Armando CR com duas fotos de sua autoria. |
Tenho especial interesse pela fotografia por
registrar numa fração de segundos uma cena inusitada reinterpretando a
realidade transformando em imagens. Sendo jornalista convivi com muitos
fotógrafos durante anos que registravam instantaneamente com sua técnica e astúcia os fatos jornalísticos. Aprendi na
prática que uma fotografia vale realmente mais que muitas palavras. Atualmente com
a chegada dos smartphones e a fotografia digital muita gente se arvora à
fotógrafo, mas existe uma grande diferença entre aqueles que quase
mecanicamente registram um fato ou uma paisagem e os fotógrafos verdadeiros que
registram com a cabeça, com o coração, com o sentimento. Esses são parecidos
com os pintores diante de uma tela em branco. Eles sentem o ambiente, a luz,
procuram um ângulo melhor e eliminam coisas que não lhes interessam na
composição. A criatividade prevalece e a câmara é apenas uma ferramenta como se
fosse um pincel imaginário. Hoje os smartphones trazem câmeras cada vez mais sofisticadas
e as pessoas registram tudo, inclusive sem até nós percebermos. Já as câmeras
fotográficas usadas por fotógrafos profissionais têm inúmeros recursos que lhes
permitem diferenciar suas fotos das amadoras. E na tarde de ontem me vi diante de inúmeras
fotos de qualidade ímpar ao visitar o Studio do fotógrafo Armando CR, na Rua da
Paciência, no bairro do Rio Vermelho, em Salvador. Fiz com ele um tour cultural
e visual ao examinar as belas e criativas fotografias que ele fez em Marrocos, Myanmar ( antiga Birmânia), que para ele foi a viagem mais produtiva. Esteve em Cuba e na Índia em ambas por quatro vezes, Camboja, Vietnã, Butão, Veneza, Portugal, Cachoeira e muitos outros lugares. Agora está programando passar um mês em Bali
fotografando. É um verdadeiro festival de cores, cheiros e belezas que vão
Gal Costa, no Festival MPB, da Record. |
penetrando em seu corpo através o olhar. É como que se você estivesse fisicamente naqueles locais observando
e captando cada detalhe das cores das vestes e dos ornamentos nos corpos dos
personagens, e vendo as expressões captadas por suas câmeras alemãs Leicas,
tidas como uma das melhores no mercado. Conheço o Armando há décadas e sendo
repórter fui entrevistá-lo algumas vezes quando ele era um empresário bem
sucedido e a sua empresa Correa Ribeiro S/A Comércio e Indústria, grande
exportadora de cacau da Bahia, estava em operação. Depois como comerciante dono
das lojas Tio Correa. Hoje, afastado de sua empresa que a transformou numa holding
patrimonial ele vive imerso no mundo da fotografia. Não foi de repente que
aconteceu esta transformação do empresário num fotógrafo. Sua paixão pela
fotografia vem desde jovem, quando estudante registrou nos anos 60 muitos
momentos dos festivais de música popular brasileira da TV Record, em São Paulo.
Armando CR aos oito anos com sua Brownie. |
Mas o seu contato com a fotografia começou ainda mais cedo, ou seja, aos oito anos de idade quando seu avô materno Armando Joaquim de Carvalho lhe presenteou
com uma câmera Brownie, de fabricação americana, durante um cruzeiro de navio com
toda sua família percorrendo vários países europeus. Com o passar dos anos a
primeira câmera se perdeu, mas o gosto pela fotografia permaneceu. Agora para
sua satisfação a sua secretária Andressa Santana conseguiu comprar pela internet uma câmara Brownie pela
bagatela de R$150,00, igual à que ganhara do seu avô. Hoje ele ostenta numa prateleira
do seu Studio junto a foto dele aos 8 anos de idade com sua primeira câmera Brownie
dependurada no pescoço. É interessante ressaltar que ele também coleciona
fotografias de famosos fotógrafos como do Sebastião Salgado, Mário Cravo Neto,
do cubano Alberto Corda, que fez aquela foto famosa de Che Guevara que os
estudantes de esquerda costumam ostentar em camisetas e os comunistas em suas
manifestações. Tem ainda uma foto do suíço René Burri, falecido em 2014, que foi
fotógrafo da agência Magnum Photos por décadas e ficou conhecido por fotografar Che Guevara com um imenso charuto cubano e Pablo Picasso,
além de políticos, militares e artiscas, assim como, imagens icônicas de São
Paulo e Brasília. Inclusive participou de um Workshop em Cuba promovido
pela brasileira a paulista Alessandra Silvestre, casada com o embaixador da
França e que moram na ilha caribenha. Neste evento estiveram presentes fotógrafos
famosos e ele fez amizade com o colega fotógrafo Mário Dias, que é cubano, e já
esteve por lá quatro vezes. Compareceu também ao Workshop o suíço René Burri,
fotógrafos americanos, um austríaco e de vários outros países. os filhos
de Che Guevara e o Fidelito, filho do Fidel Castro. Nessas viagens e
convivências aprendeu a sair da bolha e a trocar experiências enriquecedoras.
