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sábado, 21 de junho de 2025

FORY E SUAS ESCULTURAS ESTILOSAS DE MULHERES E ORIXÁS



O
Fory em seu ateliê esculpindo  entidade 
de matriz africana.
escultor Fory é um artista autodidata da cidade de Cachoeira, Bahia, que tem se destacado no cenário das artes visuais com suas esculturas de madeira de mulheres e orixás. Na conversa que tivemos por telefone lembrou que seu pai Wandercock do Nascimento era um ex-combatente das Forças Expedicionárias Brasileiras e por ter sofrido com os horrores da guerra não queria que nenhum dos nove filhos seguisse a carreira militar. Foi então que ia colocando cada filho numa tenda ou oficina para que aprendesse uma profissão. O Fory inicialmente ainda criança foi para uma pequena marcenaria de um vizinho onde realizava pequenos serviços como varrer a tenda, pegar ferramentas para o mestre e até mesmo comprar ou levar alguma coisa para um cliente. Lá também aprendeu a fazer miniaturas de móveis. Quando tinha por volta de quinze anos certo dia no início dos anos 70 surgiu na rua onde morava uma barbearia-ateliê de Boaventura da Silva Filho, famoso escultor da cidade conhecido por Louco, e seu irmão Clovis Cardoso Silva que também esculpia quando não estavam cortando cabelo ou fazendo a barba de algum cliente. 

Bela escultura Bocas. Vemos
que aproveitou as formas 
de uma árvore
.
Procurou se aproximar e assim começou lixando as obras dos escultores, e aos poucos observando o modo deles esculpirem até que surgiram suas primeiras incursões pela arte da escultura. Disse que seus primeiros trabalhos foram entalhes de placas, e à medida que ia dominando as ferramentas apareceram naturalmente as primeiras peças tridimensionais ou sejam as esculturas. Uma de suas características herdadas do seu mestre Louco é de aproveitar as formas, os veios, as reentrâncias e saliências das madeiras que adquire para fazer a sua arte. Até mesmo a maneira de assinar as peças inicialmente ele se inspirou no Louco que assinava Louco B.S.F, ou seja, o nome artístico e as primeira letras do nome e sobrenome. O Fory passou a assinar Fory C.A.N. Com o passar do tempo abandonou esta forma de assinar as suas obras e passou a grafar somente Fory, que é um apelido que foi criado por seus irmãos.

Começou a vender as suas peças através de Louco na barraca Iansã de Oxóssi, do seu Carlinhos, que ficava no Mercado Modelo, local de grande afluência de turistas. 

Esculturas Ela, Yayá, Deusa e Dançarinas.
Disse Fory que este senhor por muitos anos trabalhava vendendo com exclusividade as esculturas de Louco e quando completou dezoito anos ele mesmo levava as suas esculturas para o seu Carlinhos vender. As esculturas eram de ceias de Cristo e os vários Orixás que esculpia. Naquela época o Mercado Modelo tinha um bom movimento de público e suas peças eram facilmente comercializadas. Com o passar do tempo adquiriu mais informações, conheceu outros escultores e foi mudando à sua maneira de esculpir até chegar nas mulheres curvilíneas e estilosas que esculpe atualmente, e  os Orixás que faz procurando manter  o seu estilo próprio. Desde os anos 80 que seu ateliê funciona na Rua 13 de Maio, no Centro Histórico da cidade de Cachoeira, Bahia, onde faz suas esculturas. Atualmente reside num sítio nas redondezas da cidade, e disse que também lá tem um ateliê, e quando não está na cidade costuma esculpir também no sítio.

                                             TRAJETÓRIA

Os Remanescentes onde  destacamos  
as formas e o acabamento das obras.
Seu nome de batismo é Carlos Alberto Dias do Nascimento, filho do ex-combatente Wandercock do Nascimento e Zélia Dias do Nascimento. Fez o primário na Escola Ana Nery e o ensino médio no Colégio Estadual de Cachoeira, ambas instituições públicas. Com o término da Guerra seu pai retornou à Cachoeira, e foi nomeado para trabalhar como ferroviário da Leste Brasileira  passando a se preocupar em colocar cada filho para aprender uma atividade profissional.

Hoje Fory é um artista conhecido e envolvido com seus colegas “brasileiros e afro-americanos que lutam por seus direitos e espaços na sociedade e na arte”, escreveu sua esposa a jornalista Alzira Costa. Diz ainda que “suas obras carregam personalidades e identidade, distinguidas pelas formas rebuscadas e fino acabamento. São obras inspiradas em divindades do panteão africano, figuras femeninas, nas manifestações populares do Recôncavo e livres criações seguindo as linhas do formato da madeira. A arte de Fory dialoga com o contemporâneo e a tradição sem perder as suas raízes.”

Cabeça do Guerreiro Celestial.
Ele tem um filho que reside na cidade de  Los Angeles, nos Estados Unidos onde trabalha numa grande casa de espetáculos. Revelou que quase todos os anos vai para lá onde costuma passar até seis meses e que  já mantém um bom relacionamento principalmente com a comunidade afro-americana . Sempre está comercializando suas esculturas, especialmente àquelas que representam Orixás e outras manifestações religiosas e culturais de raiz africana. Já expôs inclusive em Nova Iorque em 1986, juntamente com outros artistas baianos.

