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sábado, 2 de junho de 2012

FERNANDO PINTO RECRIANDO O POPULAR

Revista Neon julho de 199
Texto Reynivaldo Brito
Fotos Divulgação



A pintura é um propósito, o pote um pretexto.” Esta frase escrita pelo artista Fernando Freitas Pinto serve para entendermos uma fase importante no caminho da produção deste artista. As pinturas e gravuras dos potes marcaram muito a sua trajetória, culminando com premiação num concurso promovido pela Copene. Foi também tema do seu trabalho prático para a conclusão do mestrado em Artes, quando o artista explorou a ilusão espacial dando ao espectador novas sensações de profundidade e volumetria.
Fernando foi buscar na cerâmica, uma das manifestações populares mais presentes desde os primórdios do homem das cavernas, inspiração para sua arte. Pesquisou a cerâmica produzida em várias regiões da Bahia e assim utilizando modelos criando ambientes, detalhes e superposições, procurando sempre fugir do repetitivo. Não é uma simples reprodução do objeto, mas a transformação no modelo, no momento que acontece a sua transposição para a tela.
O jogo de luz e sombra também é importante na sua produção e na representação dos objetos que ele vivenciou. È neste clima de buscar o algo mais, de misturar o real com o sentimento que Fernando Pinto consegue transcender:
Vamos encontrar na história da arte a presença de vasos de cerâmica nas obras de Diego Velasques, Van Gogh,Paul C’ezanne e muitos outros. Porém, este artista baiano trabalhou com mais intensidade utilizando os vasos, especialmente, os potes, como temática de sua arte.
Sabemos que o artista sempre parte do pressuposto do real para representar a sua leitura. Aí entram todos os elementos do consciente e inconsciente e assegura a diferenciação.
Se mandarmos dois ou mais artistas representar um determinado objeto certamente teremos obras diferentes. As visões, as técnicas, as habilidades etc. São diferentes, e é neste mundo maravilhoso da criação que caminha a obra de arte. Por estas e outras razões abominamos as cópias, os artistas que não procuram sua própria personalidade pictórica que o diferencie e assegure o seu crescimento e importância.
No realismo dos potes pintados por Fernando vemos a representação das características principais do objeto, portanto da realidade, mas bem diferente da fotografia, que é um instantâneo, imagem do objeto. Bem mais realista, embora a luz do ambiente influencie esta imagem captada pela máquina fotográfica.

Lembra Delmar Shneider que...Ele não pinta apenas os potes, as formas materiais, mas o “conjunto”, as“posições” e as “suposições”, a “profundidade”, ás vezes tão nítida que o espectador queria abraçar o fundo do pote, e pára tocando a tela lisa...Assim, Fernando pinta verdadeiras “coreografias”. E, no meu entender, tudo isto consegue graças à luz que cria sobre a tela,com perfeição, da qual a evidência maior ou menor das formas materiais, a proximidade, a distância, a profundidade, são como que decorrências naturais, graças ao contrário da luz:a sombra”.
Num projeto que ele concebeu para ser executado na Estação de Passageiros da Codeba, na Cidade Baixa, Fernando argumentou na ocasião que sendo a cerâmica figurativa uma das principais manifestações de arte popular brasileira, e uma das mais elevadas expressões artísticas do nosso povo escolheu esta temática para o mural projetado.
A cerâmica baiana tem influência indígena, portuguesa, espanhola e holandesa. Aproveitando a oportunidade ele faz síntese de nossa cerâmica registrando e resgatando as suas formas e desenhos com a representação de objetos produzidos em Rio Real, Livramento do Brumado, Santo Antonio de Jesus, Irará, Caetité, Ribeira do Amparo, Tucano, Maragogipinho e Monte Santo.
Este mural é um sonho não realizado do artista, o qual poderá algum dia ser concretizado como uma forma inteligente de inventariar e deixar registrado para a posteridade a cerâmica produzida em nosso estado.

