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segunda-feira, 12 de fevereiro de 2024

CARLOS SCLIAR FALA DA FUNÇÃO SOCIAL DO ARTISTA

Scliar e Emanoel Araújo no MAMB
Fiz esta entrevista no Museu de Arte Moderna da Bahia no final de abril de 1977 e foi publicada no jornal A Tarde, de Salvador,  no dia 3 de maio de 1977 . Reproduzo aqui por entender a importância do artista que precisa ser cada vez mais conhecido pelas novas gerações. O Carlos Scliar nasceu na cidade de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, em 21 de junho de 1920 e faleceu no Rio de Janeiro em 26 de abril de 2001. O título original foi : Carlos Scliar - O Artista é a galinha dos ovos de ouro dos marchands.

 Encontrei Carlos Scliar rodeado de amigos entre os quais Emanoel Araújo, Luís Jasmim, Jacyra Oswald e outros, no restaurante do Solar do Unhão. O papo estava animado e em determinado momento cheguei para entrevistá-lo sobre sua atual exposição que está aberta ao público no Museu de Arte Moderna da Bahia. Fiquei impressionado com a lucidez e a capacidade de se expressar de Scliar. Falamos de muitas coisas da sua primeira exposição aos 15 anos de idade em Porto Alegre, sobre sua presença na qualidade de soldado na Itália de 1944 a 1945, de sua pintura lírica ligada a Ouro Preto, do mercado de arte e sua ligação com a Bahia.O depoimento do Carlos Scliar deve ser lido e refletido porque interessa a todos aqueles que militam ou estão preocupados com nossas atividades culturais. O artista denuncia a procura do lucro fácil dos marchands, a preocupação em destruir as cidades históricas por construtores inescrupulosos através do abandono dos monumentos, que terminam por ruir, ali se construindo edifícios. Uma prática abusiva — como diz o artista — mas que está se disseminando por todo o País. E como não podia deixar do ser ele fala da gravura, pintura e de sua experiência como ilustrador.

                                                        A GRAVURA

Gravura  de Carlos Scliar.
Diz Scliar que "a gravura foi um meio que encontrei de comunicação maior com o público. Quero deixar claro que nunca abandonei a gravura e reconheço que num país como o nosso, em face de um público restrito que atingimos, indiscutivelmente temos que ter um papel no processo geral e cultural". E prosseguiu: “Num dado momento, quando você acha que tem uma função social, isto é que deve influir num número cada vez maior de pessoas, deve lançar mão de todos os meios de comunicação e expressão para conseguir o objetivo determinado. Aí é claro que a gravura entre os meios visuais possibilita muitos recursos para o artista. O problema dos custos, por exemplo, é fundamental. A gravura, sendo um múltiplo, possibilita atingir uma faixa maior de pessoas e é muito portátil, fica muito mais fácil você fazer uma exposição de gravuras, o que não acontece com uma exposição de pinturas".

A Casa Ateliê onde morou e trabalhou.
- Lembro-me que em 1972 fiz um álbum de serigrafias - tem um exemplar exposto no Museu de Arte Moderna da Bahia - MAM-Ba, com uma tiragem determinada e doei alguns exemplares para universidades e museus do Brasil. Portanto foi uma exposição que circulou pelos Correios. Cada exemplar que chegava num lugar muita gente tomava conhecimento. Ora, num terreno como o nosso, temos tudo por fazer ainda - o que acho maravilhoso - por mais que a gente tenha feito alguma coisa por aí, não digo apenas em termos de Bahia, mas de Brasil, ainda é pouco."Acha Scliar que temos um potencial, uma possibilidade no país que nos obriga a aceitar qualquer desafio. "A gravura é um dos veículos que utilizo. Não abandonei nunca a gravura pela simples razão de que eu periodicamente faço gravuras. Acho que sou daqueles pintores que fazem gravuras. O mestre Goeldi certa vez disse que eu era um pintor que fazia gravuras. Isto ele me disse talvez como uma forma de crítica porque achava que eu não devia usar a cor na gravura. Respondi ao Goeldi, que era um homem restrito e muito explicito no seu conceito. Era um homem que achava que o gravador deveria ser exclusivamente gravador. O mestre Lívio Abramo pensa também desta forma. Eu penso diferente e tenho exemplos que não são deles dois. Basta lembrar Picasso e Matisse, que são dois dos maiores pintores do nosso tempo, foram grandes gravadores. Acho que citando o caso de Goya ou Rembrandt pegando outras épocas, mostro que são dois extraordinários pintores que foram também gravadores. Então quando eu faço a minha gravura ela se parece com a minha pintura. É claro que busco antes de mais nada respeitar sua linguagem específica. Porém, penso na gravura como uma continuação do meu trabalho como artista, como pintor. Um pintor que utiliza a cor. Quando pego o traço, o meu traço é exatamente parte do meu processo criativo, mas antes de nada todas as técnicas que utilizo são para me comunicar com as pessoas e isto é que é fundamental”. E continua: "Se utilizo hoje toda uma iconografia que já é conhecida como meus ferros de passar, minhas frutas estilizadas, é porque acho que a partir de um certo momento nós temos que usar um pouco aquela forma, como diria o La Fontaine de fazer fábulas, com os elementos para que as pessoas entendam aquilo que você está dizendo. As pessoas entendem muito bem".

