JORNAL A TARDE, SALVADOR, SÁBADO 12 DE FEVEREIRO DE 1979.
RESPOSTA A UM MANIFESTO
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Alguns dos recusados explicam objetivo do Salão. |
Discordo
do Manifesto assinado pelos artistas Antônio Luiz M. Andrade e Haroldo
Cajazeiras Alves que nega a presença de vários elementos capazes de
proporcionar o surgimento de uma arte vanguardista. O que existe é o comodismo
dos artistas que não buscam as informações necessárias visando dinamizar sua
criação. O que existe é o papel carbono que podemos observar no próprio salão
dos recusados com vários trabalhos que representam cópias mal feitas da obra de
Sante Scaldaferri, Pancetti e outros. O que existe é uma arte boa e uma arte
ruim. Disto ninguém, pode fugir, e a seleção é uma coisa natural como separar o
joio do trigo. Uma questão de valorização, que certamente entra o subjetivo,
Sim, o subjetivo porque a arte é muito subjetiva.
Podemos
dizer que o trabalho artístico tem um significado quase que individualizado.
Daí a presença de alguns bons trabalhos no salão dos recusados. Confesso que
fui responsável pela recusa de alguns trabalhos.
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Este cartaz faz alusão àqueles que não concordaram com o Salão dos Recusados. |
Uma
posição que assumi consciente diante das explicações que me foram dadas no
momento em que estávamos escolhendo os artistas que seriam premiados. Os
organizadores estavam surpresos com a presença de grande número de obras
enviadas 185 artistas com 518 obras e não tinham espaço para expô-las. Primeiro
partimos para diminuir o número de trabalhos, no máximo dois, para todos os
artistas e ainda tivemos que selecionar. Os erros cometidos pelos meus colegas
de júri são também meus. Assumi e aceitei a regra do jogo como os artistas
recusados que não desconheciam que de qualquer forma haveria uma seleção ou
seja, aquela que escolheria os prêmios de aquisição. Além disto, acrescenta-se
que no momento em que você expõe um trabalho para outra pessoa, ele está
sujeito a criticas positivas ou não. A valoração sempre existirá porque é o
próprio do ser humano. A
escolha deste ou daquele trabalho para prêmio é portanto, que era de conhecimento
público e inclusive divulguei em minha coluna por várias vezes. |
Esta obra de Graça Olivieri foi recusada. |
Quanto à
arte política, engajada, reclamada pelos assinantes do manifesto, é uma questão
individual. Você pode independente da Fundação Cultural ou outro qualquer órgão
fazer uma arte política. Evidente se a Fundação não aceita a sua proposta é
porque ela joga em outro time. E se não existisse mais de um time, as coisas
andariam ainda pior...
Contestar é
fácil, bonito e estar na moda. Contesta-se tudo. É bom esta contestação porque
no final alguma coisa de positiva tem que aparecer. Continuando
no exame do Manifesto que reflete o pensamento da maioria dos recusados digo
ainda que existe uma grande contradição nele inserido. Diz o Manifesto. Somos
contra, não ao fato de haver seleção pois situar-se só é possível quando se
toma partido, o que somos contra é o tipo de seleção não objetiva, determinada
por critérios política pessoal, burocrática. Ataca o próprio salão alternativo que surgiu
em decorrência desses fatos reproduz os mesmos defeitos do salão oficial em
relação á produção artística. Ora os manifestantes são contra tudo. Contra o
próprio Salão que participam na qualidade de recusados e contra a seleção de
modo geral. Sim, porque toda seleção por mais objetiva que os juízes queiram,
estará presente uma grande parcela de subjetividade. Todo julgamento tem subjetividade.
É a questão da neutralidade axiológica, quase impossível até no laboratório,
porque no momento que você elege um tema ou escolhe um tipo de doença para
estudar e realizar pesquisas está presente a subjetividade. Portanto, o
manifesto de Andrade e Cajazeiras carece de um estudo mais profundo e levanta a
possibilidade de uma discussão mais apurada.
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Esta obra também foi recusada. |
Creio
que ele foi elaborado num momento de aborrecimento ou excitação por terem sido
recusados e por isso, está também cheio de subjetividade e valorização.
