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quinta-feira, 14 de julho de 2022

OS ARTISTAS POPULARES QUE TEIMAM EM CRIAR

 Temos em todas as cidades do interior os chamados artistas populares que nunca frequentaram escolas de arte ou mesmo tiveram orientação de um professor mais especializado. Eles surgem com seus talentos espontaneamente e vão tateando daqui e dali até serem reconhecidos pelo que criam e produzem. Assim surgem escultores, pintores, desenhistas, gravuristas, artesãos, fotógrafos dentre outras categorias. Portanto, este texto se propõe a mostrar alguns desses artistas que estão aí no mercado em Ribeira do Pombal tentando mostrar e sobreviver da arte que fazem. Sendo um amante da arte por onde passo procuro ver e descobrir novos talentos. Minha casa tem suas paredes repletas de obras de arte e sempre estou olhando e admirando cada detalhe. Elas servem para dar alegria e vida, transformando as paredes frias em locais de boas vibrações, além de proporcionar o embelezamento. Uma casa sem uma obra de arte, quer seja uma pintura, uma fotografia ou escultura é uma casa sem vida, de paredes mortas. Portanto, procurem colocar em suas casas e apartamentos uma obra de arte, e prestigiem os artistas da terra que precisam sobreviver de sua arte, e que teimam em mostrar seus talentos. Ao adquirir uma obra de arte você também está contribuindo para a melhoria da qualidade da arte que eles produzem, porque à medida que pintam, esculpem, gravam ou fotografam vão aperfeiçoando suas habilidades e a qualidade de suas obras.

Vânia Reis e algumas telas de sua autoria. A maior é
da Praça Getúlio Vargas , vendo o sobrado dos Brito.
 A Josivânia Santana dos Reis , que assina suas obras como Vânia Reis, é natural do Povoado de Barrocão, é  a mais talentosa, conhecida experiente  entre os artistas populares do município. Ela nasceu em 15 de junho de 1967 e diz que seu interesse pelas artes começou desde criança  quando descobriu que poderia fazer alguns objetos de barro, e também  passou a realizar  seus primeiro desenhos. Frequentou alguns cursos temporários ministrados no município e até mesmo em São Paulo , e em 1997 passou a expor algumas obras. Hoje é uma artista reconhecida na região e de quando em fez solicitada a fazer um mural em pousadas, bares e mesmo em residências particulares. Também, escreve poemas e é uma ativista contra a violência doméstica. Sempre está participando de lives ou outros eventos mostrando sua arte e levando a mensagem contra a violência doméstica, a que inclusive  diz que foi uma das vítimas.

Vânia Reis tem realizado também um trabalho de resgate pintando prédios históricos que desapareceram devido a insensibilidade de gestores públicos e mesmo de famílias que se desfizeram de seus imóveis por várias razões. A nossa Cidade tem uma memória curta, como se diz no popular. Preservação aqui é quase um palavrão. O último prédio histórico que foi demolido  para a construção da sede do Tribunal Regional Eleitoral  foi a Cadeia Pública. Eu cheguei a falar com um Diretor do TRE , que trabalhou comigo no jornal A Tarde sob a possibilidade de pelo menos preservar a fachada da Cadeia Pública, mas ele respondeu que seria impossível porque o projeto é padrão. Isto não iria interferir no projeto. Apenas um simples recuo poderia ter salvo mais este prédio histórico. A culpa foi do prefeito da época que simplesmente permitiu sem qualquer reflexão.

A arte de Marlene, índia Kiriri, utiliza materiais
recolhidos da natureza. 
Temos a índia Kiriri Marlene Maria de Jesus, 57 anos, casada com Orlando Jesus dos Santos e tem oito filhos: Josileide, Rogério, Ricardo, Maíra, Rosângela, Cleoma, Sueli e Ronaldo.  Nasceu na Mirandela, quando pertencia a Ribeira do Pombal, e ela trabalha com palha do ouricurizeiro de onde tirar a fibra que confecciona bolsas, tranças,  tangas e sutiãs. Também sem tirar a fibra usa a palha in natura faz as esteiras e abanos , e com outros materiais confecciona cocares,   maracás e colares . "Um galho de ouricurizeiro para mim é vida! Às vezes trabalho com meu filho Rogério  que faz também aiôs com a fibra do ouricurizeiro, mas, ele sabe fazer também com linhas industriais  tricotadas. "