                                 ILUSTRADOR

Livro Seara Vermelha de 
Jorge Amado, ilustrado
Por Carlos Scliar.Edição
para fora do país.
 "Como Ilustrador tenho uma experiência muito interessante. É como certos escritores, como críticos de arte, isto é, acho que alguns dos textos melhores que tenho sobre a minha obra foram feitos por escritores entre os quais os de autoria de meu padrinho Jorge Amado, o de Vinícius de Moraes, Clarice Lispector e mais alguns outros escritores, da mesma qualidade destes. Eles só escreveram porque tinham afinidade com minha obra. Aí eles não fazem crítica de arte, mas dão um depoimento sobre o convívio com alguém, desmistificando junto ao público, tirando aquela auréola de artista fora do comum. Eles trazem através de uma linguagem, que é uma linguagem que fez desses escritores e poetas que são, tornando o artista, pessoa de convívio do público.Esse papel de esclarecer quem são esses artistas junto ao público é muito importante importante porque cria um contato, uma afinidade”. Por isso mesmo acha que é um pintor e não um ilustrador. Gosta de ilustrar apenas aqueles textos com os quais tem afinidade. "Quando ilustrei o Seara Vermelha, de Jorge Amado, em Paris, em 1949 reconheço que foi muito importante para minha vida de artista e minha formação. Jorge era um homem importante e eu lia tudo que ele escrevia com a sofreguidão de qualquer jovem que redescobria o Brasil. Redescobria porque sendo um homem do sul, o Brasil era desconhecido para mim. Acho que, com a mesma vontade, eu teria ilustrado um Graciliano Ramos ou outros autores que como Jorge me emocionaram".

 


CONVÍVIO

Carlos Scliar e escritor baiano Jorge Amado 
- Me senti capaz de ilustrar aquele texto porque eu tinha um tremendo convívio com a obra da Jorge Amado o também um certo convívio com sul da Bahia que era uma região que de certa maneira ele tinha descrito. Posteriormente ilustrei poemas de Vinícius de Moraes e livros de outros autores que tinham afinidade de temperamento. Agora, recentemente, eu fiz uma capa a pedido do Antônio Callado e fiquei muito espantado quando o convite veio, que era específico, pois ele desejava que a capa fosse feita por mim. Quando li o livro fiquei espantado porque era um livro da melhor qualidade e que tinha me emocionado, e via outra pessoa fazendo outra capa e não eu. Mas quando, de repente, me dei conta que ele conhecendo a minha obra querendo que fizesse aquela capa era possivelmente alguma coisa ligada à minha obra que ele queria. Foi o que fiz e acho que interpretei através da capa que fiz aquela síntese, aquela ideia, aquela espécie de metáfora que eu poderia fazer através de um quadro aparentemente abstrato daquela sugestão que trazia o livro "Reflexos do Baile", do Callado. Só faço Ilustrações de trabalhos que tenham afinidade com minha obra. Infelizmente autores que eu gosto muito e que aprecio no sentido da qualidade da obra confesso que indicaria outro artista para ilustrar, porque acho que a minha obra não seria mais adequada,"

                                                   AS EXPOSIÇÕES

Capa do convite da exposição em 1981 na
Sobre as exposições, salões e bienais, Carlos Scliar disse que há muitos anos tem a posição tomada: "é uma posição tomada não por ser conhecido, consagrado ou por ter uma clientela. Clientela é um fenômeno muito recente no Brasil, que tem quinze anos. Porque até então os pintores viviam de teimosos. Então, na verdade, antes disto eu não participava de salões por uma questão muito simples, porque achava que o salão no Brasil — o Salão de Arte Moderna — significava aquela possibilidade de você ganhar um prémio e ir para Europa. Ora, eu achava que já tinha vivido quatro anos na Europa, portanto já tinha vivido aquela parte e não devia de maneira alguma tirar o lugar de um jovem, que de outra maneira não poderia ir. Era uma posição consciente de quem já tinha coberto a sua parte. Claro que não foi através do salão que eu tive a oportunidade de ir à Europa. Já tinha tido condições segundo Rubem Braga – ter feito um rude prêmio de viagem nas Força Expedicionária do Brasil – FEB, mas que valeu muito esta minha estadia. Se eu voltei vivo, voltei com toda uma experiência também ligada a todo o mundo de arte em guerra, inclusive na Itália que foi muito importante para mim. Foi talvez até decisiva. Acho que até mudou minha linha de trabalho. Mudou de uma maneira radical. Eu que fazia um trabalho socialmente muito engajado ligado a uma realidade social que queria denunciar de repente me dei conta que pela minha própria origem cultural e econômica via uma realidade de janela porque nunca tinha sofrido aquilo, mas era sensibilizado pela miséria que rodeava. Então eu tinha uma consciência política das coisas, mas na verdade achava que o meu protesto estava se fazendo num nível ainda que autêntico e honesto era um pouco desligado da realidade. Possivelmente neste rude prêmio de viagem que foi de 44 a 45 na Itália, sendo soldado, vi de repente que a Guerra era uma coisa tão terrível, era uma coisa tão decisiva que despertou em mim todo aquele desejo de fazer as pessoas terem consciência de que a guerra era uma coisa que deveria ser evitada de qualquer maneira.