Quanto ao seu apelido inicialmente dado por seus irmãos era Forifa,  depois passou para Fori, e ele  adotou o nome artístico de Fory com o y. Contam uma versão, que não é verdadeira, que o apelido teria sido inspirado num famoso lutador chamado de Forforifa. Acontece que fui pesquisar e nada encontrei sobre esse enigmático lutador. Voltei ao Fory para saber. Inicialmente, ele não lembrava, e terminou por dizer que esta estória teria sido cunhada  por uma pesquisadora dinamarquesa. Quando indaguei a razão ele não soube explicar. Portanto, é mais correto afirmar que o apelido surgiu em casa entre seus irmãos.

Escultura de Xangô Jovem.
Escreveu a professora Suzane Pinho Pêpe que em 1986 ele “participou da III Conferência Mundial dos Orixás, Tradição e Cultura, em Nova Iorque, que reuniu representantes do mundo “Atlântico Negro” – Caribe, Brasil, África e EUA – lugares das “diásporas negras” e lhe proporcionou a troca de experiência com artistas de outros países. Essa exposição de arte, que integrou o grande evento, aconteceu no Aaron Davis Hall, da Universidade no Halley. Na mesma ocasião, Fory proferiu uma palestra sobre os orixás, no Caribe Cultural Centre “.

Entre suas obras mais significativas estão a escultura Rastafari datada de 1983 homenageando o famoso cantor de reggae Bob Marley e o  Ferreiro Celestial que foi feita utilizando pregos, correntes, formões, chaves de fenda e outras ferramentas inspirada nos seus ancestrais ferreiros que se manifestam nos terreiros da região como Ogum (Iorubá) e Gun (Fon.). Ligado às suas tradições ele frequenta o terreiro de Yiê Oyó Mecê Alaketu Axé Ogum ,na cidade de Governador Mangabeira, que é dirigido pelo babalorixá Leopoldo Silvério da Rocha desde 1963. Voltando às suas esculturas vemos que  estiliza a figura humana e mesmo nas representações  como das mulheres  da Irmandade da Boa Morte, dos tocadores de atabaques e de outros instrumentos, e até das entidades religiosas da matriz africana ele sempre está esculpindo-os de forma elegante e apresentam algum erotismo em suas formas. 

EXPOSIÇÕES INDIVIDUAIS

Em 1984 – Cachoeira-BA – Individual, Exposição de Fory, na Galeria da Sphan/Pró-Memória; 1986 – Cachoeira-BA – Individual, Exposição de Fory. Sobrado na Rua Ana Néry, n. 23; 1988 – Cachoeira-BA – Individual, Omo-Ebora no Ateliê de Fory Nascimento; Morro de São Paulo-BA – Individual, no Hotel Villegaignon; 2010 – Morro de São Paulo-BA – Individual, na Galeria do Hotel Portaló.

Participações em Salões, Bienais e coletivas:

O Orixá Oluadé,  obra de Fory.
Em 1978 – Salvador-BA. Mostra de Arte Popular na Aliança Francesa da Bahia – 1 – Cachoeira-BA, na Aliança Francesa; 1984 – Cachoeira-BA. Exposição Coletiva, no SPHAN; Salvador-BA – Pré-Bienal de Cultura Afro, no Museu Afro-Brasileiro (UFBA); 1984/1985  –  Salvador-BA – Bienal de Cultura Afro, no Museu Afro-Brasileiro (UFBA); 1986  –  Salvador-BA – Cachoeira e seus Artistas, no Solar do Ferrão; Nova Iorque-EUA – Exposição na III Conferência Mundial dos Orixás, Tradição e Cultura, no Aaron Davis Hall;  1987  –  Cachoeira-BA – Exposição em Homenagem a Tamba e Bolão, no SPHAN; Salvador, BA – I Bienal de Arte Negra, no Museu de Arte da Bahia (promovido pelo Núcleo Cultura Afro-Brasileiro ; 1991  –  Cachoeira-BA – Exposição Coletiva, na I Semana de Arte e Cultura, na Galeria do IPAC- Organização: AAACC e Casa do Benin; São Félix-BA – I Bienal do Recôncavo, na Fundação Dannemann; 1992  –  Cachoeira-BA – II Bienal de Cultura e Arte Negra, realizada em Salvador, com extensão em Cachoeira, Organização: Núcleo Cultural Afro-Brasileiro, AAACC e IPAC, na Galeria do IPAC; 1995  –  Cachoeira- BA – Exposição Coletiva de Artes Plásticas, promovida pela AAACC, na Sede do IPHAN; 2000  –  Salvador-BA – Exposição Coletiva de Artistas Regionais, na Galeria SEBRAE; 2002  –  Cachoeira-BA – Cachoeira na Ótica dos Artistas Plásticos Cachoeiranos, na Câmara Municipal; 2005  –  Cachoeira-BA – Exposição Coletiva, na Galeria do IPAC; 2006/2007  –  São Félix-BA – VIII Bienal do Recôncavo, na Fundação Dannemann; 2009  –  Salvador-BA – “Cidade Histórica, uma Cachoeira de Emoções”, no Instituto Mauá, no Pelourinho; 2012  –  Cachoeira-BA – Exposição Coletiva Escultores de Cachoeira, no Espaço Cultural Fundação Hansen Bahia.


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