JORNAL A TARDE, SALVADOR, SÁBADO, 23 DE
DEZEMBRO DE 1978
De autor ignorado, esta paisagem,
preciosa como pintura da primeira metade do século passado entre nós,
provavelmente de mão de viajante estrangeiro pelo Brasil, nos remete a certas
paisagens de Nicolas de Taunay dos arredores do Rio. De qualquer forma, reflete
um clima idílico, numa concepção romântica de natureza, aqui projetada de forma
organizadora e acolhedora. Pertence a Pinacoteca do MASP.
Focalizando uma fazenda do interior
utilizando a cor como elemento fundamental para o estudo de luz e sombra, o
pintor compõe o quadro dividindo a paisagem em planos que se sobrepõem, em
faixas horizontais. Assim, no primeiro plano, jogando simultaneamente com luz e
sombras, vemos as figuras dos dois homens, à esquerda, como distanciados da
cena das escravas sentadas ao sol, em seus afazeres, a animar, estas figuras, o
que em verdade comporia este primeiro plano, uma cerca de mourões coberta de
vegetação e beira de estrada. O segundo plano, mais sóbrio, já representa entre
arbustos mais densos dois paiois de construção rústica. Amplamente ensolarado, o
terceiro plano destaca, á distância, a casa-grande, á esquerda, o terreiro, a
casa dos serviçais, e á direita o casario da senzala. O tratamento de
miniaturista, em factura ordenada, permite conferir a impressão de distância em
tela de tão pequenas proporções. O último plano focaliza a mata na encosta da
montanha contra o céu.
Estamos, portanto, bem distantes
das paisagens espontâneas pelo seu auto didatismo, das cenas do Rio ou da Baía
de Guanabara de Leandro Joaquim de fins do século XVIII, assim como das
paisagens que começam a aparecer nas dunas últimas décadas do século XIX entre
os discípulos da Academia Imperial de Belas Artes.
São raros, na primeira metade do
século XIX, os artistas brasileiros que fixam e interpretam o seu entorno
físico. Com a implantação da Academia impõem-se gêneros como a pintura
histórica, a de temática religiosa, ou mesmo a retratística, e a paisagem
somente começaria a ter adeptos e entusiastas no fim do século. Assim, eram
sobretudo estrangeiros, de passagem ou que aqui se radicaram, os que se
encantavam com nossa natureza, desejando retê-la, de forma documental como os
membros das missões científicas, ou interpretativa, através da pintura.
MORRE RESTAURADOR AUGUSTO VERMEHREN
O restautador de obras de arte
Augusto Vermehren, conhecido do mundo todo por introduzir modernos métodos
científicos em sua profissão morreu, aos 80 anos, segundo informou a família,
sem revelar a causa da morte.
Vermehren introduziu o uso de
microscópio, da fotografia estereoscópica e de exames com raio-x na restauração
de quadros de autoria de mestres do renascimento como Leonardo da Vinci, Rafael
Verrocchio, Ticiano e Masaccio.
Antes desses, Vermehren também
restaurou obras de Rubens, Velásquez, Vandyk e Bronzino.
ARTE DO BRASIL EM KING’S ROAD
Em King’s Road, Chelsea, uma rua
famosa por seus lançamentos de moda e pela marca da vanguarda de todos os seus
empreendimentos, está sendo apresentada uma exposição de arte com temática
brasileira. A Galeria Chenil, uma das mais bem montadas de Londres, e os
artistas são jovens, um brasileiro e outro britânico. São eles Mário Borges
Coelho de Sousa e Anthony Moorc.
Moorc já tem amplo currículo
internacional, inclusive com bolsas do Governo brasileiro. Seus quadros, de
acento moderno, são representações da paisagem e do povo do Brasil. Foram
feitos nas suas duas últimas viagens ao país.
Mário Borges é formado pela Esdi,
do Rio, Cida onde já se apresentou individualmente muitas vezes. Para a atual
mostra ele pintou em Londres, nos últimos quatro anos, mas o tema permanece
brasileiro.
São paisagens rurais e urbanas,
igrejas coloniais e formas humanas, parcialmente abstratas. O artista recorre
ás técnicas da colagem e da inserção e suas superfícies altamente elaboradas em
cartão ou madeira produzem um efeito tridimensional de grande interesse, que só
reforça a mensagem humana e religiosa dos quadros.
