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quarta-feira, 29 de julho de 2020

GALERIAS CONVIVIUM,MANOEL QUERINO E OXUMARÉ

A Rua Chile nos anos 70 era muito chic.
Vamos falar agora sobre três galerias de arte que tiveram importante papel em apresentar aos baianos a arte moderna e de vanguarda  que estava sendo produzida no sul do país e até no exterior. São as Galerias Convivium, Manoel Querino e a Oxumaré. Todas localizadas no Centro da Cidade. A Galeria Convivium na Rua Senador Costa Pinto,nº114, a Manoel Querino, na Rua Carlos Gomes e a Oxumaré na Ladeira de São Bento.  Nesta época nos anos 60 e 70 o Centro da Cidade era muito frequentado, sendo as Rua Chile e Avenida Sete de Setembro os principais núcleos do comércio varejista com lojas chics como a Sloper; Souto Maia; Adamastor ( loja masculina) ; Os Gonçalves  e a Africana (tecidos); Duas Américas e  Mesbla ( magazines) ; a Granfina ; depois surgiu a Florensilva, num prédio majestoso; a Casa Marconi , que vendia eletrodomésticos e bicicletas; a Leão de Ouro, sapataria ; as farmácias Chile e Caldas, dentre muitas outras. Enfim, era realmente os locais onde os baianos procuravam as novidades para uso pessoal ou para equipar suas residências. 
Naquela época as famílias costumavam sair de suas casas e ir andando da Avenida Sete de Setembro até a Rua Chile e vice-versa ,  no início da noite para apreciar as vitrines e depois iam saborear um sorvete na A Primavera , que ficava próxima ao Relógio de São Pedro ou na Sorveteria Cubana, que até hoje encontra-se instalada ao lado do Elevador Lacerda, na Praça Municipal, famosa por seu milk shake e os bolinhos de ovo. Os principais cinemas funcionavam na área como o Cine Guarani,  Cine Glória ( vizinho ao então prédio de A Tarde) o Cine Art , na Rua da Ajuda; o  Cinema Excelcior e Cine Liceu,da Praça da Sé e imediações e o Cine Capri, no Largo Dois de Julho. Havia um fluxo significativo de pessoas na área. É bom lembrar que a Cidade era pacata , não tinha esta violência assustadora de hoje.
 
GALERIA CONVIVIUM
A casa onde funcionou a
Galeria Convivium.
 
A Galeria Convivium foi fundada pelos irmãos Albertoni  e  Liana Bloise com o objetivo de expor artistas de vanguarda e funcionou durante menos de dois anos na Rua Senador Costa Pinto, nº 114. A Liana era uma artista que trabalhava com tecidos criando obras vanguardistas as quais provocavam muita inquietação. Depois de um período a direção artística da Galeria foi entregue ao mestre Juarez Paraíso que prosseguiu nesta disposição de expor obras  vanguardistas. 
Lembra Juarez Paraíso  a Galeria " tinha a proposta de só expor arte de vanguarda e assim operamos durante sua breve ,mas importante existência. Lá organizamos o melhor e mais avançado que existia na Bahia e no Brasil." E continua : "expomos obras de Reynaldo Eckenberger, José Maria de Souza, Francisco Liberato,  dentre outros. O pessoal do grupo da Nova Figuração Brasileira como Antônio Dias, Rubens Gerchman."
Confessa Juarez Paraíso que a Galeria faliu porque gastava muito e vendia pouco. Fizemos ainda alguns cursos e oficinas, mas nunca visando lucros.Tínhamos uma excelente estrutura arquitetônica com duas grandes salas de exposição, um bar fantástico, que foi o recanto para discussões e palestras ,mas principalmente bate papos e encontros de artistas. Lá você encontrava pessoas talentosas e bonitas da Bahia como Liana Bloise, Edsoleda Santos, Elizabeth Rothers,dentre muitas outras "
Anna Georgina , Liana Bloise e Emanoel Araújo.
Ele  disse ainda que a Galeria Convivium "foi uma parte muito importante de minha vida e atendeu de forma eficaz aos anseios de muitos artistas emergentes e de grande talento, todos lutando contra a maré, devido ao latifíndio cultural da época e a existência dos artistas oficiais de sempre".
A Liane Bloise utilizava a elementos da moda como objetos de arte, e o então Diretor do Museu de Arte de São Paulo - Masp, Pietro Maria Bardi escreveu um artigo  defendendo a integração entre a Arte e a Moda.
Quando a Galeria encerrou suas atividades , Liana Bloise me presenteou a Galeria com tudo que tinha dentro. "Mas, não foi possível continuar, porque na época eu não tinha a menor condição financeira para mantê-la. ". Não recebeu um centavo como diretor artístico da Galeria e  tinha criado no corredor na galeria como  local para expor quadros de 60x50,tamanho quase padronizado,dos artistas mais importantes das décadas de 50 e 60 , doados por eles. Depois do fechamento Juarez procurou outro  local adequado para eles, e ofereceu a coleção para a Universidade Federal da Bahia,na época através de Valentin Calderon de La Vara, braço direito do então reitor Roberto Santos. Solicitou de todos os artistas que tinham doado uma nova doação oficial dos quadros para a UFba. Apenas uma herdeira de um dos artistas não concordou respondendo que "já tinha um candidato para a sua venda".
"As vendas na Galeria Convivium eram muito fracas porque todos os que fizeram exposições lá eram inusitados e ninguém estava preocupado em vender", finalizou Juarez. Como o mercado é implacável com os que mesmo tendo talentos e objetivos nobres não conseguem cobrir seus custos e usufruir de algum lucro terminam enfrentando dificuldades e encerrando as atividades.

