JORNAL A TARDE SALVADOR,
TERÇA-FEIRA, 21 DE NOVEMBRO DE 1983
QUATRO ARTISTAS BAIANOS REUNIDOS
NA MAB GALERIA
Obra de Sante Scaldaferri
Os atistas Sante Scaldaferri, Chico Liberato, Juraci Dórea e Antônio Brasileiro estão expondo na Mab Galeria de Arte, na Pituba, cuja mostra permanecerá aberta até o dia 15 de dezembro. Quatro artistas unidos numa temática calcada no Nordeste, onde sobressaem a temática, o uso de elementos e materiais desta região sofrida. Mas, não um regionalismo caolho, um regionalismo que não enxerga o que está acontecendo aqui e no exterior. São artistas informados do movimento de arte em nosso mundo, mas que por coerência ao vivenciado optaram por um trabalho ligado a sua própria linguagem. Não ficam perambulando, como outros artistas que dão verdadeiros vôos cegos utilizando materiais e linguagens completamente destoantes das suas realidades.
Os atistas Sante Scaldaferri, Chico Liberato, Juraci Dórea e Antônio Brasileiro estão expondo na Mab Galeria de Arte, na Pituba, cuja mostra permanecerá aberta até o dia 15 de dezembro. Quatro artistas unidos numa temática calcada no Nordeste, onde sobressaem a temática, o uso de elementos e materiais desta região sofrida. Mas, não um regionalismo caolho, um regionalismo que não enxerga o que está acontecendo aqui e no exterior. São artistas informados do movimento de arte em nosso mundo, mas que por coerência ao vivenciado optaram por um trabalho ligado a sua própria linguagem. Não ficam perambulando, como outros artistas que dão verdadeiros vôos cegos utilizando materiais e linguagens completamente destoantes das suas realidades.
Não defendo uma arte regional
fechada. Seria uma contradição, já que sou professor de Comunicação e um
jornalista que trabalha há dezesseis anos, diariamente divulgando informações. O
que defendo é uma arte voltada para a própria realidade do artista, uma arte
feita com os pés no chão, isto é, sabendo o que está fazendo. Uma arte para ser
consumida em qualquer local, que tenha características de sua origem, mas com
uma linguagem universal.
O trabalho “Noites no Sertão”, de
1982, de Juraci Dórea, dá uma demonstração inclusive que até o suporte feito de
couro e pedaços de madeiras, além de inovador, é também de material comumente
usado no Nordeste. Como bom nordestino, filho da zona da caatinga, me veio á
lembrança dos couros de boi e carneiros esticados com varas, que os empregados
de meu pai colocam no sol para secar. Verdadeiros estandartes, que são uma
demonstração da sobrevivência. A morte do animal para alimentar o homem, que
expões ao sol o couro deste animal abatido para em seguida usá-lo na feitura
dos arreios, selas, sapatos e gibões que vão ser usados pelos vaqueiros na
labuta diária com outros animais na caatinga insólita. Um ciclo e uma relação
entre a vida e a morte.
O desenho de Liberato, feito em
acrílico sobre madeira, intitulado “Os Astronautas”, lembra os cordéis vendidos
nas feiras livres do Nordeste. O mandacaru e os esqueletos que se espraiam
sobre na terra quente. Chico é também um artista muito ligado á temática nordestina,
embora tenha toda uma formação que lhe permite, se quisesse, percorrer outros
caminhos.
Antônio Brasileiro, conheço desde
os tempos em que estudava Ciências Sociais, na antiga Faculdade de Filosofia,
na Avenida Joana Angélica, onde fomos colegas em algumas matérias. É verdade
que conhecia Brasileiro apenas como poeta. Tenho algumas publicações de suas
poesias. Sempre preocupado com o homem. Mas, confesso que ainda não tinha visto
nenhuma obra plástica de sua autoria. Finalmente, o Sante Scaldaferri que
costumo chamar de o artístico com cara de beato. Sobre sua obra, já falei em
outras ocasiões.
Mas aconselho ler a carta de sua
autoria que publico abaixo.
CARTA DE SANTE RESSALTA MOVIMENTO
DE ARTE NO PAÍS
"Caro Reynivaldo:
A arte neste começo de década
está mostrando que as chamadas vanguardas, já incorporadas à história da arte
com a consagração de seus artistas maiores, está dando lugar a outras novas
tendências mais atuais. Sempre foi e será assim.
A arte de hoje, devido a vários
fatores e principalmente aos meios de comunicação, conta-se por décadas. E
neste começo de década já sabe o que está ocorrendo devido às grandes
exposições internacionais e ao mercado dos países produtores de arte, onde a
liderança inconteste é dos Estados Unidos e New York tornou-se o centro
irradiador das artes visuais internacionais.
O comportamento da arte de hoje é
a não existência de nenhuma predominância, de uma tendência sobre a outra. O
que existe é a feitura das obras com os materiais tradicionais e o que está se
chamando prazer de pintar, de realização, que transparece nas cores vibrantes,
na alegria e na beleza.
Não a beleza tradicional,
evidente. É primário saber-se que também os conceitos de beleza mudam e
acompanham a evolução e contemporaneidade das linguagens.
O que está acontecendo nos países
produtores de arte é que seus artistas maiores estão cada um com a sua
linguagem, volvidos para a identidade cultural de suas respectivas regiões. Os
artistas contemporâneos latino-americanos estão cada vez mais em evidência e mostrando
a sua grande força criadora.