O Brasil que emerge desse tratamento é o de
paisagem transformada em símbolo, mas que retém sua qualidade pictórica. O
contraste entre os trabalhos dos dois artistas é dos mais estimulantes e tem o
Brasil como fator de unificação.
O LUGAR DA FOTOGRAFIA
"Colecionar fotografias é colecionar o mundo", Susan Sontag, On Photography
A fotografia, sua criação, aproveitamento, preservação e exposição um dos componentes mais estimulantes, acessíveis e amplamente discutidos do cenário artístico contemporâneo dos Estados Unidos. Após anos sem ser levada a sério, e ser revelada às alas menos visitas dos poucos museus que exibiam fotografias, este retardatário entre os gêneros visuais conquistou, nitidamente, seu lugar ao sol.
Um amplo sistema de apoio vem se
formando em torno dele, disse Renato Danese, diretor adjunto do programa de
artes visuais da Fundação Nacional para as Artes, dos EUA. As exposições em
museus, o interesse que os norte-americanos vêm demonstrando em colecionar e em investir em fotografias
históricas, estão sendo impulsionados por uma análise crítica maior da arte,
por um crescente número de livros sobre o assunto e um incremento nas posições
adotadas em importantes museus, bibliotecas e arquivos e relação á fotografia.
O interesse por esta forma
específica de arte passou a fermentar nos últimos poucos anos.
Uma série de acontecimentos
específicos levou-a a despertar a
atenção do público.
Por exemplo:
O valor comercial de material de
vinheta aumentou. Os diretores de importantes galerias começaram a
interessar-se em preservar provas fotográficas do passado e as coleções
particulares, bem como de instituições. Aumentaram.
Os jovens passaram a tomar
conhecimento desta recém-adquirida base comercial que a fotografia usufrui
atualmente. Como resultado, um número sem precedente de fotógrafos está se
dedicando à fotografia como uma atividade artística.
A fotografia está sendo submetida
a um escrutínio crítico cada vez maior e merecendo uma aclamação generalizada.
A série de artigos de Suzan Sontag relativa a esta modalidade de arte,
publicada originalmente no The New York Revlew of Books obteve grande
penetração e foi transformada em um livro, On Photography, em fins de 1977.
Foto de Ralph Gibson A Mão Encantada, 1969 |
As doações de verbas, tanto
privadas como públicas estão aumentando.
As exposições fotográficas
desenvolveram-se consideravelmente. Os museus exibiam, com certa freqüência,
coleções de fotografias mas não com a assiduidade com que fazem hoje.
Desde os dias do fotógrafo
histórico da Guerra da Secessão, Matthew Brady, e dos retratistas e
especializados em paisagens do final do século XIX até nomes como Diane Arbuse,
Richard Avedon e Lee Friedlander da era contemporânea, a fotografia tem gozado
de uma presença curiosa e esquizóide uma presença que perpetuou o desgastado
debate entre a fotografia como jornalismo e comentário social e a fotografia
como arte. Cada categoria tem tido seus defensores; hoje, entretanto, os
valores artísticos da fotografia estão merecendo um reconhecimento sem
precedente.
A presença em rápida expansão da
fotografia promete crescer ainda mais na medida em que se segue o debate, a
discussão e a reconsideração. Recentemente, uma mostra de trabalhos
contemporâneos no Museu de Arte Moderna de Nova Yorque, Espelhos e Janelas: A
fotografia Norte-Americana a partir de 1960, provocou um acalorado debate sobre
o papel da fotografia nos dias que correm como um espelho de nossa época, uma
arte intemporal vis-a-vis.
Este debate deverá aumentar
quando a exposição cumprir a sua programação de visitar sete outros museus
norte-americanos.
Também estão sendo analisados os
aspectos não-criativos do fenômeno da fotografia na década de 1970. Um simpósio
de dois dias de duração realizado na Galeria de Arte Corcoran, de Washington,
em fevereiro último, teve como tema: Fotografia: Onde Estamos.
Os participantes, que incluíam
fotógrafos, curadores, críticos e colecionadores, manifestaram opiniões sobre
os preços cada vez mais elevados das peças colecionáveis, o papel da crítica e
a fotografia como arte.
E qual a sua qualidade especial? Deve adaptar-se á
arte ou à vida? Parte de sua singularidade, sugere Renato Danese, é sua
ausência de singularidade.É tão ampla como o ambiente visual. A boa fotografia
tem sempre refletido idéias firmes sobre a arte, mesmo quando não há intenção,
uma certa integridade visual da mesma forma que reflete algo importante sobre a
vida.
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