sexta-feira, 21 de julho de 2023

TRÊS ARTISTAS HOMENAGEADOS NO MAFRO

Edmundo Simas rindo e Reginaldo Bonfim.
 Três artistas permaneceram durante suas existências à margem das principais galerias da época em que viveram e produziram: Reginaldo Bonfim e Edmundo Simas e Gil Abelha, todos falecidos,  que agora estão sendo homenageados com uma exposição coletiva organizada pelo artista e galerista Washington Silva intitulada de Identidades até o próximo 20 de agosto, no Museu Afro-Brasileiro da Universidade Federal da Bahia, que funciona no prédio da antiga Faculdade de Medicina, no Terreiro de Jesus. A exposição conta com obras dos homenageados Reginaldo Bonfim e Edmundo Simas, além de Leonel Mattos, Enock Silva, Raimundo Bida, Menelaw Sete, Francisco Santos, Chico Vieira, Samuel Gomes, Marcos Costa (spray Cabuloso), Anunciação e Carlos Kahan. Viviam no Centro Histórico entre botequins e os pardieiros, que não tinham qualquer conservação, até quando assumiu o governador Antônio Carlos Magalhães que convocou uma equipe competente e entregou a parte de pesquisa e cultural ao etnógrafo Vivaldo Costa Lima. O Centro Histórico foi restaurado, e hoje é motivo de orgulho, embora tenha passado por momentos de abandono por parte de alguns governadores que os sucederam. Foi neste ambiente do Centro Histórico que estes dois artistas talentosos viveram e produziram em condições muito difíceis, agravada pelos temperamentos e comportamentos de ambos. Sofriam de distúrbios mentais e isto foi um elemento importante para que houvesse uma certa discriminação, porque é difícil viver com alguém que tenha algum problema mental. Apenas o saudosos Deraldo Lima, da Galeria 13, que funcionava no Centro Histórico, e o RAG, que abriu sua galeria na orla exatamente numa casa em frente ao mar, perto da ponte, na Boca do Rio. Os dois galeristas acolhiam esta gente marginalizada e assim eles tinham onde frequentar e muitas vezes pintar. 

Foto 1. Cartaz da mostra Identidades. Foto 2 - Leonel Mattos
e Washignton Silva. Foto 3. Chico  Vieira e sua obra.
Foto 4 - Obra de Raimundo Bida
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Não tive quase aproximação com o Reginaldo Bonfim, que  nasceu em  Salvador no ano  1950  e faleceu aqui em 2007,  mas tive uma convivência com o Edmundo Simas, chamado de Super Boy. Era um entusiasta das histórias em quadrinhos e de quando em vez se arvorava de ser um desses heróis retratados nas revistas que vendiam muito nas bancas de jornais de então. Tem uma história, não sei se é verdadeira, de que certava vez improvisou umas asas e pulou de um prédio e foi cair num monte de areia que alguém estava utilizando na reforma ou construção. Todos se assustaram, mas ele teria escapado ileso. Verdade ou não, o fato é que o Super Boy seria mesmo capaz de façanhas como esta. Ele trabalhou no jornal A Tarde, se não me engano tirando as férias de alguém. Ficou por pouco tempo devido ao seu temperamento inquieto que logo com o passar dos dias começou a se tornar incompatível e foi dispensado. Consta que   fez duas exposições na Biblioteca Pública  em 1969 e 1971.Participou de outras mostras coletivas e até de salõesSeu nome completo era Edmundo Luiz da Silva Simas, nasceu Ubaitaba no ano de 1941, na Bahia,  vindo depois pra Salvador  também chegou a morar em São Paulo.

Já o Reginaldo Bonfim tive muito pouco contato. Sabe-se que nasceu em Salvador em 1950 e veio a falecer no ano de 2007. Gostava de pintar desde a infância e chegou a fazer um curso livre de pintura na Escola de Belas Artes da Universidade Federal da Bahia. Tinha uma grande facilidade em pintar, inclusive com temas e técnicas variadas de algumas escolas de arte. Devido a sua habilidade chegou a ir ao Rio de Janeiro para se apresentar num programa de televisão no Rio de Janeiro mostrando a sua arte, foi quando teve uma crise nervosa e teve que retornar.

Gostava de pintar à noite e conversando sozinho como estivesse discutindo com alguém as cores e as formas que estava deixando ali registradas na tela ou em outro suporte qualquer que conseguisse para expressar a sua arte. Usava um macacão que alguns consideram sua armadura para se defender do mundo externo, bem diferente do que vivia em suas crises de esquizofrenia. Dizem que sempre era internado e lhe medicavam muitos remédios para controlar a doença mental.

Gil Abelha com uma obra sua.

O Gildásio Feliciano Costa, o Gil  Abelha trabalhou algum tempo com publicidade e era um artefinalista e layoutista conhecido. "Layout é uma palavra inglesa, muitas vezes usada na forma portuguesa leiaute, que  significa planoarranjoesquema
designprojeto." Lembro quando estava no jornal A Tarde as agências de publicidade mandavam a arte final que já era o layout finalizado e aprovado pelo cliente para ser fotografado, e ai surgia o fotolito que era depois transferido para uma placa de metal sensibilizada que ia para a rotativa para imprimir a página do jornal. Sua arte tinha uma grande influência regionalista e enaltecia a cultura afro-brasileira. Fjundou a Associação dos Artistas |Populares do |Centro Histórico de Salvador, Bahia, e chegou a catalogar mais de 200 integrantes. Desde 1983 que se lançou no segmento das artes plásticas ,onde obteve algum destaque. Seu ateliê funcionava na Rua do Carmo , número 3, em Salvador, Bahia. Nasceu em 1955 , já faleceu em 2008.

O RAG não era um galerista de formação ou alguém que tivesse algum conhecimento de arte. Ele veio de Valença, e aqui chegando, não sei a razão, resolveu se envolver com o mercado de arte. Sua galeria parecia um depósito com obras amontoadas por todo canto. Eram centenas delas e estes artistas que pintavam compulsoriamente como Edmundo Simas e Reginaldo Bonfim encontraram um local onde podiam pintar e deixar ali suas obras para serem comercializadas. Muitas vezes o RAG comprava as obras e ficavam ali empilhadas. Eu cheguei a dizer a ele que recebesse as obras em consignação porque senão ia ter dificuldades financeiras. Mas, como os artistas eram necessitados ele sempre soltava algum dinheiro.
Apreciando as obras de Edmundo Simas e Reginaldo
Bonfim, no Mafro, no Terreiro de Jesus, Salvador
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No documentário As Cores da Utopia que Júlio Nascimento fez sobre o artista Reginaldo Bonfim ele conclui num pequeno texto que "A impressão de que eu trouxe comigo ao fim do documentário é a de que, mesmo imerso em sua loucura, Reginaldo Bonfim era tão normal quanto outras pessoas que já conheci. Na verdade, precisa-se de certa dose de loucura para desafiar qualquer modelo de ordem, para ser livre, para ser grande, para ser artista. Eu não saberia dizer se o trabalho de Reginaldo teria sido o mesmo se ele não fosse louco."

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