 E continua Marlene "tenho trabalhado fazendo sutiãs e tangas de fibras de pindoba (ouricurizeiro) mas sinto falta de um manequim para ver melhor o resultado do que faço. Muitas vezes a gente pede a uma sobrinha para vestir, para olhar como está o caimento, e mesmo se precisa ser feito algum ajuste. Com o manequim seria melhor porque estaria sempre a disposição para isto. "

Ela mora na comunidade de kiriri , na Mirandela, que hoje pertence ao município de Banzaê, que foi desmembrado de Ribeira do Pombal em 24 de fevereiro de 1989. Começou a trabalhar com a mãe em utensílios domésticos feitos de barro e quando sua mãe faleceu ela continuou e aprendeu a fazer outros utensílios e elementos de sua cultura que são comercializados em feiras e outros eventos. 

Obras de  Humberto Souza. Abaixo vemos o antigo
Mercado Municipal, que foi demolido.
 Humberto Santos Souza, 71 anos, filho de Zezito Paulo dos Santos e  Josefa Cristina de Souza (falecida),  montou a primeira galeria de arte que funcionava na Rua Fernanda Gama, ao lado do Bradesco, mas terminou fechando porque não tinha movimento comercial. "Depois que me aposentei  do Banco do Brasil tive que procurar fazer algo. A saída foi me dedicar à arte senão ia endoidar. Queriam me transferir para São Paulo, Paraná e outros estados . Foi quando preferi aceitar o Pedido de Demissão Voluntária - PDV, em 1996 . Depois passei um ano mal,  adoeci e tive um AVC. Foi a arte que me salvou. Desde criança que desenhava e já adulto comecei a pintar a partir dos 18 anos. Nunca tive curso, embora os colegas na época me incentivaram muito a fazer um curso na Escola de Belas Artes da Ufba." Ele é natural de Jandaíra, Bahia, e está em Ribeira do Pombal há mais de cinquenta anos. Confessa Humberto que " hoje estou com os movimentos limitados do lado direito e isto tem dificultado pintar. Tenho várias obras  aqui em Ribeira do Pombal ."

Geovane e as luminárias  feitas de tubos  de  pvc.
 Geovane Bitencourt Gomes, diz ser  natural de Tucano, 59 anos, "mas vivo aqui há mais de quarenta anos, sou praticamente pombalense. Desde os quatorze anos que estou envolvido com a arte. Primeiro fazia entalhes em madeira e depois fiz algumas pinturas, e cheguei a fazer uma exposição na Mona Pizza, aqui mesmo em Ribeira do Pombal. Parei de pintar por falta de incentivo e as pessoas não dão o valor que a gente espera. Publiquei um livro de poemas  "Desabafo do Poeta", em 2001, e a partir de 2018 descobri o pvc como material para fazer a minha arte. Hoje elaboro abajures, luminárias, miniaturas, caricaturas o que você pensar em pvc eu faço. Já tenho minha Carteira Nacional de Artesão e estou esperando ajuda do Governo "porque a coisa está braba".

Ricardo e suas esculturas de cimento e casca de coco.
O artesão Ricardo Oliveira Silva, o Ricardo Arte ,  trabalha com vários materiais, inclusive com casca de coco, pó de madeira e cola. São materiais naturais reciclados. Faz também entalhes de madeira reproduzindo animais da região e mesmo de outros estados do Brasil. "Ultimamente tenho feito algumas esculturas de cimento e já tenho peças de espalhadas em vários cidades do país. É um trabalho simples, humilde, procuro sempre dar vida aos meus trabalhos." Sempre procurou aproveitar materiais da natureza, que estão disponíveis na região. 
Essas pequenas esculturas de tartarugas mostram que o Ricardo poderia criar outros produtos, mas para isto precisaria de cursos para conhecer novos materiais e novas técnicas para melhorar ainda mais a qualidade dos produtos que cria. Também, seria necessário que houvesse um local onde os artistas pudessem expor seus produtos e obras para que os visitantes pudessem conhecer e adquiri-los.

Ana Belck usa massa de biscuit. em suas obras.
A jovem paulista Ana Belck de vinte e seis anos, nasceu em São Paulo, mas mora em Ribeira do Pombal desde um ano de idade. Ela disse que
 teve contatos com os mais variados tipos de materiais e instrumentos ligados à arte. Escolheu trabalhar com a massa de biscuit ou porcelana fria em 2017. A Ana  modela as peças e depois passa a pintar suas pequenas esculturas.  Já adquire a massa de biscuit pronta e para colorir as peças usa tinta de tecido ou mesmo corantes em pó. Trabalha e manuseia cola branca, isopor, rolo para misturar a massa , arame galvanizado e estecas, que são ferramentas em metal usadas em modelagem e esculturas de argila para retirar excessos, cortar e criar sulcos.