Não
estou defendendo os interesses da Fundação Cultural. Primeiro, porque não sou
empregado de tal órgão e muito menos tenho qualquer vinculação ou aceitação
passiva de sua política cultural! Discordo de muita coisa, inclusive da
presença de algumas pessoas que poderiam muito bem estar vendendo livros atrás
de um balcão. Sou independente dentro das
possibilidades de um ser humano, contra a burocracia, mas também contra
a contestação vazia. Vamos contestar mas apresentar soluções. O manifesto não
apresenta soluções e o próprio salão demonstra que os artistas aceitaram de uma
forma ou de outra o jogo da Fundação. Basta dizer que se consideram e se
rotularam recusados. Este é inclusive o rótulo para divulgação do salão, que em
tão boa hora foi acolhido pelo pessoal da Escola Baiana de Arte e Decoração.
Quanto
ao mercado de arte ele sempre esteve em mãos de burguesia. Arte sempre foi
consumida por pessoas que desfrutam dentro das comunidades de um status social
pelo menos estável.Basta
lembrarmos dos mecenas e mesmo em tempos imemoriais você encontra a arte sendo,
consumida por uma certa camada da sociedade. Esta posição de arte para o povo é
muito romântica, pelo menos de maneira que nos colocam os manifestantes. O que
é preciso é partir para divulgar a arte através de todas as formas de
comunicação. No entanto nada disto é feito. Vocês mesmo não mostraram até hoje
seus trabalhos em lugar algum.- Ah! Mas não temos apoio. Poderão responder.
Esta é a posição do Jeca Tatu de Lobato. Posição assumida por muitos artistas,
inclusive figurões que conseguiram uma situação financeira estável e paravam no
tempo. Vocês precisam é de uma ação positiva que lhes permitia levar avante o
seu trabalho, melhorando a qualidade para poder discutir, mostrar e exigir.
Caso o trabalho seja bem feito, tenha qualidade, será forçosamente aceito no
mercado. Evidente que concordo que muita gente consegue posição de destaque e
vende trabalhos de má qualidade. É a
posição social, é a amizade que levam a isto.
É
evidente que o espaço reclamado foi aberto com o I Salão de Verão. Abrir um
espaço para a arte não é como a Fundação Cultural propôs, com o Salão de Verão,
mas sim abrir um espaço para discussão aberta que venha criar novos hábitos de
produção e leitura. Os manifestantes esqueceram que estão discutindo e
contestando. Que a recua proporcionou a criação do Salão dos Recusados. Concluo
falando acerca do manifesto que carece de u aprofundamento maior e maturidade
daqueles que o subscreveram.
Considerando
que os autores do manifesto dispõem de poucas possibilidade de divulgá-lo
público por uma questão de consciência o documento na íntegra: Manifesto
Arte-Bahia- Estagnação.
Para
haver uma arte de vanguarda (crítica) é preciso haver instituições crítica
artística, salões, escola de artes aparelhadas, mercado mínimo de
operacionalidade abertas que permitam em seu interior a produção, circulação e
consumo de novas informações que ampliem o repertório de signos artísticos. Na
Bahia podemos constatar a ausência desses fatores, e também, como fator
negativo ao desenvolvimento de novos repertórios, podemos citar a preservação
de um falso patrimônio que a elite econômica se utiliza para demonstrar status
e ao mesmo tempo deter a cultura, controlando a produção ideológica.
A
divulgação da arte na Bahia só é possível quando os artistas aceitam as regras
do mercado e dos grupos que controlam as instituições.Um
fato que vem comprovar esta situação é o Salão de Verão que inicialmente tinha
como estratégia uma exposição aberta a todo e qualquer trabalho, mas de última
hora os organizadores mudaram de estratégia impondo uma seleção. Somos contra,
não ao fato de haver seleção, pois o situar-se só é possível quando se toma
partido, o que somos contra é o tipo de seleção, não objetiva, determinada por
critérios de política pessoal, burocrática, etc.
Mesmo
o salão alternativo que surgiu em decorrência desses fatos reproduz os mesmos
defeitos do salão oficial em relação à produção artística.
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Os recusados tiraram esta foto de costas. Por que? |
A
situação na arte na Bahia estagnou nas propostas da década de 60 (Pró-Art, etc.
não havendo nenhum vínculo com a produção e as discussões dos anos 70 Arte
conceitual, arte ecológica, Arte Corpo, etc. este desvinculamento da arte
baiana em relação ás novas estratégias, contra o circuito artístico, levam os
artistas a uma prática cultural alienada.
