Guel diante de seu última obra |
Xilogravura de 1974,de Guel |
Portanto, tem uma sólida formação e
disciplina de trabalho, que faltam a muitos artistas. Diariamente, sai de sua
casa e vai para o atelier localizado num amplo apartamento no Morro do Gato, em
Salvador, onde cria suas obras. Guel Silveira não gosta de limites e de ficar
preso a determinadas temáticas. Hoje pode pintar uma marinha, amanhã uma
natureza morta e depois vai para as dobras e colagens misturando temáticas e
materiais.
"Violeta Varonil", obra feita em spray 1984. |
Relembra Guel Silveira que foi muito
profícua a convivência com os grandes artistas modernistas baianos "porque
cada encontro era um aprendizado." Aos 18 anos já frequentava o atelier de
Calazans Neto, o querido Calá, que passava as informações necessárias para que
criasse suas gravuras as quais eram impressas na prensa do mestre, no atelier
que funcionava na casa de Calá no bairro de Itapuã. Depois comprou uma prensa e
posteriormente alugou um espaço no bairro da Boca do Rio, por sinal vizinho ao
amigo e contemporâneo Mário Cravo Neto, o Mariozinho, o grande fotógrafo
reconhecido mundialmente, que nos deixou prematuramente.
Em 1999 mostra naturezas-mortas |
Nesta marinha em acrílica sobre tela me chama a atenção a transparência e a luminosidade . |
"A Inquisição", também em acrílica e tela. |
Uma das características da forma de trabalhar de Guel Silveira é que além de pintar ao mesmos obras usando o abstracionismo e o figurativo ele nunca está satisfeito com o quadro que teria concluído. Ao olhar sempre volta e faz algumas modificações retirando ou introduzindo novos elementos. A sua intenção é que a obra realmente tenha tudo que ele imaginou em momentos diferentes. Sempre foi assim quando começou com as gravuras, depois com a técnica do spray, com a pinturas em acrílico sobre tela e agora com as dobras onde faz recortes, colagens e pintura na mesma obra, utilizando alguns tipos de materiais como juta, cartonado, papéis lisos, estampados e reciclados e Arches, este muito utilizado pelos seus colegas artistas para pintar aquarelas, além de pedaços de placas de isopor full. Portanto, além da criação pictórica tem esta coisa do fazer, da habilidade manual de um artesão que vai construindo o meticulosamente o seu mundo dentro de uma dimensão de intimidade com os diversos materiais.
Pintou e ainda pinta inspirado nas pinaúnas, que existiam em grande número nos arrecifes das praias do bairro do Rio Vermelho. |
A propósito de suas Dobras o próprio Guel
Silveira escreveu :Dobras: Virar, revirar, dobrar, transpor em múltiplas viras.
/ Buscar todas as viradas de cada esquina, de cada rua, de cada labirinto, de
todos os avessos / Tudo na vida é dobra. / O que não pode ser dobrado é fixo,
estático, não se multiplica, não dá sombra, não revela, também não esconde. /
Não ilumina, não mostra a intensidade da luz. / Não amplifica, não reverbera e
nem vibra / É oco, não ecoa, não transmuta. /...
Vejo também um distanciamento completo da sua produção e do que fazia o seu pai, que era um figurativo, enquanto o Guel Silveira tende mais para o abstrato, e mesmo quando se inspira numa singela piraúna ou ouriço do mar, como é conhecida em outros locais do litoral brasileiro, ele consegue transmutar este molusco e representá-lo dentro de sua linguagem abstrata. E aqui reproduzindo as sábias palavras do caro Geraldo Edson de Andrade, escritas em 2012, infelizmente Edson está em outra dimensão. Veja: "A linguagem abstrata não é tão fácil como costumam afirmar os diletantes. Uma composição abstratizante pode conter, sim, elementos reais quando transfigurados pela sensibilidade do artista que nela expressa não somente sua catarse interior nela inserida memória e afetividade. Há, pois sensível ligação entre formas e cores com sentimento e emoção norteando as intenções de Guel nas mais recentes pinturas".
Esta obra ele estava trabalhando nela quando cheguei ao seu atelier para iniciar a nossa conversa. |
Outra surpresa foi saber que Guel Silveira era amigo do poeta Thiago de Mello com quem privou desta amizade alguns dias em sua casa construída às margens de um rio em plena floresta Amazônia. Aí lembrei de um episódio que vivi no final dos anos 1960 quando fui ao Rio de Janeiro participar de um congresso estudantil realizado na Faculdade Cândido Mendes, e o então agentes do DOPS, que era o temido Departamento de Ordem Político e Social apareceram com várias viaturas cercando o prédio da Faculdade. Foi exatamente logo após o poeta Thiago de Mello, que estava todo vestido de branco, acabara de recitar vários poemas de cunho político para nós estudantes. Foi um momento sublime, interrompido com a possibilidade de sermos presos e levados para a sede do DOPS. Felizmente o então reitor da Faculdade o professor Cândido Mendes era um homem muito querido e respeito interveio e lá pela madrugada as viaturas começaram a sair. Foi um alívio geral.
Guel ao lado de seu amigo o poeta Thiago de Mello na sua casa doada por Lúcio Costa em plena floresta amazônica, onde passou alguns dias. |
A propósito o poeta dedicou alguns versos em ocasiões distintas sobre a obra pictórica do Guel Silveira. Escolhi esses versos e aqui os transcrevo: "É nas cores que está a linguagem poética de Guel. / Como a moça da janela, o pássaro no vento, a doçura no pêssego. / No convívio com elas, amoroso e constante aprendeu sozinho / o que o mestre Albee ensinou na sua teoria das cores. / Passa horas, tem vez que atravessa o dia na frágua palheta, / trabalhando só para encontrar a sua cor mágica. / Recordo que respondeu Rodin, quando o poeta Rilke, jovem, ?
lhe perguntou o que era preciso para ser um grande artista: /-Primeiro nascer artista e depois trabalhar , trabalhar e trabalhar". E em outra ocasião escreveu o poeta Thiago de Mello: "Faz tempo considero que não deve haver discórdia / entre o artista e a pessoa... Os dois são um só / Guel Silveira, belo artista, um homem bom".Atualmente Guel Silveira está expondo vários trabalhos da série Dobras, na Galeria Zeca Fernandes, localizada na Rua Alameda dos Mulungus, 83, Praça dos Eucaliptos, bairro Caminho das Árvores. Guel está também expondo várias obras no evento de decoração Casas Conceitos, que está sendo realizado no bairro de Santo Antônio Além do Carmo , no Centro Histórico de Salvador. É um evento que reúne arquitetura, decoração, arte e entretinimento e estará aberto até 30 de outubro. Está instalado na Escola Divino Mestre, um antigo centro de ensino que não funciona há 20 anos. A área te, 3 mil metros quadrados e o evento tem três ambientes. Vale a pena conferir. Ao lado o convite da outra exposição, que você ainda pode visitar na Praça dos Eucaliptos.
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