Fabrício , artista versátíl no seu ofício de pintar.
O artista Fabrício Santana, embora seja natural de Euclides da Cunha, também reside em Ribeira do Pombal. É desenvolto para falar dos seus trabalhos e segundo ele tudo começou espontaneamente desenhando até chegar aos pincéis. Já fez algumas exposições. Ele contou que o primeiro desenho que fez foi para um tio que na época lhe pagou R$5,00. A partir daí viu que poderia ganhar algum dinheiro  desenhando, porque antes trabalhava na roça. A diária era muito baixa. Então no colégio ele desenhava os mapas das aulas de Geografia e outros trabalhos escolares. Sempre teve interesse em tornar-se profissional e sempre que pedia materiais à sua mãe para pintar ela não podia dar e ficava muito triste com isto. Até hoje quando lembro, ela chora". Lutei muito para vender meus quadros e com 17 anos vim para a Cidade e fui trabalhar de cabelereiro, onde fiquei durante um ano. Todo início de trabalho é difícil e passei muitas dificuldades, inclusive passei até fome. As coisas foram acontecendo e continuei desenvolvendo o meu trabalho de artista plástico. Participei de um concurso no colégio e ganhei o primeiro lugar e o segundo da região. Ganhei um kit de pintura e uma viagem para Salvador onde passei uma semana no Hotel Fiesta Bahia participando de um Workshop (é seminário ou curso intensivo, de curta duração, em que técnicas, habilidades, saberes e artes tudo aplicado e demonstrado). Tudo foi pago pelo Governo Federal e isto foi um ponto chave para continuar. Trabalhei na lanchonete MeKoma, que ficava na Praça Getúlio Vargas, e quando sai fui trabalhar no Centro Municipal de Cultura como desenhista. Ai passei a ficar mais conhecido e vendi minha casa e uma moto que tinha e me mandei para Carmo do Paranaíba, em Minas Gerais,  para participar de um evento com o artista mineiro  com o artista hiper realista Fabiano Milani e voltei com R$120,00 no bolso. Lá conheci minha atual esposa e estamos aqui na luta. Trabalho hoje com pintura residencial e artística. Ainda não fiz uma exposição individual, mas pretendo fazer em breve. O nome já foi escolhido Gratidão, a todos que me ajudaram".
José Ailton e algumas de suas obras realistas.
Morador da localidade de Barro Vermelho, na zona rural de Ribeira do Pombal o jovem  José Ailton Bezerra de Oliveira, que assina José Ailton, de 23 anos, disse que começou desenhando desde 10 anos de idade. Sempre que tinha uma folga das aulas do colégio desenhava uns coelhos e outros animais e as pessoas que viam ficavam admiradas dos desenhos. De lá para cá acho que evolui muito e fui mesmo levar a sério este meu dom de desenhar a partir de 2016 quando comecei a me interessar pelo desenho realista, que lembra uma fotografia. "
Trabalha como ferramenta os lápis em várias graduações que vai do HB até o 8B para conseguir dar todos os traços desde o mais fino ao mais grosso. Diz que "temos que ter uma boa técnica para tirar a dureza do lápis e dar uma ideia de pele quando desenhamos pessoas. Uso o ´papel Canson e para conseguir tenho que comprar em Feira de Santana e Salvador. Estou iniciando o uso de  lápis de cor para os desenhos. Atualmente os lápis de cor são  marca Faber Castel que é bem melhor para   desenhar.  Estou também fazendo escudos e letreiros, uma forma de sobreviver com a minha arte. Mas, confesso que está muito difícil no momento sobreviver de arte em Ribeira do Pombal. Atualmente estão devagar as encomendas de desenhos. Agora estou também cortando cabelo e ainda trabalho na roça, e dá uma risada, mostrando sua disposição em enfrentar a vida  sem lamúrias. Já mostrou seus desenhos na Cultureira, em 2018 aqui em Ribeira do Pombal . Com a pandemia tudo parou. O meu sonho é expandir minha arte e mostrar em outras cidades." 

NR - Meus agradecimentos a Hamilton Rodrigues por sua busca pelos artistas . Quando é um texto com vários depoimentos dá mais trabalho porque depende dos horários e disponibilidade das pessoas. 

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