Abrir
um espaço para a arte não é como a Fundação Cultural propôs, com o Salão de
Verão, mas sim abrir um espaço para discussão aberta que venha criar novos
hábitos de produção e de leitura.
O
que se pretende neste texto é contribuir para a discussão da prática alienante
que ainda reina nas artes na Bahia, sincronizar o fazer artístico na Bahia com
os principais centros produtores e pensar formas de minar o mercado baiano. Não
podemos deixar de citar também a falta de um posicionamento ideológico dos
artistas. Enfim é necessário envenenar toda uma tradição cultural medíocre e
suas táticas.
Concluindo,
para revitalizar a estagnada produção artística baiana, è fundamental frisar
que o fazer artístico é essencialmente um fazer sobre a linguagem no interior
da estrutura social e o questionamento
deve ser neste nível. Politizar a arte e a semântica e as formas de circulação.
Antônio
Luiz M. Andrade-Haroldo Cajazeiras Alves.
Estive
pessoalmente visitando com toda a boa vontade a abertura possível, o I Salão
dos Recusados de Verão o constatei a presença de alguns trabalhos que deveriam
estar figurando no I Salão de Verão, o oficial Aliás isto eu já tinha dito duas
vezes e minha coluna. Citei nomes de alguns artistas que não deveriam estar
figurando na relação dos premiados e critiquei a falta de atenção e cuidado
profissional de artistas já conhecidos que enviaram trabalhos medíocres, além
de bons trabalhos recusados.
O Salão dos Recusados se propõe a uma mostra da produção artística da Bahia sem
prender-se a qualquer critério, aberto ao bom e ao ruim, abrindo espaço para os
novos, para a crítica e para o debate. Um salão longe da burocracia dos salões
oficiais. Esta abertura é demasiada, porque o ruim é sempre desprezado pelo
homem. Abrir espaço para a presença de uma obra sem qualidade, ruim, como
expressam os organizadores do Salão dos Recusados, não leva a nada. O trabalho
ruim deve realmente ser recusado. Não deve ser exposta ao público sob pena de
seu autor sofrer maior decepção. É preferível recusá-lo numa sala fria do que
expô-lo numa parede aos olhos de visitantes que terminam por ridicularizar o
autor.
Quanto
a alusão àqueles que não participaram do Salão dos Recusados com receio d
futuras sanções dos responsáveis pela política cultural do nosso Estado, devo
dizer, que alguns resolveram não contestar certamente porque aceitaram a
crítica e vão procurar melhorar a qualidade, para em seguida partir para uma
exposição. Alguns que estão integrando o salão dos recusados, por exemplo,
poderiam ter desistido porque não apresenta nada de positivo. Verdadeiros
borradores de tela, e cupins de madeira de lei.
Termino
afirmando, que a discussão foi aberta. Aceitei e prometo que estarei aberto diálogo. Não ao diálogo apaixonado.
Estou disposto a dialogar com seriedade.
OS
RECUSADOS:
Di
Paula, Luiz Torres, Álvaro Guimarães Pinheiro, Maso, Sumaya Mendes, Menandro
Ramos, Antônio Otávio de Araujo, Flanklin Wriz, Lau Ping Luen, Ling Kam Cheng
Lau, Belisário C. Nunes Manoel Duran, Lila Bouzas, Siloeh, Geraldo Guimarães,
Aloísio Cerqueira Campos, Carlos Bessa Magalhães, Aldo de Aquino, Henrique
Passos, Graça Costa Olivieri, Celeste Coelho, Vieira Neto, Edson Cezário,
Elinaldo Costa, Luisa Torres, Edson Batista Ramos, José F. de Souza, Ananias
Reis, Ângela Salomão e Eusvaldo Souza.
O
que houve entre a Fundação Cultural e os artistas inscritos para o Salão de Verão foi a falta de comunicação. Segundo Graça Olivieri a ideia da Fundação
era de dar oportunidade para os novos. Esta foi à proposta inclusive divulgada
por Jacyra Oswald em programas de televisão. Acredito que devido a esta
abertura prometida foi que 185 artistas procuraram a Fundação para realizar
suas inscrições. Depois a própria Fundação recuou, quando seus dirigentes
notaram que tinham sido enviados muitas obras e não poderiam expô-las todas por
falta de espaço.
Este
cartaz ao lado faz alusão àqueles que não concordaram com o Salão dos Recusados.
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