ROMPEU A BOLHA
Armando CR no seu apartamento do Copan, em São Paulo.Época de militância. |
O nosso personagem chama-se
Armando de Carvalho Correa Ribeiro, assina como fotógrafo Armando CR, é filho
de Carlos Correa Ribeiro Filho e Maria Lúcia Carvalho Correa Ribeiro. Nasceu na
maternidade do Hospital Português, em Salvador, no dia 15 de fevereiro de 1944,
portanto está com oitenta anos de idade bem vividos. Morou do zero aos 16 anos no
famoso edifício Oceania, de frente ao Farol da Barra. Fez seu curso primário na
Escola Modelo, que era uma escola particular, mista, pertencente à professora
Helena Mateus, conhecida por proporcionar uma boa qualidade de ensino e também por
ser disciplinadora. De lá foi para o Colégio Antônio Vieira onde permaneceu até
o terceiro ano quando decidiu romper a bolha do conforto de sua família
abastada e foi para São Paulo morar no famoso edifício Copan, cujo projeto
arquitetônico é de Oscar Niemeyer.
Este prédio foi
inaugurado em 1966, fica na Avenida Ipiranga, na capital paulista número 200, tem
32 andares e 1.160 apartamentos de dimensões variadas e ocupados por cinco mil
pessoas. Imagine o choque que o jovem Armando Correa Ribeiro deve ter sofrido,
ele que morava aqui confortavelmente. Em São Paulo fez o vestibular para a
Escola de Administração da Fundação Getúlio Vargas onde entrou no dia 31 de
março de 1964, exatamente no dia da chamada por muitos de Revolução de 1964 e
outros de Contra Revolução, Ditadura Militar e por aí vai. Participou
ativamente do movimento estudantil e chegou a ser eleito vice-presidente do
Diretório Acadêmico da faculdade com uma votação expressiva.
Decidiu ir trabalhar numa madeireira e lá tinha
um diretor da empresa que era
comunista e possuía muitos livros sobre o
marxismo. Com medo de receber a visita do DOPS e da Polícia Federal pediu que
guardasse esses livros, e assim ele andava com seu fusca cheio de livros
considerados “subversivos”, para cima e para baixo pelas ruas de São Paulo. A sorte
é que nunca caiu numa blitz. Montou um pequeno laboratório fotográfico no seu
apartamento no icônico edifício Copan e ali revelava fotos dos festivais de música popular e
outras que fazia em São Paulo. No ano de
concluir o seu curso de Administração na FGV foi procurado por um diretor da
Gillette que estava decidido a trocar os dirigentes aqui no Brasil. Era para
ganhar um bom dinheiro cerca de NCR$1.200,00. Seu tio Fernando Correa Ribeiro ao
saber da sua decisão resolveu convidá-lo para voltar para Salvador e ingressar na
Correa Ribeiro S/A Comércio e Indústria recebendo o salário de NCr$900,00. Portanto
um pouco menor que o oferecido pela multinacional. Mas, atendendo aos apelos
dos pais e do tio Fernando Correa Ribeiro resolveu voltar e passou a trabalhar
terminando como dono da empresa que hoje é uma holding patrimonial.
Baile em Cuba, onde vemos a singeleza dos gestos. |
Lembrou que aprendeu a língua inglesa através
de um curso à distância chamado de Calvert School of English e neste curso tinha
aulas até de História da Arte. Nas viagens que fez para a Europa e Estados Unidos
teve a oportunidade além de conhecer as cidades visitar muitos museus
importantes e esta formação do curso de inglês“me ajudou muito em apurar a minha sensibilidade e
conhecimentos, e a partir daí desenvolver a arte fotográfica que faço
atualmente”, disse Armando CR.