Mesmo sabendo que aquela guerra era mais do que justa, pois lutávamos contra o fascismo e nós não tínhamos procurado aquela guerra. Ao contrário, foi ela que veio ao nosso encontro. Tinha consciência que estava participando de uma coisa que era importante, decisiva da minha posição como homem consciente e ao mesmo tempo a guerra era uma coisa que não perdoava nada. Então saí da guerra muito temperado e, principalmente, consciente de que a vida era uma coisa fantástica. Assim, de repente minha pintura começou a ser voltada para o cotidiano que até ontem eu não percebia que era tão fundamental. Quero assim através das coisas que mostra em torno de mim, fazer as pessoas sensíveis à vida”.

                                      MERCADO DE ARTE

 Carlos Scliar gostava de pintar bules.

 Falando sobre o mercado disse Scliar: Acho que o mercado de arte no Brasil tem todos os defeitos e as poucas qualidades de tudo que temos aqui. Isto é, estamos num país em formação onde4 nós mais imitamos os defeitos do que as qualidades que deveríamos aprender. O mercado está calcado fundamentalmente – quando eu penso no mercado é em termo de marchand, em lucros rápidos. São esses tais de lucros rápidos que estão destruindo a nossa paisagem, o nosso passado histórico, que é tão precário e tão pequeno. Então vemos que realmente criam nas pessoas aquela afobação que antes de mais nada é uma falta de tradição, uma falta de respeito com algo que é fundamental para nós que é nossa raiz cultural. Antes de mais nada é manifestação de falta de cultura. Acho que o verdadeiro marchand seria aquele que saberia que o artista é uma galinha dos ovos de ouro e ele tem que cultivar os ovos e não comer a galinha. Mas, infelizmente, o que vem acontecendo na prática é que eles querem comer a galinha. Nós vemos exatamente o marchand apressado querendo rapidamente fazer grandes lucros. Não querem nem que a galinha ponha os ovos, pois querem até negociar o quadro antes de estar terminado. Literalmente é uma falta de tradição. Não estou dizendo nada de original porque quem disse mais ou menos isto de uma maneira lúcida e perfeita foi Di Cavalcanti, há poucos anos atrás, numa entrevista que deu no Rio de Janeiro onde ele dizia que os diferentes setores que estão envolvidos num programa de arte no Brasil eram muitos precários a começar pelos artistas." Ele achava que tendo se formado numa maneira autodidata, num terreno precário eles não sabiam nem se defender profissionalmente. Nem sabiam bem que tinham uma profissão. Isto criava, inclusive em torno deles, um comportamento dos marchands, que também não tendo tradição nenhuma, só tinham a preocupação do lucro rápido e mais rápido possível. Este problema é tão sério que se amanhã a soja der mais dinheiro eles largam as galerias e vão plantar soja. Disse ainda que o público também tinha uma culpa muito grande porque existe uma parte não muito pequena do público que compra por uma questão de "status" em leilões completamente manipulados, quadros perfeitamente manipulados. O Di achava que isto era muito bem-feito, porque essas pessoas não sabiam respeitar o seu dinheiro, que era a única coisa que elas tinham."

- As palavras do Di, que eu achei que colocou com muita justeza, com uma certa severidade e bastante humor, mostram um panorama. Agora temos alguns marchands que começam a desconfiar que têm de trabalhar diferente. Agora nós temos uma faixa não pequena do público em diferentes pontos e quadrantes do país, que começa a comprar quadros, porque gosta de quadros. Temos um público fundamentalmente jovem que deixa de comprar uma geladeira para comprar um quadrinho. Muitas vezes pagando a perder de vista, mas aquele quadrinho é importante para eles e não estão comprando como aplicação. Nós temos pintores hoje que se preocupam mais com esta faixa de público jovem do que com colecionadores, que nós sabemos que se preocupam com as assinaturas e não com os quadros. Então você vê que esta coisa nova que existe no Brasil é o que dá ao país esta carga e faz com que a gente tenha confiança que teremos muito trabalho positivo pela frente. Claro que as dificuldades não serão pequenas, pelo contrário, acho que serão maiores. Mas em compensação nosso conhecimento aumenta um bocadinho”.

