E |
Leonardo Celuque em 1986 e atualmente em seu ateliê. |
stou
diante de um artista que vive voltado para o Universo, as novas descobertas
científicas, a Filosofia e manifestações do espírito. Ele transita entre a
ciência e o espiritual porque gosta de deuses e de praticar artes
marciais e ao mesmo tempo de meditar e principalmente de observar e representar
o Universo em sua arte. Foi assim que decidiu ir até o mosteiro zen-budista que
existe no município de Ibiraçu, no Espírito Santo, onde chegou a ser ordenado. Os monges deste mosteiro budista Soto Zen procuram unir à realidade
brasileira para transmitir seus ensinamentos milenares. E a busca, a inquietude
de Leonardo Celuque transita principalmente entre as realidades, a imensidão do
Universo e as descobertas científicas que estão cada vez mais aceleradas com a
inteligência artificial que é um dos temas que o fascina e
preocupa. Quando lembrei que o cientista e historiador israelense Yuval
Harari disse que a inteligência artificial vai criar uma massa de inúteis e que
teremos que nos reinventar constantemente. Celuque balançou a cabeça mostrando
preocupação com este futuro tão perto de nós. O historiador israelense também
vaticinou que “é possível criar algoritmos
que nos conheçam melhor do que nós mesmos, que podem nos hackear e manipular
nossos sentimentos e desejos. Eles não precisam ser perfeitos, apenas nos
conhecer melhor. E isso não é difícil, pois muitos de nós não se conhecem muito
bem”, disse. Percebi que ficou incomodado porque ao conversar
comigo não me aprofundei nestes temas porque não são assuntos que domino e
tampouco tenho um interesse vital como acontece com ele. E durante a conversa
mostrou que sente dificuldade em se relacionar porque esses assuntos quase
sempre não podem ser compartilhados a não ser por um grupo restrito de amigos e mesmo assim têm pontos de
discordância.
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Catálogo da primeira exposição. |
Na primeira exposição que fez em abril de 1982 na
Genaro Galeria de Arte, da saudosa Domitila Garrido, falecida em 2019, mostrou
suas pinturas figurativas, inclusive a capa do catálogo tem um autorretrato
onde aparece tendo ao fundo o mar, coqueiro e um morro. Atualmente abandonou o
figurativo e faz uma arte que alguns classificam de realismo científico
pintando inúmeros corpos celestes como galáxias, estrelas, nebulosas, satélites,
meteoros, meteoritos e planetas que lembram as que vemos quando a Nasa nos
revela novas imagens captadas por um satélite ou mesmo pelo famoso telescópio
Hubble, que já transmitiu milhares de imagens do Universo para alegria dos
cientistas. Escreveu no catálogo de sua exposição em 1989 que
"a diferença básica entre a atitude do mágico e a do cientista é que o
primeiro desenha o mundo dentro de si e o segundo externaliza e impessoaliza o
mundo por um movimento de vontade em direção oposta." E continuou: “Gaia,
a nossa mãe-terra funciona como um organismo vivo. Estamos não apenas
circundados, mas somos parte de um mar de informação onde o mundo observável é
um aspecto de uma vasta ordem invisível."
QUEM
É
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Celuque e sua última obra ainda sendo finalizada. |
O
Leonardo Ribeiro Celuque nasceu em 29 de abril de 1954 na maternidade Hospital Português, em Salvador, Bahia e teve sua infância dividida entre o
Morro Ipiranga, que era um local chic, e a praia do Cristo, na Barra, que
frequentava para preocupação de seus pais porque naquela época era quase deserta
e ainda tinha uns frequentadores que eram considerados perigosos. Mas, o
Celuque ali se sentia à vontade porque gostava de mergulhar e pescar peixes e
mariscos nas locas, observar os pássaros, e outros animais que habitavam naquele
pedacinho de restinga . Assim levava sua vida matando sua curiosidade. Também
os rochedos e as plantas eram motivo de suas observações. Ele relembra que era
um pedacinho de mundo selvagem e com alguma biodiversidade. Também frequentava
as fazendas de seu pai no Vale de Iguape, em Cachoeira, onde plantavam cacau, e
a do seu avô chamada de Floresta Negra, no município de Ipiaú, também dedicada
ao plantio do cacau. "Adorava ir para as fazendas", diz Celuque.
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Foto 1. Homem Azul 3. Foto 2.Homem Azul 2. Foto 3. Encapuçado (croquis ) .
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Fez
o primário na Escola Modelo, que funcionava no bairro da Graça, onde depois passou
a morar na Avenida Euclides da Cunha e continua até hoje. O ginásio e o
cientifico foi no Colégio Marista, que funcionava no bairro do Canela, em
Salvador, e ao terminar fez vestibular para Física, mas não conseguiu concluir
porque achava que era muita teoria e pouca prática. Cursou apenas dois anos.
