Edvaldo Assis, hoje com 75 anos, e a beleza de suas obras |
Este calor humano é uma característica forte neste homem simples de Santo Amaro da Purificação que constrói o seu mundo em seu imenso atelier, cheio de salões repletos de livros, quadros e esculturas.
Senti que ele está deslocado do tempo e de lugar. Ao olhar os seus quadros onde retrata, dentro de sua visão pictórica impressionista a paisagem baiana, com seus casarios centenários, suas igrejas plantadas no alto dos morros, e outros prédios históricos, como o antigo e já desaparecido Mercado Modelo, Edvaldo de Assis apresenta-se como um lutador que quer mostrar ao mundo que ele tem uma memória que precisa ser compartilhada e vivenciada por todos aqueles que se dispõem a perder um tempo, e fixar os olhos alguns minutos em uma de suas telas cheias de luz dos trópicos, o romantismo e a saudade do passado. Também pinta cenas da atualidade com a luz e a mesma intensidade de suas cores bem distribuídas.
Lembro quando ele chegava a redação do Jornal A Tarde com seu jeito simples e envolto numa timidez que era difícil tirar algumas palavras de sua boca. Quando perguntado mostrava uma tela que acabara de pintar, e a entrevista sempre ficava restrita por falta de maiores informações.
O antigo ( já desaparecido) Mercado Modelo e os saveiros |
A arte que Edvaldo de Assis realiza é também da mais alta importância, e nós baianos somos pródigos em descartar artistas de valor. Lembro de Ivan Bastos, Reginaldo Bonfim e o próprio Carlos Bastos, Genaro de Carvalho , já falecidos, e outros que precisam ser melhores reconhecidos, lembrados e festejados com exposições retrospectivas, catálogos e livros.
Em boa hora este livro sobre Edvaldo de Assis é lançado com ele ainda vivo e produzindo para que fique ai registrado para a História da Arte da Bahia e que futuras gerações possam conhecer quem foi este artista que pintou as ruas , os casarões, as praias e tantos outros lugares de nossa terra.
Foi complicado encontrar o Edvaldo Assis. Primeiro,tive que solicitar a alguns amigos uma pista do seu telefone. Através do seu colega Leonel Mattos soube que ele seu atelier ficava no bairro da Saúde próximo a uma molduraria. Consegui o telefone da molduraria do Edvaldo ( não é o Assis) que me passou para uma filha, que tinha o telefone do Edvaldo Assis.Assim, pude falar com ele e marcar uma data para visitá-lo antes de escrever o prefácio. Queria sentir e saber como andava o personagem sobre quem iria escrever.
O pintor Edvaldo Assis em frente ao seu atelier na Saúde |
Edvaldo de Assis embora mais velho continua o mesmo. Fala mansa, olhar triste e simples como um típico interiorano. Nascido em 1941, em Santo Amaro da Purificação, morou em Oliveira dos Campinhos e Nazaré do Jacuípe acompanhando sua avó, com quem sempre tinha uma grande afinidade.Sua mãe claro, teve também um importante papel em sua vida, e fica emocionado quando lembra que ela faleceu há poucos meses.
Este menino pobre e sensível deixava de comprar brinquedos em troca de revistas como a O Cruzeiro, Manchete, gibis, e era fã do famoso caricaturista Péricles, com seu personagem O Amigo da Onça, que tanto sucesso fez nos anos 50 e 60.
Estudou na então Escola Agrícola em São Bento das Lages, em São Francisco do Conde. Depois veio trabalhar no jornal Diário de Notícias, do grupo dos Diários Associados, de Assis Chateaubriand, no setor de distribuição.
Uma visão parcial de um dos salões do seu atelier com estante e quadros. |
Mas, a vida sempre foi muito difícil para Edvaldo Assis, que teve que largar a Escola de Belas Artes. Lembra que o mestre Réscala reclamou de suas faltas e insistiu para que não largasse o curso. Mas, a situação financeira não permitiu. Como fazia retratos a carvão para ajudar nas despesas foi observado pelo comerciante português Manoel Pinto, dono da loja Império das Louças, que ficava no Relógio de São Pedro, e iria abrir uma filial no bairro da Calçada. O português ficou tão entusiasmado com ele que foi falar com seu chefe no Diário de Notícias o José Muniz oferecendo vantagem com salário melhor. Assim lá se vai o Edvaldo Assis trabalhar na filial do Império das Louças, na Calçada, e assim a distância, difícil de ser vencida naquela época, entre a Calçada e o Centro Histórico contribuiu para seu afastamento definitivo da Escola de Belas Artes. Neste ínterim ele ainda fez uma incursão como desenhista pelos corredores da TV Itapoan, que pertencia ao grupo Diários Associados .
Depois de várias décadas pintando, sua vida ainda continua cheia de dificuldades com sua mulher doente e alguns filhos ainda dependendo do seu ofício de pintor. Também, os tempos mudaram. Os jornais impressos estão encolhendo, e aquele acolhimento que tinha de quando chegavam nas redações sendo recebido com respeito por mim, Aldo Tripodi ( recentemente falecido), e mesmo fora deste ambiente por outras pessoas que apoiavam os artistas com suas reportagens e textos críticos, a exemplo do meu amigo professor Ivo Vellame, de saudosa memória. Haviam também galeristas como Jacy Brito, de O Cavalete , no Rio Vermelho, grande incentivadora que lançou vários artistas emergentes , que que hoje estão ai vitoriosos no mercado de arte; Deraldo Lima, da Galeria 13, no Centro Histórico; Rag, na Bôca do Rio; Panorama Galeria de Arte, na Barra, fundada em 1967, por Euler de Pereira Cardoso, que realizou dezenas de exposições e contribuiu para a formação de muitos artistas, e antes a Bazarte, que ficava no Politeama,de José de Almeida Castro que se transformou numa espécie de oficina para os artistas, graças ao espírito de mecenato de seu criador; e mais alguns,que promoviam encontros e exposições desses artistas, inclusive lançando muitos iniciantes no mercado, e os apoiando até que alcançassem voos mais altos.
Guardei para o fechamento deste pequeno texto esta frase de Edvaldo Assis que resume tudo que afirmo sobre o atual ambiente de trabalho e a dificuldade de divulgação das obras desses artistas: "Minha vida difícil, continua". Se você for ouvir outros artistas vai também constatar esta dificuldade.
O conjunto do Solar do Unhão fixado na tela por este artista impregnado de baianidade. |
Guardei para o fechamento deste pequeno texto esta frase de Edvaldo Assis que resume tudo que afirmo sobre o atual ambiente de trabalho e a dificuldade de divulgação das obras desses artistas: "Minha vida difícil, continua". Se você for ouvir outros artistas vai também constatar esta dificuldade.
mkjmk,
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