O colecionador Domenico Gatto. |
Todos os artistas das décadas de 50 a 70 conheceram a figura simpática e de grande facilidade de se expressar que foi o empresário e colecionador Domenico Gatto. Desde Carybé, Floriano Teixeira,Sante Scaldaferri,Calasans Neto,Fernando Coelho, Mário Cravo Jr, Carlos Bastos ,Jenner Augusto, Poty, Zé Claudio, Udo Knoff e muitos outros ele manteve uma convivência em seus ateliers procurando novas obras, as quais eram adquiridas, às vezes até em lotes , e quando não existiam costumava encomendar , inclusive adiantando algum dinheiro para que o artista se sentisse com aquele compromisso de criar para lhe entregar.
Algumas moradias de artistas foram construídas dentro desta sua busca por novas obras de arte, com o fornecimento de parcela de dinheiro de entrada ou em parcelas para que os mesmos criassem e tocassem seus projetos particulares de construir ou adquirir uma nova moradia, comprar um automóvel, etc.
Era um relacionamento muito próximo entre Domenico Gatto e os vários artistas de sua época. O Carybé num depoimento disse : "O colecionador entusiasta foi Domenico Gatto, que acompanhava o movimento , corria os ateliers, comprava arte, sempre ajudando quem precisasse".
Algumas obras de arte remanescentes da coleção do empresário e colecionador Domenico Gatto. |
Portanto, está ai um testemunho de como este italiano procurava comprar e incentivar os artistas e em consequência a arte na Bahia. É certo também que sendo empresário do setor da construção civil tinha uma visão de mercado e da busca do lucro quando lidava com vendas de imóveis ou até mesmo com obras de arte , tanto ao adquirir e comercializar.
Segundo me informou o empresário Antônio Gatto "a coleção permanece com a família. Apenas algumas obras foram divididas , a maioria está com minha mãe".
A professora Jancileide Souza Santos, em artigo apresentado num Encontro de História da Arte, na Unicamp , em São Paulo, escreveu : "Os colecionadores de arte fazem parte de um grupo social importante no mundo da arte, e a prática de colecionismo, motivada por questões estéticas,
políticas,sociais ou simplesmente a paixão pela arte,contribuiu para o enriquecimento do patrimônio artístico do país, além de estimular o gosto artístico em um determinado contexto social, histórico e social. Na Bahia , os colecionadores de arte exerceram um importante papel na construção de um mercado de arte, bem como despertaram o interesse pela aquisição de objetos para a formação de coleções no Estado".
A professora Jancileide Souza, que é doutora em História da Arte, focou o seu artigo na arte popular , mas certamente suas observações podem ser aplicadas numa forma mais ampla,abrangendo também o colecionador de obras de arte de modo geral.
Na realidade Domenico começou tarde a garimpar obras de arte nos ateliers dos artistas,mas seu entusiasmo era tanto que ele superou este atraso e se transformou no maior colecionador em nosso Estado. Foi na década de 1950 que construiu na Ladeira de São Bento o Hotel Oxumaré e foi instalada a galeria do mesmo nome no térreo, onde aconteceram grandes exposições.
Ele nasceu em 1923 em Rocca Imperiale, província de Cosenza, região da Calábria, na Itália, e faleceu aos 69 anos de idade, uma morte prematura para os padrões de hoje. Teve três filhos Adele, Antônio e Anna Paola com Teolita Noya Gatto. Domenico Gatto chegou ao Brasil em 1938.
A empresa que ele criou completou 58 anos - a Gatto Empreendimentos - de atuação no mercado imobiliário ,tendo iniciado suas atividades em 9 de agosto de 1963, construindo pequenos prédios residenciais e comerciais em diversos pontos da cidade, tendo inclusive lançado um dos primeiros loteamentos de condomínio residencial, o Belvedere, no bairro do Bomfim.Construiu também um dos primeiros cinemas da Cidade, o Cine Capri, no Largo Dois de Julho, além de fundar o Banco do Trabalho, sendo sua primeira agência localizada na cidade de Feira de Santana.