Adiantou quando retornou e já casado foi morar na
Avenida Princesa Izabel, no bairro da Barra Avenida, em Salvador, e montou
também um pequeno laboratório para revelar suas fotos. Continuava com a
exportação de cacau, mas quando a lavoura cacaueira passou a declinar
especialmente com a vassoura de bruxa que dizimou muitas fazendas ele resolveu
acabar com a empresa exportadora de cacau. Em 1966 o Armando Correa Ribeiro fundou as famosas
lojas Tio Correa que tinha o inconfundível senhor barrigudo com bigodão como
marca e chegou a ter 32 lojas espalhadas por várias cidades baianas da região
cacaueira e duas em Recife. Uma curiosidade quem criou a marca das lojas foi a
empresa de publicidade Publivendas, do saudoso Fernando Carvalho, que
Velha barqueira fotografada no Vietnã. |
contratou
um freelancer para fazer a marca. Depois passou a ser atendida pela Propeg e
finalmente a DM9. Na época o Duda Mendonça seu amigo, era corretor de imóveis da
Construtora Promov e resolveu abrir uma empresa de publicidade e marketing político
juntamente com Zilmar Fernandes e passou a atender as Lojas Tio Correia. As lojas
funcionaram de 1968 quando o Armando Correa Ribeiro vendo a inflação
alcançar altos patamares de cerca de 80% resolveu se desfazer das lojas e
procurou o empresário Israel Portnoy, que era o dono da concorrente Lojas Ypê,
que as adquiriu e passou a operar as lojas. O trato era que Israel Portnoy ia
operar as Lojas Tio Correa por um ano e se não conseguisse tocar o negócio lhe
devolveria. Três meses depois Israel Portnoy o procurou e disse que o negócio
estava fechado definitivamente , acertaram os valores, e assim semanalmente
Menino num mercado na Índia. |
o Israel fazia o
pagamento parcelado do valor acordado.
Após a venda das lojas o Duda Mendonça o
convidou para trabalhar na DM9 e assim ele foi com toda a sua família para São
Paulo integrando o marketing político da campanha de Paulo Maluf, que terminou
sendo eleito governador de São Paulo, e o Armando Correa Ribeiro ficou por sete anos na capital paulista. Seguiu para Brasília trabalhar na campanha do candidato a governador do
Distrito Federal, Joaquim Roriz, que foi eleito. Voltando a Salvador criou o
Restaurante Trapiche Adelaide que foi um sucesso, depois o demoliu e construiu
um conjunto de vinte apartamentos de alto padrão no local. Agora deu um tempo à
sua atividade empresarial e vive dedicado à sua arte de fotografar.
A FOTOGRAFIA
Armando CR fotografou a Menina da Ilha de Maré e voltou a fotografá-la dez anos depois. |
Foto de uma tourada em Portugal.Isto mesmo na terra lusitana tem touradas . |
Falando da arte fotográfica de Armando CR é
preciso antes de tudo esquecer o empresário bem sucedido que conheci e olhar
com atenção as imagens que consegue captar com suas câmeras e
principalmente com sua aguçada sensibilidade. Posso dizer que Armando é um
artista ousado que rompeu a sua bolha de conforto e sai por aí procurando
captar a essência das pessoas, das paisagens e objetos que lhes tocam de perto.
Sua postura é diferente daquela do turista deslumbrado que sai por aí
fotografando tudo. Não, Armando CR sabe o que lhe interessa fotografar, vive
emocionalmente aquele momento e vibra quando consegue transformar aquela
realidade numa fotografia de qualidade. Suas fotos emanam sentimento como uma tela
de um artista. São emoções diferentes? São. o artista vai criando a cada passo e pode
demorar até meses. O fotógrafo muitas vezes conta apenas com fração de um
minuto para realizar aquela foto fantástica. Mas, são emoções que surgem com a
mesma intensidade e quando um artista recebe um elogio da tela
Monge em Mynmar, antiga Birmânia. |
que pintou e o
Armando CR de sua fotografia. Esses elogios se equivalem. É o reconhecimento
explícito de um trabalho feito com suor, emoção e sensibilidade.
