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Edmundo Simas rindo e Reginaldo Bonfim. |
Três artistas permaneceram durante suas existências à margem das
principais galerias da época em que viveram e produziram: Reginaldo Bonfim e
Edmundo Simas e Gil Abelha, todos falecidos, que agora estão sendo homenageados com uma exposição coletiva
organizada pelo artista e galerista Washington Silva intitulada de Identidades até
o próximo 20 de agosto, no Museu Afro-Brasileiro da Universidade Federal da
Bahia, que funciona no prédio da antiga Faculdade de Medicina, no Terreiro de
Jesus. A exposição conta com obras dos homenageados Reginaldo Bonfim e Edmundo
Simas, além de Leonel Mattos, Enock Silva, Raimundo Bida, Menelaw Sete,
Francisco Santos, Chico Vieira, Samuel Gomes, Marcos Costa (spray Cabuloso),
Anunciação e Carlos Kahan. Viviam no Centro Histórico entre botequins e os
pardieiros, que não tinham qualquer conservação, até quando assumiu o
governador Antônio Carlos Magalhães que convocou uma equipe competente e
entregou a parte de pesquisa e cultural ao etnógrafo Vivaldo Costa Lima. O
Centro Histórico foi restaurado, e hoje é motivo de orgulho, embora tenha
passado por momentos de abandono por parte de alguns governadores que os
sucederam. Foi neste ambiente do Centro Histórico que estes dois artistas
talentosos viveram e produziram em condições muito difíceis, agravada pelos
temperamentos e comportamentos de ambos. Sofriam de distúrbios mentais e isto
foi um elemento importante para que houvesse uma certa discriminação, porque é
difícil viver com alguém que tenha algum problema mental. Apenas o saudosos
Deraldo Lima, da Galeria 13, que funcionava no Centro Histórico, e o RAG, que
abriu sua galeria na orla exatamente numa casa em frente ao mar, perto da
ponte, na Boca do Rio. Os dois galeristas acolhiam esta gente marginalizada e
assim eles tinham onde frequentar e muitas vezes pintar.
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Foto 1. Cartaz da mostra Identidades. Foto 2 - Leonel Mattos e Washignton Silva. Foto 3. Chico Vieira e sua obra. Foto 4 - Obra de Raimundo Bida. |
Não tive quase
aproximação com o Reginaldo Bonfim, que nasceu em Salvador no ano 1950 e faleceu aqui em 2007, mas tive uma convivência com o Edmundo
Simas, chamado de Super Boy. Era um entusiasta das histórias em quadrinhos e de
quando em vez se arvorava de ser um desses heróis retratados nas revistas que
vendiam muito nas bancas de jornais de então. Tem uma história, não sei se é verdadeira,
de que certava vez improvisou umas asas e pulou de um prédio e foi cair num monte
de areia que alguém estava utilizando na reforma ou construção. Todos se
assustaram, mas ele teria escapado ileso. Verdade ou não, o fato é que o Super
Boy seria mesmo capaz de façanhas como esta. Ele trabalhou no jornal A Tarde,
se não me engano tirando as férias de alguém. Ficou por pouco tempo devido ao
seu temperamento inquieto que logo com o passar dos dias começou a se tornar
incompatível e foi dispensado. Consta
que fez duas exposições na Biblioteca Pública em 1969 e
1971.Participou de outras mostras coletivas e até de salões. Seu nome completo era Edmundo Luiz da Silva Simas, nasceu Ubaitaba no ano de 1941, na Bahia, vindo depois pra Salvador também chegou a morar em São Paulo.
Já o Reginaldo
Bonfim tive muito pouco contato. Sabe-se que nasceu em Salvador em 1950 e veio
a falecer no ano de 2007. Gostava de pintar desde a infância e chegou a fazer
um curso livre de pintura na Escola de Belas Artes da Universidade Federal da
Bahia. Tinha uma grande facilidade em pintar, inclusive com temas e técnicas
variadas de algumas escolas de arte. Devido a sua habilidade chegou a ir ao Rio
de Janeiro para se apresentar num programa de televisão no Rio de Janeiro
mostrando a sua arte, foi quando teve uma crise nervosa e teve que retornar.
Gostava de
pintar à noite e conversando sozinho como estivesse discutindo com alguém as
cores e as formas que estava deixando ali registradas na tela ou em outro
suporte qualquer que conseguisse para expressar a sua arte. Usava um macacão
que alguns consideram sua armadura para se defender do mundo externo, bem
diferente do que vivia em suas crises de esquizofrenia. Dizem que sempre era
internado e lhe medicavam muitos remédios para controlar a doença mental.
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Gil Abelha com uma obra sua. |
O Gildásio Feliciano Costa, o Gil Abelha trabalhou algum tempo com publicidade e era um artefinalista e layoutista conhecido. "Layout é uma palavra inglesa, muitas vezes usada na forma portuguesa leiaute, que significa plano, arranjo, esquema,
design, projeto." Lembro quando estava no jornal A Tarde as agências de publicidade mandavam a arte final que já era o layout finalizado e aprovado pelo cliente para ser fotografado, e ai surgia o fotolito que era depois transferido para uma placa de metal sensibilizada que ia para a rotativa para imprimir a página do jornal. Sua arte tinha uma grande influência regionalista e enaltecia a cultura afro-brasileira. Fjundou a Associação dos Artistas |Populares do |Centro Histórico de Salvador, Bahia, e chegou a catalogar mais de 200 integrantes. Desde 1983 que se lançou no segmento das artes plásticas ,onde obteve algum destaque. Seu ateliê funcionava na Rua do Carmo , número 3, em Salvador, Bahia. Nasceu em 1955 , já faleceu em 2008.
O RAG não era um galerista de formação ou alguém que tivesse algum
conhecimento de arte. Ele veio de Valença, e aqui chegando, não sei a razão,
resolveu se envolver com o mercado de arte. Sua galeria parecia um depósito com
obras amontoadas por todo canto. Eram centenas delas e estes artistas que
pintavam compulsoriamente como Edmundo Simas e Reginaldo Bonfim encontraram um
local onde podiam pintar e deixar ali suas obras para serem comercializadas.
Muitas vezes o RAG comprava as obras e ficavam ali empilhadas. Eu cheguei a
dizer a ele que recebesse as obras em consignação porque senão ia ter
dificuldades financeiras. Mas, como os artistas eram necessitados ele sempre
soltava algum dinheiro.
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Apreciando as obras de Edmundo Simas e Reginaldo Bonfim, no Mafro, no Terreiro de Jesus, Salvador. |
No documentário
As Cores da Utopia que Júlio Nascimento fez sobre o artista Reginaldo Bonfim
ele conclui num pequeno texto que "A impressão de que
eu trouxe comigo ao fim do documentário é a de que, mesmo imerso em sua
loucura, Reginaldo Bonfim era tão normal quanto outras pessoas que já conheci.
Na verdade, precisa-se de certa dose de loucura para desafiar qualquer modelo
de ordem, para ser livre, para ser grande, para ser artista. Eu não saberia
dizer se o trabalho de Reginaldo teria sido o mesmo se ele não fosse louco."
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