Através do escritor Vasconcelos Maia, em 1963, o artista Calasans Neto, iniciando sua vitoriosa carreira, foi apresentado ao empresário e colecionador Domenico Gatto que estava ultimando a construção do Hotel Oxumaré.
A bela xilogravura feita por Calasans Neto para ilustrar o cardápio do Hotel Oxumaré. |
Conta sua filha Adele Gatto num depoimento no catálogo do The Catt Parade que lembra de seu pai "chegando em casa com o paletó no braço , jornais numa mão e na outra uma tela que acabara de adquirir com a tinta ainda fresca. Ia logo falando: "Teo! Martelo e pregos!", ele estava chamando sua esposa Teolita Gatto , que sempre o ajudava a colocar mais uma obra na parede da casa, que tinha um pé direito duplo, localizada na Avenida Princesa Isabel, no bairro da Barra Avenida. Assim, sempre cabia mais uma tela nas paredes de sua residência.
Ele tinha em casa um armário grande no seu gabinete com três andares , onde guardava centenas de obras de arte.
Diz Adele "Minha mãe era quem subia na escada, com uma caixa com martelo e pregos, e assumia o trabalho ... Ao final , satisfeito, deixava as paredes redecoradas até a próxima leva de quadros, que às vezes chegava no dia seguinte".
Já o maranhense Floriano Teixeira , que veio para a Bahia a convite de Jorge Amado, declarou que "Colecionar obras de arte se faz com tempo disponível, sensibilidade, amor , cultura e muito dinheiro, e o Domenico tinha tudo isto junto além de sua capacidade de fazer amizades ." E continuou " Ele sabia por instinto e sensibilidade que as revoluções culturais são benéficas , porque é da natureza humana mudar e acrescentar para melhor".
Estes depoimentos estão no catálogo da exposição e leilão The Catt Parade que seu filho Antônio Gatto mandou editar em comemoração aos "50 anos da Gatto Empreendimentos", quando cinquenta artistas de todo o país foram convidados a pintar esculturas de um gato feitas em resina.
Parabéns Reynivaldo, excelente!!!
ResponderExcluirO nome desta construtora estava no meu inconsciente e eu jamais iria imaginar este perfil do empresário. A Bahia precisa conhecer a própria história.
ResponderExcluirFiquei sabendo da importância de Gatto quando estudei Desenho Industrial na Escola de Belas Artes da Ufba. Eu já estava formado em Comunicação, trabalhava em A Tarde e buscava ampliar os conhecimentos nas artes visuais porque sempre pintei. Ainda hoje continuo produzindo (https://www.concrecoisa.com/pinturas). Belo registro de quem pouco aparece na cena cultural.
ResponderExcluirMaravilha de matéria Reynivaldo e sinto-me honrado por ter participado da exposição "The Catt Parade ".
ResponderExcluirObrigado Leonel
ExcluirInfinito Rey
ResponderExcluirAbraço do tamanho de vossa terra
Pombal..
Infinito Rey
ResponderExcluirAbraço da grandeza da vossa terra.
Obrigado
ResponderExcluirArtigo de agradabilíssima leitura, não só por tratar da Arte como agregadora do Saber, mas também por delinear o interessante perfil do colecionador italiano Domenico Gatto. Traga-nos outras matérias tão notáveis quanto essa! Você, caro Reynivaldo, como sempre, irretocável no que produz! Abraço.
ResponderExcluirMuito interessante...Um verdadeiro mecenas.parabéns pelo artigo
ResponderExcluirMi dispiace non esserci.la pandemia me lo impedisce. Tantissimi auguri
ResponderExcluirUn saluto a Teolita
ExcluirBom também esse seu trabalho de resgatar a história do mercado de arte na Bahia, meu caro professor e jornalista. Abraços.
ResponderExcluirLembro-me da Galeria Oxumaré, que lançou muitos artistas baianos e ainda dos vários prédios que construiu, dentre eles um na Av. Oceanica, de 3 andares, em frente ao Quartel da Aeronáutica, projeto de Jader Tavares, que foi a minha primeira aquisição de imóvel em Salvador. A decoração do interior era de Lev Smarcevski. Em todos os prédios da Construtora Gatto - todos com nomes italianos - havia uma obra de arte.
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