                                                  MARCA FORTE
O pote marcou forte a produção pictórica de Fernando Pinto. Todavia não podemos enclausurar sua produção no espaço vazio do pote onde as pessoas costumam guardar água e até mesmo esconder algum objeto precioso. Ela é bem mais abrangente e com incursões até mesmo pelo nu feminino e a arte abstrata.
Aliás, este era um caminho natural se observarmos com mais cuidado os cortes que já vinha dando nas telas onde utiliza esta temática que o marcou.
Em alguns estudos que chamou de “Corpo Mulher”, e expôs no espaço Bom Vivant, na Barra, em 1990, o artista que iniciou sua vida no campo da arte pintando a arquitetura barroca baiana, e em seguida a cerâmica, agora valorizava a figura humana, tão ausente em sua obra.
Naquela ocasião ele desembarcou forte e desnudou suas modelos com poses sensuais, buscando o equilíbrio entre o real e a fantasia. Como um “voyeur” comportado, próprio aliás, do temperamento sempre conciliador e centrado de Fernando Pinto.
Carlos Eduardo da Rocha escreveu naquele momento que “ para confirmar as suas preocupações de formalista, o jovem pintor volta-se também para a figura humana, fixando com maestria o corpo feminino; o corpo da mulher nas riquezas das linhas curvas de tanta beleza, encontra na pintura de Fernando Freitas Pinto uma expressão das mais completas”.
Os novos trabalhos estão sendo produzidos e mostrarão a versatilidade e o crescimento deste artista que sempre está buscando ultrapassar novos desafios.
No segundo semestre deste ano Fernando vai mostrar várias obras abstratas inspiradas nos traçados que são feitos por este interior de nosso Estado. Será uma releitura desta arte também milenar que tem um cunho utilitário e decorativo muito forte entre as famílias do interior. Estou enxergando que aos poucos o artista está caminhando para o tridimensional e não será surpresa se no futuro surgirem algumas esculturas.
Recentemente participou da exposição “100 Artistas Plásticos da Bahia”, no Museu de Arte Sacra; da mostra “Arte 450 anos de Salvador”, e da “Agenda”, organizada por Maria Adair.
Também duas revistas da UFBA estão circulando com capas criadas pelo artista.
Num pleito de gratidão quero lembrar aqui que foi através do meu saudoso amigo Ivo Vellame que conheci Fernando Pinto. A propósito ele escreveu em 1991 para o catálogo de uma exposição que o artista fez na NR Galeria de Arte o seguinte: “Talentoso e senhor de impecável técnica oficial, ele vive a sua arte e nela circula, com inteira consciência, liberdade e alegre espontaneidade. Sua temática atual são os potes de barro, objetos que convivem com o artista no amplo espaço verde que antecede ao seu atelier, em Vilas do Atlântico. Os potes de barro- o pretexto, o acontecido que o artista cria a partir de algo que aconteceu, a natureza, seres e objetos e as formas da própria arte”.
“Da cerâmica utilitária e artesanal, Fernando Freitas Pinto propõe uma nova realidade. Todavia, ele não sente muita necessidade de deformar a realidade.
Seus potes, por intencional decisão do artista, continuam formalmente próximos a nós espectadores e nos comunicam uma incontida vontade de abraçá-los. São rostos e corpos sensuais femininos, ávidos de acariciamentos. Há neles uma força mágica de sentimentos, é o mistério da arte. Suas pinturas organizadas com toque de mestre, colorida e composição numa integração agradável, é o artista impondo a sua própria ordem á realidade do tema, fazendo prevalecer a sua visão artística e a matéria dos potes de barro transmuda-se nessa coisa interna, qualitativamente diferente que é a arte”.

                                                               QUEM É

Fernando Freitas Pinto, é baiano, de Salvador, diplomado pela Universidade Federal da Bahia- Escola de Belas Artes, trabalha com várias técnicas, atua nas áreas de pintura, desenho, gravura, moldagem, arte-mural e ambientação.
Realizou uma centena de exposições individuais e coletivas aqui, no Rio de Janeiro e São Paulo. Já participou de salões, bienais e premiações. È professor da Escola de Belas Artes, membro do conselho de coordenação da UFBA, já dirigiu a Associação dos Artistas Plásticos e Modernos da Bahia.



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