GALERIA QUERINO

O edifício Derick onde
funcionou a Querino.

A Galeria Manoel Querino foi fundada em 1963 pelo jornalista Renot em sociedade com alguns amigos, e foi palco de grandes exposições de artistas conhecidos nacional e até internacionalmente como em 1963  Di Cavalcanti, Djanira, Manabu Mabe, Aldemir Martins, Antônio Bandeira   , José de Dome,João Alves, Jenner Augusto , Hansen Bahia, Calasans Neto, Genaro de Carvalho , o escultor Agnaldo dos Santos  e Carlos Bastos .
Em 1964 Heitor dos Prazeres e também a primeira individual de Fernando Coelho; Carlos Scliar em 1965; em 1966 Kazuo  Wakabayashi e 1967 Franz Krajcberg .e muitos outros. 
A Galeria funcionava no térreo do edificio Derick, de propriedade de d. Veleda Lanat. Este edifício tem saída para a Avenida Sete de Setembro e a rua Carlos Gomes.
Lembra Reinaldo Marques, filho de Renot  que nesta época seu pai foi pioneiro em realizar leilões de arte em Salvador juntamente com o leiloeiro oficial Orlando Pereira, no Clube Baiano de Tenis. 
Cabia ao professor Clarival Prado Valadares, que era um dos sócios da galeria,  orientar as exposições a serem realizadas.
O artista baiano de Poções, atualmente residindo em Vitória da Conquista, Adilson Silva , 77 anos, disse que sua primeira exposição foi na Biblioteca Pública, na Praça Municipal, junto com Geraldo Rocha, já falecido, que expôs desenhos, e ele pinturas. Em seguida fez a sua primeira individual na Galeria Querino, "que era uma galeria top, bem estruturada, que nada devia às grandes galerias do Rio de Janeiro e São Paulo."
Apresentação de Mário Cravo
para a exposição de Adilson

 Na sua época apresentou exposições de importantes artistas do país. "Quem escreveu o texto me apresentando foi Mário Cravo Jr, que tinha chegado recentemente da Alemanha.Lembro que foi um sucesso de público e de vendas. Depois fui para o Rio de Janeiro onde passei 40 anos . Retornei à Vitória da Conquista  e já estou aqui há 15 anos, produzindo e bem adaptado. Hoje com a internet a gente vive conectado com o mundo inteiro de qualquer lugar. Tenho minha esposa e filha que me ajudam nesta conexão que considero muito importante para o artista ", disse Adilson Santos
Quando falei sobre a vida curta das galerias Adilson Santos lembrou de uma conversa que teve com Giuseppe Irlandini, famoso galerista carioca, que disse mais ou menos assim: para se montar uma boa galeria a pessoa tem que levar pelos menos antes uns dez anos fazendo um bom acervo e contatos com artistas e colecionadores. Senão acaba abrindo a galeria e perdendo tempo e dinheiro"
Adilson Santos em seu atelier .