 


 OURO PRETO

Foto que fiz numa visita a  Ouro Preto.
Esta cidade é fascinante para o artista pela sua descoberta permanente. É uma cidade que me estimula no sentido de despertar nas pessoas toda aquela monstruosidade que é o não conhecimento daquele patrimônio que a gente vê se destruir pela ignorância, pela safadeza. Quando digo safadeza são aqueles seres que sabem que estão destruindo aquilo, mas que vão obter menos lucro se no terreno que tem uma casa antiga não for permitido que se ponha um arranha céu ou edifício naquele lugar. Então eles deixam a casa cair ainda que seja parte de um monumento. Esta mentalidade está em todo o Brasil, inclusive aqui na Bahia. Esta mentalidade tinha que ser denunciada como vinha sendo denunciada pelo Património Histórico e por inúmeros intelectuais e artistas brasileiros. Eu fiz minha bandeira disto a partir do momento que em 1973 fiz o meu primeiro painel sobre Ouro Preto. Queria mostrar a cidade de uma maneira mais polêmica que pudesse despertar nas pessoas este desejo de brigar pelo nosso patrimônio. De repente, no ano passado, depois de 20 anos ausente do Rio Grande do Sul, Ouro Preto de um trabalho coletivo no Clube de Gravura, a convite de Bagé voltamos para lá. O Grupo dos Quatro e trabalhamos juntos durante um mês depois de vinte anos. O contato com aquele ambiente, no ambiente onde novamente o trabalho emocional predominou sobre o trabalho intelectual. Quando voltei para Ouro Preto para terminar o painel eu não me vi capaz de fazer aquele trabalho de protesto que iniciara antes. Depois de quatro meses de uma luta com o trabalho elaborado, tive que refazê-lo várias vezes, finalmente, saiu um painel lírico e cheguei à conclusão de que o meu painel lírico era o meu protesto, porque na verdade é uma cidade idealizada, porque tudo aquilo que na cidade de Ouro Preto eu não gostava eu não mostrei no painel. Em vez de botar aquela mancha que queria denunciar, resolvi omitir tudo aquilo que tinha sido deformado e fiz a cidade idealizada. Acho que de certa maneira, o painel sensibilizou o público, pelo menos muita gente (eu sei) foi ver a cidade depois de meu painel. E acho que eles devem ter percebido a minha proposição.

                                                  A ARTE BRASILEIRA

Ouro Preto acrílica sobre tela de Scliar.
- Ouro Preto era para mim uma necessidade muito grande, de tomar uma posição, diria assim a favor de uma raiz como fosse uma alavanca, em defesa de uma raiz que é nossa. Onde é que começa e termina uma arte brasileira? Este assunto está em pauta. Cada um de nós dá a sua contribuição e eu estou tentando dar através do meu trabalho. Claro que hoje o meu trabalho em geral tem uma posição conceitual.  Isto é, faço do meu trabalho, se possível uma arma para estimular a sensibilidade e a inteligência das pessoas. Gostaria que vendo um trabalho meu pessoa saísse de uma cuca um pouco fundida para uma boa. Uma boa significa que as pessoas sintam que a realidade que elas imaginam pode ser diferente para cada pessoa. Respeitem, inclusive, a sua própria individualidade porque eu posso despertar nela a sua maneira de ver diferente da minha. Quando alerto as pessoas como num quadro que está na exposição, que tem um texto escrito dentro dele é uma espécie de provocação para o público. Está escrito no quadro: Eu sou uma montanha pintada. E você? Este quadro é importante, na medida em que estou no momento armando toda uma exposição, que fiz em torno de proposições que obrigo a pessoa a entrar, numa outra faixa, que não a da tela pintada. Mas sim do conceito estabelecido ali dentro obrigando uma discussão da pessoa comum com o quadro e consigo própria. Então na medida em que a pessoa diante de um quadro se sente atuar com a sua cuca, eu acho que o quadro tem a sua utilidade, a sua função social também".

                                               FUNÇÃO SOCIAL

Barco pintado no litoral fluminense.
Scliar achava que todo homem tem função social. O artista, atuando sobre uma faixa de público, tem uma obrigação ética de fazer daquilo instrumento, que é   o seu Instrumento de trabalho, de expressão, alguma coisa que sensibilize, que permita que cada homem seja parte deste processo. Isto é patente desde a idade das cavernas quando o primeiro homem fez alguma coisa que foi útil para os outros. Através de um quadro, um conto ou um poema, as pessoas podem despertar para um problema que até aquele momento do contato com um destes instrumentos não pensavam daquele jeito. Na minha opinião, não há obra sem conotação política. Acho que toda obra é parte de um processo. O artista que pensa está desligado, está num papel de alienação. E é um papel político."