Recorda que as aulas de Geologia I e Geologia II eram as que mais lhe agravavam
porque tinha aulas de campo e que gosta muito de ver e examinar rochedos e os
minerais de modo geral. Em 1976 faz vestibular para a Escola de Belas Artes, da
Universidade Federal da Bahia, e
faz um curso com a artista norte americana Alice Baber. Em 1978 ganhou uma
viagem para a Europa de seus pais e fixa residência na França e no ano seguinte
participa de um curso na Academia de La Grand Chaumière onde convive com
vários artistas já estabelecidos e com muitos jovens iniciantes. Lá faz muitos
desenhos de modelos vivos e mesmo de objetos, de ruas e prédios. Afirmou que as
modelos eram estudantes, "mulheres lindas", que tiravam a roupa para
servirem de modelo no maior respeito possível. Isto lhe permitiu
aprimorar seus conhecimentos de desenho e sobre a arte de modo geral. Diz que
trocava ideia com artistas já profissionais e que tinha gente de várias partes
do mundo. "Foi aí que passei a ter mais atenção com o feminino porque as
modelos eram mulheres jovens muito bonitas que me encantavam ".
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Shiva, acrilíca sobre tela. |
Volta
a Salvador e continua seu curso na Eba quando foi monitor de aulas dos professores Riolan Coutinho e de Aylton Lima até concluir em 1980. Seu
pai Raul Golfeto Celuque era ligado a indústria e sua mãe Walquiria Ribeiro
Celuque era dona de casa. O casal teve cinco filhos, sendo três homens e duas
mulheres. Atualmente gosta de Alquimia e disse que "eu não me perco, são
os outros que se perdem. Quero entender as origens dos elementos, acompanhar a
complexidade do nosso organismo." Fez o Mestrado em História da Ciência e
hoje ensina História, Desenho e Pintura aplicado a Arquitetura, além
de Perspectiva de Sentimento, Perspectiva numa faculdade particular. "Sinto que a formação dos jovens no ginásio e no colégio está muito aquém do que
estávamos acostumados. Acho que vem piorando a cada ano e os jovens chegam nas
universidades muito despreparados e isto dificulta sua formação profissional.", observa Celuque.
Ele
confessa que gosta de várias áreas e que isto talvez seja um defeito. Adora
aulas práticas e teve como professor Arne Mune que dava umas belas aulas
práticas exatamente na praia do Cristo, que tanto frequentava e conhecia .
"Parece que os deuses resolveram me ajudar conduzindo as aulas para aquele
local que tanto me identificava", disse Celuque. Foi casado e tem um filho de 36 anos que reside na Austrália e gosta de surfe. Contou que ao se separar teve
que criar o seu filho dos oito anos até que alcançou a maioridade. "Foi
uma experiência bacana". Para e faz alguns segundos de reflexão, e como
que acorda e diz. "É a vida!". Talvez quisesse dizer a vida é
assim criamos filhos para o mundo.
Em 2018 fez uma carta a colecionadores americanos que doaram seis obras de sua autoria para a Biblioteca de Santa Bárbara , da Universidade da California, nos Estados Unidos. Vejamos o que escreveu Celuque : "Sempre amei a noite com suas estrelas, assim como o dia com suas maravilhas reveladoras. A natureza é rica em beleza, e a maioria de nós, em algum momento é tocado por ela. A visão do mar ou de uma bela manhã no campo têm o seu encanto particular. Um arco-íris em uma tarde chuvosa também nos chama a atenção com a mesma força. Outros cenários naturais nos fornecem imagens belas, que não só se aplicam às coisas, mas também ao campo das ideias. Uma flor tanto intriga um poeta como também um cientista. Comecei meus estudos acadêmicos na Universidade Federal da Bahia, em Física, mas depois acabei me transferindo para Artes Plásticas.
Hoje em dia as imagens do nosso imaginário estão sendo ampliadas por computadores e estações orbitais. Entendo o meu trabalho como uma tentativa de expressar o meu próprio espanto nesse contexto complexo e amplo em que estamos inseridos, uma época que nos situa com espanto, como uma mistura de poeira e astro, como apontou um velho poeta."