O italiano-carioca  abriu  a Galeria Irlandini em 1968, que era uma das principais do sul do país. Ele nasceu em Bolzano, na Itália em 1924 e faleceu no Rio de Janeiro em 1997. Era pintor,gravador,restaurador,tapeceiro e se transformou em grande galerista. Chegou ao Brasil em 1948. Era também pintor de paisagens, marinhas, monumetos ,casarios,naturezas-mortas com flores e figuras humanas.
Voltando ao personagem Renot ele tinha muito prestígio em Salvador . Seu nome Renot  foi escolhido quando  foi trabalhar no Jornal da Bahia escrevendo uma coluna social chamada Grand Mond, sobre a sociedade baiana . Esta coluna terminou sendo transferida para o jornal Estado da Bahia, pertencente na época ao poderoso grupo de comunicação Diários Associados, de Assis Chateaubriand. Passou então a dirigir um programa na TV Itapoã ,  entrevistando personalidades, além de manter a coluna no jornal e um programa na rádio Sociedade da Bahia, todos do mesmo grupo de comunicação. 
Renot assinando uma obra
de sua autoria. Foto Google
A Galeria era um grande sucesso, com várias exposições sendo vendidas por antecipação. Tinha o apoio incondicional de Odorico Tavares, que era Diretor dos Diários Associados, na Bahia, colecionador e um grande incentivador das artes plásticas. Mesmo assim a galeria, como as demais da época, teve uma vida breve que não chegou a cinco anos de funcionamento.
Em finais dos anos 60 Renot mudou para São Paulo e, em 1972 inaugurou a Galeria Renot, nos Jardins, na Capital paulista ,  promovendo exposições importantes como as de Francisco Rebolo,Aldemir Martins,Pennacchi, José Antônio da Silva,Cícero Dias, Rubens Gerchaman, Di Cavalcanti e João Alves , dentre outros. Em 2006 Renot se aposentou e passou o trabalho com arte para seu filho Reinaldo Marques que hoje faz leilões e exposições importantes em São Paulo e outras capitais. Ele trabalhou diretamente com o pai de 1987 até o ano 2000.

                                           GALERIA OXUMARÉ

O edificio Oxumaré.
 A primeira Galeria Oxumaré funcionava no Passeio Público e foi fundada nos anos 50 pelo professor Carlos Eduardo da Rocha em parceria com Zittelman de Oliva e Manuel Cintra Monteiro. Foi a primeira galeria que expôs obras de arte moderna em Salvador, e também realizou as primeiras exposições de Carybé, Carlos Bastos, Hansen Bahia, Raimundo Oliveira e de outros artistas que surgiam no cenário artístico da Bahia.  Também foi a primeira a comercializar obras de arte profissionalmente. Os artistas Jenner Augusto, expôs em 1952, Rubem Valentin em 1954, e em 1958  Aloísio Magalhães, com apresentação de Wilson Rocha. Também expôs o artista paulista Aldo Bonadei (nascido em 1906 e faleceu em 1974 .
A Galeria promoveu o II Salão Baiano de Belas Artes, agora com participação de artistas mulheres, e  funcionou até os anos 1961.
Depois o arquiteto e colecionador Domenico Gatto, construiu o prédio Oxumaré ,  Avenida Sete de Setembro, 89, ( Ladeira de São Bento) e lá o casal Pedro Fragoso e Káttya fundou a nova Galeria Oxumaré.  
A Galeria funcionava no prédio do mesmo nome que  tem  nove andares, e 80 anos de idade , é um dos edifícios que contam a história do desenvolvimento de Salvador, tem a classificação C.
Lembra o artista Edvaldo Gato, que não é parente de Domenico Gatto, que as exposições eram muito concorridas a ponto de as instalações da galeria não comportarem o número de presentes, e as pessoas se espalhavam pelo corredor onde funcionavam algumas outras lojas, e o hotel a partir do primeiro andar. "As exposições na Oxumaré eram acontecimentos cultural e social de relevância. Muita gente comparecia porque os expositores eram artistas daqui e de fora muito qualificados."
O artista Adilson Silva participou de uma coletiva na Galeria Oxumaré , mas tem poucas lembranças do vernissage. Lembra que o convite era muito simples com os nomes dos artistas expositores, mas que as exposições eram muito concorridas. 
NE-Diante das dificuldades de fontes primárias e falta de documentação este artigo está aberto a novas contribuições .




