                                            SUA PINTURA ATUAL


Scliar e dois trabalhos que expôs no MAMB
Falando sobre sua pintura atual, Scliar adiantou que dizer que minha pintura não me satisfaz era o mesmo que dizer que não gosto dela. Não é nada disto. Mas, ao mesmo tempo, se eu dissesse que estava satisfeito com o resultado que consegui, como se tivesse chegado a um resultado final, francamente eu não estou com o pé no túmulo. Ao contrário, quero viver ainda uns quarenta anos e pintando o máximo. Quanto a esta exposição, é uma oportunidade de vocês compararem vários quadros meus de 1940 até 1977. O painel de Ouro Preto é uma súmula pelo menos de quinze anos de Ouro Preto. Uma súmula lírica, e é um trabalho de protesto, dentro do seu lirismo. Explicava a um amigo que quando eu propus aquele painel, há dois anos atrás, tinha a ideia do painel, não da maneira que fiz. Mas de uma maneira diversa ligada a um painel de protesto para protestar contra a destruição que a cidade vinha sofrendo. Então achava que devia denunciar num painel aquelas coisas por serem fantásticas dentro daquela cidade torta nascida das mãos do homem rude. O construtor de Ouro Freto inventou uma cidade de acordo com uma topografia muito específica e praticamente inventou cada casinha em relação à outra. É como eu dizia ao Emanoel Araújo: é uma cidade cubista. Antes do cubismo já existia Ouro Preto. Portanto, o cubismo estava todo lá lançado. É uma cidade com a perspectiva clássica com um ponto de fuga, que você quebra a cara, pensando que vai estabelecer, analisar a cidade sobre este aspecto, é uma cidade que foi reinventada pelo homem de acordo com cada pedaço de terreno”.

                                                    O RETORNO

 Carlos Scliar  sempre disposto a opinar.
Sobre sua volta à Bahia, Scliar, já expôs na antiga Galeria Querino, na Rua Carlos Gomes, disse que "minha volta à Bahia não é uma volta, e sim um permanente retorno. Na verdade, estou tão ligado à Bahia, mesmo antes de vir através os livros de Jorge Amado. Na verdade, a partir do momento, quando nos meus 14 a 15 anos, li os primeiros romances de Jorge, já fiquei sendo parte daquela imensa quantidade de pessoas que no Brasil afora realmente se ligaram para o Brasil para o resto de sua vida. Em 1941 estive na fazenda do pai dele e ali colhi elementos para ilustração de Seara Vermelha, no sentido de terra, de ambiente, de vivência, e, em 1944 quando vim. Já vim sobre o patrocínio de Jorge Amado e quando depois fiz os painéis em 1973 para o Centro Administrativo também o meu padrinho foi o Jorge. Isto aconteceu depois de uma viagem que fizemos a Porto Seguro e Santa Cruz Cabrália. É que me empolguei tanto com estas duas cidades que ele, percebendo meu entusiasmo, acabou sendo meu advogado e, de repente, disso resultou o convite para fazer os painéis. Agora esta exposição nasceu da continuidade deste clima através de Fernando Peres a Jacyra Oswald, que tendo visto um painel no Rio de Janeiro queriam este painel exposto aqui. Tendo vindo em dezembro para a exposição da coleção de Gilberto Chateaubriand do qual eu sou um dos padrinhos, tive o convite confirmado, ou melhor, ampliado, pois além do painel faria uma pequena retrospectiva, a qual só foi possível porque eram peças do meu acervo. Portanto, estou aqui na Bahia, que é minha casa porque sempre estive ligado a ela”.

sábado, 3 de fevereiro de 2024

A CRIATIVIDADE E A TRADIÇÃO NA CERÂMICA DE IRENE OMURO

 Irene Omuro em seu  ateliê onde vemos 
peças nas pratileiras  de sua autoria.
Estive no ateliê da arquiteta e ceramista Irene Omuro num condomínio em Lauro de Freitas, localizado nos arredores de Salvador, e pude constatar que as peças que faz refletem a tranquilidade desta artista filha de imigrantes japoneses que há anos se dedica à sua profissão de arquiteta, e também à arte da cerâmica. Quando você tem a oportunidade de conversar com ela nota que transmite tranquilidade e suavidade até mesmo neste momento difícil que está vivendo devido as mortes recentes de alguns de seus entes queridos. O encontro com a ceramista foi intermediado pelo decano das artes visuais baianas o Antônio Lobo que a conhecia e foi seu aluno nas aulas de cerâmica que Irene costuma ministrar. Juntos fomos ao encontro de Irene Omuro que chegou em Salvador em 2002 quando seu esposo Luiz Toshio Omuro foi transferido para trabalhar na fábrica da Ford, em Camaçari, a qual depois foi fechada. Chegando eles foram logo criando um ciclo de amizades e a Irene uma relação profissional com alguns artistas baianos especialmente com Calasans Neto e Sante Scaldaferri e suas esposas Auta Rosa e Marina, respectivamente. Acontece que  faleceram seu esposo , sua mãe e uma irmã  e anteriormente seus amigos  o José Júlio Calasans Neto (1932-2006) e Sante Scaldaferri (1928-2016) e também a esposa de Calasans Neto a Auta Rosa em 2018. Portanto, foram perdas sucessivas de parentes (esposo, mãe e irmã) e amigos queridos  que contribuíram para que a Irene Omuro desse uma desacelerada na sua produção de ceramista. Mas, vamos falar aqui de coisas boas e da beleza de suas obras e que ela ainda tem muito a contribuir com sua experiência ministrando suas aulas e produzindo porque criatividade não lhes falta.