São Paulo, hoje, com seus grandes
museus, críticos, colecionadores, artistas e público, nos dá o grande momento
da arte brasileira. E é também com muita alegria que se constata a presença
cada vez mais envolvente da arte de outras regiões do país, não só a Bienal
que, juntamente à Panorama, dá uma clara visão da atual arte brasileira, como
também com a presença marcante de seus artistas com exposições em inúmeras
galerias.
E pode-se verificar que muitos
artistas não se submetem a uma arte colonizadora absorvida do estrangeiro. O
projeto da Funarte, “Arte nas Religiões”, elaborado a partir de vários
seminários, tem sua primeira experiência, “Circuito de Artes Plásticas no
Nordeste”, já em realização.
Atualmente estão ocorrendo em
todas as capitais dos estados do Nordeste exposições organizadas por seus
órgãos culturais. Uma comissão composta de três membros, dois eleitos pelos
artistas e um representando a Funarte, já selecionou os trabalhos que irão
formar a grande exposição itinerante por todos os estados do nordeste,
Brasília, São Paulo e Rio de Janeiro.
Na Bahia, onde o surgimento de um
grande número de novos artistas é evidente, também proporcionalmente atravessa
um período muito bom de atividades artificiais.
Os novos artistas, alguns mais
maduros e com maior experiência, vêm se destacando tanto nos meios
profissionais como em meio ao público, usando em suas obras uma linguagem
contemporânea e pessoal. Não reconhecer isto seria ridículo ou mesmo burrice.
Você mesmo Reynivaldo, com sua
bondade, já publicou, tempos atrás, que eu, dos artistas com maior experiência,
sou o mais aberto aos jovens. É que a idade física não importa. A obra é que
tem de ser jovem. Por isso estou ao lado deles na conquista dos nossos espaços.
E esses artistas já conquistaram
os seus espaços e o reconhecimento da comunidade.
Vou citar para você alguns poucos
exemplos dos muitos que existem. Exemplo muito rico vemos no painel coletivo da
Biblioteca Central da Universidade, onde grande maioria de artistas jovens ao
lado de outros mais antigos executarem a idéia de Juarez Paraíso, acolhida pelo
ex-reitor Macedo Costa.
Temos a louvar no campo da
cultura a administração do ex-reitor que, apesar da crise econômica e
financeira, nos deu boas realizações neste setor, coisa que não se via desde os
tempos magníficos do reitor Edgard Santos. A Fundação Cultural, através de sua
executiva. Olívia Barradas, vem implantando satisfatoriamente os seus projetos
culturais sem paternalismos e dentro de critérios previamente estabelecidos.
O vereador Ednaldo de Souza Santos
apresentou projeto aprovado pela Câmara de Vereadores e sancionado pelo prefeito
Manoel Castro, reconhecendo de utilidade pública a Associação de Artistas
Modernos da Bahia, que representa a classe dos artistas plásticos.
Após, o prefeito cedeu o prédio
onde funcionava a Academia Bahiana de Letras, no Terreiro de Jesus, para sede
da referida associação.
Eventos coletivos de arte como
este magnífico Sertania o Boi Misterioso, realizado por Lia Robatto e o Grupo
de Dança Viravolta, com música de Ernest Widmer e Elomar, sobre o tema do
desenho animado de longa-metragem Boi Aruá, que está sendo elaborado por Chico
Liberato, já são constantes e mostram a força da união.
Com o abraço fraterno e o
agradecimento de Sante."
SIVOLC EXPÕE NO DIA 22
Sivolc por trás de sua obra. |
O Sivolc é realmente versátil. O
próprio catálogo da exposição foi idealizado por ele aproveitando vários slides
que fez de suas obras. Colocou-os dispostos numa folha e mandou imprimir,
resultando num catálogo encontramos uma montagem com vários recortes de jornais
e fotos também recortadas de sua mulher e filhos. Tudo é disposto de tal ordem
que funcionam bem plasticamente.
Conheci o Sivolc através de um
telefonema da jornalista Ângela Guimarães, sua amiga há muitos anos. Na
conversa que mantivemos por telefone Sivolc ficou de trazer alguns quadros até
a Redação deste jornal para que pudesse examiná-los e escrever sobre sua
exposição. Poucos minutos depois estava o artista diante de mim com alguns
quadros. Já entrou na sala brincando e dando explicações sobre os trabalhos.
“Este aqui é o corpo de uma
grande modelo, que resolvi geometrizar. Veja você as linhas retas que dividem
o corpo e as curvas que o contornam”. E assim, passou a descrever os demais.
Chamei o fotógrafo para documentar os trabalhos e quando nem esperava o Sivolc
estava escondido por trás das telas procurando uma postura original. O
fotógrafo ficou um pouco embaraçado, mas ele passou a explicar o que desejava.
E, assim, foi fotografado, mostrando que a obra é mais importante que o próprio
autor.
Também, que desejava fugir
daquela postura tradicional, onde o artista fica duro diante ou ao lado de suas
obras.
Depois dessas explicações podemos
sentir um pouco que Sivolc não é um artista saído de uma prancheta de um
escritório de projetos arquitetônicos calado e quase parado. Ao contrário, sua
obra versátil e corajosa reflete justamente a sua postura, que está sempre em
busca de inovação.
Num dos recortes que colocou no
catálogo sublinhou uma frase que considero interessante: “o que os une os
homens é a produção de riquezas morais e materiais”. Diria então que Sivolc
vive em busca da união, procurando cada vez mais enriquecer os seus conhecimentos
estéticos, variando as suas atividades no campo da criação.
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