 

8 comentários:

  1. Teresinha Carvalho- Muito importante para nós baianos, ter conhecimento do que existiu em Salvador , que faz parte da história , contribui para o nosso conhecimento , e enriquecimento da nossa cultura geral .
    Sabemos que poucos se interessam em pesquisar , e publicar , muitas vezes por pensar que poucos vão se se interessar por este tipo de leitura . Com isso os mais jovens ficam alheios à história cultural da nossa cidade .
    Esta matéria apresentada para nós sobre as Galerias de Arte mais antigas , e os artistas plásticos da época que deixaram suas marcas para a cultura , com certeza contribuíram para a evolução , e aprimoramento das técnicas utilizadas , como também incentivaram o surgimento de novas galerias , e novos artistas .
    Sei que muitas pessoas ainda se interessam em saber sobre os grandes acontecimentos na nossa Bahia antiga , mas que hoje pouco se divulga .
    Construir uma matéria deste nível , requer muita pesquisa , e demanda muito tempo para sua construção por existir poucos registros , e dificilmente se encontra fotos da época , para ilustração , coisa que acho importante .
    Reynivaldo , continuo a dizer que este seu trabalho deve ser continuado , pois acho importante para nós leitores , e para você que continua fazendo o que gosta que é escrever . Sei que a esta altura já está pensando na próxima matéria

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  2. Fernando Freitas Pinto-Muito bom!! Esclarecedor... Uma Salvador antiga e saudosa e boas galerias para também papear com amigos sobre arte e cultura.

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  3. Murilo-Eu tinha 11 anos.Meu tio José Lessa Ribeiro, tinha a sede da construtora nesse prédio.
    Eu já apontava. Com 13 vendi um trabalho numa pequena galeria que funcionava em baixo do Grande Hotel da Barra ,no final da Ladeira da Barra ,era de Tonho Saback, irmão do tapeceiro Zito Saback ,este depois teve duas ou três galerias no Rio.Tonho coitado ,poucos anos depois morreu atropelando no terminal da França no Comércio.
    O trabalho que vendi era uma pequena tela 22x27 CM, se chamava " O RIDÍCULO DA VIDA " ,eram músicos e palhaços e executivos, o comprador um senhor do Paraná ,que estava hospedado no hotel ,chamava -se, nunca esqueci: Amauri de Lavigne Bueno

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  4. Guache - Estou lendo todas . Muito legal saber essa história das nossas galerias.

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  5. Moema Garcia - vivendo e aprendendo! Obrigada!

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  6. Beleza de texto ,Reynivaldo. E que falta faz em nossa Salvador galerias do quilate das pioneiras que criavam e mantinham um bom ambiente cultural e congregava artistas . Reconheço a dificuldade de mante-las num mundo atual descartável , volúvel e sujeito a regras de mercado ,com elevados custos financeiros.Acho que deveremos voltar ao espírito e a simplicidade das históricas galerias para sobrevivermos.

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  7. Belissima matéria amigo fico feliz em saber que meu pai Renot contribuiu com seu trabalho para o mercado de arte pioneiro em Salvador lembro pouco pois nasci em 65 mas conheço história contadas por ele de grandes artistas com por exemplo a de Antônio Bandeira que no final da sua exposição tendo que voltar para o Rio de navio pois não gostava de aviao perdeu o embarque o navio já tinha zarpado quado ele chegou no porto e não teve dúvida pegou um banquinho daquele que ficavam na rampa do mercado modelo e conseguiu alcançar o navio e embarcou. Obrigado Renyvaldo pelo seu teabalho impecável de peaquisa.bas

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