Irene concentrada operando o torno.
Irene Omuro não sofreu influência de familiares para escolher a arte da cerâmica porque seu avô e pai trabalharam na lavoura do algodão e depois no comércio. e seus três irmãos seguiram profissões completamente diferentes da sua. Irene Omuro foi fazer arquitetura na Faculdade Mackenzie, em São Paulo, onde formou-se em 1978. Exerceu a profissão por muitos anos e quando nasceu seu segundo filho teve que deixar o emprego para cuidar da criança que nasceu com um problema cardíaco e não podia ser logo operado. À medida que o menino crescia foi trabalhar num pequeno estúdio de design e passou a frequentar aulas de cerâmica com Lúcia Ramenzoni, Terese Mueller, Lica Cox, Maria Helena Ribeiro, Jacy Takai e Hideko Honma. Foi ao Japão em 2000 e esteve com artistas locais e na tradicional Faculdade de Cerâmica de Arita para conhecer de perto a metodologia e os processos criativos dos japoneses. Depois passou a ministrar aulas nos ateliers de Hideko Honma e na Usina das Artes, em São Paulo. A cerâmica já estava assim incorporada à sua vida profissional e daí em diante passou a se expressar e até hoje está envolvida com esta arte milenar que nos surpreende a cada peça que sai de um forno após a queima.

                                                       TRAJETÓRIA

Pintura a óleo sobre tela feita na  juventude.
Na juventude gostava de pintar a óleo, mas a arquitetura o envolvia e o ocupava de tal forma que foi deixando de lado a pintura. Enquanto a conversa  prosseguia  ela se dirigiu ao Antônio Lobo e perguntou: “Lobo conhecia este meu lado de pintora?” Lobo respondeu que não e então ela foi explicar que pintou a óleo sobre tela alguns anos, mas que teve depois de abandonar a pintura devido a seu envolvimento com o estudo e o trabalho na arquitetura. Uma curiosidade que observei é que no quadro que apontou na parede todas as casas não tem portas e janelas. Estão hermeticamente fechadas. Seria aí algum traço psicológico de repressão, de formação numa cultura milenar mais fechada? Talvez sim, talvez não. Só que para os mais curiosos este detalhe chama a atenção porque normalmente as casas retratadas nas obras de arte quase sempre têm portas e janelas.

Obras com  iconografia de
Calasans Neto
.
 Já vimos que sua arte não sofreu a influência de familiares. “Eu surgi do nada como artista meu avô e meu pai Yokichi Kimura trabalharam na lavoura de algodão.” Ela contou que os imigrantes vieram para o Brasil com a promessa de ganharem um pedaço de terra. Ocorreu que isto não foi cumprido e assim seu avô e seu pai com catorze anos de idade foram trabalhar na cultura do algodão. Sabemos que a planta do algodão tem uma estrutura espinhosa e isto machucava as mãos dos imigrantes com muita frequência e chegava a sangrar. Dois anos depois seu pai conseguiu arrendar um pedaço de terra e plantou seu próprio algodão, mas a inexperiência de lidar com esta cultura não lhes rendeu bons frutos. Foi então que decidiu mudar de cidade e se dedicar ao ofício de sapateiro. Passou um ano inteiro trabalhando sem remuneração até que aprendeu foi trabalhar nesta profissão. Ia melhorando de vida quando conheceu sua mãe Yoshie Takayanagi Kimura. Finalmente, montou uma sapataria e passou o resto da vida trabalhando no comércio de sapatos.