EXPOSIÇÕES REALIZADAS
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Foto 1. Rochedo. Foto 2.Chama Solar,1898. Foto 3.Campo Estelar, 2002. Foto 4. Rastro de Cometa, 1986. Foto 5. Ordem Terceira de São Francisco. |
Ingressa na Escola de Belas
Artes em 1976 e neste mesmo ano participa de um curso com a artista americana
Alice Baber. Em 1977 integra a Exposição Coletiva no Salvador Praia Hotel; 1980
Exposição Proposta 80; 1981 Exposição de Artes Plásticas da XXXIII Reunião da
Sociedade Brasileira de Pesquisa e Ciência - SBPC; 1981 - Exposição Encontro
dos Artistas do Nordeste; 1982 - Sua primeira exposição individual na Genaro
Galeria de Arte; 1982 - Participa do XXXV Salão de Artes Plásticas de
Pernambuco; 1983- Participa do XXXVI Salão de Artes Plásticas de Pernambuco;
1984 - XXXVII Exposição de Arte Contemporânea Chapel Art Show, em São Paulo;
1984 - Exposição Coletiva no Beco da Arte, em Salvador; 1986 - Exposição
Individual na Galeria O Cavalete, em Salvador; 1987 - Exposição Escotilhas Para
o Aberto. Museu de Arte da Bahia, Salvador; 1988 - Coletiva
Abril na Galeria Artenata, em Salvador ; 1988 - Exposição Rotas e Perspectivas,
na Anarte Galeria , Salvador; 1988 - I
Salão Baiano de Artes Plásticas no Museu de Arte Moderna da Bahia; 1989 -
Exposição Individual na Galeria Artenata, em Salvador; 1989 - Exposição The
Evolution of Image or The Image of Evolution: The Visual Art of Leonardo
Celuque, na Universidade do Colorado, nos Estados Unidos; 1989 - Exposição no
Escritório de Arte da Bahia, Salvador; 1991 - Exposição de Pinturas
Galaxies, Myths and Stars, em Nova Iorque, nos Estados Unidos; 2013 - Exposição
no Circuito da Artes ,em Salvador; 2013 - Exposição Triangulações, em Brasília
; 2014 - Exposição no Circuito das Ates, em Salvador; 2016 - Exposição de
Desenho no Circuito das Artes, em Salvador; 2022 - Pintura Art Walk and Talk,
na Biblioteca de Santa Bárbara, na Universidade da Califórnia, nos Estados
Unidos.
REFERÊNCIAS
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Croquis de duas mulheres feitos na La Grand Chaumière, Paris, e detalhe de árvore. |
Em 1982 quando da sua primeira
exposição individual na Genaro Galeria de Arte o crítico Wilson Rocha escreveu:
"A pintura dos nossos dias traz uma problemática de certo modo inédita - a
inquietude dos artistas menos acomodatícios, que buscam os campos não esgotados
no passado. Insinuando eloquentemente o calor da vida e a densidade de
problemas ocultos sob os símbolos e objetos do nosso mundo, Celuque, jovem
artista baiano, cultiva uma pintura emotiva e de grande sensibilidade com uma
técnica da mais alta qualidade. uma pintura objetiva e lírica, em busca da
contenção da cor e da afirmação de um cromatismo tonal capaz de expressar a
quietude de sua bagagem de imaginação, pensamento e sonho.
Sua visão incorpora, com
extraordinário frescor, a ressonância da pop art e a
poderosa influência que a fotografia exerce sobre a pintura hoje. Uma leitura
onde o fundamental é a sua existência, mesmo esboçando, sumariamente, uma
explicação epidérmica, fragmentária e completamente provisória da vida atual,
este campo de luta entre a violência e a poesia".
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Ilustração da poesia A Volta da Primavera, para o livro Castro Alves, editado pela Odebrecht. |
Já o psiquiatra e pensador
Ricardo Chemas escreveu em 1986 no catálogo da exposição que Celuque fez na
Galeria O Cavalete, que funcionava no Salvador Praia Hotel, chamou de
Galáxias, Mitos e Estrelas. É um longo texto que aqui público uma pequena
parte. Vejamos: ..."Encontramo-nos em plena Terceira Onda, no dizer de
Toffler, num planeta azul e recém-nascido 0nde a cosmologia tornou-se uma
ciência experimental, e não mais domínio do irracional ou de ficções
religiosas.
Junto a este vertiginoso
mergulho, a arte de Leonardo Celuque vem para nos lembrar, todo o tempo, que
neste mundo a maravilha é comum, e o espanto, uma dádiva de todo o homem. Shiva
é também, de fato, a imagem de um dançarino real, lida sob o espectro do
infravermelho e processada por computador em cores falsas, porém agudamente
belas. Vivemos numa época incrível da
História, um
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Foto 1. Ictiossauro. Foto 2. Peixe Fóssil. Nestas obras ele escreve mensagens .
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momento no qual o homem começa a dar-se conta de que o cosmos é
mais vasto do que as fantasias narcísicas a seu respeito, e mais, que é chegado
o momento de observar em vez de supor".... Já na exposição do escritório de
Arte da Bahia, que também funcionava no Salvador Praia Hotel, em 1989, foi
reproduzido o texto de Wilson Rocha e parte de um texto que escrevi. Vejamos
... "Celuque trocou o pincel e passou a vasculhar os céus com seu telescópio
eletrônico e captou aquilo que mais o sensibilizou, aquilo que mais se
identificou com o seu próprio universo de conhecimento . Neste contato entre o
homem e o desconhecido surge a arte de Celuque"....
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