pertence, embora não lhe sirva para nada, e o deixe cair aos pedaços! E os
Moradores, que muitas vezes são inquilinos pobres, nada podem fazer para
cuidar, porque não possuem recursos. Porém este é outro papo. Os moradores
Eckenberger e Wolfgang estão noutro patamar. Eles amam este lugar. Agora, numa
extensão dessa amizade acaba de incorporar-se outra pessoa que é o Lourenço
Müller, arquiteto, já morou algum tempo na Alemanha e tem a sensibilidade
aguçada.
Eles
gostam do centro histórico e outra prova deste amor é que acabam de criar o 18
do Paschoal, um espaço dedicado à arte que abriu com uma exposição dos
integrantes do Projeto Nordeste. O espaço foi inaugurado no último dia 18 com
obras de Eckenberger, J. Cunha, César Romero, Chico Liberato, Márcia Magno,
Sônia Rangel, Murilo, Bel Borba, Antônio Brasileiro, Juarez Paraíso, Washington
Falcão e Juraci Dórea.
Eles
avisam que é um espaço lúdico, dos que vêem, dos que leem, dos que bebem,
conversam, ouvem... Dos que gostam de comer, dos que vivem. Aí me tocou de
perto. Dos que vivem. Eu que fico todos os dias até quase meia-noite na redação tocando o jornal não estou incluído porque
fico impossibilitado de frequentar e mesmo de visitar muitos eventos de
importância. Só apareço em momentos de folga, e quase sempre não encontro as
pessoas que desejava encontrar. Mas aí está o espaço, criado com muito carinho
e sabedoria na cidade velha da Bahia, no largo em homenagem a Nossa Senhora do
Pilar onde fica a Cruz do Pascoal. Está funcionando de terça a domingo das 10
horas às 22 horas, com uma bela mostra do Projeto Nordeste.
ARTISTAS
LANÇAM UM MANIFESTO
A alegria dos artistas que integram o Projeto Nordeste após concluir o mural nas ruas de Recife |
Para
sondar e preparar o terreno, Chico Liberato seguiu na frente mantendo contatos
com artistas, galeristas e pessoas envolvidas com os eventos culturais.
Tudo
não saiu conforme o estabelecido. A exposição foi realizada na Galeria
Metropolitana Aloísio Magalhães, situada na Boa Vista. Chico ficou em Olinda
cuidando dos preparativos, mantendo contatos com o pessoal da Oficina
Guaianases e do Museu de Arte Contemporânea de Recife.
Eles
sofreram do mesmo problema acontecido nas capitais que visitaram anteriormente.
Não houve a devida divulgação e com isto muita gente deixou de participar do
evento.Aliás,
este é um mal que se espalha por todo o Nordeste, inclusive aqui.
O
artista é que tem que se virar procurando os jornais, contatando com os
colunistas, porque as galerias nada fazem neste sentido, a não ser colocar um
convite num envelope e despachar pelo Correio, muitas vezes chegando ao
destinatário quando a exposição já acabou. O tratamento precisa mudar. É fácil
entrar em contato com os colunistas, que infelizmente são muitos poucos aqui em
Salvador, e em todas as capitais nordestinas.
Acreditam
os membros do Projeto Nordeste que esta foi a melhor exposição que realizaram.
Teve uma relativa repercussão entre os artistas e o público que espontaneamente
compareceu, pois a galeria pouco realizou. Eis o Manifesto do Projeto Nordeste:
"A desvalorização da Cultura Nordestina é consequência da falta de apoio aos produtores culturais, cada vez mais ausentes no processo de transformação por que passa a região.
Entregues
as distorções e azares de uma área extremamente competitiva, o artista plástico
nordestino ainda enfrenta a pobreza material e espiritual impostas pelas
estruturas oficiais de apoio institucional. Na maioria dos estados do Nordeste
constatamos uma absurda indiferença à produção de Artes Plásticas.
Sem
ter sua profissão regulamentada, o artista plástico ainda carece de um mínimo
de recursos que assegure o seu crescimento e a sua sobrevivência profissional.
Ignora-se a participação do artista nas decisões governamentais e todo um
sistema de apoio que venha a evitar o êxodo e a estagnação na área das artes
plásticas. Predomina o paternalismo nos caos de exceção e o que existe é uma
prioridade absoluta para os problemas materiais devido à dramática pobreza de grande parte do
Nordeste brasileiro, obviamente conseqüente da falta de eqüidade, de uma
legislação tributária mais justa. Para o equilíbrio desejado, torna-se
inadiável a preservação e o crescimento da Cultura Nordestina já não ameaçada
de descaracterização pelo abandono e pela imposição de participação dos meios
de comunicação do sul do país.
No
entanto, uma política de preservação e crescimento os bens culturais do
Nordeste só pode ser entendida com respeito à sua expressão histórica, étnica e
regional, integrada á sua produção contemporânea, com o pressuposto de uma
percepção crítica e universal. Torna-se necessário a criação de associações de
classe representativas e devido reforço
ás já existentes, com o objetivo de fortalecer e unificar os artistas do
Nordeste e que sirvam de base à criação futura de uma associação nordestina de
artistas profissionais.
Mais
uma vez os artistas plásticos do Nordeste estão unidos na reflexão e discussão dos seus principais
problemas, buscando possíveis soluções para um programa de trabalho capaz de
integrá-lo como cidadão e como artista no processo de transformação de sua
região e do seu país.
Diante
do exposto, os artista plásticos do Nordeste reivindicam.
DO GOVERNO FEDERAL
1º-
adotar novas alternativas para a efetiva participação dos artistas do Nordeste
no programa nacional de realizações da Funarte.
2º-
Descentralização do Salão Nacional ou formas mais objetivas de participação dos
artistas do Nordeste.
3º -Rediscutir as dotações destinadas à cultura e em especial às Artes Plásticas.
4º- Um programa especial de aplicação de fundo de promoção cultural da Lei Sarney
diretamente no Nordeste.
DO
GOVERNO ESTADUAL E MUNICIPAL
1º- Uma Bienal Nordestina
2º- Oficinas de Arte
3º- Galerias de Exposição
4º -Salões Estaduais
5º- Obrigatoriedade da implantação de Obras de Arte de pequeno e grande porte nos
edifícios e espaços públicos.
6º- Institucionalização do Concurso Público na área das Artes Plásticas.
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