                                                              SUA ARTE

Bailarinas dançam em torno das
cerâmicas de Irene Omuro
.
Disse Irene Omuro que ao trabalhar com o barro ela ficou muito impressionada com o resultado e as possibilidades porque podia se expressar no tridimensional. Aí surgiu um encantamento que nunca mais se desprendeu e passou a criar suas peças as quais passaram a ser mostradas em várias exposições coletivas em São Paulo. No ano de 2003 ministra aulas no atelier de Zilma Motta um curso de placas na modelagem em cerâmica e posteriormente ministra aulas de modelagem e torno elétrico em seu próprio atelier. A primeira exposição individual foi realizada em 2004 na Escola de Dança de Fátima Suarez, em Salvador. Irene Omuro lembra que foram momentos muito especiais porque o coreógrafo criou um ambiente com umas prateleiras compridas e os dançarinos dançavam ao redor das peças enquanto um músico tocava uma flauta de bambu japonesa. “Ficou muito bonita e todos que tiveram a oportunidade de visitar gostaram muito das peças que apresentei, disse.”
Matrizes de Calasans Neto que ela
usa para transferir as imagens
para suas cerâmicas.
Da amizade que estabeleceu com o Calasans Neto ela fez algumas exposições
utilizando as matrizes em madeira  dele e transferindo para o barro. Para isto ele fez várias matrizes em pequenos formatos e assim Irene Omuro utilizava essas matrizes para transferir diretamente as imagens criadas por Calasans Neto para sua cerâmicas. Quando as  monotipias só permitem uma única cópia, portanto é exclusiva, original. Calasans usava uma técnica que consistia em fazer suas pinturas com tinta tipográfica em placas de alumínio e depois levava para a prensa. Levava estas placas pintadas para a prensa e a imagem era transferida para um papel de alta resistência, e assim obtinha efeitos inesperados. Dizem que o Calá se divertia com os efeitos que surgiam deste processo de impressão. Todos sabemos que Calasans Neto era principalmente o mestre das xilogravuras na Bahia, embora também pintasse em acrílica sobre tela e as próprias matrizes.

Foto 1- Irene Omuro abraça o saudoso
Calasans Neto. Foto 2 -Irene e Antônio
Lobo prosando, e abaixo detalhe de duas
obras em acrilíca sobre tela de autoria
de Calasans Neto.

Já Irene Omuro nesta sua parceria com o artista baiano usava a técnica de Raku para a queima das cerâmicas. Ela faz a transferência das imagens das matrizes em madeira na argila ainda úmida. Depois de totalmente seca, é feita a primeira queima que pode chegar a 1000°.Posteriormente são esmaltadas e levadas para segunda queima. Nessa fornada de Raku, a peça ainda incandescente é retirada e depositada na serragem onde se incendeia e é abafada. O choque térmico decorrente produz efeitos surpreendentes. Após o resfriamento está pronta a obra.
Na mostra Vivências que apresentou em 2002 no Superclube Breezes,
em Sauipe, em Mata de São João, interior da Bahia, as matrizes feitascom Calasans Neto em pequenos formatos foram prensadas na argila pela ceramista funcionando assim como suporte, substituindo o papel que normalmente era utilizado para a transferência das imagens das matrizes feitas pelo artista . Portanto, a Omuro escolhia a disposição das imagens, os cortes, e a forma de cozimento, a estruturação do campo plástico. Também Irene Omuro fez monotipias inspiradas na natureza retratando plantas, flores e borboletas. Era uma parceria queno final além de mostrar a criatividade do mestre Calasans Neto sobressaiu também a habilidade e a sensibilidade da ceramista em criar  suas obras.
Na exposição Vivências que apresentou em 2002 no Superclube Breezes, em Sauipe, em Mata de São João, interior da Bahia, as matrizes feitas com Calasans Neto em pequenos formatos depois foram prensadas na argila pela ceramista funcionando assim como suporte, substituindo o papel que normalmente era utilizado para a transferência das imagens das matrizes feitas pelo artista Calasans Neto. Portanto, a Omuro escolhia a disposição das imagens, os cortes, e a forma de cozimento, a estruturação do campo plástico. Na segunda queima utilizou o tradicional método japonês do Raku, o qual possibilita resultados inesperados devido ao choque térmico. Também a Irene Omuro fez monotipias inspiradas na natureza retratando plantas, flores e borboletas. Era uma parceria que no final além de mostrar a criatividade do mestre Calasans Neto sobressaiu também a habilidade e a sensibilidade da ceramista em criar suas obras.