O fotógrafo americano Arnold Newman ficou conhecido
por seus retratos ambientais. Ele conseguia capturar a essência das pessoas e
também suas obras. Fez retratos de políticos como de John Kennedy e outras
celebridades, e falando da arte fotográfica disse: “Nós não tiramos fotos com
nossas câmeras nós tiramos fotos com os nossos corações e mentes. Elas são
reflexo de nós mesmos... o que somos e o que pensamos”. Ele nasceu em Nova
Iorque em 3 de março de 1918 e faleceu em 6 de junho de 2006, na sua cidade
natal.
EXPOSIÇÕES REALIZADAS
Foto na chamada Cidade Azul, em Marrocos. |
Nos textos que você está escrevendo (graças a deus) tem duas coisas importantes o registro e a observação sobre a atividade fos artistas, ou das pessoas que co tribuiam para a formação da cultura baiana, hoje reduzida a alguns babilaques e também o olhar antropológico, como nesse texto. Uma parte significativa da cobstrucao econômica da cidade vem à tona com registros memoráveis, vide o de Duda Mendonça e o do próprio CR. Você está com uma capacidade invejável só vista nos textos de Thales de Azevedo, que trabalhou na Casa Tude , como apontador de almoxarifado e depois se tornou um gran de sociólogo, parabéns
ResponderExcluirRita De Cassia Martins
ResponderExcluirAdorei, realmente Armando CR é surpreendente, conheci na DM9, a história dele merece um roteiro!
E você meu amigo, nos enriquecendo com esses textos maravilhosos! A Bahia é um manancial de talentosos artistas!!!
Parabéns professor...
Edna Silva
ResponderExcluirSou apaixonada por fotografias.
Washington Arléo Art
ResponderExcluir·
E este é um fotógrafo que faz Arte através das lentes...!
Teresinha Nogueira
ResponderExcluirQue pessoa inteligente desde 8 anos ja gostava de fotografar
Maria Das Graças Santana
ResponderExcluirFotos interessantes! Sucesso
Antonio Jorge Studart
ResponderExcluir💯👏👏👏
Alice Campos
ResponderExcluirLuiz Claudio Campos
ResponderExcluirFascinante história desse desse empresário que se tornou fotógrafo. Reynivaldo Brito sempre divulgando novos talentos
Graça Gama
ResponderExcluirLindas fotografias 👏👏👏👏👏
Carlos Félix
ResponderExcluirEste Reynivaldo sempre teve um bom olhar para artes
Antonio Carlos Da Rosa
ResponderExcluirExcelente profissional!!👏👏
Núbia Espinheira Avena
ResponderExcluirBeleza de trabalho, belas fotos enriquecidas pela matéria de Reynivaldo que mais uma vez nos brinda com mais esse registro cultural. Parabéns
Ivo Neto
ResponderExcluirBelíssima divulgação parabéns amigo Reynivaldo Brito 👏👏👏
Lurdes Jacobina
ResponderExcluirGrande fotógrafo,belíssima reportagem!
Zélia Alves
ResponderExcluirArrasou!
Liane Katsuki
ResponderExcluirBravo!
Maria Maxixe
ResponderExcluirSou uma fã da fotografia em preto e branco , meu pai foi fotógrafo amador quando ainda não eram colorida , ele usava a sepia , as fotos ficavam lindas .
Parabéns ao fotógrafo .
Armando CR
ResponderExcluirMeu amigo me emocionei. Me emocionei.Nunca tive uma biografia tão bem escrita e tão verdadeira, pegando a essênciada minha vida e me incentivando mais do que nunca a prosseguir neste meu caminho.Quando a gente encontra uma pessoa com a visão como a sua, que não se espera, não é uma opinião de familiares ou de amigos próximos torna-se um momento muito inportante e muito especial.Não tenho como lhe agradecer.
Publico este áudio do Armando CR devido ao seu reconhecimento e das palavras sinceras acerca do que venho fazendo revelando o lado humano dos artistas e de sua trajetória.
ExcluirElisa Galeffi
ResponderExcluirBela matéria! Gostei muito de conhecer o belo trabalho e trajetória desse artista.Parabéns.
Domingos Dantas Brito
ResponderExcluirA fotografia é como perfume , marca lugares pessoas e épocas..
Antonio Lins
ResponderExcluirUm grande fotógrafo.
Zebay Silva
ResponderExcluirMuito bacana!🤝
Darcy Brito
ResponderExcluirMuito bom. Ele não só fotografa o lado material mas alma que ali emana.
Lurdes Jacobina
ResponderExcluirGrande fotógrafo,belíssima reportagem!