JORNAL A TARDE SALVADOR,
TERÇA-FEIRA, 28 DE NOVEMBRO DE 1983
CIRCUITO ENCERRA ETAPA E
SELECIONA 106 ARTISTAS
Trabalho em madeira e couro de Juraci Dórea. |
Obras de 106 artistas integrarão
a mostra itinerante que marca a segunda etapa do Circuito de Artes Plásticas do
Nordeste. Com a etapa das mostras estaduais seguida de um debate de avaliação,
reunindo as comissões regional e estadual, artistas e membros da Secretaria do
Circuito, foi encerrada a primeira etapa.
Prevista para o próximo ano, a
mostra itinerante, reunirá obras representativas de todos os estados
nordestinos e terá um caráter didático, permitindo uma análise das vertentes
existentes na produção artística da região.
Após visitar todas as mostras
estaduais realizadas, a Comissão Regional pôde identificar as muitas
dificuldades que afligem as artes plásticas em estados do Nordeste. A absoluta
falta de informação nos campos teóricos e visuais gera, segundo a Comissão,
“uma carência em termos de uma reflexão crítica do artista em relação ao seu
meio e à sua própria produção”. Além das mostras ocorreram debates durante o
Circuito com representantes dos artistas plásticos. Nos inúmeros debates
realizados uma constatação aflorou como a mais importante: a necessidade de uma
política nacional voltada para o Nordeste. E mais, que esta política deve
refletir, com precisão, os anseios de todos os nordestinos envolvidos com artes
plásticas a incorporar, sempre, as diretrizes apontadas pela própria região.
Vinte artistas baianos integrarão
a mostra itinerante: Antônio Brasileiro, Guache, Murilo, Bel Borba, César
Romero, Edsoleda, Emma Valle, Florival, Gustavo Uzeda, Juarez Paraíso, Juraci
Dórea, Luís Jasmin, Márcia Magno, Paulo Serra, Reinaldo Eckenberg, Sonia Rangel
e Yeda Maria.
Representarão Sergipe cinco
artistas:Henrique Luís, Jorge Luiz, José
Fernandes, Marinho Neto e Oziel Polia.
RELATÓRIO DA COMISSÃO É A
RADIOGRAFIA DO QUE SE FAZ NO NORDESTE
A arte de Francisco Liberato , óleo sobre eucatex. |
Os debates ocorridos com
representantes de associações, algumas estabelecidas e, outras em formação, e
também com artistas e profissionais, deixou patente a necessidade de uma
política cultural nacional voltada para o Nordeste.
A absoluta falta de informação,
quer no campo visual ou teórico gera uma carência em termos de uma reflexão
crítica por parte do artista em relação ao seu meio e à sua própria produção.
O material deficitário e caro
dificulta, sobremaneira, a possibilidade do fazer artístico, provocando
limitações e até equívocos nessa área específica.
É evidente que a mera constatação
desses fatos não acarreta automaticamente qualquer mudança real neste sistema.
No entanto, este documento servirá para que entidades ligadas ao setor possam
se colocar, com maior clareza, diante dos problemas que afligem a região no
sentido cultural.
TROCA DE IDÉIAS
A abertura de um espaço para a
troca de idéias, impressões, novas colocações diante da imagem, a postura
crítica diante do trabalho, sem a hegemonia dessa ou daquela tendência seria o
ideal desse circuito.
Durante o debate foi enfatizada a
necessidade de melhor estruturação das associações de artistas plásticos
profissionais existentes e da criação das mesmas nos locais onde ainda não
foram implantadas, reconhecendo-se o caráter político reivindicatório que devem
assumir, fato fundamental para a própria conscientização desse processo de
intercâmbio e articulação que constitui o circuito. O evento não deverá
convergir apenas para a exposição itinerante, mas para uma realidade mais
diversificada de atividades e iniciativas da qual a mostra deverá desempenhar
uma função deflagradora de um processo que se está iniciando, e, como tal,
demonstra provavelmente naturais limitações e carências desse mesmo processo .
As exigências, impostas pelo
mercado de arte tem um papel importante, limitando e orientando a produção
artística em detrimento da necessidade de transformações da linguagem e de
novas propostas no universo da arte.
Tais condicionamentos do mercado,
bem como as limitações de oportunidades e a carência de materiais, instalações
e equipamentos destinados à produção artística colocam em questão a própria
produção das artes plásticas e têm dificultado a compreensão do exercício
profissional como prática de liberdade.
LIBERDADE DE EXPRESSÃO
A liberdade de expressão
artística é, prioritariamente, a liberdade no sentido mais amplo, isto é,
valores voltados para a obtenção da justiça social, garantia de direitos
humanos e implantação de um processo democrático. Pois o artista á antes de
tudo um cidadão.
A nível ideológico, há uma
distância entre a concepção puramente estrutural da sociedade e o seu reflexo
na produção das artes plásticas. Se por um lado existe um relativo consentimento
no que se diz respeito às transformações sociais voltadas para uma maior
justiça social e criação de oportunidades para todos, por outro, a nível de
especifico, as idéias continuam geralmente vinculadas a um sistema onde a
liberdade seria exclusiva e endógena ao processo de criação artística.
O caráter competitivo das
premiações deve ser diluído, divulgando e implantando, nos diversos estados
participantes do circuito, concursos públicos de projetos de artes plásticas a
exemplo daqueles realizados no Estado da Bahia e recentemente, por iniciativa
do INAP, a realização do Concurso “Ivan Serpa”.
CRITÉRIOS E AVALIAÇÃO
Partindo do pressuposto que a
mostra deverá representar uma síntese da produção atual das artes plásticas na
Região Nordeste, entendeu a comissão que todos os estados participantes do
evento deveriam estar presentes na mostra itinerante, excluindo de início o
critério de excelência. Procurou entender cada exposição preparada e/ ou
indicada pelas respectivas comissões estaduais, como uma realidade própria
dentro do próprio contexto cultural, evitando estabelecer critérios de
referência a outras realidades. Dentro de cada contexto estadual, a comissão
procurou identificar as obras mais representativas da produção artística.
Obras da pintura naif Emma Valle e do artista Sante Scaldaferri. |
Considerando, por outro lado, a
realidade dos contextos culturais analisados, ficou decidido que a mostra
itinerante não deveria ser organizada por estados. Distribuir as obras
selecionadas por vertentes evitando assim os tradicionais agrupamentos de
caráter meramente geográficos, foi a postura adotada. Tal proposta imprimirá à
mostra itinerante um caráter didático e permitirá uma análise dos diversos
aspectos culturais.
Constatada a ausência de artistas
da região, de reconhecimento nacional nas mostras visitadas, a comissão
recomenda aos organizadores do circuito que se incluía no mesmo uma “sala
especial” acompanhando a mostra itinerante com obras, recentes dos artistas ora
selecionados. No caso de serem detectadas certas dificuldades para a sua
realização, preparar pelo menos um audiovisual que permitirá analisar o
conjunto de obras desses artistas, que são: Rubem Valentim, Gilvan, Samico,
João Câmara, Francisco Brenann e Miguel dos Santos, tidos como artistas
representativos do Nordeste pelas contribuições que vêm dando às vertentes de
expressão, particularmente no que concerne ao processo da produção artística
relacionada com a identidade cultural da região.
A comissão regional foi formada
por:- Hermano Guedes- representante da Paraíba; -Kate Van Scherpenberg- do
INAP, Rio de Janeiro; Pasqualino Magnavita-da Bahia.
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