Irene trabalhando com 
a técnica do Raku.
Disse Irene que devido a sua idade e mesmo por este processo de queima ser muito pesado e trabalhoso precisaria de uma pessoa para ajudá-la. “Aqui as coisas são mais difíceis, e até meus filhos ficam reclamando que este processo de cerâmica exige muito esforço”. Mas, com sua resiliência e força de vontade Irene Omuro pretende continuar criando suas cerâmicas que têm um design e um toque completamente diferenciado em relação a peças que vemos por aí. 
Num projeto elaborado por  Tanira Fontoura  visando a captação recursos para uma exposição, que não chegou a se concretizar, ela escreveu “Acreditando na arte como instrumento de intervenção cultural e observando o seu amplo poder transformador, a artista Irene Omuro pretende desenvolver uma metodologia nessa exposição em interface com o conjunto de caracteres próprios das tradições orientais presente no Raku associada a contemporaneidade dos aspectos culturais locais, buscando meios de conhecimento, aproximação com o material criativo, assimilando e traduzindo influências plurais, dotando as mais inesperadas manifestações com as mais variadas visões”. Reproduzo este pequeno texto da Tanira porque ela foi muito feliz ao explicitar o trabalho da artista que além de sua habilidade e criatividade conseguiu em pouco tempo se aproximar e conquistar amizades com as pessoas da sociedade baiana, além de assimilar os traços culturais da nossa Bahia. Foi assim que ocorreu desde que chegou em 2002 e em pouco tempo já tinha bons relacionamentos com vizinhos e com artistas como Calasans Neto, Sante Scaldaferri dentre outros. Logo depois de se estabelecer se integrou ao circuito cultural das artes na Bahia e passou a produzir peças, inclusive algumas inspiradas em elementos de nosso Estado e na obra de Jorge Amado. Isto revela a sua capacidade de observação e de captar a essência cultural do local onde está vivendo e podemos observar em muitas de suas peças que expôs em vários locais em Salvador.

                                                                  EXPOSIÇÕES

Belas peças de cerâmica atestam
a arte refinada de Irene Omuro.
Em 2001 participou da exposição coletiva chamada de Mostra Wa no restaurante Gendai Beach, em Boissucanga, interior de São Paulo, promovida pelo atelier de Hideko Honma. No mesmo ano da exposição de bules de ceramistas brasileiros no Tee Gschwendner, Loja de Chá, no shopping Iguatemi, em São Paulo. Ainda em 2001 da exposição Mão Cheia , no primeiro mercado de artesãos diferenciados ni atelier de Hideko Honma; em 2002 da Mostra de Arte Cerâmica e Cidadania, uma coletiva de ceramistas brasileiros realizada na Assembleia Legislativa, de São Paulo; 2003 – Exposição Individual no Projeto Torno do Centro de Dança Mantra de Fátima Suarez, onde cerâmica, dança e música aconteceram simultaneamente, Salvador, Bahia; 2007- Exposição individual Vivência, no Hotel Super Clube Breezes, em Costa do Sauipe, curadoria de Pena Cal Galeria de Arte, Bahia; 2007- Exposição Individual Vivências II comemorativa dos 10 anos do Teatro Jorge Amado e do Espaço Calasans Neto, Salvador, Bahia; 2007 – Exposição Coletiva Circuito das Artes no Museu de Arte da Bahia, com curadoria de Rita câmara; 2008-  Exposição Individual Cerâmica e Monotipia Irene Omuro, no Hotel Pestana, no bairro do Rio Vermelho, Salvador, Bahia; 2008-  Exposição Confraria da Terra, Mercado de Arte em atelier próprio com a participação dos artistas Antonello L’abatte, Antônio Lobo e Consuelo Picazo, com curadoria da  Irene Omuro; 2009-  Exposição Cerâmica da Bahia, na Galeria Cañizares, da Escola de Belas Artes, da UFBA. Nesta exposição coletiva ela fez um workshop da queima de Raku ao vivo; 2012 - Exposição Coletiva de Cerâmica pró Hospital Aristides Maltez, na Paradoxus, do Shopping Barra, com curadoria de Zilma Cardoso Motta, Salvador, Bahia; A Exposição Maritimidade foi aberta no último dia 25 de janeiro de 2023 no Museu Costa Pinto, no Corredor da Vitória, em Salvador, e ficará aberta durante dois meses. É uma boa oportunidade de conhecer as jóias de Ana Gradin e as cerâmicas de Irene Omuro.

                                        CERÂMICA COMO ARTE

Exposição em 2012, no Museu Costa
Pinto de Ana Gradin e Irene Omuro.
Numa entrevista que deu para uma publicação do Instituto Mauá quando de uma exposição coletiva de ceramistas baianos que foi realizada na Galeria Cañizares, da Ufba, no bairro do Canela, em Salvador, Irene Omuro declarou que “considera toda cerâmica uma expressão artística, desde o artesanato mais popular e utilitário quanto o mais sofisticado. Acha que são maneiras de representação inerentes a cada situação. Todas as vertentes têm seu valor, de acordo com o olhar, com a necessidade e com a cultura da região. A Bahia tem uma cerâmica muito expressiva, que é a popular de Maragogipe, Coqueiros, etc. e isto não impede que possa haver até um momento de conjunção dessas vertentes, como eu mesma, que vim de São Paulo, com um trabalho diferenciado, em alta temperatura, que não é comum aqui. Acho que pode até haver um momento de trocar essas experiências com o pessoal do artesanato popular. Eu acho que existe abertura para tudo”.